Cartola

Cartola, s.d.
Texto
Angenor de Oliveira (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1908 – Idem, 1980). Compositor, cantor. Considerado um dos maiores sambistas brasileiros, é um dos fundadores da escola de samba carioca Estação Primeira de Mangueira e do ritmo conhecido como samba-canção.
Filho de operário, mora em diversos bairros do Rio de Janeiro durante a infância. Aos 11 anos, dificuldades financeiras levam a família a se transferir para o Morro da Mangueira, onde Cartola é iniciado no samba e na boêmia pelo amigo Carlos Cachaça (1902-1999), seis anos mais velho, que se tornaria um dos seus parceiros mais constantes.
Abandona a escola para trabalhar e exerce várias profissões, como aprendiz de tipógrafo e servente de pedreiro. O apelido surge nessa época. Para proteger a cabeça na construção civil, passa a usar um chapéu-coco, que orgulhosamente chama de cartola. Aos 15 anos, perde a mãe. O pai, que desaprova sua vida boêmia, expulsa-o de casa.
Cartola começa a compor e cantar em bares do morro. Torna-se figura cativa nas rodas de samba e ensaia suas primeiras composições e acordes no violão. Participa da fundação de um bloco para brincar o Carnaval, o Bloco dos Arengueiros, embrião da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, fundada em 1928. Tanto as cores, verde e rosa, quanto o nome são sugestões de Cartola. No desfile inaugural, a escola apresenta um samba de sua autoria, “Chega de demanda”.
Em 1929, sua composição “Que infeliz sorte” é gravada por Francisco Alves (1898-1952), marcando a entrada de Cartola no meio artístico. Ele conhece Noel Rosa (1910-1937), com quem compõe “Não faz amor” e “Qual foi o mal que eu te fiz?”. Em 1932, grava um dos seus maiores sucessos, “Divina dama”. Nos anos 1930, suas composições são gravadas por intérpretes como Carmen Miranda (1909-1955) e Silvio Caldas (1908-1998).
Nos anos 1940, Cartola apresenta na rádio o programa A Voz do Morro e cria, com Heitor dos Prazeres (1898-1966) e Paulo da Portela (1901-1949), o Conjunto Carioca. No fim da década, desentende-se com o presidente da Mangueira, afasta-se da escola e interrompe a carreira musical. Em 1956, é redescoberto pelo jornalista Sérgio Porto (1923-1968), que o encontra trabalhando como lavador de carros.
Na década de 1950, sua obra é preterida por uma indústria fonográfica voltada aos sambas-canções bolerizados e, posteriormente, à bossa nova. Somente em meados dos anos 1960, durante a ditadura civil-militar (1964-1985), a nova geração, ligada ao Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC/UNE), passa a valorizar artistas da velha-guarda do samba, como Cartola.
A obra de Cartola tem significado especial na narrativa da evolução do samba. O estilo inconfundível de suas harmonias, melodias e letras traduz a poética do trovador da Mangueira, que influencia novas gerações de sambistas, em especial Paulinho da Viola (1942), compositor cuja carreira começou no restaurante Zicartola, reduto do samba no centro do Rio de Janeiro, fundado, nos anos 1950, por Cartola e sua última esposa, a sambista Eusébia Silva do Nascimento, a Dona Zica (1913-2003).
Em 1974, aos 65 anos, ele grava seu primeiro LP, Cartola, premiado e reverenciado pela crítica e pelo público. A seguir, lança outros quatro álbuns, que incluem sucessos como “As rosas não falam” e “O mundo é um moinho”. Sua popularidade permite uma intensa agenda de shows pelo país, interrompida pela fragilidade de sua saúde no final dos anos 1970.
Nas décadas seguintes à sua morte, muitos artistas revisitam sua obra, entre eles Cazuza (1958-1990), Marisa Monte (1967) e Chico Buarque (1944), com o álbum Chico Buarque de Mangueira (1997), gravado com os integrantes da Mangueira.
Em 2007, é lançado um documentário sobre sua vida: Cartola: música para os olhos, de Lírio Ferreira (1965) e Hilton Lacerda (1965). Cartola também participa de alguns filmes, como Orfeu negro (1959), do diretor francês Marcel Camus (1912-1982), e Ganga Zumba (1964), de Cacá Diegues (1940).
As composições de Cartola atravessam décadas e se atualizam a cada regravação. “Não quero mais amar a ninguém”, com Carlos Cachaça e Zé da Zilda (1908-1954), gravado em 1937 por Aracy de Almeida (1914-1988), volta à tona nos anos 1970 com a gravação de Paulinho da Viola. O mesmo acontece com a interpretação de seus sambas por Ney Matogrosso (1941), em 2002.
Em sua trajetória, Cartola se mantém fiel ao universo sociocultural que inspira seus sambas. Um bom exemplo é a canção “Sala de recepção”, cuja letra diz: "Habitada por gente simples e tão pobre / Que só tem o sol que a todos cobre / Como podes, Mangueira, cantar?".
Cartola se consagra como um dos maiores nomes do samba brasileiro. Tornando-se um patrimônio da Mangueira, compôs canções emblemáticas do samba, gravadas por importantes intérpretes da música brasileira.
Obras 9
Exposições 1
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17/9/2016 - 15/11/2016
Links relacionados 2
Fontes de pesquisa 4
- Cartola e Nelson Cavaquinho. São Paulo, Abril Cultural/Col. História da MPB, 1970.
- PEREIRA, Arley. Cartola: semente de amor sei que sou, desde nascença. São Paulo, SESC, 2008.
- SEVERIANO, Jairo; MELLO, Zuza Homem de. A canção no tempo: 85 anos de músicas brasileiras (vol. 1: 1901-1957). São Paulo: Editora 34, 1997. (Coleção Ouvido Musical).
- SILVA, Marília T. Barboza da; OLIVEIRA FILHO, Arthur L. de. Cartola: Os Tempos Idos, Rio de Janeiro: Gryphus, 2003.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
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CARTOLA.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa11957/cartola. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7