Banda Black Rio
Texto
Grupo musical formado no Rio de Janeiro, em 1976. Sob liderança, do saxofonista Oberdan Magalhães (1945-1984), a formação original traz também: Barrosinho (c.1940-2009) no trompete, Cristovão Bastos (1946) no piano, Jamil Joanes no baixo, Luiz Carlos dos Santos (1946-2007) na bateria e percussão, Lúcio Silva no trombone e Cláudio Stevenson (1955-1987) na guitarra. A banda constrói uma trajetória de pioneirismo na fusão de ritmos brasileiros com influência do soul e do jazz estadunidense, com elaborados arranjos de sopros e uma sonoridade apoiada na maioria das vezes em temas instrumentais e dançantes.
A formação do conjunto é motivada pelo interesse da gravadora Warner Music em acompanhar um fenômeno dos subúrbios do Rio de Janeiro batizado como Movimento Black Rio: festas que reúnem milhares de jovens para dançar ao som de artistas estrangeiros, como os cantores estadunidenses James Brown (1933-2006), Isaac Hayes (1942-2008) e a banda Kool and Gang. Dom Filó (1949), líder da equipe de som Soul Grand Prix, e o executivo André Midani (1932-2019) convoca Oberdan Magalhães para essa missão. O músico já havia trabalhado em discos com linguagem semelhante alguns anos antes, como Hot International (lançado por Raulzinho e Impacto 8, em 1968) e Som, Sangue Raça (de Dom Salvador & Abolição, de 1971).
O saxofonista chama antigos parceiros das bandas Impacto 8 e Abolição para se juntar a ele. Depois de vinte dias de ensaios, a Banda Black Rio cria uma de suas músicas mais emblemáticas, “Maria Fumaça”, feita sob encomenda para o tema de abertura da novela Locomotivas (1977), da Rede Globo. Parceria entre Oberdan e Luiz Carlos, a música, toda instrumental, anima Midani a gravar um disco inteiro com a banda. Antes da estreia fonográfica, no entanto, a maioria dos músicos da banda participa da gravação do álbum Maravilhas contemporâneas, de Luiz Melodia (1951-2017). Ao mesmo tempo que essa parceria contribui para aproximar o trabalho do músico carioca (sobretudo nas faixas “Congênito” e “Questão de posse”) do soul, as gravações servem de laboratório de ensaio para o desenvolvimento da sonoridade que a banda apresenta no primeiro LP.
Maria Fumaça é lançado em 1977 e, além de temas originais, traz releituras para clássicos de diversos gêneros da música brasileira em arranjos que remetem ao funk estadunidense: “Casa forte”, de Edu Lobo (1943); “Baião”, de Luiz Gonzaga (1912-1989) e Humberto Teixeira (1915-1979); “Na baixa do sapateiro”, de Ary Barroso (1903-1964); e “Urubu Malandro”, de João de Barro (1907-2006). Os arranjos de sopros se destacam no trabalho, com uma linguagem que equilibra elementos das bandas de gafieira (que formaram os músicos da banda) com a pontuação típica de bandas de funk estadunidenses, como Kool and Gang, e a influência do jazz de artistas como John Coltrane (1926-1967), Miles Davis (1926-1991) e Freddie Hubbard (1938-2008).
Em 1978, a Banda Black Rio participa da turnê de lançamento do disco Bicho, de Caetano Veloso (1942). O compositor baiano grava o LP após viagem à Nigéria, e o trabalho reflete de alguma forma os efeitos da experiência. Músicas como “Odara”, “Gente” e a versão para “Olha o menino”, de Jorge Ben (1939), apresentam uma acentuação funk, sobretudo nas dinâmicas estabelecidas entre baixo e bateria, e se encaixam perfeitamente na linguagem da Banda Black Rio. Além das faixas do recém-lançado disco e sucessos da carreira de Caetano, o show tem um momento em que o cantor sai do palco e a banda toca alguns dos temas instrumentais de "Maria Fumaça".
Nos discos seguintes, o repertório deixa de ser totalmente instrumental. Em Gafieira Universal, o baixista Valdecir Nei e o tecladista Jorjão Barreto (1952) entram na banda no lugar dos integrantes originais. O segundo, ao lado do baterista Luiz Carlos, assume os vocais nas faixas cantadas: “Rio de Fevereiro”, “Vidigal” e “Chega mais”. As letras tratam do cotidiano nos subúrbios cariocas. Há ainda sete temas instrumentais, cinco autorais e duas versões para “Cravo e canela”, de Milton Nascimento (1942) e Ronaldo Bastos (1948), e “Tico-tico no fubá”, de Zequinha de Abreu (1880-1935). A receita ainda é baseada na fusão do soul e funk estadunidenses com a tradição rítmica do Brasil.
A formação da banda muda novamente em Saci Pererê. Carlos Darcy assume o trombone, Paulinho é o baterista, Bebeto toca percussão e Décio é o novo baixista. Além disso, Gerson e Abóbora assumem os vocais. A faixa título, composição de Gilberto Gil (1942), traz o reggae para a fórmula da Banda Black Rio. O repertório combina, mais uma vez, temas instrumentais e cantados, composições autorais e versões, com destaque a releitura samba-funk para “Profissionalismo é isso aí”, de João Bosco (1946) e Aldir Blanc (1946-2020).
Oberdan Magalhães morre em 1984, em um acidente automobilístico, e a banda encerra as atividades. Filho do saxofonista, o tecladista William Magalhães (1965) remonta a Banda Black Rio em 1999, com nova formação e apenas o trombonista Lúcio Silva entre os integrantes originais. O som incorpora influências contemporâneas da música pop e lança os discos Movimento (2001), Super nova samba funk (2011) e O som das Américas (2019).
A Banda Black Rio faz história em sua curta trajetória entre os anos 1970 e 1980, ao sintetizar em uma obra autoral um movimento que agita os subúrbios cariocas no período. Sua fusão de ritmos brasileiros com elementos do soul, do funk e do jazz inspira artistas internacionais da cena de acid jazz dos anos 1990 (como as bandas britânicas Incognito e Jamiroquai) e a base de “Casa Forte” é citada pelo rapper estadunidense Mos Def (1973) na música “Casa Bey”. Os três discos lançados pela formação original da banda são clássicos do soul brasileiro.
Obras 1
Fontes de pesquisa 4
- BAHIANA, Ana Maria. Enlatando Black Rio. Jornal da Música, Rio de Janeiro, fev. 1977.
- MIDANI, André. Música, ídolos e poder: do vinil ao download. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.
- PEIXOTO, Luiz Felipe de Lima; SEBADELHE, Zé Octávio. 1976 – Movimento Black Rio. Rio de Janeiro: José Olympio, 2016. 284 p.
- THAYER, Allen. Black Rio: Brazilian Soul and DJ Culture’s Lost Chapter. Wax Poetics, Nova York, n. 16, p. 88-106, abr.-maio 2006.
Como citar
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BANDA Black Rio.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/grupo636041/banda-black-rio. Acesso em: 05 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7