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Cinema

Cinema Novo

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 27.10.2022
Movimento de renovação da linguagem cinematográfica brasileira, que ocorre nos anos 1960 e início dos 1970, marcado pelo realismo e pela crítica às injustiças sociais ao retratar o sofrimento de brasileiros que tentam sobreviver num país desigual. Seus filmes se caracterizam pela concepção de cinema autoral e pelo baixo orçamento de produção. Os...

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Movimento de renovação da linguagem cinematográfica brasileira, que ocorre nos anos 1960 e início dos 1970, marcado pelo realismo e pela crítica às injustiças sociais ao retratar o sofrimento de brasileiros que tentam sobreviver num país desigual. Seus filmes se caracterizam pela concepção de cinema autoral e pelo baixo orçamento de produção. Os diretores que compõem o movimento buscam imprimir uma linguagem própria e marcar diferença em relação ao cinema feito até então no Brasil.

O movimento tem seus primórdios no fim dos anos 1950, quando um grupo de jovens se reúne no Rio de Janeiro para discutir os problemas do cinema brasileiro e ver os filmes uns dos outros em cineclubes. Na década seguinte, são lançados os longas que fazem do cinema novo um dos movimentos mais marcantes da cultura brasileira.

Uma espécie de marco inaugural é Cinco Vezes Favela (1962), dirigido por um grupo que conta com diretores de cinema como Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988), Cacá Diegues (1940) e Leon Hirszman (1937-1987). Na sequência, são realizados filmes como Os Cafajestes (1962), de Ruy Guerra (1931), Vidas Secas (1963), de Nelson Pereira dos Santos (1928-2018), e Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Glauber Rocha (1939-1981), entre outros.

Parte desses filmes contém a chamada Eztetyka da Fome, que Glauber torna pública em 1965. Um dos mais notórios integrantes do movimento, o diretor defende que o homem latino-americano precisa comunicar sua miséria e reagir a ela de forma violenta, algo que o cinema novo faz por meio de personagens que comem terra e raízes, que roubam e matam para comer. Segundo ele, o homem colonizado é um escravo enquanto não ergue as armas. Glauber, como outros cinemanovistas, é fã do soviético Serguei Eisenstein (1898-1948), diretor de O Encouraçado Potemkin (1925), clássico do cinema mudo sobre uma revolta de marinheiros.

Cacá Diegues define o clima da época como um delírio de fazer filmes decisivos, a fim de mudar a história do cinema, a realidade brasileira, o mundo. O planeta fervilha com guerras de descolonização na Ásia e na África – como a Guerra da Argélia (1954-1962) – e com o embate ideológico da Guerra Fria – Cuba faz sua revolução em 1959. O Brasil vive uma novidade, um governo de esquerda: João Goulart (1961-1964), deposto em 1964 por um golpe civil-militar que inaugura uma ditadura de 20 anos.

O “delírio” pode ser grandioso, mas se concretiza com simplicidade, por meio de filmes anti-industriais, sem estúdios nem grandes orçamentos. É uma crítica às produções da Companhia Cinematográfica Vera Cruz (São Paulo) e da Atlântida Cinematográfica (Rio de Janeiro), especialmente às chanchadas, filmes de caráter humorístico, popular, muitas vezes parodiando o cinema dos Estados Unidos. A meta é lutar contra o que se considera uma colonização cultural sofrida pelo Brasil, fazendo filmes que sensibilizem o público para os problemas do país. Filmes modernos e contemporâneos aos cinemas novos de outros países.

Diegues afirma que a nouvelle vague francesa e o pós-neorrealismo italiano dão uma pista do que os cinemanovistas buscam: uma política de grupo que os fortalece e um modo viável de fazer cinema, com filmagens fora dos estúdios, luz natural e outros recursos, de acordo com suas intenções cinematográficas. Como defende Glauber, o princípio é ter “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”. Ao optar por esse estilo, o cinema novo introduz elementos da moderna tecnologia audiovisual no Brasil, como negativos de maior sensibilidade e câmeras leves.

Sobra voluntarismo, mas falta distribuição. Os filmes têm pouca exibição nos cinemas brasileiros, mas começam a ser vistos e premiados no exterior. Isso atrai a atenção da crítica europeia, interessada no então chamado terceiro mundo e aberta ao cinema de autor. Entre 1960 e 1972, o cinema novo ganha 45 prêmios internacionais, inclusive em Cannes. Num festival na Itália, Gustavo Dahl (1938-2011) declara que sua geração não quer saber de cinema, e sim ouvir a voz do homem. Esse conceito, que Glauber destaca como síntese do movimento, é também apontado como uma utopia e um erro, já que os cineastas não têm origem popular e não vivem em meio ao povo.

Com o passar do tempo e com o reconhecimento, o movimento consegue apoio de órgãos públicos de fomento, mesmo durante o regime militar. Mas não desperta o interesse do grande público. Acredita-se que a burguesia e a classe média não gostam do Brasil ali retratado, e que só estudantes e intelectuais com a mesma cultura política dos realizadores veem os filmes. Sem acesso ao público, as possibilidades de combater o imperialismo cultural e desalienar o povo ficam limitadas.

Com a decretação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em 1968, e o endurecimento da ditadura, fazer cinema revolucionário se torna perigoso, inviável. Glauber parte para o exílio, o movimento arrefece e acaba não se beneficiando da criação, em 1969, da Embrafilme, dedicada a fomentar a produção e distribuição de filmes – embora a existência dessa empresa pública seja considerada um legado das batalhas do movimento.

O cinema novo é uma época de produção intensa de filmes e ideias, em que a ordem é fazer política por meio do cinema, à margem do sistema e de suas engrenagens comerciais, contrariando quase tudo que se faz no cinema brasileiro e propondo um olhar novo e autoral sobre a realidade. Não cativa o grande público, mas marca época e se torna o movimento cinematográfico brasileiro mais importante e reconhecido no mundo.

Obras 2

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Fontes de pesquisa 8

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  • DIEGUES, Cacá. Vida de cinema: antes, durante e depois do Cinema Novo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014.
  • GOMES, Paulo Emílio Sales. Cinema: trajetória no subdesenvolvimento. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
  • NOVA história do cinema brasileiro. Organização Fernão Ramos, Sheila Schvarzman. São Paulo: Ed. SESC SP, 2018. 2.v.
  • ROCHA, Glauber. Estética da fome. Manifesto lido em 1965, em Gênova (Itália). Disponível em: https://hambrecine.files.wordpress.com/2013/09/eztetyka-da-fome.pdf. Acesso em: 17 maio 2020.
  • ROCHA, Glauber. Revolução do cinema novo. Rio de Janeiro: Alhambra/Embrafilme, 1981.
  • SANTOS, Roberto Elísio dos. Glauber Rocha: uma câmera na mão e o Brasil na cabeça. Omelete, [s.l.], 22 ago. 2006. Disponível em: https://www.omelete.com.br/filmes/glauber-rocha-uma-camera-na-mao-e-o-brasil-na-cabeca. Acesso em: 18 maio 2020.
  • SIMONARD, Pedro. Origens do cinema novo: a cultura política dos anos 50 até 1964. [S.l.], [s.d.]. Disponível em: http://www.achegas.net/numero/nove/pedro_simonard_09.htm. Acesso em: 18 maio 2020.
  • XAVIER, Ismail. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo, cinema marginal. São Paulo: Brasiliense, 1993.

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