Lucio Costa

Vila Operária da Gamboa, Rio de Janeiro, 1933
Lucio Costa, Gregori Warchavchik
Texto
Lucio Marçal Ferreira Ribeiro de Lima e Costa (Toulon, França 1902 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1998). Arquiteto, urbanista, estudioso e teórico da arquitetura e conservador do patrimônio. Autor de uma expressiva obra e de textos fundadores da historiografia arquitetônica brasileira, Lucio Costa é figura-chave na implantação e consolidação da arquitetura moderna no Brasil.
Forma-se em 1924 na Escola Nacional de Belas Artes (Enba), no Rio de Janeiro. Entre 1922 e 1929, realiza inúmeros projetos e obras orientados predominantemente pelo estilo neocolonial, de teor nacionalista, e, eventualmente, pelos preceitos internacionais do ecletismo.
Em 1930, o arquiteto é convidado a trabalhar como assessor de obras do Itamaraty e, depois da Revolução de 1930, é nomeado diretor da Enba. Rompe com a tradição beaux-arts de sua formação e consuma sua “conversão” ao movimento moderno, após descobrir a Casa Modernista, de Gregori Warchavchik (1896-1972). Como diretor, realiza uma importante reviravolta no ensino da escola, demitindo antigos professores e contratando outros, de orientação moderna, como o próprio Warchavchik.
Ainda no cargo, organiza o Salão Revolucionário de 1931, que conta com a participação de artistas como Guignard (1986-1962), Candido Portinari (1903-1962), Di Cavalcanti (1897-1976), Anita Malfatti (1889-1964) e Tarsila do Amaral (1886-1973), e tem papel fundamental na divulgação e legitimação do movimento modernista iniciado em São Paulo com a Semana de 1922.
Nos anos seguintes, aprofunda o estudo da obra do suíço Le Corbusier (1887-1965), e dos alemães Walter Gropius (1883-1969) e Ludwig Mies van der Rohe (1886-1969), e aos poucos recupera o prestígio profissional adquirido como arquiteto acadêmico. Seu percurso caracteriza-se não por uma ambição de sucesso pessoal, mas por um projeto de “formação nacional”1. Escreve o importante texto-manifesto Razões da Nova Arquitetura (1934/1936), advogando a inevitabilidade histórica do modernismo.
Em 1935, é convidado pelo então ministro Gustavo Capanema (1900-1985) a conceber o projeto da nova sede do Ministério da Educação e Saúde (MES), tarefa para a qual constitui um grupo de jovens arquitetos: Affonso Eduardo Reidy (1909-1964), Carlos Leão (1906-1983), Jorge Moreira (1904-1992), Ernani Vasconcelos (1912-1989) e Oscar Niemeyer (1907-2012), com a coordenação de Le Corbusier. É o primeiro arranha-céu no mundo a realizar integralmente os “cinco pontos da arquitetura moderna” idealizados por Le Corbusier.2 Esse edifício, bem como o Pavilhão do Brasil, na Feira Mundial de Nova York, (1939), projetado em parceria com Niemeyer, e o Conjunto da Pampulha, são considerados o marco inaugural da arquitetura moderna brasileira.
Em 1937, passa a trabalhar no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), que posteriormente passa a se chamar Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), pelo qual se aposenta em 1972. Deve-se a Costa a definição de critérios e normas de classificação, análise e tombamento do patrimônio arquitetônico brasileiro, bem como a definição de critérios para a intervenção em centros históricos, como a realizada na construção do Grande Hotel de Ouro Preto, em 1940.
Lucio Costa defende a convergência entre modernidade e patrimônio, o que é possível observar tanto em seus textos quanto em suas obras arquitetônicas. Ao combinar inovações técnico-formais do modernismo (pilotis, brise-soleil, concreto armado, panos de vidro) com elementos da tradição artesanal (treliças, cobogós, alvenarias de pedra), procura encontrar a conciliação entre a impessoalidade da sociedade de massas vindoura e a afetividade do mundo doméstico, herdada dos tempos da colônia. Exemplos dessa articulação são: o Museu das Missões (1937), em São Miguel, Rio Grande do Sul; os edifícios do parque Guinle (1943-1948), no Rio de Janeiro; e o Park Hotel São Clemente (1944), em Nova Friburgo, Rio de Janeiro.
Em 1957, Costa vence o concurso para o plano piloto de Brasília, a nova capital do Brasil, inaugurada em 1960. Concebe-a com base em dois eixos que se cruzam em ângulo reto – o eixo rodoviário-residencial e o eixo monumental –, como a gravar no terreno o sinal da cruz. Assim, o desenho da cidade orienta-se pela definição de diferentes escalas de uso do espaço: a escala residencial, nas superquadras; a monumental, no eixo dos edifícios públicos; a gregária, no setor cultural e de diversões, situado em um anel em torno do encontro dos dois eixos; e a bucólica, à beira do lago, para os passeios da população urbana. Em 1987, Brasília é considerada Patrimônio Mundial, Cultural e Natural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Depois dessa grande exposição, Costa mantém-se reservado e distante da cena principal da arquitetura brasileira. Em 1995, aos 93 anos de idade, lança Lucio Costa: Registro de uma Vivência, livro autobiográfico contendo projetos, ensaios críticos, cartas pessoais e textos memorialísticos, referência para qualquer estudo da arquitetura brasileira.
Lucio Costa tem importância inquestionável para a formação da arquitetura moderna brasileira. Rompe com o antigo, ao adotar os princípios arquitetônicos do modernismo, mas preserva e incorpora alguns de seus elementos, estabelecendo um diálogo harmonioso entre passado e presente, produzindo, assim, uma arquitetura brasileira com identidade própria.
Notas:
1. Otília Arantes estende o conceito de “formação”, formulado por Antonio Candido no caso da literatura brasileira, para a arquitetura, com base na ação de Lucio Costa. Ver: ARANTES, Otília B. F. Lucio Costa e a 'boa causa' da arquitetura moderna. In: ______. Sentido da Formação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
2. São eles o pilotis, o térreo livre, o teto-jardim, a fachada livre e as janelas horizontais.
Obras 6
Exposições 28
Links relacionados 4
Fontes de pesquisa 8
- BRUAND, Yves. Arquitetura Contemporânea no Brasil. Tradução Ana M. Goldberger. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1999.
- COSTA, Lucio. Registro de uma vivência. 2.ed. São Paulo: Empresa das Artes, 1997.
- GUIMARAENS, Cêça de. Lucio Costa: um certo arquiteto em incerto e secular roteiro. Rio de Janeiro: Rio, 1996. 115 p. (Perfis do Rio, 4).
- NOBRE, Ana Luiza (org.); KAMITA, João Masao (org.); LEONÍDIO, Otávio (org.). Um modo de ser moderno: Lúcio Costa e a crítica contemporânea. São Paulo: Cosac & Naify, 2004. 336 p., il. p&b.
- PESSÔA, José (org.). Lucio Costa : documentos de trabalho. Rio de Janeiro: IPHAN, 1999. 325 p., il., p.b.
- SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil, 1900-1990. 2.ed. São Paulo: Edusp, 1999.
- WISNIK, Guilherme (org.). O Risco: Lucio Costa e a utopia moderna: depoimentos do filme de Geraldo Motta Filho. Rio de Janeiro: BangBang Filmes, 2003. 272 p., il. p&b. color.
- WISNIK, Guilherme. Lucio Costa. Coordenação Célia Euvaldo. São Paulo: Cosac & Naify, 2001. 128 p., il. color. (Espaços da arte brasileira).
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
-
LUCIO Costa.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa14559/lucio-costa. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7