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Enciclopédia Itaú Cultural
Cinema

Kleber Mendonça Filho

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 06.12.2019
1968 Brasil / Pernambuco / Recife
Kleber de Gonçalves Mendonça Filho (Recife, Pernambuco, 1968). Cineasta. É diretor e roteirista de filmes que revelam um olhar crítico e irônico sobre diversos aspectos da relação entre pessoas, das disputas de poder e das desigualdades sociais.

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Kleber de Gonçalves Mendonça Filho (Recife, Pernambuco, 1968). Cineasta. É diretor e roteirista de filmes que revelam um olhar crítico e irônico sobre diversos aspectos da relação entre pessoas, das disputas de poder e das desigualdades sociais.

Forma-se em jornalismo na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Durante o curso, é convidado por seu professor para escrever um artigo sobre o cineasta estadunidense Ed Wood (1924-1978), para o Jornal do Commercio, de Recife. Passa a atuar como repórter do periódico e, a partir de 1997, como crítico de cinema. Em 1998, começa a publicar também no CinemaScópio, primeiro site pernambucano dedicado ao cinema. No mesmo ano, torna-se coordenador de cinema da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj).

Enquanto atua como crítico de cinema, Kleber começa a dirigir curtas e médias-metragens. O trabalho mais conceituado dessa fase é Recife Frio (2009), curta sobre um fenômeno meteorológico que faz o sol desaparecer por sete meses e os termômetros registrarem temperatura máxima de 14oC. A mudança climática intensifica a desigualdade social, exemplificada na cena em que o morador de um apartamento de frente para o mar obriga a empregada a trocar de quarto com ele, já que no dela, por ser pequeno e ter janela minúscula, o frio é menos intenso.

Após encerrar sua atuação como crítico, dedica-se a seu primeiro longa-metragem de ficção, Som ao Redor (2012). A partir de uma rua de classe média de Recife, faz uma crítica à ascensão social urbana, que carrega imaginariamente resquícios do poder dos antigos engenhos de açúcar do Nordeste brasileiro. Com elenco diversificado, incorporando diferentes posições sociais, o diretor transfere para uma rua da capital pernambucana a herança das relações de poder coloniais: o senhor que detém grande parte das casas da rua, as reuniões de condomínio que se tornam espaços para manifestação de preconceitos e as empregadas domésticas que transitam pelas casas servindo a seus patrões são exemplos que traçam os caminhos do poder ao longo da história brasileira.

A chegada de um grupo de vigilantes oferecendo serviços de segurança patrimonial abre as portas para que o espectador entre nas casas dos moradores da rua. Assiste, assim, como as relações individuais no espaço doméstico se relacionam com os “sons” da rua e das casas vizinhas.

O Som ao Redor pode ser lido como uma alegoria da arquitetura social brasileira, sobretudo da classe média, enclausurada em muros e em relações assentadas sobre “pequenos poderes”. É o que se vê nas relações entre patrões e empregados, nos preconceitos sociais e raciais e no individualismo dentro dos condomínios.  

Para Lúcia Nagib, o filme produz uma identidade regional e nacional.  Para isso, entretanto, utiliza o reverso do paisagismo grandioso que caracteriza o Brasil no Cinema Novo dos anos 1960 e 1970 e no movimento de retomada do cinema nacional nos anos 1990. Assim, compara a crítica, em vez do travelling que acompanha a corrida de Manoel em direção ao mar nunca visto em Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Glauber Rocha (1939-1981), no filme de Kleber a câmera segue uma menina de patins na garagem de um prédio, chegando a um pátio murado cheio de babás e crianças amontoadas.

A crítica estrangeira destaca que o longa retrata espaços privados e áreas públicas como ramificações do mesmo pesadelo coletivo urbano, jogando luz sobre um estado peculiar da sociedade brasileira. O Som ao Redor é premiado nos festivais do Rio, Gramado e Roterdã, no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

Ao falar sobre o filme, o diretor afirma que se interessa pela arquitetura como sintoma de uma sociedade que não é saudável. Quatro anos depois, ele volta a abordar essa questão em Aquarius (2016), filmado em um edifício à beira-mar de Recife. A única moradora remanescente é uma viúva interpretada por Sônia Braga (1950), que luta contra a incorporadora que pretende executar um novo empreendimento no terreno.

Enquanto Som ao Redor desenha o conflito, ainda que velado, de classes, em Aquarius, a burguesia pernambucana entra em conflito consigo mesma e com as transformações sociais pela qual a cidade passa. Vítima da especulação imobiliária, a personagem Clara [Sônia Braga] é deslocada da posição de poder que desfruta no edifício e, por extensão, na cidade.

A crítica vê no filme uma metáfora do Brasil, com casos de nepotismo, corrupção, individualismo e desonestidade, e elogia o diretor pela forma como maneja a questão espacial, sobretudo as fronteiras entre exterior e interior. O diretor, entretanto, também recebe críticas por explicitar preferências pessoais e reduzir circunstâncias complexas a uma briga do bem contra o mal, com um vilão simplista e uma heroína praticamente sem conflitos internos. Segundo Kleber, seu filme retoma uma narrativa clássica do cinema, com forças antagônicas bem delineadas. 

Aquarius conquista os prêmios de melhor filme nos Festival Internacional de Cinema de Cartagena (Colômbia), Festival de Havana (Cuba), Sydney Film Festival (Austrália) e no Festival Internacional de Cinema de Mar del Plata (Argentina), entre outros. Mas a comoção maior vem com a indicação à Palma de Ouro no Festival de Cannes (França). O filme perde o prêmio, mas a equipe chama atenção da imprensa internacional ao protestar contra o processo de impeachment que afasta a presidente Dilma Rousseff e entrega interinamente o poder a seu vice, Michel Temer.

Nos meses seguintes, Aquarius perde a disputa pela indicação brasileira para o Oscar de filme estrangeiro, e o diretor é processado pelo Ministério Público Federal sob alegação de irregularidades na captação de recursos. Kleber também deixa a Fundaj, ligada ao governo federal, depois de dezoito anos à frente da instituição.

Em 2019, o diretor retorna à grande tela com Bacurau, novamente com Sônia Braga no elenco. Dessa vez, longe da atmosfera de classe média e da maresia de Boa Viagem, ela encarna Domingas, médica de um vilarejo onde as divergências se resolvem de forma violenta.

Bacurau é uma história distópica sobre um país tomado pela violência e pela cisão entre norte e sul do país. A crítica o define como “faroeste futurista” que reúne exemplos da violência secular praticada no país. Quando o longa foi lançado, entretanto, algumas situações propostas como ficção delirante no filme estavam se tornando banais na realidade.

O filme, codirigido por Juliano Dornelles (1980), leva Kleber de volta a Cannes. A estreia se dá no mesmo dia em que milhares de brasileiros protestam contra o corte de verbas para educação anunciado pelo governo. O filme perde a disputa pela Palma de Ouro, mas conquista o Prêmio do Júri, o terceiro mais importante do festival, empatando com Les Misérables (2019), do diretor malinês Ladj Ly (1978).

Os filmes de Kleber Mendonça partem de situações e locais específicos para retratar problemas latentes da sociedade brasileira e, até mesmo, mundial. Essa universalidade temática, embalada por tramas bem filmadas, faz dele um dos cineastas mais admirados de sua geração.

Obras 1

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