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Enciclopédia Itaú Cultural
Literatura

História da Literatura Brasileira

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 16.08.2016
1916
A História da Literatura Brasileira (1916) é resultado da sistematização do crítico, educador e literato paraense José Veríssimo (1857-1916). Publicada quase duas décadas depois da História da Literatura Brasileira (1888), de Silvio Romero (1851-1914), diferencia-se dela em recorte e método. A obra de Veríssimo procura identificar, por meio da h...

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A História da Literatura Brasileira (1916) é resultado da sistematização do crítico, educador e literato paraense José Veríssimo (1857-1916). Publicada quase duas décadas depois da História da Literatura Brasileira (1888), de Silvio Romero (1851-1914), diferencia-se dela em recorte e método. A obra de Veríssimo procura identificar, por meio da história brasileira, um corpo de obras literárias que seja “expressão de um pensamento e sentimento que não se confundem mais com o português, e em forma que, apesar da comunidade da língua, não é mais inteiramente portuguesa”1. Diferente da visão cientificista de Romero, que se interessava pelas influências do meio social e geográfico, e da raça sobre a produção literária brasileira, Veríssimo visa o plano da formação cultural. Nela, observa uma tradição literária mediada pela expressão da nacionalidade e por um conceito humanizador da obra literária, objeto de “prazer intelectual”2 ligado ao desenvolvimento do homem. A experiência estética determina a seleção do conjunto de obras.

É importante registrar os saltos teóricos, inerentes à obra de Veríssimo. Membro de uma das primeiras gerações de homens de letras brasileiros, o autor não se ocupa do trabalho filológico de pesquisa bibliográfica e manuscrita de textos literários produzidos no Brasil. Em vez disso, dedica-se à literatura brasileira com questões relacionadas à naturalidade dos escritores coloniais e a critérios de contraste entre as literaturas brasileira e portuguesa que ainda se mostravam sensíveis a disputas. Veríssimo é importante para essa difícil seleção. Com Romero, é responsável pela consolidação de parâmetros para avaliar a autonomia da literatura brasileira. Na História de 1916, a diferenciação estilística e as particularidades autorais unem-se a um padrão evolutivo que marca as balizas dos períodos históricos. Assim, a autonomia da sociedade brasileira corresponde a três graus de produção literária. O primeiro corresponde à “primitiva sociedade colonial” dos quinhentos e início dos seiscentos, da qual se depreendem manifestações de uma cultura literária ainda lusa, embora marcadas pela experiência da terra. É o caso de Prosopopeia (1601), de Bento Teixeira (1561-1600), épico escrito em homenagem ao governador de Pernambuco Jorge de Albuquerque Coelho (1539-?), e de Frei Vicente do Salvador (1564-1639), cuja História do Brasil (1627), medíocre nos termos do estilo luso, cultivado à época, mostra “singeleza e naturalidade” próprias à expressão brasileira3 e usa o nome da colônia, Brasil, pela primeira vez como “expressão histórica e social” particular4.

Veríssimo prefere obras relacionadas a grupos literários do que manifestações isoladas. Os “grupos” diferem das “escolas literárias” (termo usado por Romero) por não se estabelecerem à sombra de dogmas ou preceitos, mas por sugerirem a ideia de conjunto relacionado a um modo de vida coletivo. Dele, participam o grupos baiano e mineiro. O baiano, formado pelos poetas Gregório de Matos (1636-1696) e Manuel de Botelho (1636-1711), autor do poema “Ilha da Maré” em que o crítico lê “o primeiro sintoma de emoção estética produzida pela terra em um dos seus naturais, e literariamente exprimida”5. O mineiro, formado por escritores que transformam a terra e o sentimento nativista em propósito de emulação com a metrópole. Na produção mineira, concentrada na segunda metade do século XVIII, o elogio do local evidencia-se no arcadismo acadêmico de Cláudio Manoel da Costa (1729-1789), que estabelece “motivos [...] a impor-se aos engenhos brasileiros”6 e no trabalho de Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), responsável pela naturalização da “sentimentalidade voluptuosa do lirismo português”7, passando por Alvarenga Peixoto (1744-1792) e Silva Alvarenga (1749-1814), com os quais os vícios retóricos do grupo se amainam. Caberia, porém, a Basílio da Gama (1741-1795) e ao épico O Uraguai (1769) o lugar de monumento da época, tomando “por motivo de inspiração coisas americanas e pátrias” e cantando-as “com um raro espírito de liberdade cívica e poética”8.

A experiência inerente às manifestações e aos grupos desemboca no que Veríssimo chama de movimento, correlato da complexidade dinâmica das relações entre sociedade e literatura autônomas. Veríssimo reconhece dois desses momentos: o romantismo, que se segue à Proclamação da Independência; e o “modernismo”9 ligado à veiculação das “ideias modernas” responsáveis pela formação do pensamento progressista que leva à abolição da escravatura e à queda da monarquia. Identifica no primeiro “um movimento de liberdade espiritual”, “uma reação contra o espírito clássico”10, mas nota o descompasso dele em relação à Europa pela demora da Independência e do surgimento de “um  seleto grupo de homens de estudo e letras”11 para que a cultura nacional se alinhasse ao horizonte europeu. A primeira geração romântica prende-se a uma religiosidade moralizante e aos resquícios do clacissismo, feridos por um desejo de afirmação nacional que mais prejudica as boas regras da composição literária12 do que estimula uma autonomia formal. Verissimo passa do esforço medíocre dessa geração, da qual o “subarcadismo” de Gonçalves de Magalhães (1811-1882)13 reserva o melhor exemplo, a Gonçalves Dias (1823-1864) e o “grupo maranhense” – ambos cultores da melhor literatura do período. Segue com José de Alencar (1829-1877), que completará com seu romance O Guarani (1857) as fundações da literatura nacional, em sua “vontade decisiva de fazê-la de todo independente da portuguesa”14.

A autonomia da literatura e da sociedade brasileira é condição para que se entenda o “pensamento moderno”15, a partir da década de 1870, como incremento de um progresso necessário e desejado pela intelectualidade brasileira. Como o romantismo, o dito modernismo não se limita a um único grupo ou localidade e reflete a integração de diferentes núcleos dos intelectuais brasileiros sob propósitos comuns. Assim, se naquele primeiro movimento os pensadores e artistas da capital dividem o protagonismo com São Paulo e São Luis, agora Recife desponta, por meio de Tobias Barreto (1839-1889), como vanguarda da reflexão sobre o país, irradiador de tendências progressistas que se farão presentes na literatura do momento. Tais tendências serão constatadas nos mais notáveis romances do período – O Mulato (1881) e O Cortiço (1890), do maranhense Aluísio Azevedo (1857-1913), e O Ateneu (1888), do fluminense Raul Pompeia (1863-1895) – e na inspiração objetivista e apuro técnico da poesia parnasiana. A arbitrariedade do recorte de Veríssimo se faz por uma ausência e uma exceção: a primeira, a poesia simbolista, da qual Cruz e Souza (1861-1898), aclamado como um dos grandes poetas do período é o maior expoente; e a última, Machado de Assis (1839-1908), cuja excepcionalidade, jamais passível de redução a movimentos e modismos, permite a avaliação do gênio às custas do próprio esquema histórico de Veríssimo, cujas linhas não convergem necessariamente para sua grandeza.

Ao lado de Silvio Romero, José Veríssimo encerra, nas palavras do Roberto Acízelo de Souza, “o ciclo oitocentista de construção dos conceitos correlativos de literatura brasileira e sua história”16. Consolidando a noção de autonomia da produção literária nacional mediante um esquema enxuto, sua História traz um importante esforço de síntese à compreensão da literatura como fenômeno social e cultural no Brasil.

Notas
1 VERÍSSIMO, José. História da literatura brasileira, de Bento Teixeira (1601) a Machado de Assis (1908). São Paulo: Letras & Letras, 1998. p.9.
2 Ibidem, p. 21.
3 Ibidem, p. 66.
4 Ibidem, p. 65.
5 Ibidem, p. 85.
6 Ibidem, p. 136.
7 Ibidem, p. 138.
8 Ibidem, p. 151.
9 Movimento finissecular.
10 VERÍSSIMO, op. cit., p. 164.
11 Ibidem. p. 185
12 Ibidem, p. 189.
13 Ibidem, p. 197.
14 Ibidem, p. 265.
15 Ibidem, p. 336.
16 SOUZA, Roberto Acízelo de. Introdução à historiografia da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Eduerj, 2007. p. 95.

Fontes de pesquisa 3

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  • BARBOSA, João Alexandre. O cânone na história da literatura brasileira. Organon – Revista do Instituto de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, vol. 15, n. 31-32, 2001. Disponível em: < http://seer.ufrgs.br/index.php/organon/article/view/29708/18366 >. Acessado em: 30 mar 2016.
  • SOUZA, Roberto Acízelo de. Introdução à Historiografia da Literatura Brasileira. Rio de Janeiro: Eduerj, 2007.
  • VERÍSSIMO, José. História da literatura brasileira: de Bento Teixeira (1601) a Machado de Assis (1908). São Paulo: Letras & Letras, 1998.

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