Paulo Villaça
Texto
Paulo Barbosa Villaça (Bauru, São Paulo, 1933 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1992). Ator, diretor de cinema e teatro. Atua em filmes emblemáticos do cinema marginal brasileiro dos anos 1960 e 1970, como O bandido da luz vermelha (1967), e em peças históricas como Navalha na carne (1967) e Fala baixo senão eu grito (1969).
Nascido no interior paulista, gradua-se em letras e inicia a vida profissional como professor de literatura, português e grego. Trabalha ainda como jornalista e publicitário antes de viajar a Paris, em 1960, onde participa do Festival Internacional de Estudantes como ator da peça Pluft, o fantasminha (1955), de Maria Clara Machado (1921-2001).
Decidido a prosseguir na atuação, frequenta a Escola de Artes Dramáticas da Universidade de São Paulo (EAD-USP), até 1964. No ano seguinte, faz suas primeiras peças profissionais, Electra, com o Grupo Decisão, e O caso Oppenheimer, com texto de Heinar Kipphardt (1922-1982) e direção de Jean-Luc Descaves, ao lado de Rubens de Falco (1931-2008) e Jairo Arco e Flexa (1937-2018). Em 1966, integra o elenco de Os inimigos, de Máximo Gorki (1868-1936), dirigida por José Celso Martinez Corrêa (1937-2023), do Teatro Oficina.
Notabiliza-se nos palcos com dois personagens marginais: o cafetão Vado, de Navalha na carne, obra-prima de Plínio Marcos (1935-1999), e o ladrão de Fala baixo senão eu grito, peça de estreia da dramaturga Leilah Assumpção (1943). Na primeira, forma o trio de protagonistas com Ruthinéa de Moraes (1930-1998), como Neusa Sueli, e Edgar Gurgel Aranha (1937-1990), o Veludo, trabalhando novamente com Jairo Arco e Flexa – agora na função de diretor.
Em Fala baixo senão eu grito, dirigida por Clóvis Bueno (1940-2015), atua ao lado de Marília Pêra (1943-2015), que se torna sua esposa entre 1969 e 1970. Enquanto a atriz recebe os prêmios Molière e da Associação Paulista de Críticos Teatrais (APCT) pela representação da pudica Mariazinha.
A representação de tipos desviantes da lei toma maiores proporções em suas experiências no cinema. Conhecido como um dos “atores marginais” dos anos 1960 e 1970, Villaça faz história como o assaltante Jorge, protagonista de O bandido da luz vermelha, a subversiva sátira política e moral que consagra o diretor Rogério Sganzerla (1946-2004), emblemática também no modo de criação cinematográfica, em razão da precariedade do circuito artístico nacional.
Coprodutor do filme, inspirado na biografia de João Acácio Pereira da Costa (1942-1998), Villaça contracena com Helena Ignez (1939) e Sônia Braga (1950). O longa-metragem, premiado como melhor filme no Festival de Brasília, torna-se sucesso de público e crítica. Nas palavras do jornalista Naief Haddad, o filme “[...] é indiscutivelmente popular, compromissado com o entretenimento do público, mas é também inequivocamente erudito, em seu habilidoso manuseio de diversas heranças, traduzido por inquietos procedimentos de câmera e montagem”1.
São da mesma fase seus trabalhos em Perdidos e malditos (1970), de Geraldo Veloso (1944-2018); e Mangue bangue (1970), com direção de Neville D'Almeida (1941). O crítico Sérgio Alpendre explicita o tom da primeira obra: “Meio do mato. [...] O noviço rebelde Paulo Villaça acena para a câmera. De repente, vontade de defecar. Ele não pede licença para a platéia. Defeca ali mesmo [...]. Trata-se de Perdidos e Malditos [...]. É pura transgressão. Invenção constante”[2].
Mangue bangue opera outra ruptura moral frente à censura do regime ditatorial então vigente. Ao lado de Maria Gladys (1939), Villaça cumpre a trajetória de um corretor da bolsa de valores que se lança a um hedonismo com teor fortemente político-libertário, associado ao resgate do corpo e do prazer pela contracultura. No desfecho, seu personagem encontra uma vida idílica, próxima da natureza, em uma sequência em que está nu, grita para a câmera, toca os genitais e cheira folhagens colhidas por ele. Uma animalidade restauradora.
Com essas atuações, o ator demonstra estar em plena sintonia com o chamado cinema marginal. “Escrachado, expressivo, espontâneo, ele criou uma espécie de persona e a utilizava em todos os seus papéis, ainda que entre elas houvesse nuanças. Sempre o mesmo malandro de fala mole, com o sotaque carregado e os palavrões a explodir de sua boca [...]”3.
Ao fim de dois anos dedicados somente ao cinema, Villaça procura outras fontes de renda. Em 1972, atua na telenovela O bofe (1972-1973), da Rede Globo, e, na mesma década, mora em Londres, na casa do britânico Mick Taylor (1949), guitarrista dos Rolling Stones. Em 1976, dirige o espetáculo Gente fina é outra coisa.
Retorna à televisão em produções como Selva de pedra (1986), Anos dourados (1986), Vale tudo (1988-1989) e Barriga de aluguel (1990-1991), em papéis menores. Seu último filme é Perfume de gardênia (1992), de Guilherme de Almeida Prado (1954), em participação especial, novamente como no papel de um ladrão e ao lado de Helena Ignez. No mesmo ano, morre em decorrência de Aids.
Com o estilo espontâneo e malandro que imprime às suas atuações, Paulo Villaça dá corpo a personagens desviantes no teatro e se eterniza como uma das faces do cinema marginal brasileiro.
Notas
1. HADDAD, Naief. Os 70 anos de um criador de filmecos. Folha de S.Paulo, 4 dez. 2016. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2016/12/1837801-os-70-anos-de-um-criador-de-filmecos.shtml. Acesso em: 2 ago. 2022.
2. ALPENDRE, Sérgio. Perdidos e Malditos. Contracampo. Disponível em: http://www.contracampo.com.br/30/perdidosemalditos.htm. Acesso em: 2 ago. 2022.
3. FAUSTO, Juliana. O avacalhado Paulo Vilaça. Contracampo. Disponível em: http://www.contracampo.com.br/38/vilaca.htm. Acesso em: 2 ago. 2022.
Obras 1
Espetáculos 15
Fontes de pesquisa 12
- ALPENDRE, Sérgio. Perdidos e Malditos. Contracampo. Disponível em: http://www.contracampo.com.br/30/perdidosemalditos.htm. Acesso em: 2 ago. 2022.
- ARENA conta Zumbi. São Paulo: Teatro de Arena, 1965. 1 programa do espetáculo realizado no Teatro de Arena. Não catalogado
- DUARTE, Theo Costa. O cinema de vanguarda em diálogo com as artes visuais: contrastes e paralelos em experiências brasileiras e norte-americanas (1967-1971). 2017. 289 f. Tese (Doutorado em Meios e Processos Audiovisuais) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27161/tde-27092017-103239/publico/TheoCostaDuarte.pdf. Acesso em: 2 ago. 2022.
- EICHBAUER, Hélio. [Currículo]. Enviado pelo artista em: 24 abr. 2011. Não catalogado
- ESPETÁCULOS Teatrais. [Pesquisa realizada por Edélcio Mostaço]. Itaú Cultural, São Paulo, [20--]. 1 planilha de fichas técnicas de espetáculos. Não Catalogado
- FAUSTO, Juliana. O avacalhado Paulo Vilaça. Contracampo. Disponível em: http://www.contracampo.com.br/38/vilaca.htm. Acesso em: 2 ago. 2022.
- HADDAD, Naief. Os 70 anos de um criador de filmecos. Folha de S.Paulo, 4 dez. 2016. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2016/12/1837801-os-70-anos-de-um-criador-de-filmecos.shtml. Acesso em: 2 ago. 2022.
- MAGALDI, Sábato. Amor ao teatro. São Paulo: Edições Sesc, 2016.
- OS INIMIGOS. São Paulo: Teatro Oficina Uzyna Uzona, [1966]. 1 programa do espetáculo realizado no Teatro Brasileiro de Comédia. Não catalogado
- Programa do Espetáculo - Navalha na Carne - 1967. Não catalogado
- Programa do Espetáculo - Torre de Babel - 1977. Não catalogado
- RIZZO, Sérgio. "Faroeste sobre o 3° Mundo" une o popular e o erudito. Folha de S.Paulo, 2 dez. 2007. Ilustrada. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0212200711.htm. Acesso em: 2 ago. 2022.
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PAULO Villaça.
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