Joaquim Pedro de Andrade
![Garrincha, Alegria do Povo [cartaz], ca. 1962 [Obra]](http://d3swacfcujrr1g.cloudfront.net/img/uploads/2000/01/001675005019.jpg)
Garrincha, Alegria do Povo [cartaz], 1962
Joaquim Pedro de Andrade
Desenho e fotografia
104,00 cm x 69,00 cm
Texto
Joaquim Pedro de Andrade (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1932 – Idem, 1988). Cineasta e roteirista. Destaca-se como um dos mais importantes nomes do Cinema Novo.
Frequenta o curso de Física na Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi), instituição em que se gradua em 1956. Nesse período, reativa o cineclube da faculdade ao lado de colegas. Considera-se como sua primeira obra O mendigo e a pintura (1953), filme amador desse período, interpretado por Saulo Pereira de Mello (1933-2020).
Filho de Rodrigo Melo Franco de Andrade (1898-1969), fundador do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), acompanha o pai, em 1957, na restauração de obras de Aleijadinho (1738-1814) em Congonhas do Campo, Minas Gerais. Essa experiência se desdobra em momentos diversos de sua carreira, que tem início ao trabalhar como assistente de direção em Rebelião em Vila Rica (1958), dos gêmeos Geraldo Santos Pereira (1925-?) e José Renato Santos Pereira (1925-?).
Entre os cineastas do cinema novo, é o que mais demonstra a afinidade no diálogo com a literatura brasileira. Em 1959, como sócio da Saga Filmes, realiza os curtas-metragens O mestre de Apipucos e O poeta do castelo, dois documentários com forte impulso ficcional, que registram respectivamente o cotidiano do sociólogo Gilberto Freyre (1900-1987) e do poeta Manuel Bandeira (1886-1968). Semelhantes nos elegantes movimentos de câmera e na narração verbal com a voz dos retratados, os curtas compõem dois estilos distintos da vida intelectual do país: Freyre se apresenta como um senhor da casa-grande, dentro de uma propriedade reduzida ao jardim rústico, em ações que insinuam uma persistente situação patriarcal; Bandeira é o homem urbano, de uma cidade que reflete sua própria solidão, resgatado por uma arte própria que o transporta para o território de sua invenção, Pasárgada1.
Entre 1961 e 1962, dedica-se aos estudos de cinema. Bolsista do governo francês, faz estágio em duas instituições parisienses, o Institute des Hautes Études Cinématographiques (Idhec) e a Cinemateca Francesa. Trabalha para o produtor francês Sacha Gordine (1910-1968), que viabiliza a finalização do curta Couro de gato (1961), filmado no Rio de Janeiro. Graças à bolsa da Fundação Rockfeller, estuda em Londres com o diretor britânico Thorold Dickinson (1903-1984) na Slade School of Arts e, em Nova York, tem aulas de técnicas de cinema direto com os irmãos Albert Maysles (1926-2015) e David Maysles (1931-1987).
De volta ao Brasil, participa do projeto Cinco vezes favela, filme produzido em 1962 pelo Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE), com a inclusão de Couro de gato entre as cinco histórias que compõem o longa. Integra um dos núcleos fundadores do cinema novo ao lado do grupo da Pontifícia Universidade Católica (PUC), do cineasta Cacá Diegues (1940). Dirige o Garrincha, alegria do povo (1962), seu primeiro longa-metragem, em que descreve a biografia do jogador. O documentário apresenta lances e dribles que tornam o jogador famoso e, na parte final, a película abandona o mito do jogador e se dedica à paixão do torcedor.
Seu primeiro longa de ficção, O padre e a moça (1966), é criado a partir da sugestão de um poema de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987). Diálogos ambíguos explicitam aos poucos os relacionamentos escusos que tanto o espectador quanto o novo padre, que chega a um lugarejo decadente de Minas Gerais, conseguem captar nas sombras e nos cantos das casas e da igreja. A protagonista luta para ter vontade própria, mas, subjugada pelos homens do local, busca no titubeante padre o auxílio para escapar da opressão. Essa é uma forma sutil de mostrar um Brasil preso a formas socioeconômicas arcaicas, em que predominam a repressão e o patriarcalismo.
Desde então, o cineasta realiza diversas adaptações literárias. Nelas se veem não apenas o encontro do realizador com o tema desenvolvido pelo escritor, com respeito e fidelidade ao original, mas também um embate reflexivo e crítico com as próprias obras literárias, procurando extrair uma ponte entre a criação escritural e o compromisso do cineasta com a época de realização dos filmes e com sua visão pessoal da cultura brasileira.
Macunaíma (1969), seu primeiro filme colorido, promove uma "radicalização ideológica" no romance de Mário de Andrade (1893-1945), propondo uma reflexão voltada tanto para a questão do mito da identidade nacional e da fundamentação ética de um herói brasileiro, quanto para a constatação de um processo antropofágico institucionalizado, segundo o qual o Brasil devora os brasileiros pela miséria e pelo subdesenvolvimento em estado perpétuo.
Morre durante os preparativos de filmagem de Casa-Grande, Senzala & Cia, cujo roteiro é publicado em 2003. Na criação, pretendia investigar as origens da civilização brasileira: o patriarcado português, a contribuição indígena e negra, as lutas de afirmação nas quais é sedimentada a cultura do país. Também postumamente, em 1990, é impresso o roteiro de O imponderável Bento contra o crioulo voador (escrito em 1986), em que, nas palavras de Carlos Augusto Calil (1951), "novela e roteiro cinematográfico [...] convivem num texto que exibe mérito literário evidente"2, cumprindo involuntariamente o cineasta sua vocação de escritor.
Com preocupação em retratar a realidade brasileira e, simultaneamente, interesse em dialogar com obras caras da literatura, Joaquim Pedro de Andrade deixa um vasto legado para o cinema nacional.
Notas
1. Referência ao poema “Vou-me embora pra Pasárgada”, de Manuel Bandeira, publicado no livro Libertinagem (1930)
2. ANDRADE, Joaquim Pedro de. O imponderável Bento contra o crioulo voador. São Paulo: Marco Zero: Cinemateca Brasileira, 1990.p. 8.
Obras 8
Cartaz do filme Guerra Conjugal
Cartaz do filme O Padre e a Moça
Garrincha, Alegria do Povo [cartaz]
Exposições 6
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26/10/2001 - 14/1/2000
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30/11/2003 - 2/3/2002
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6/3/2012 - 29/4/2012
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28/4/2017 - 16/10/2017
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25/5/2017 - 13/8/2017
Fontes de pesquisa 15
- ANDRADE, Joaquim Pedro de. Casa-grande, senzala & cia: roteiro e diário. Rio de Janeiro: Aeroplano: Editora UFRJ, 2003.
- ANDRADE, Joaquim Pedro de. O imponderável Bento contra o crioulo voador. São Paulo: Marco Zero: Cinemateca Brasileira, 1990.
- ARAUJO, Luciana Sá Leitão Corrêa de. Joaquim Pedro de Andrade: primeiros tempos. Tese de doutorado. São Paulo, 1999.
- BENTES, Ivana. Joaquim Pedro de Andrade. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1996.
- BERNARDET, Jean-Claude. Piranha no mar de rosas. São Paulo: Nobel, 1982.
- ESCOREL, Eduardo. Adivinhadores de água: pensando no cinema brasileiro. São Paulo: Cosac Naify, 2005. p. 85-94.
- FILMES DO SERRO. Site de Joaquim Pedro de Andrade. Disponível em: http://www.filmesdoserro.com.br/jpa.asp. Acessado em: 18 ago. 2012.
- FILMES DO SERRO; PETROBRAS. Vida em movimento: Joaquim Pedro de Andrade. Rio de Janeiro, 2006.
- HOLLANDA, Heloisa Buarque de. Macunaíma: da literatura ao cinema. Apresentação Leandro Tocantins. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1978.
- JOHNSON, Randal. Cinema novo x 5: masters of contemporary Brazilian film. Austin: University of Texas, 1984. p. 13-51.
- MINISTÉRIO DA CULTURA. Joaquim Pedro de Andrade. Rio de Janeiro, 2000.
- RAMOS, Alcides Freire. Canibalismo dos fracos: cinema e história do Brasil. Apresentação de Ismael Xavier. Bauru: Edusc, 2001. 362 p.
- RAMOS, Fernão Pessoa; MIRANDA, Luiz Felipe (Orgs). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo: Senac, 2000. p. 23-25.
- VIANY, Alex. O processo do cinema novo. Rio de Janeiro: Aeroplano, 1999.
- XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo, cinema marginal. São Paulo: Brasiliense, 1993.
Como citar
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JOAQUIM Pedro de Andrade.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa13097/joaquim-pedro-de-andrade. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7