1º Salão Internacional de Arquitetura Tropical
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O 1º Salão Internacional de Arquitetura Tropical, realizado em abril de 1933, é organizado pelos jovens arquitetos Adhemar Portugal, Alcides Rocha Miranda (1909-2001) e João Lourenço da Silva. A cerimônia ocorre no Palace Hotel, no Rio de Janeiro, e faz parte de uma gama de acontecimentos que marcam o desenvolvimento do modernismo no Brasil, a exemplo da Semana de Arte Moderna de 1922. O Salão representa o início da identificação de uma arquitetura moderna e brasileira, particularmente dos princípios defendidos pela chamada escola carioca.
À época, Portugal e da Silva estagiam no escritório Costa & Warchavchik, dos renomados arquitetos Gregori Warchavchik (1896-1972) e Lucio Costa (1902-1998), que também colaboram nos preparativos do Salão e são homenageados como “precursores” ao lado do engenheiro Emílio Baumgart (1889-1943). O arquiteto alemão Alexandre Altberg (1908-2009) colabora com a organização do catálogo e o arquiteto americano Frank Lloyd Wright (1867-1959), por sua vez, é homenageado com o título de Presidente de Honra.
É considerado um dos primeiros eventos a tratar das especificidades climáticas brasileiras. A denominação do Salão como “tropical” vem justamente da tentativa de diferenciar a produção arquitetônica nacional. No momento, a identificação de uma arquitetura moderna e brasileira reside no fato de aderir aos princípios modernos internacionais, defendidos pelo arquiteto francês Le Corbusier (1887-1965), e também aplicar um estilo próprio, com particularidades tropicais.
A Associação de Artistas Brasileiros (AAB) é a organizadora do evento, da qual Portugal, Miranda e Lourenço da Silva mais tarde fazem parte. A AAB, fundada em 1929, reúne diversos profissionais como arquitetos, artistas e escritores e é idealizada como contraponto ao projeto da Escola Nacional de Belas Artes (Enba), considerada conservadora pelos modernistas do período.
O Salão Internacional de Arquitetura Tropical provém de uma sucessão de eventos importantes, resultado da efervescência cultural da época. Um deles é o Salão Revolucionário (1931), o primeiro a compilar prioritariamente uma vasta coleção de artistas modernos para exposição, organizado por Lúcio Costa. O Salão de 1933 retoma debates do Salão de 1931 e é inaugurado logo após eventos emblemáticos do modernismo como a construção da primeira casa modernista por Warchavchik, a casa da Rua Santa Cruz (1928). O evento tem a presença de importantes figuras públicas, como o ministro da Educação da época, Washington Pires (1892-1970).
Não se tem registros sobre os critérios de escolha e exposição das obras. Efetivamente, o catálogo da exibição apresenta-se como um exemplar bastante relevante sobre os trabalhos e debates do Salão. A publicação, de autoria de Altberg, tem clara influência da estética alemã bauhausiana. A capa exibe uma colagem com construções modernistas da época, como a Casa Nordschild, de Warchavchik. Apresenta ainda um texto programático do arquiteto alemão Walter Gropius (1883-1969) e o estatuto dos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (Ciams), o que ressalta a intenção desse grupo de arquitetos de seguir os princípios internacionais da profissão.
Entre o compilado de obras destaca-se, por exemplo, a ponte sobre o Rio do Peixe (entre Herval d'Oeste e Joaçaba, em Santa Catarina), de Baumgart. A ponte é realizada com um método inovador para a construção em concreto armado, sem escoramentos, apresentando o maior vão livre conhecido à época, com 68,5 metros. Outros projetos como o edifício do Albergue da Boa Vontade, dos arquitetos Affonso Reidy (1909-1964) e Gerson Pinheiro (1910-1978), denotam a diversidade de programas abordada pela arquitetura moderna.
É notória a quantidade de residências unifamiliares apresentadas, a maioria delas já construídas, a exemplo da Residência em Ipanema, de Altberg, na qual o arquiteto utiliza-se de fundamentos corbusianos como o terraço-jardim. Destacam-se também os utensílios de design industrial, como a coleção de luminárias, mobiliário e tapetes apresentados no interior de um apartamento projetado por Warchavchik e Lucio Costa.
A solenidade promove ainda conferências e debates, abordando temas de interesse no cenário moderno brasileiro, que evidenciam as inquietações da época. O então presidente da AAB, Celso Kelly (1906-1979) realiza a palestra de abertura com o tema Sentido Intelectual da Arquitetura.
A repercussão na imprensa nacional é mínima, e ainda é um episódio pouco mencionado entre críticos e historiadores. Identifica-se certa desorientação, consequência da incipiência do movimento moderno na arquitetura. Entretanto, sua importância tem sido reavivada.
Para além de seu pioneirismo, o Salão Internacional de Arquitetura Tropical simboliza a intenção desse grupo de arquitetos de identificar um movimento próprio brasileiro, configurando-se quase como um manifesto na tentativa de compreender o sentido da profissão e direcionar as futuras pesquisas da área.
Ficha Técnica
Alcides da Rocha Miranda
Alexandre Altberg
Artista participante
Affonso Eduardo Reidy
Gerson Pompeu
Gregori Warchavchik
Lucio Costa
Luiz Nunes
Marcelo Roberto
Fontes de pesquisa 9
- A República no Brasil. Angela de Castro Gomes, Dulce Chaves Pandolfi, Verena Alberti, coordenação; Américo Freire ... [et. al.]. Rio de Janeiro: Nova Fronteira : CPDOC, 2002.
- ARANHA, Maria Beatriz de Camargo. A obra de Rino Levi e a trajetória da arquitetura moderna no Brasil. 2008. Tese (Doutorado) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), São Paulo, 2008. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16133/tde-29032010-153615/pt-br.php. Acesso em: 19 jan. 2021.
- GOMES, Angela de Castro; PANDOLFI, Dulce Chaves; ALBERTI, Verena; FREIRE, Américo. A República no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: CPDOC, 2002.
- HERBST, Helio. Pelos salões das bienais, a arquitetura ausente dos manuais: expressões da arquitetura moderna brasileira expostas nas bienais paulistanas (1951-1959). 2007. Tese (Doutorado) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), São Paulo, 2007.
- IRIGOYEN, Adriana. Wright e Artigas, duas viagens. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002.
- KELLY, Celso. “Uma contribuição histórica: o Salão de Arquitetura Tropical“, Anais do II Congresso Nacional de Críticos de Arte, 1961.
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- NEDELYKOV, Nina; MOREIRA, Pedro. Caminhos da Arquitetura Moderna no Brasil: a presença de Frank Lloyd Wright. Arquitextos, 018.03, ano 01, nov. 2001. Disponível em: https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/02.018/829. Acesso em: 5 jun. 2020.
- SALÃO Revolucionário. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2020. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/evento84519/salao-revolucionario. Acesso em: 8 jun. 2020. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7.
Como citar
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1º Salão Internacional de Arquitetura Tropical.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/evento486359/1-salao-internacional-de-arquitetura-tropical. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7