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Enciclopédia Itaú Cultural
Música

Rogério Duprat

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 01.12.2021
07.02.1932 Brasil / Rio de Janeiro / Rio de Janeiro
26.10.2006 Brasil / São Paulo / São Paulo
Rogério Duprat (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1932 - São Paulo, São Paulo, 2006). Compositor, arranjador, maestro, violoncelista. Em 1935, muda-se com a família para São Paulo. Ainda criança, aprende a tocar gaita, violão e cavaquinho, e somente aos 17 anos recebe educação musical formal. Por intermédio do irmão Régis Duprat, músico já profiss...

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Biografia
Rogério Duprat (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1932 - São Paulo, São Paulo, 2006). Compositor, arranjador, maestro, violoncelista. Em 1935, muda-se com a família para São Paulo. Ainda criança, aprende a tocar gaita, violão e cavaquinho, e somente aos 17 anos recebe educação musical formal. Por intermédio do irmão Régis Duprat, músico já profissionalizado, estuda harmonia, contraponto e composição com Olivier Toni (1926) e Claudio Santoro (1919-1989), que o incentiva a ter aulas de violoncelo com Calisto Corazza. Como violoncelista, integra em 1950 o grupo de câmara da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFCHL/USP), onde inicia, no mesmo ano, o bacharelado em filosofia. Porém, determinado a dedicar-se à música, abandona o curso e se inscreve no Conservatório Musical Heitor Villa-Lobos, e se forma em 1958. No fim da década, tem aulas de composição com Claudio Santoro.

Funda com Olivier Toni a Orquestra de Câmara de São Paulo, em 1950. Desse núcleo parte a ideia de criar um Grupo de Música Experimental, que Rogério Duprat dirige entre 1956 e 1961, recrutando instrumentistas de até 20 anos para divulgar um vasto repertório, com ênfase na obra de jovens compositores. Com Régis, funda a orquestra Angelicum do Brasil (1952-1953), dedicada à música dos séculos XVI a XVIII. Ainda na década de 1950, atua como violoncelista na Orquestra Sinfônica Estadual (1953) e Municipal (1955) de São Paulo e compõe suas primeiras obras eruditas, além de escrever sobre música em jornais e revistas.

Em 1961, é um dos fundadores do Grupo Música Nova,1 dedicado à arte de vanguarda. No ano seguinte, inscreve-se no curso de verão de Darmstadt, na Alemanha, ministrado por importantes nomes da música contemporânea, como o alemão Karlheinz Stockhausen (1928-2007) e o francês Pierre Boulez (1925-2016). Em seguida, estagia por um mês no laboratório da Radio Télévision Française, dirigido pelo criador da música concreta, Pierre Schaeffer (1910-1995). Atua como regente e arranjador da TV Excelsior entre 1963 e 1964, quando se muda para o Distrito Federal, a fim de lecionar na recém-criada Universidade de Brasília (UnB). Ali, com Régis Duprat, Damiano Cozzela (1929) e Décio Pignatari (1927-2012), revoluciona o ensino de música no Brasil, criando grupos experimentais de criação. Mas, no ano seguinte, a intervenção dos militares na universidade o leva a pedir demissão. De volta a São Paulo, abandona a academia e a música contemporânea, dedicando-se a compor para teatro, TV e cinema, para o qual produz mais de 40 trilhas, premiadas com os filmes de Walter Hugo Khouri (1929-2003), A Ilha, Corpo Ardente, Noite Vazia e As Cariocas (parceria de Khouri com Fernando de Barros e Roberto Santos), além do prêmio Kikito de melhor de melhor música original por Marvada Carne, de André Kloetzel (1954).

Rogério Duprat é um dos principais arranjadores do tropicalismo, com destaque para o disco Tropicália ou Panis et Circenses (1968), A Banda Tropicalista do Duprat (1968), e, no mesmo período, os discos dos Mutantes, Gilberto Gil (1942), Caetano Veloso (1942) e Gal Costa (1945), além de arranjos para canções de Elis Regina, Chico Buarque (1944)  e Jorge Ben Jor (1942). A canção Domingo no Parque, de 1967, de Gilberto Gil, lhe rende o prêmio de melhor arranjador do 3º Festival da Música Popular Brasileira da TV Record. Em 1968, divide com Lindolpho Gaya (1921-1987) o LP Os Maestros Premiados com arranjos de músicas concorrentes dos festivais. Nessa época, cria o Vice-Versa, um dos maiores estúdios de gravação de São Paulo.

No fim dos anos 1970, uma surdez progressiva o afasta da atividade de arranjador, que só retoma em 1987. Passa os últimos 30 anos de sua vida em um sítio em Itapecerica da Serra, São Paulo, onde, além de compor, dedica-se à marcenaria e à atividade de videomaker amador.

Análise da trajetória
A exemplo de outros músicos de sua geração, como Julio Medaglia (1938) e Damiano Cozzela, Rogério Duprat transita com desenvoltura e irreverência entre a música contemporânea e a canção popular, produzindo um encontro original − e às vezes polêmico − entre elas. Esse intercâmbio se explicita nos anos 1960, quando participa de dois importantes movimentos culturais brasileiros: a vanguarda musical erudita, que tem como marco a publicação, em 1963, do Manifesto Música Nova e o tropicalismo, surgido em 1968, com o lançamento do disco Tropicália ou Panis et Circenses, do qual participa como arranjador e maestro.

Até então, a obra de Duprat filia-se ao nacionalismo de viés comunista − inicialmente, o "nacionalismo folclórico", inspirado nas ideias de Mário de Andrade (1893-1945) e integrado por compositores como Camargo Guarnieri (1907-1993) e Olivier Toni; mais tarde, o "nacionalismo dodecafônico", desenvolvido nos anos 1950 por Claudio Santoro, que funde a técnica dos 12 sons2 a sonoridades brasileiras. No início da década de 1960, porém, sua carreira entra em uma nova fase. Instigado por uma visita de Pierre Boulez a São Paulo, ele compõe três peças utilizando o serialismo integral.3 Mas é o compositor norte-americano John Cage, cuja obra Rogério Duprat conhece em Darmstadt por meio de alunos dos Estados Unidos presentes no curso de verão (entre eles, o guitarrista e compositor Frank Zappa), que o afasta definitivamente do nacionalismo e revoluciona seu pensamento musical.

Desencantado com o Partido Comunista Brasileiro (PCB), que estigmatiza os artistas não alinhados a sua cartilha, ele percebe a necessidade de separar música e política, pois a arte prescindiria de justificativas externas. Também passa a valorizar a busca pelo novo, o inusitado e o aleatório na criação musical. É nesse contexto que redige com Gilberto Mendes (1922-2016), Willy Corrêa de Oliveira (1938), Sandino Hohagen, entre outros, o Manifesto Música Nova, pondo no papel ideias concebidas pelo grupo paulista homônimo. Publicado na revista de arte de vanguarda Invenção, o documento propõe a substituição da técnica serial-dodecafônica, até então hegemônica na música de vanguarda, por elementos advindos das teorias da informação, da semiótica e das leis matemáticas das probabilidades. E apregoa a incorporação de novos materiais sonoros (ruídos, microtons, sons eletrônicos), linguagens (poética, teatral, visual) e grafias4 às composições. Daí o aparecimento de Klavbim II, música para computador realizada em parceria com Damiano Cozzela; Projeto Unbica, para piano e percussão, e Tempo Passou, para piano e violoncelo.

Outra problemática técnico-estética do contato com a obra de Cage é a adesão ao happening como meio da expressão. Em 1966, ao lado de Décio Pignatari e outros artistas, cria o Movimento de Arregimentação Radical em Defesa da Arte (Marda), uma crítica aos costumes burgueses. O grupo pendura mensagens satíricas em diversos monumentos da cidade de São Paulo − como a estátua do Borba Gato, em Santo Amaro; o avião de Santos Dumont, na antiga Praça 14 Bis; ou os cemitérios da Consolação e do Araçá −, ícones kitschs da elite paulistana. Em 1969, convidados a dar uma palestra na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP), Duprat e Cozzela, vestidos de contadores (boné preto e camisa branca), conferem papéis diante do público, realizando, ao pé da letra, uma conferência. Numa época em que os artistas eram considerados ou "de esquerda" ou "alienados", logo são alvo de vaias e ovos. A atuação dos "conferencistas", porém, não deixa de ser política: a subversão está na forma e, sobretudo, na crítica.

É esse espírito irreverente e contestador que orienta Rogério Duprat em direção à atividade de arranjador de canções populares. Desde o fim dos anos 1950 atua nesse ramo. E lança Os Imortais (Os Mestres de sempre na Bossa de Hoje), em 1959, em que abrasileira clássicos de Schumann, Chopin, Carlos Gomes, Verdi, Brahms, mas é ao lado dos tropicalistas que deixa sua maior contribuição para a MPB ao mesmo tempo que encontra terreno fértil para suas experimentações. Na canção Domingo no Parque, 1967, de Gilberto Gil, Rogério Duprat funde timbres sinfônicos, ruídos de um parque de diversões, ritmos marcadamente brasileiros e instrumentos elétricos, o que confere um caráter singular, quase composicional, ao arranjo. Essa coexistência bem-humorada e irônica de elementos aparentemente disparatados também pode ser ouvida no disco Tropicália ou Panis et Circenses, do ano seguinte, bem como em diversas outras orquestrações.

A obra de Duprat caracteriza-se pela incessante busca pelo novo. Daí a brusca interrupção de suas atividades no fim dos anos 1970, quando acredita não ter mais nada a dizer. "Para ficar repetindo o que já havia feito, achei mais honesto parar." Ainda grava uma série de discos: Três Séculos de Música Brasileira, com o irmão Régis Duprat, Música Popular no Século XIX no Vale do Paraíba (1977), Dobrados, A Bela Época, Maxixes, Valsas e Polcas (1978) e Evocação IV − Anacleto de Medeiros (1981). Embora tenha abandonado a música como sua principal atividade profissional, continua atuando esporadicamente como arranjador − em canções como Tempo/Espaço Contínuo, de Lulu Santos, de 1997, e O Gosto de Azedo, de Rita Lee, de 1998 −, e como compositor erudito.

Notas
1 Grupo de compositores paulistas formado por Rogério Duprat, Willy Correia de Oliveira, Damiano Cozzela, Julio Medaglia e Gilberto Mendes.
2 Criada por Arnold Schoenberg, também conhecida como dodecafonismo, a técnica propõe o uso de séries compostas pelos 12 sons da escala cromática (1925).
3 Técnica composicional desenvolvida nos anos 1950 por Pierre Boulez e Karlheinz Stockhausen. Leva ao paroxismo a noção de série, criada no início do século XX pelo compositor austríaco Arnold Schoenberg, estendendo-a para todos os parâmetros do som (intensidade, duração, timbre).
4 No século XX, o tradicional pentagrama usado para grafar as sete notas da escala diatônica, com suas alterações de altura (bemóis e sustenidos) e seus ritmos periódicos e divisíveis, não dá mais conta de representar todas as sonoridades da música contemporânea, que inclui microtons, clusters, sons eletrônicos, efeitos timbrísticos, polirritmias etc. Daí a necessidade de se desenvolver novas grafias musicais, com a criação de notações específicas e novos suportes para seu registro, tais como partituras gráficas (desenhos ou diagramas que indicam altura, timbre, duração etc.), verbais (textos descritivos sobre o que os intérpretes devem tocar).

Espetáculos 3

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Fontes de pesquisa 9

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  • BARRO, Maximo. Rogério Duprat: ecletismo musical. São Paulo: Imprensa Oficial, 2009 (Coleção Aplauso).
  • FAVARETTO, Celso F. Tropicália, alegoria, alegria. São Paulo: Kairós, 1979.
  • FRASER, Etty. Etty Fraser. São Paulo: [s.n.], s.d. Entrevista concedida a Rosy Farias, pesquisadora da Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira.
  • GAÚNA, Regiane. Rogério Duprat: sonoridades múltiplas. São Paulo: Editora Unesp, 2001. Disponível em: < http://www.felu.xpg.com.br/Sonoridades_multiplas_Regiane_Gauna.pdf >. Acesso em 20 out. 2012.
  • MARCONDES, Marcos Antônio. Enciclopédia da música brasileira: erudita, folclórica e popular. 2. ed., rev. ampl. São Paulo: Art Editora, 1998.
  • NEVES, José Maria. Música contemporânea brasileira. São Paulo: Ricordi Brasileira, 1981.
  • O REI da Vela. São Paulo: Teatro Oficina Uzyna Uzona, [1967]. 1 programa do espetáculo realizado no Teatro Oficina.
  • O REI da Vela. São Paulo: Teatro Oficina Uzyna Uzona, [2017]. 1 programa do espetáculo realizado no SESC Pinheiros.
  • ROGÉRIO Duprat morre em São Paulo. Folha de S. Paulo, São Paulo, 27 de out. 2006. Cotidiano, p. 12.

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