Letieres Leite

Letieres Leite, 2014
Texto
Letieres dos Santos Leite (Salvador, Bahia, 1959 – Idem, 2021). Maestro, compositor, arranjador, saxofonista, flautista, percussionista. É um artista comprometido com a valorização dos ritmos de terreiro na música brasileira contemporânea. Como maestro da Orkestra Rumpilezz, faz um trabalho marcante ao adaptar toques do candomblé à linguagem sinfônica, em uma banda com 20 instrumentistas de sopro e percussão. É também um personagem importante da axé music, com trabalhos associados a artistas icônicas do gênero como Daniela Mercury (1965), Ivete Sangalo (1972) e os grupos Olodum e Timbalada.
Aos 12 anos, como aluno de colégio público, em Salvador, integra como flautista e saxofonista uma orquestra afro-brasileira, criada pela pesquisadora Emilia Biancardi (1941). Nesse período, tem contato com o mestre de capoeira Moa do Katendê (1954-2018), com quem aprende percussão. No ano seguinte, dedica-se à pintura e à gravura e participa de uma exposição coletiva na Biblioteca Central, em Salvador. Ingressa, em 1977, no curso de artes plásticas da Universidade Federal da Bahia (UFBA), que frequenta por três anos.
Paralelamente, estuda música de forma autodidata. As vivências nas ruas de Salvador o aproximam da linguagem percussiva dos terreiros de candomblé e dos grupos afro Ilê Ayê, Olodum e Filhos de Gandhy. Em 1981, muda-se para o sul do país, onde vive em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul e toca saxofone em grupos locais. Em 1984, escreve arranjos para o Orquestra Sinfônica de Porto Alegre e, no ano seguinte, ingressa na escola Franz Schubert Konservatorium, em Viena, na Áustria, onde mora até 1994.
Lá, aprofunda-se nos estudos das linguagens do jazz e da música sinfônica ocidental e elabora as primeiras ideias para a Orkestra Rumpilezz. De volta à Bahia, participa em gravações e shows de artistas como o percussionista pernambucano Naná Vasconcelos (1944-2016), o grupo Timbalada e a cantora Daniela Mercury. Firma, a partir de 1998, importante parceria com Ivete Sangalo, com quem trabalha como diretor musical e saxofonista, até 2011.
Em 2002, funda a Academia de Música da Bahia (Ambah), onde aplica o método de ensino que ele chama de Universo Percussivo Baiano (UPB), e quatro anos depois funda a Orkestra Rumpilezz. A formação da banda chama atenção por reunir 15 músicos de sopros e cinco percussionistas (sem cordas e teclas). O nome da banda faz referência aos atabaques usados nos rituais de candomblé: rum (de som mais grave), rumpi (médio) e lé (agudo). As duas letras “z” fazem referência ao jazz.
Compõe e arranja todas as músicas autorais da banda, cujo repertório é inspirado na cultura rítmica do centro de Salvador, nos toques de orixás da música sacrobaiana e em grandes agremiações percussivas como o Ilê Ayê e o Olodum, além de importantes nomes da música baiana como Gilberto Gil (1942) e Dorival Caymmi (1914-2008). Outra referência é o maestro pernambucano Moacir Santos (1926-2006), que também trabalha com o cruzamento de elementos do universo percussivo brasileiro e do jazz e da música de concerto ocidental.
Com a Orkestra Rumpilezz, lança o primeiro disco (Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz), em 2009, com oito composições do maestro e uma versão para “Balendoah”, do cantor Ed Motta (1971). O repertório é repleto de referências aos ritmos de terreiro e ao vocabulário da língua yorubá. O tema “Floresta azul” é baseado no ritmo agueré, tocado nos rituais de candomblé para o orixá Oxóssi (santo da mata e do campo). A faixa “Aláfia” traz no título uma palavra em yorubá que significa “caminhos abertos”. Nos anos seguintes, a orquestra faz shows dedicados ao repertório de outros artistas: Gilberto Gil, em 2014, Dorival Caymmi (1914-2008) e Lenine (1959), ambos em 2015.
Em 2016, com a Rumpilezz, lança A saga da travessia, em que propõe uma reflexão sobre o impacto da escravização de africano na música ocidental. Enfatiza a influência africana no surgimento de gêneros musicais como blues, jazz, samba, salsa e tango. O maestro declara em entrevistas que, durante o processo de composição, fantasia a imagem dos homens nos navios negreiros antevendo que seus descendentes seriam personagens fundamentais da música brasileira como Pixinguinha (1897-1973), Jackson do Pandeiro (1919-1982) e Milton Nascimento (1942).
Assina os arranjos do musical Elza, sobre Elza Soares (1930-2022), que estreia em 2018 e tem direção de Duda Maia (1968). Com o Letieres Leite Quinteto, lança o álbum O enigma lexeu, em 2019, em que experimenta as ideias rítmicas da Rumpilezz em um grupo com a formação clássica do jazz, com piano, baixo, bateria e percussão. No mesmo ano, é lançado o álbum Mangueira, a menina dos meus olhos, de Maria Bethânia (1946), em que o maestro assina os arranjos. Após sua morte, em 2021, é lançado o álbum Moacir de Todos os Santos (2022), em que a Orkestra Rumpilezz toca o repertório do disco Coisas (1965), de Moacir Santos.
Letieres Leite dá continuidade à uma tradição iniciada pelo maestro mineiro Abigail Moura (1904-1970) com sua Orquestra Afro-Brasileira nos anos 1950 e potencializada pelo pernambucano Moacir Santos na década seguinte: a de explorar a complexidade dos ritmos brasileiros, realçar sua origem africana e misturá-los com as linguagens do jazz e da música de concerto.
O diferencial de Letieres está no compromisso em evidenciar a influência desses importantes nomes da música negra a partir dos toques dos terreiros de candomblé baiano. Essa característica está não só na obra da Orkestra Rumpilezz e no seu quinteto de jazz, mas também em seus trabalhos associados à axé music e no método de ensino que desenvolve na Academia de Música da Bahia.
Obras 1
Mídias (1)
Fontes de pesquisa 8
- FERREIRA, Mauro. Morre Letieres Leite, artista consagrado pela maestria de unir o jazz ao universo percussivo baiano. G1, Rio de Janeiro, 17 out. 2021. Música. Disponível em: https://g1.globo.com/pop-arte/musica/blog/mauro-ferreira/post/2021/10/27/morre-letieres-leite-artista-consagrado-pela-maestria-de-unir-o-jazz-ao-universo-percussivo-afro-baiano.ghtml. Acesso em: 31 maio 2022.
- JAZZ de terreiro. Radiola Urbana, São Paulo, 26 fev. 2019. Disponível em: http://www.radiolaurbana.com.br/25007/. Acesso em: 31 maio 2022.
- MARIA, Julio. Sobre todas as coisas. O Estado de São Paulo, 30 ago. 2017.
- Morre músico Letieres Leite, maestro da Orquestra Rumpilezz e autor de arranjos de artistas baianos como Ivete e Bethânia. G1, Salvador, 27 out. 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2021/10/27/morre-musico-letieres-leite.ghtml. Acesso em: 27 out. 2021.
- PINHEIRO, Marcelo. Letieres Leite, guardião da mãe África. Arte!Brasileiros, São Paulo, 16 maio 2018. Disponível em: https://artebrasileiros.com.br/cultura/letieres-leite-guardiao-da-mae-africa/. Acesso em: 31 maio 2022.
- RÉ, Adriana Del. Mestre dos arranjos. O Estado de São Paulo, 18 jul. 2019.
- VIANNA, Luiz Fernando. ‘Coisas’ ganham sotaque baiano em SP. Folha de S.Paulo, 16 set. 2017.
- ZWETSCH, Ramiro. O maestro que dança. Revista Trip, São Paulo, 15 mar. 2019. Disponível em: https://revistatrip.uol.com.br/trip/trocamos-uma-ideia-com-letieres-leite-a-mente-por-tras-da-fusao-de-ritmos-da-orkestra-rumpilezz. Acesso em: 31 maio 2022.
Como citar
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LETIERES Leite.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa587734/letieres-leite. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7