Lívio Abramo
![Sem Título, 1964 [Obra]](http://d3swacfcujrr1g.cloudfront.net/img/uploads/2000/01/011463001019.jpg)
Sem Título, 1964
Lívio Abramo
c.i.e.
18,00 cm x 29,00 cm
Texto
Lívio Abramo (Araraquara, São Paulo, 1903 – Assunção, Paraguai, 1992). Gravador, ilustrador, desenhista. Abramo tem como marca a versatilidade. Dos temas aos métodos, expressa em suas obras os acontecimentos sociopolíticos de seu tempo, além de explorar diferentes técnicas. Constrói uma carreira sólida, mas flexível à experimentação, contribuindo para as artes plásticas em diferentes esferas.
Lívio Abramo começa a estudar desenho com Enrico Vio (1874-1960) em 1909. Com incentivo do professor, segue a carreira artística, fazendo suas primeiras ilustrações para pequenos jornais na década de 1920. Autodidata em gravura, realiza, em 1926, suas primeiras obras, trabalhando de forma rudimentar com lâminas quebradas em pedaços de madeira. Adquire pouco depois suas primeiras goivas1. Em 1928 e 1929, faz gravuras em linóleo para o jornal Lo spaghetto, em que retrata a vida operária em formas bastante simplificadas, ao estilo cubista. No fim da década, conhece as gravuras de Oswaldo Goeldi (1895-1961) e visita mostras de expressionistas alemães, que o afetam pela força e expressividade de sua arte, cheia de cor e de sentimento, manifestando o desejo de transformação que o artista procurava definir em seu trabalho.
No início dos anos 1930, a obra de Lívio Abramo é bastante influenciada pelo movimento da antropofagia, apresentando formas largas e arredondadas ao estilo de Tarsila do Amaral (1886-1973), com elementos paisagísticos estilizados e deformação dos personagens. As linoleogravuras Litoral fluminense e Mulher e bananal, ambas de 1933, são exemplos dessa fase. Outra influência importante que se manifesta nos trabalhos de Abramo é sua relação com a política. No período varguista, o artista se filia ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), do qual é expulso em 1932. Em 1931, começa a trabalhar no Diário da noite como desenhista, mas, como suas charges são consideradas demasiado críticas – a exemplo de Inundação no Canindé (ca.1932) –, é designado para o cargo de titulista da seção internacional, no qual permanece até 1962. Em paralelo, dedica-se ao sindicalismo.
O engajamento político de Abramo resulta em trabalhos com forte temática social. Tanto nas obras da fase operária, tais como as xilogravuras Meninas de fábrica (1935) e Operário (1935), quanto nas que tiveram como tema as guerras, o artista segue a linguagem expressionista, marcada pela dramaticidade e monumentalidade das cenas. A xilogravura Guerra-medo (1937), por exemplo, foca o rosto de duas pessoas que se abraçam, aparentemente numa tentativa de se proteger diante de uma ameaça. Todo o rosto das duas personagens se contorce de medo: os olhos arregalados, as pupilas dilatadas e a boca aberta dão a dimensão desse sentimento. Impressionado com a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), realiza a série Espanha (1938), com gravuras contundentes que revelam sua oposição ao conflito. Faz parte dessa série a xilogravura Bombardeio (1940), em que uma mulher, ao centro, diante de um pequeno corpo morto e à frente de corpos indistintos que se amontoam, encolhe-se para se defender.
Na década de 1940, conhece o alemão Adolphe Köhler (1882-1950), professor de gravura, que o auxilia a dar refinamento técnico ao trabalho, tanto no tratamento da madeira utilizada nas pranchas quanto no uso de buris mais sofisticados, raiados, que, em um só golpe, cortam a madeira em diversos cortes paralelos, produzindo matizes diferenciados e variados. Em 1946, viaja para a região de caatinga de Minas Gerais e Bahia para realizar as ilustrações do livro Pelo sertão (1946), de Afonso Arinos de Mello Franco (1868-1916), com xilogravuras em papel-arroz. Afasta-se da estética expressionista e procura nova solução formal, mais despojada e sintética. O uso da madeira de topo permite mais delicadeza nos cortes, que, aliada a novos instrumentos, serve para expressar melhor seu conceito de luz, cor e forma da paisagem brasileira. A xilogravura de mesmo nome do livro, Pelo sertão (1948), evidencia essa mudança, exibindo formas mais geometrizadas.
Nos anos seguintes, na década de 1950, Abramo passa a privilegiar o abstracionismo em suas obras. As séries de gravuras Rio (1953), Festa (1954) e Mandala (1955), mostram essa tendência, a partir da qual o artista cristaliza melhor sua linguagem gráfica, valorizada pela diversidade de tons e texturas que articulam figuras e planos. Com a série Rio, é premiado como o melhor gravador nacional na 2ª Bienal Internacional de São Paulo em 1953.
A convite do Itamaraty, integra, em 1962, a Missão Cultural Brasileira no Paraguai, que, posteriormente, tornou-se o Centro de Estudos Brasileiros. Muda-se para lá, onde se radica, e dirige, até 1992, o Setor de Artes Plásticas e Visuais.
É fundador do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Paraguai. Nas gravuras da fase paraguaia, recria a paisagem do país, trabalhando com pontilhados e linhas que se aproximam da renda local, nhanduti, muito delicada. Intensifica-se a simplificação da forma, predominam os elementos horizontais e verticais, que dão um ritmo intenso, lírico e por vezes dramático a composições quase abstratas, em que o artista não perde o referencial visual, buscando traduzir a geometria das fachadas das casas e dos povoados.
A produção de Lívio Abramo situa-se entre a figuração e a abstração. Seu engajamento ao programa modernista gradualmente é alterado pela abertura às vertentes não figurativas que começam a chegar ao Brasil após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O artista consegue conciliar, de maneira peculiar, esses dois conceitos opostos e, com refinamento técnico, apresenta em seu trabalho soluções formais de grande interesse estético.
Notas
1. Instrumentos cortantes utilizados no entalhe em madeira.
Obras 39
Assombramento
Bombardeio
España - Vieja Castilla
Espanha
Festa
Exposições 292
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25/1/1935 - 24/2/1935
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14/12/1936 - 14/1/1935
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11/1939 - 12/1939
Fontes de pesquisa 27
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- MOSTRA DO REDESCOBRIMENTO, 2000, SÃO PAULO, SP. Arte moderna. Curadoria Nelson Aguilar, Franklin Espath Pedroso, Maria Alice Milliet; tradução Izabel Murat Burbridge, John Norman. São Paulo: Associação Brasil 500 anos Artes Visuais/ Fundação Bienal de São Paulo, 2000.
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Como citar
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LÍVIO Abramo.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa9132/livio-abramo. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7