Nuno Ramos
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Maré Mobília, 2000
Nuno Ramos
Texto
Nuno Alvarez Pessoa de Almeida Ramos (São Paulo, São Paulo, 1960). Artista plástico, escritor, diretor de cinema, dramaturgo e músico. Ao explorar diferentes linguagens, Nuno Ramos trabalha com formas e materiais distintos, trazendo à tona a brutalidade da realidade.
Forma-se em filosofia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) em 1982. Durante a graduação, edita a revista Almanaque-80 com poemas, ensaios e artes visuais, e a revista Kataloki, um panorama da poesia paulista do período. Em 1983, funda o ateliê Casa 7 com os artistas plásticos Paulo Monteiro (1961), Rodrigo Andrade (1962), Carlito Carvalhosa (1961) e Fábio Miguez (1962). O grupo se dissolve depois da participação da 18ª Bienal Internacional de São Paulo, em 1985.
Recebe o Prêmio Aquisição do 2º Salão Paulista de Arte Contemporânea e o Prêmio Viagem ao Exterior do 7º Salão Nacional de Artes Plásticas em 1984, e a bolsa Émile Eddé, do MAC USP, em 1987. De 1988 a 1990, destacam-se os quadros de grandes dimensões que recebem aplicação de diversos materiais, como parafina, breu, lona e sucata.
Até 1991, trabalha sobretudo com pinturas e, ao longo do anos 1990, começa a explorar outras linguagens, como a escrita, a escultura, a instalação e a land art (ou earthwork). Em 1993, publica seu primeiro livro, Cujo, e, em 1995, o livro-objeto Balada.
Desse novo período, distingue-se a obra 111 (1992-1993), instalação que relembra o assassinato, em 1992, de 111 presidiários pela Polícia Militar na rebelião da Casa de Detenção de São Paulo. A obra apresenta, no Instituto Estadual de Artes de Porto Alegre, 111 lápides em forma de paralelepípedos, cobertas de asfalto e com os nomes das vítimas. Cada paralelepípedo traz um recorte de jornal com a notícia do massacre além de cinzas de páginas da Bíblia. Na parede, o artista fixa um texto de sua autoria em letras de parafina em pequenas superfícies de vidro também preenchidas com folhas da Bíblia queimadas.
Ao contrário de muitos artistas contemporâneos, Nuno não compreende vida e obra como coisas de mesma natureza, entre as quais se realiza uma continuidade. Para ele, essa relação só se dá por caminhos forçados, o que o leva a instaurar descontinuidade radical em seus trabalhos. Como afirma o crítico Rodrigo Naves (1955), Nuno busca “a revelação de uma instância bruta da realidade”, “uma formalização que, em lugar de domesticar, exponencie a materialidade do mundo”1. Daí a importância da matéria em sua obra, presente também no uso da linguagem, pois as palavras são realizadas com materiais como a parafina, e devem ser esculpidas como tal.
Em 1994, é contemplado com bolsa da Fundação Vitae, mesmo ano em que recebe o prêmio da Associação Nacional de Críticos de Arte. Vence, em 2000, concurso realizado em Buenos Aires para a construção de um monumento em memória aos desaparecidos durante a ditadura militar naquele país.
A estreia no cinema se dá em 2002 com Luz Negra. Em 2005 recebe o Prêmio Mário Pedrosa como artista de linguagem contemporânea da Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA), e, em 2006, o prêmio da Barnett and Annalee Newman Foundation, de Nova York, pelo conjunto da obra e pela contribuição às artes visuais. A produção literária segue com as publicações da coletânea de narrativas Pão de Corvo (2001), o compilado de fragmentos da produção artística, projetos e ensaios Ensaio Geral (2007), o vencedor do Prêmio Portugal Telecom Ó (2008) e o livro de contos O Mau Vidraceiro (2010).
O crítico Lorenzo Mammì (1957) compara a escrita de Nuno com os quadros e observa em ambos o mesmo comportamento: não é possível uma visão unitária, nem uma leitura por partes. Para ele, os trabalhos de Nuno Ramos surgem de uma comunicação interrompida entre corpo e signo que faz com que a obra “transborde de um lado ou de outro: num excesso de matéria ou num excesso de significado”2. Dada sua complexidade, é difícil apreender a obra de Nuno Ramos. Com várias proposições formais, sua unidade parece residir nos questionamentos que propõe.
Em 2018, dirige a peça A Gente se Vê por Aqui, na qual os atores permanecem em cena por 24 horas. A abordagem da cultura e da política brasileiras voltam a ser exploradas em 2019 com o livro de ensaios Verifique se o Mesmo.
O trabalho de Nuno Ramos aborda, com diferentes linguagens, temas próprios do contemporâneo. Do tratamento mais alusivo à crítica mais provocadora, o artista coloca em debate questões relacionadas a cultura, política, concretude e potencialidade de transformação dos materiais.
Notas
1. Ver NAVES, Rodrigo. Nuno Ramos: uma espécie de origem. In: NAVES, Rodrigo. O Vento e o Moinho: ensaios sobre arte moderna e contemporânea. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
2. Ver MAMMÌ, Lorenzo. Noites brancas. Curitiba: Casa da imagem, 1999.
Obras 57
Exposições 276
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18/11/1983 - 11/12/1983
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7/12/1985 - 20/1/1984
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Mídias (2)
Produção: Documenta Vídeo Brasil
Captação, edição e legendagem: Sacisamba
Intérprete: Erika Mota (terceirizada)
Locução: Júlio de Paula (terceirizado)
Links relacionados 1
Fontes de pesquisa 40
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NUNO Ramos.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
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