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Enciclopédia Itaú Cultural
Música

João Bosco

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 02.08.2023
13.07.1946 Brasil / Minas Gerais / Ponte Nova
João Bosco de Freitas Mucci (Ponte Nova, Minas Gerais, 1946). Compositor, cantor, violonista. Na infância, canta nas missas da cidade natal e estuda violão. Em 1962, muda-se para Ouro Preto, Minas Gerais, para estudar mineralogia e, depois, engenharia civil. Em 1967, compõe três canções com Vinícius de Moraes (1913-1980): “Rosa dos Ventos”, “Sam...

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João Bosco de Freitas Mucci (Ponte Nova, Minas Gerais, 1946). Compositor, cantor, violonista. Na infância, canta nas missas da cidade natal e estuda violão. Em 1962, muda-se para Ouro Preto, Minas Gerais, para estudar mineralogia e, depois, engenharia civil. Em 1967, compõe três canções com Vinícius de Moraes (1913-1980): “Rosa dos Ventos”, “Samba do Pouso” e “O Mergulhador”.

Em 1970, conhece Aldir Blanc (1946-2020), que se torna seu maior parceiro musical. Em 1972, participa do compacto Disco de Bolso, projeto dirigido por Sérgio Ricardo (1932) e lançado pelo jornal O Pasquim. No lado A, Tom Jobim (1927-1994) registra “Águas de Março”; no lado B, João Bosco estreia como cantor em “Agnus Sei”. A canção chama a atenção de Elis Regina (1945-1982), que grava “Bala com Bala”, composta pela dupla João e Aldir. 

No ano seguinte, muda-se para o Rio de Janeiro e lança o primeiro LP pela RCA Victor. Em 1974, Elis Regina registra três músicas dele: “Mestre Sala dos Mares”, “Dois Pra Lá, Dois Pra Cá” e “Caça à Raposa”. Com o sucesso das canções na voz de Elis Regina, João grava o segundo LP, Caça à Raposa (1975). No ano seguinte, lança Galos de Briga, marcado pela canção “Transversal do Tempo”, regravada por Elis Regina e que dá título ao show da cantora. Em 1979, grava a canção “O Bêbado e o Equilibrista”, outro sucesso na voz de Elis Regina.

Em 1982, lança Comissão de Frente, cuja canção-título alcança sucesso na voz de Clara Nunes (1943-1983). Em 1983, participa de seu primeiro show internacional, no festival de Montreaux. No ano seguinte, lança Gagabirô, álbum em que explora novas sonoridades, como a música africana e caribenha, e outros parceiros, como Capinan (1941), com quem compõe “Papel Machê” e “Imã dos Ais”. Em 1986, dá continuidade às experimentações com a música africana em Cabeça de Nego. No ano seguinte, assina contrato com a gravadora CBS Records e lança Ai Ai de Mim, álbum com toques jazzísticos e participação de músicos estrangeiros. Em 1989, grava Bosco, com destaque para “Corsário”, parceria com Aldir Blanc, faixa antecipada pela declamação do poema “E Então, que Quereis”, do poeta russo Vladimir Mayakóvski (1893-1930). 

Em 1995, lança Dá Licença, Meu Senhor, álbum em que interpreta outros compositores e divide os vocais com Martinho da Vila (1938) em “Pagodespell”, canção adaptada de um poema de Oswald de Andrade (1890-1954), com a colaboração de Caetano Veloso (1942) e Chico Buarque (1944). Em 1997, lança As Mil e Uma Aldeias, incursão na música árabe. Esse trabalho marca o início da parceria com seu filho, Francisco Bosco (1976). Em 2000, grava o vigésimo disco, Na Esquina, retornando para a temática afro-cubana. Em 2003, lança Malabaristas do Sinal Vermelho, projeto com 11 canções inéditas, e Songbook, livro de cifras e letras do compositor, idealizado pelo músico Amir Chediak (1950-2003). Em 2006, grava o primeiro DVD, Obrigado, Gente, gravado em São Paulo. Em 2009, lança Não Vou para o Céu, Mas Já Não Vivo no Chão, álbum apenas com canções inéditas.

 

Análise

João Bosco é um artista versátil. Cantor, compositor e violonista. É difícil atribuir-lhe um estilo, pois a vasta produção do artista mistura e experimenta diversas sonoridades e faz referência a diversos gêneros musicais do século XX. É um ouvinte atento ao que é produzido na música brasileira e mundial. Em suas canções, percebe-se a influência do choro de Ernesto Nazareth (1863-1934) ao samba carioca dos anos 1930; do bolero do compositor francês Maurice Ravel (1875-1937) aos boleros populares nacionais dos anos 1940 e 1950 (e que participam de sua formação musical em Minas Gerais). Nos primeiros discos, encontra-se a maneira percussiva de tocar violão – que o aproxima da bossa nova –, mas com andamento mais acelerado, típico dos violonistas de choro. Outra característica marcante é a divisão rítmica e harmônica das canções, que o aproxima do jazz estadunidense. 

Como compositor, divide com parceiros a maior parte das músicas. Invariavelmente, João compõe a melodia, e seus parceiros, a letra. O primeiro deles, ainda nos tempos de estudantes, foi Vinicius de Moraes, com quem compõe três canções. Entre outros parceiros estão Capinan, Antônio Cícero (1945), Paulo Emílio (1941-1990), Antônio Maria (1921-1964), Chico Buarque, Martinho da Vila, Francisco Bosco e Aldir Blanc, seu parceiro mais constante, com quem compõe mais de uma centena de canções. 

As melodias de Bosco articulam-se perfeitamente com as letras de Blanc, crônicas do cotidiano sobre a cidade do Rio de Janeiro, as ruas e as pessoas. Segundo Elis Regina, a dupla retrata sua época com sinceridade. Desse período, destacam-se os sambas-enredos “Mestre-Sala dos Mares” (1974) e “O Bêbado e o Equilibrista” (1979), canções de protesto político, compostas no período da ditadura militar. A primeira é uma homenagem a João Candido (1880-1969), marinheiro negro, líder da revolta da Chibata em 1910:

 

Há muito tempo

Nas águas da Guanabara

O dragão do mar reapareceu

Na figura de um bravo feiticeiro

A quem a história não esqueceu

Conhecido como o navegante negro

Tinha a dignidade de um mestre-sala

 

A segunda música, considerada um hino de combate à ditadura militar, defende a anistia dos exilados políticos, como o sociólogo Herbert de Souza (1935-1997), o Betinho, irmão do cartunista Henfil (1944-1988):

 

Meu Brasil  

Que sonha com a volta do irmão do Henfil  

Com tanta gente que partiu  

Num rabo de foguete.

 

A canção também aborda outro tema delicado: a tortura e a morte durante a ditadura militar, como a do jornalista Vladimir Herzog (1937-1975). Nos versos “Chora a nossa pátria, mãe gentil / Choram marias e clarisses no solo do Brasil”, Clarisse é a esposa de Herzog, assassinado pelo regime. 

Além de sambas, João Bosco ousa compor boleros, gênero associado à música pouco refinada. Dois pra Lá, Dois pra Cá (1974) é sucesso na voz de Elis Regina. Os versos da canção inspiram o título de um dos maiores shows da carreira da cantora, Falso Brilhante

 

No dedo um falso brilhante

Brincos iguais ao colar 

E a ponta de um torturante 

Band-aid no calcanhar. 

 

No álbum Galos de Briga, as canções aproximam-se da música africana, característica de toda a obra posterior do compositor. Nesse disco, João é influenciado pela cantora Clementina de Jesus (1902-1987) e mescla elementos musicais presentes na religião africana, como lundus, corimás, incelências. A partir de Gagabirô, João une o samba brasileiro à musicalidade africana e cubana. Esse álbum inicia nova fase de seu trabalho. As palavras das canções aproximam-se cada vez mais do som: as letras estão associadas à sonoridade percussiva, com onomatopeias sintonizadas com congadas e jongos, como em “Tambores” (1984). Os versos dessa canção são onomatopeicos, marcados pela sonoridade dos dialetos africanos: 

 

Caí no cha-cha-cha  

Caí no mabojá  

Caí no sambabá  

Caí no yorubá  

Batá e Bembé 

Yuka e Arará  

Africaribe  

Iyesa. 

 

A canção “Gagabirô” (1984) é inspirada nos cantos de wemba, canção de ritual afro-cubano. No disco seguinte, Cabeça de Nego, o compositor radicaliza os experimentalismos, com o violão mais percussivo e próximo da dialética musical africana, caracterizada pela função estética e ritualística.

Na década de 1990, lança As Mil e Uma Noites, disco em que inicia parceria com o filho Francisco Bosco. Em 1997, os dois compõem “Das Marés”, “Convocação”, “Enquanto Espera” e “O Sacrifício”. João pesquisa também sobre a música árabe, resgatando tradições de sua família, de origem síria. Comprovando a capacidade em transitar por diferentes gêneros em uma mesma canção, produz a trilha sonora do espetáculo Benguelê, apresentado em 1998 pela Companhia de Dança Grupo Corpo. Segundo o próprio compositor, Benguelê é “uma forma de viagem”: o compositor mistura a música espanhola, com destaque para o flamenco, com as sonoridades árabe, caribenha e africana.

Obras 2

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Espetáculos de dança 1

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João Bosco | No Estúdio IC (2023)
Na estreia de “No estúdio IC”, João Bosco escava seus mais de 50 anos de carreira e 30 álbuns lançados para escolher duas músicas. Com voz e violão, o mineiro conduz uma apresentação em que relembra sua primeira ida ao Rio de Janeiro, permeada do encontro com a bossa nova e das suas observações sobre o Brasil e suas ambiguidades: a beleza e a desigualdade.

João mergulha em duas canções que são crônicas sobre o cotidiano e abre as portas dos seus processos de composição. Interessado por música desde criança, deixa aqui um registro do seu fazer artístico.

“No estúdio IC” é uma série de programas que trazem grandes nomes da cultura brasileira para a apresentação de duas músicas e uma conversa intimista sobre elas, revivendo memórias, reflexões e vivências.

Fontes de pesquisa 6

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  • BOSCO, João; BLANC, Aldir. João Bosco e Aldir Blanc. [São Paulo]: Abril Cultural, 1977. (Nova História da Música Popular Brasileira).
  • CHEDIAK, Ami. João Bosco – Songbook. Vol. 2. Rio de Janeiro: Lumiar, 2003.
  • CHEDIAK, Ami. João Bosco – Songbook. Vol. 3. Rio de Janeiro: Lumiar, 2003.
  • CHEDIAK, Amir. João Bosco – Songbook. Vol. 1. Rio de Janeiro: Lumiar, 2003.
  • DINIZ, André. Almanaque do samba: a história do samba, o que ouvir, o que ler, onde curtir. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.
  • NAPOLITANO, Marcos. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural na MPB (1959-69). São Paulo: Annablume, 2001.

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