Expo-Projeção 73
Texto
Histórico
Mostra organizada por Aracy Amaral (1930) e realizada em junho de 1973, na sede do Grupo de Realizadores Independentes de Filmes Experimentais (Grife), em São Paulo. Trata-se de uma das primeiras iniciativas curatoriais no país que reúne obras audiovisuais e obras sonoras. Produções desconhecidas do público traduzem com imagens e sons a multiplicidade temática e estética da cena cultural da época. A mostra exibe a produção de 42 autores que formam a primeira geração de artistas brasileiros que operam com linguagens multimídias, especialmente com o vídeo.
A exposição reúne duas gerações importantes: artistas com trajetória consolidada e experiência com abstração geométrica – como Hélio Oiticica (1937-1980), Décio Pignatari (1927-2012) e Lygia Pape (1927-2004) – e uma nova geração que presencia o concretismo e o neoconcretismo e começa experimentações com a pop art, o minimalismo, a arte conceitual e a arte povera. Desse grupo, fazem parte Artur Barrio (1945), Carlos Vergara (1941) e Claudio Tozzi (1944).
Credita-se à Aracy Amaral a iniciativa de aproximar essas duas gerações e expor a qualidade da produção audiovisual brasileira, ainda incipiente no país. Diferentemente de mostras tradicionais, a curadora propõe expandir e questionar as fronteiras da arte visual brasileira.
A produção artística brasileira na década de 1970 acelera o processo de interdisciplinaridade – a fotografia aproxima-se da pintura, como na obra de Miguel Rio Branco (1946) – e questiona a ideia de registro na performance. Há uma preocupação da curadoria em criar meios de exposição e crítica de uma produção artística que investiga novas percepções e criações da imagem por meio do audiovisual e do som e questiona ou amplia a noção de registro e performance na prática artística brasileira.
Hélio Oiticica apresenta a obra Neyrótica (1973), um audiovisual contendo 80 slides dos “garotos de ouro de Babylonests”. Segundo o texto do artista presente no catálogo da exposição:
NÃONARRAÇÃO porque
não é estorinha ou
imagens de fotografia pura
ou algo detestável como "audio-visual"
porque NARRAÇÃO seria o q já foi
e já não é mais há tempos:
tudo o q de esteticamente retrógrado existe
tende a reaver representação narrativa
E complementa:
NÃONARRAÇÃO é NÃODISCURSO
NÃO FOTOGRAFIA "ARTÍSTICA".
NÃO "AUDIO-VISUAL": trilha de som
é continuidade pontuada de
interferência acidental improvisada
na estrutura gravada do rádio que é
juntada à sequência projetada de slides
de modo acidental e não como sublinhamento da mesma
– é play-invenção.
A Super-8, em especial, passa a ser uma mídia bastante utilizada pelos artistas brasileiros no início da década de 1970. Além de proporcionar a experimentação de uma nova poética, o equipamento apresenta baixo custo e oferece a possibilidade de aproximação de determinadas pesquisas pictóricas do universo do cinema. O depoimento de Lygia Pape para o catálogo da mostra é elucidativo desse momento: “O S8 é realmente uma nova linguagem, principalmente quando também está livre de um envolvimento mais comercial com o sistema. É a única fonte de pesquisa, a pedra de toque da invenção, hoje”. A característica ágil da câmera Super-8 permite o registro imediato e livre dos esquemas tradicionais de montagem – e a exposição torna clara essa nova qualidade de aparição e pesquisa da imagem no meio das artes visuais.
Outro ponto ressaltado no texto da curadora é o caráter não comercial das obras, possivelmente pelo fato de serem um elemento novo e estranho ao mercado que tem pintura e escultura como desígnios principais do que se chama arte.
Os legados desta mostra são o caráter do novo, a proximidade do artista com o meio ambiente, as ações ordinárias pertencentes à ordem do antiespetáculo, ou seja, “o próprio mundo se transformando em museu”1. Além disso, o destaque da televisão no meio cultural do país e sua linguagem eletrônica e midiática servem como proposta de trabalho e material de crítica para esses artistas, visto que há, em certa medida, preocupação política de crítica aos meios de informação e à sociedade capitalista.
Expo-projeção 73 é um marco no histórico das exposições realizadas no Brasil pelo caráter de ineditismo e pela forma como apresenta e demarca as primeiras iniciativas artísticas voltadas para o estudo da imagem em movimento.
Notas
1 No texto do catálogo, Aracy Amaral retoma a frase do crítico norte-americano Harold Rosenberg (1906-1978).
Ficha Técnica
Aracy Amaral
Artista participante
Anna Bella Geiger
Anna Maria Maiolino
Antonio Dias
Antonio Manuel
Artur Barrio
Beatriz Dantas
Carlos Vergara
Cildo Meireles
Ciro Flamarion S. Cardoso
Claudio Tozzi
Décio Pignatari
Donato Ferrari
Frederico Morais
Gabriel Borba
George Helt
Hélio Oiticica
Iole de Freitas
Ismenia Coaracy
João Ricardo Moderno
Julio Abe Wakahara
Luiz Alberto Mota Pelegrino
Luiz Alphonsus
Lygia Pape
Marcello Nitsche
Mario Cravo Neto
Mariselda Bumajny
Maurício Andrés Ribeiro
Maurício Cirne
Maurício Fridman
Olívio Tavares de Araújo
Paulo Emílio Lemos
Paulo Fogaça
Raymundo Colares
Rubens Gerchman
Savério
Victor Knoll
Fontes de pesquisa 7
- AMARAL, Aracy. Algumas idéias em torno à EXPO-PROJEÇÃO 73. Expoprojeção73, São Paulo, 1973. Catálogo da exposição. Disponível em: < http://www.expoprojecao.com.br/_pdf/expo_catalogo_73.pdf >. Acesso em: 21 jul. 2017.
- CANONGIA, Ligia. Quasi cinema: cinema de artista no Brasil, 1970-80. Rio de Janeiro: Funarte, 1981. (Col. Arte Brasileira Contemporânea).
- COCCHIARALE, Fernando; PARENTE, André. Filmes de artista: Brasil, 1965-80. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2007.
- GRUPO de Estudos em Arte Conceitual e Conceitualismos no Museu (GEACC). Terra Brasilis: arte brasileira no acervo conceitual do MAC USP. São Paulo: MAC USP, 2019. (MAC essencial, 9).
- MACIEL, Katia. Transcinemas. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2009.
- MAIOLINO, Anna Maria. [Currículo virtual]. Disponível em: http://annamariamaiolino.com/linha-do-tempo-amm.html. Acesso em: 19 Out.2023
- PONTUAL, Roberto. Arte/ Brasil/ hoje: 50 anos depois. São Paulo: Collectio, 1973.
Como citar
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EXPO-PROJEÇÃO 73.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/evento221139/expo-projecao-73. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7