Sônia Braga
![Cartaz do filme Dona Flor e Seus Dois Maridos, ca. 1976 [Obra]](http://d3swacfcujrr1g.cloudfront.net/img/uploads/2020/01/592798_67148.jpg)
Cartaz do filme Dona Flor e Seus Dois Maridos, 1976
Benício, Sônia Braga
Desenho
93,00 cm x 64,00 cm
Texto
Sônia Maria Campos Braga (Maringá, Paraná, 1950). Atriz. Naturalizada estadunidense, é uma das primeiras atrizes brasileiras a construir carreira internacional. Conhecida por atuações emblemáticas em telenovelas e filmes, a atriz geralmente é associada a personagens com elementos marcantes de sensualidade e transgressão.
Em 1964, aos 14 anos, inicia a carreira em São Paulo em programas infantis. Em 1969, integra o elenco da montagem brasileira da peça Hair, dirigida por Ademar Guerra (1933-1993) e contracenando com Antônio Fagundes (1949), Aracy Balabanian (1940-2023) e Armando Bógus (1930-1993). A montagem torna-se célebre pelo discurso pacifista ao questionar a Guerra do Vietnã (1955-1975) e por trazer no fim do primeiro ato o elenco em completa nudez. No mesmo ano, estreia na televisão na novela A menina do veleiro azul, na TV Excelsior, iniciando a trajetória de uma das atrizes mais populares do país.
Depois da passagem bem-sucedida na série infantil Vila Sésamo (1972), é como a protagonista de Gabriela (1975), telenovela adaptada da obra do escritor Jorge Amado (1912-2001), que a atriz de 25 anos arrebata o público. Fugindo da seca, Gabriela chega a Ilhéus, na Bahia, onde fascina homens com sua alegria e sensualidade. Como a protagonista, a atriz personifica o estereótipo da sensualidade da mulher brasileira ao mesclar tons de inocência no olhar com a ênfase em suas formas corporais e vasta cabeleira negra.
Nos anos seguintes, Sônia Braga direciona sua carreira para o cinema nacional, onde interpreta personagens adaptados da literatura e da dramaturgia brasileira. A partir de outro romance de Jorge Amado, Dona Flor e seus dois maridos (1976), sua primeira parceria com o diretor Bruno Barreto (1955), a atriz se reafirma no protótipo da mulher brasileira sensual no papel da professora de culinária Florípedes Guimarães. Viúva de um malandro – também ótimo amante – e casada com um homem conservador e recatado, passa a se encontrar com o espírito do primeiro marido e viver um relacionamento bígamo. A atriz assume o papel principal de A dama do lotação (1978), adaptado do conto homônimo de Nelson Rodrigues (1912-1980), com direção de Neville D’Almeida (1941). No filme, representa uma mulher violentada pelo próprio marido e que só consegue fazer sexo com homens desconhecidos.
No início da década seguinte, protagoniza Eu te amo (1980), do cineasta Arnaldo Jabor (1940-2022), pelo qual recebe o prêmio de melhor atriz no Festival de Gramado. No filme, contracenando com Paulo César Peréio (1940-2024), vive uma mulher que se envolve com um industrial falido em uma relação que, ao mesmo tempo, temem e desejam. Em 1983, reencontra a personagem Gabriela e o diretor Bruno Barreto na versão cinematográfica da história de Jorge Amado, onde divide a tela com o ator italiano Marcello Mastroianni (1924-1996).
A carreira internacional da atriz começa em 1985 com O beijo da mulher-aranha, filme dirigido pelo cineasta argentino naturalizado brasileiro Hector Babenco (1946-2016) e adaptado do romance homônimo do escritor argentino Manuel Puig (1932-1990). A película trata do relacionamento entre um preso político e um homossexual que dividem uma cela de prisão durante a ditadura militar brasileira1.
Para o crítico de cinema Matheus Bonez, o filme apresenta “uma excepcional Sônia Braga em três papéis distintos: a Mulher Aranha, a espiã Leni e o amor de Valentin [o preso político] na vida ‘real’. [...] Com a presença ofuscante de Sônia Braga dominando quadro a quadro, fica quase impossível não desejar um filme à parte com sua(s) personagem(ns)”2. A boa repercussão garante à Sônia Braga uma indicação como atriz coadjuvante no prêmio estadunidense Globo de Ouro.
A carreira da atriz em Hollywood se firma em 1988, com outras duas produções: Rebelião em Milagro, dirigido pelo ator e diretor estadunidense Robert Redford (1936), e Luar sobre Parador, com direção de Paul Mazursky (1930-2014). Nos anos seguintes, a atriz se dedica a telefilmes politicamente engajados. Em Amazônia em chamas (1994), a dramatização da luta do brasileiro Chico Mendes (1944-1988) pela preservação da floresta garante à atriz a indicação ao Emmy como coadjuvante. No mesmo período integra o elenco de séries de sucesso comercial da televisão estadunidense, como Sex and the City (2001).
Mesmo vivendo nos Estados Unidos, onde obtém a naturalização em 2003, Sônia Braga continua ativa nas telas brasileiras. Em nova incursão no cenário baiano, participa do filme Tieta do Agreste (1996), dirigido pelo cineasta brasileiro Cacá Diegues (1940). Na história, outra adaptação literária de um romance de Jorge Amado, a atriz interpreta uma mulher rica e irreverente que retorna à cidade do interior baiano da qual foi expulsa pelo pai há 26 anos.
Depois de participações em séries estadunidenses no começo dos anos 2000, retoma o sucesso no cinema nacional em dois papéis marcantes sob direção de Kleber Mendonça Filho (1968). A Clara de Aquarius (2016) é considerada a personagem mais complexa e desafiadora de sua carreira. No filme – exibido na mostra oficial do festival de Cannes –, interpreta a dona de um imóvel em Recife, em Pernambuco, que resiste às investidas e ameaças da incorporadora que pretende demolir o edifício para construção de um novo empreendimento. O jornal The Guardian afirma que Clara “é o retrato de uma mulher soberbamente interpretada e observada de forma densa”3.
Em artigo sobre a atuação da atriz, os pesquisadores Pedro Henrique Varoni de Carvalho e Amanda Braga afirmam: “Sônia, que já foi tantas outras, voltou ao Brasil para ser Clara. A personagem se fixa no seu território, mas o faz a partir de uma série de vivências cartográficas que indicam a manutenção da liberdade interior”4. E a própria atriz se manifesta em entrevista: “eu e Clara somos água, talvez uma o mar e outra as cachoeiras. E quando se encontram, vira um tsunami, que é uma força incontrolável”5.
Três anos depois, volta a atuar com Mendonça Filho, que divide a direção com Juliano Dornelles (1980) em Bacurau. No filme, um povoado nordestino descobre que sumiu do mapa e percebe que será atacado por inimigos desconhecidos. Sônia Braga interpreta Domingas, uma médica respeitada pela comunidade.
Das heroínas morenas, brejeiras e sensuais de Jorge Amado à fortaleza de Clara, a mulher madura e resistente de Aquarius, Sônia Braga transita da televisão para o cinema com a mesma intensidade dramática e a mesma coragem de suas personagens. Em sua trajetória artística, desenvolve mulheres que permanecem vivas no imaginário do público e se torna uma das mais populares e talentosas atrizes do Brasil.
Notas
1. Também denominada de ditadura civil-militar por parte da historiografia com o objetivo de enfatizar a participação e apoio de setores da sociedade civil, como o empresariado e parte da imprensa, no golpe de 1964 e no regime que se instaura até o ano de 1985.
2. BONEZ, Matheus. O beijo da mulher-aranha. Papo de Cinema. s/d. In https://www.papodecinema.com.br/filmes/o-beijo-da-mulher-aranha/ Acesso em 08. ago. 2023.
3. BRADSHAW, Peter. Aquarius Review - Sônia Braga brilliant as a widow on the warpath. The Guardian. 23. mar. 2017. In https://www.theguardian.com/film/2017/mar/23/aquarius-review-sonia-braga-filho?utm_source=meio&utm_medium=email. Acesso em 24. jul. 2023.
4. CARVALHO, Pedro Henrique Varoni; BRAGA, Amanda. Um ato de plenitude diante do vazio: Sônia Braga, o acontecimento discursivo de Aquarius e os arquivos da contracultura. Revista Graphos, João Pessoa, v. 20, n. 1, 2018, p. 32.
5. MONETTI, Tino. “Estou inteirinha lá”: uma entrevista com Sônia Braga sobre “Aquarius”. Vice, [s.l.], 25 ago. 2016. Disponível em: https://www.vice.com/pt/article/bmgaxz/sonia-braga-entrevista-2016. Acesso em: 24 jul. 2023.
Obras 5
Espetáculos 2
Fontes de pesquisa 21
- "Tropa de Elite 2" bate "Dona Flor'' e se torna a maior bilheteria do cinema nacional. UOL. 08. dez. 2010. Disponível em: https://cinema.uol.com.br/noticias/redacao/2010/12/08/tropa-de-elite-2-bate-dona-flor-e-se-torna-a-maior-bilheteria-do-cinema-nacional.htm. Acesso em 26 jul. 2023.
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- CARVALHO, Pedro Henrique Varoni; BRAGA, Amanda. Um ato de plenitude diante do vazio: Sônia Braga, o acontecimento discursivo de Aquarius e os arquivos da contracultura. 2018. (Artigo). Revista Graphos, v. 20 n. 1, UFPB/PPGL, 2018, p. 21-36.
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SÔNIA Braga.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
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