Arte e Sociedade: uma relação polêmica
![Café-Secagem, 1940 [Obra]](http://d3swacfcujrr1g.cloudfront.net/img/uploads/2000/01/005647001019.jpg)
Café-Secagem, 1940
Quirino Campofiorito
Óleo sobre tela, c.i.d.
46,00 cm x 56,00 cm
Texto
Histórico
A exposição Arte e Sociedade: Uma Relação Polêmica é realizada no Instituto Itaú Cultural, entre 15 de abril e 29 de junho de 2003, com curadoria de Aracy Amaral (1930). Tem como ponto central as relações ora amistosas ora conflitantes entre arte e situação política e social no Brasil. O recorte temporal da mostra percorre da década de 1930 ao início dos anos 2000. Com cerca de 240 obras, exibe pinturas, esculturas, vídeos, objetos, desenhos, mail art, instalações, registros de performances e filmes de quase cem artistas. Entre eles, Anna Bella Geiger (1933), Antonio Manuel (1947), Candido Portinari (1903-1962) e Carmela Gross (1946).
Como afirma a curadora no catálogo, a exposição tem como proposta a circunstância política ou como os artistas traçam a relação entre suas práticas e meio em que vivem: “No século XX quase todos os artistas, em algum momento ou período de sua trajetória, foram tocados pelo instante em que viveram ou vivem, e criaram obras motivadas pela circunstância política e/ou social de seu tempo”1.
A exposição busca apresentar aspectos deste fenômeno na arte brasileira a partir de 1930, sem pretensões de esgotar o tema. Artistas como Tarsila do Amaral (1886-1973), Lívio Abramo (1903-1992) e Di Cavalcanti (1897-1976), cada um a seu modo e em diferentes fases de suas trajetórias, expressam preocupação social nas poéticas que caracterizam suas obras. É o momento da Guerra Civil Espanhola, no plano internacional, e do Governo Vargas, no Brasil. Já Portinari, a partir de meados dos anos 1930, “encarna o artista comprometido com a realidade brasileira”2. Influenciado pela produção do artista mexicano Diego Rivera (1886-1957), em um primeiro momento, o artista aborda as condições miseráveis dos trabalhadores brasileiros, imersos em cenário socioeconômico frágil. É o caso da tela Café (1935), presente na mostra, na qual a figura humana adquire formas robustas, com agigantamento de mãos e pés, recurso que reforça a ligação do personagem com o mundo do trabalho e da terra.
Outro destaque são as obras dos artistas que participam dos clubes de gravura fundados no país na década de 1940. Influenciados pelas artes gráficas chinesa e mexicana e tendo Carlos Scliar (1920-2001) como figura central, esses clubes marcam uma produção importante no Brasil. Sem dúvida, o mais duradouro é o Clube de Gravura de Porto Alegre, com grande número de associados, que recebem regularmente uma gravura em troca da subscrição. A produção de Abelardo da Hora (1924-2014), à frente do Atelier Coletivo, no Recife, também faz parte da mostra. “A temática sempre se manteve próxima à focalização de cenas de trabalhadores ou de movimentos de reivindicação (como no caso dos clubes de gravura sob a liderança de Scliar, com os artistas gaúchos)”3.
A exposição perpassa dois coletivos de artistas importantes para o cenário artístico nacional, atuantes entre os anos 1930 e 1940: a Família Artística Paulista e o Núcleo Bernardelli. Este, sediado no Rio de Janeiro, tem José Pancetti (1902-1958) e Milton Dacosta (1915-1988) como artistas participantes da mostra. Segundo a curadora, “move-os a temática de sua vida corrente, cenas de trabalhadores em seus afazeres, autorretratos, retratos de colegas em trabalho de ateliê, paisagens dos arredores de centros urbanos”4.
Também são exibidas obras que marcam a chegada do abstracionismo ao Brasil e a difícil relação dele com a arte figurativa brasileira em fins dos anos 1940. O término da Segunda Guerra Mundial coincide com a emergência de uma nova geração de artistas. Há a confluência de uma pintura expressionista, como é o caso de Marcelo Grassmann (1925-2013), e o início de uma pintura abstrata, influenciada pela arte concreta, como é o caso das produções de Luiz Sacilotto (1924-2003) e Geraldo de Barros (1923-1998). As obras desses artistas estão presentes na mostra, em um núcleo que aponta o caminho da arte moderna no Brasil. Este caminho passa pela institucionalização da arte, com a fundação de museus de arte moderna e da primeira edição da Bienal de São Paulo (1951).
Parte substancial da exposição é dedicada à produção artística do período de ditadura militar. Como escreve Aracy Amaral, “é um tempo em que o artista – como os intelectuais e os universitários – passa a olhar seu entorno e a desejar participar vivamente dos eventos. Com a implantação do regime militar no Brasil em fins de março de 1964 ocorre outra realidade, difícil de entender nos dias de hoje: a existência da censura, a dificuldade de livre expressão, o cerceamento de liberdades elementares, o exílio e mesmo o patrulhamento de atitudes de personalidades do meio artístico ou universitário”5. O corpo torturado, vitimado, desaparecido, despedaçado é referente para essas obras. É também o momento em que a arte brasileira sofre influência da pop art em meio ao conturbado panorama político. Dois artistas colocam-se nesse quadro de forma especial: “Carlos Vergara e Rubens Gerchman trazem à tona cenas do cotidiano urbano com imagética marcante em suas contribuições” [6]. A geração dos anos 1960 e 1970, de modo geral, encaminha sua produção rumo à arte conceitual e ao confronto com a ditadura, expondo as contradições e a violência do Estado contra o cidadão.
O último núcleo da mostra dedica-se à redemocratização do país e ao aumento da violência urbana no fim do século XX. Questões ambientais também se tornam uma preocupação da sociedade. Nesse contexto, destacam-se as obras de Carmela Gross e Nuno Ramos (1960), que refletem, direta ou indiretamente, sobre a violência e a exclusão social.
Notas
1 AMARAL, Aracy. Arte e sociedade: uma relação polêmica. São Paulo: Instituto Itaú Cultural, 2003, s/p.
2 Idem, ibidem.
3 Idem, ibidem.
4 Idem, ibidem.
5 Idem, ibidem.
6 Idem, ibidem.
Ficha Técnica
Aracy Amaral
Curadoria (assistente)
Regina Teixeira de Barros
Artista participante
A. Marx
Abelardo da Hora
Ado Malagoli
Alfredo Volpi
Anna Bella Geiger
Anna Maria Maiolino
Antonio Dias
Antonio Henrique Amaral
Antonio Manuel
Artur Barrio
Augusto Rodrigues
Avatar Moraes
Bené Fonteles
Bonadei
Bruno Giorgi
Caio Reisewitz
Candido Portinari
Carlos Prado
Carlos Scliar
Carlos Vergara
Carlos Zilio
Carmela Gross
Cildo Meireles
Claudio Tozzi
Clóvis Graciano
Danúbio Gonçalves
Di Cavalcanti
Edgar Koetz
Egberto Nogueira
Flavio-Shiró
Francisco Rebolo
Francisco Stockinger
Frans Krajcberg
Geraldo de Barros
Gilvan Samico
Glauco Rodrigues
Glenio Bianchetti
Guido Viaro
Hélio Oiticica
Hélios Seelinger
Henrique Oswald
Hilda Campofiorito
Ionaldo
Ivan Serpa
Ivens Machado
João Câmara
Jorge Mori
José Cláudio
José Pancetti
José Roberto Aguilar
Lasar Segall
Lívio Abramo
Loio-Pérsio
Lothar Charoux
Luiz Sacilotto
Marcello Grassmann
Marcello Nitsche
Marcelo Zocchio
Marina Caram
Mário Gruber
Mário Ishikawa
Mário Zanini
Maurício Fridman
Maurício Nogueira Lima
Milton Dacosta
Nelson Leirner
Newton Rezende
Nuno Ramos
Octávio Araújo
Oswaldo Goeldi
Paulo Bruscky
Pedro Escosteguy
Poty Lazzarotto
Quirino Campofiorito
Raimundo Cela
Raphael Galvez
Regina Silveira
Renina Katz
Rescála
Rochelle Costi
Rosana Palazyan
Rosana Paulino
Rosângela Rennó
Rossi Osir
Rubem Grilo
Rubens Gerchman
Samuel Szpigel
Sidney Philocreon
Sigaud
Siron Franco
Tarsila do Amaral
Ubirajara Ribeiro
Vasco Prado
Virginia Artigas
Waltercio Caldas
Wellington Virgolino
Yoshiya Takaoka
Obras 16
1954, I
A Camponesa
A Realidade Brasileira
Acidente de Trabalho
As Erradias
Fontes de pesquisa 5
- ARTE e sociedade: uma relação polêmica. Curadoria Aracy Amaral. São Paulo: Itaú Cultural, 2003.
- BRUSCKY, Paulo. [Currículo virtual]. Disponível em: https://nararoesler.art/usr/documents/artists/custom_cv_url/56/2023_nara-roesler_paulo-bruscky_cv.pdf. Acesso em 25 Nov. 2023
- GALERIA MENDES WOOD. Envio de materiais da artista Rosana Paulino [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por enciclopedia@itaucultural.org.br em 13 ago. 2021.
- MAIOLINO, Anna Maria. [Currículo virtual]. Disponível em: http://annamariamaiolino.com/linha-do-tempo-amm.html. Acesso em: 18 Out. 2023
- RENNÓ, Rosângela. [Currículo virtual]. Disponível em: http://www.rosangelarenno.com/biografia/pt. Acesso em: 09 nov. 2023.
Como citar
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ARTE e Sociedade: uma relação polêmica.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/evento356680/arte-e-sociedade-uma-relacao-polemica. Acesso em: 04 de maio de 2025.
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