Walter Smetak
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O bicho, 1972
Walter Smetak
Instrumento musical eletrônico percutido e friccionado. madeira, metal, cordas e cabaças
270,00 cm x 165,00 cm
Texto
Anton Walter Smetak (Zurique, Suíça 1913 - Salvador, Bahia, 1984). Compositor, professor, violoncelista, artista plástico. Filho mais velho de Anton Smetak, compositor, professor, regente e virtuose do zitar - instrumento de cordas da família da cítara muito popular na região do Tirol. É iniciado na música pelo pai, que lhe ensina na infância a tocar zitar e piano. Em desacordo com os planos do pai de fazê-lo seu discípulo no instrumento, passa a estudar violoncelo. Ingressa em 1929 no curso de violoncelo da Escola Profissional do Conservatório de Zurique; e em 1931 na Academia de Música e Arte Dramática "Mozarteum" de Salzburg. Forma-se violoncelista pelo novo Conservatório Vienense.
Com a ascensão do nazismo, Smetak emigra para o Brasil, aceitando o convite de seu antigo professor Wolfgang Grunsky. Chega a Porto Alegre em 1937, contratado pela orquestra da Rádio Farroupilha. Entre 1937 e 1939 participa da orquestra da Rádio Sociedade Gaúcha e do Trio Schubert, além de lecionar violoncelo no Instituto de Belas Artes do Rio Grande do Sul. Passa um período entre São Paulo e Rio de Janeiro, e se estabelece no Rio em 1941. Por dez anos atua como instrumentista na Orquestra Sinfônica Brasileira, Rádio Nacional, Tupi, Guanabara e Teatro Municipal.
Estabelece-se em São Paulo, em 1954, como membro da Orquestra Sinfônica do Estado, trabalhando também nas Rádios Record e Bandeirantes. Atua ainda como luthier, construindo e consertando instrumentos de corda. Em 1957 aceita o convite do compositor e regente Hans Joachim Koellreutter (1915-2005) para lecionar violoncelo nos seminários livres de música da Universidade da Bahia (UBA), em Salvador. Encorajado pelo ambiente de vanguarda e liberdade que existe na universidade no momento, inicia sua prática na construção de novos instrumentos. Cria, a partir de então, mais de 150 instrumentos musicais utilizando materiais como cabaças e pedaços de outros instrumentos. Pela beleza plástica de suas criações, inscreve-se em 1966 na 1ª Bienal de Artes Plásticas, conquistando o Prêmio de Pesquisa. Naturaliza-se brasileiro em 1968.
Passa a dedicar-se com mais afinco à luteria e à criação. É homenageado por Gilberto Gil (1942) com a composição Língua do P ("Smetak, tak, tak"), gravada por Gal Costa (1945) em 1970. Forma em 1973 o Conjunto dos Mendigos, sexteto de violões experimental do qual fazem parte Gilberto Gil, Gereba (1946), Tuzé de Abreu (1948), Marco Antônio Guimarães, Rogério Duarte (1939) e Fredera. Recebe em 1974 o Prêmio Personalidade Global para música da Rede Globo de Televisão, e no mesmo ano é lançado Smetak, primeiro LP do compositor, produzido por Caetano Veloso e Roberto Santana. O segundo LP, Interregno, é lançado em 1980. Dois anos depois é convidado a participar do Festival de Berlim, além de publicar o livro O Retorno ao Futuro - O Retorno ao Espírito. Entre 9 de outubro e 21 de dezembro de 2008 ocorre no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP) a exposição retrospectiva do projeto Smetak Imprevisto, que cataloga e digitaliza o acervo do compositor e restaura suas "plásticas sonoras".
Análise
Nos fins da década de 1940, a cidade de Salvador vê surgir um ambiente de grande efervescência cultural. Na ocasião da fundação da Universidade da Bahia (UBA), seu primeiro reitor, Edgard Santos, convida um conjunto expressivo de artistas e intelectuais para compor o corpo docente da área de artes, comprometidos com a experimentação e com a vanguarda, entre eles a arquiteta italiana Lina Bo Bardi (1914-1992), a dançarina polonesa Yanka Rudzka (1916-2008), o compositor alemão Hans Joachim Koellreutter, o fotógrafo e antropólogo francês Pierre Verger (1902-1996) e, em 1957, Walter Smetak. Esse grupo colabora para a formação de jovens como Glauber Rocha (1939-1981), Caetano Veloso, Tom Zé (1936) e Gilberto Gil, integrantes de movimentos artísticos como o cinema novo e a tropicália.
Ministrando aulas de violoncelo nos seminários livres de música da UBA, num ambiente ainda pouco institucionalizado, Smetak encontra espaço para elaborar uma obra experimental, o que não consegue fazer no Rio de Janeiro e em São Paulo. Desenvolve ali sua inclinação para a restauração e a criação de instrumentos bem como as alia a suas pesquisas musicais.
Até sua estada no Rio de Janeiro, Smetak é um violoncelista e compositor tradicional, trabalhando como instrumentista de orquestra e compondo para formações comuns como violoncelo e piano e orquestra de cordas. Na década de 1950 frequenta a Sociedade Brasileira de Eubiose (anteriormente Sociedade Teosófica Brasileira), cuja filosofia procura religar integralmente as dimensões do sagrado, profano, divino e humano. O contato com a eubiose altera profundamente a obra artística do compositor, que passa a orientar sua produção musical no sentido de "religar" suas dimensões, além de ouvir o som, vê-lo, tocá-lo, senti-lo. Assim, procura desenvolver instrumentos que dêem conta desse objetivo. Como exemplo, o instrumento intitulado vina, que Smetak descreve no encarte de seu disco como "um templo em miniatura e expressa uma doutrina", somado a um executando que seja "uma pessoa de grande cultura, de saber universal e integral", uma espécie de sacerdote vestindo um manto branco que deve ficar de costas para a plateia, cumpre esse papel metafísico. A improvisação que realiza ao instrumento deve ser como uma revelação, que ele sente e traduz aos ouvintes. O instrumento é repleto de simbologias: entre elas, as três cabaças que formam seu corpo representam os deuses da mitologia hindu Shiva, Vishnu e Brahma. Os instrumentos de Smetak são chamados pelo curador da 1ª Bienal de Artes Plásticas, Juares Paraíso, de plásticas sonoras, termo que o compositor passa a utilizar.
É por meio dessa metafísica que Smetak procura então trabalhar com as frequências mínimas perceptíveis, gerando composições baseadas em microtons1 e na análise do som.
Em seu primeiro LP, Smetak, lançado pela Philips, pode-se ouvir uma composição feita para vina, cujo nome Mantram revela sua intenção esotérica, em que "volta-se o arcaico passado". E ainda o violão eólico na faixa de abertura, instrumento este que não é tocado da maneira tradicional, mas sim "naturalmente" pela ressonância do vento dentro de seu corpo. Esse disco, lançado por intervenção de Caetano Veloso na gravadora, rende alguma projeção ao compositor, que ganha antes mesmo do lançamento o Prêmio Personalidade Global para música da Rede Globo de Televisão e concede posteriormente uma entrevista à revista Veja. O disco, no entanto, tem um caráter documental, estando clara a intenção dos produtores em demonstrar os instrumentos de Smetak de maneira quase ilustrativa. Já em seu segundo LP, Interregno, produzido com patrocínio da Fundação Cultural do Estado da Bahia em parceria com o selo Marcus Pereira, podem-se ouvir com mais clareza as propostas radicais do compositor, ainda que apenas no plano isolado da audição. Nas faixas desse trabalho tem-se ideia do sentido de sua composição, largamente baseada em improvisações, intuição dos participantes, misticismo e simbologias.
Para a música de Smetak, a improvisação é transcendental, ritualística. Nela, "o tempo torna-se volúvel", e o "decompositor" - maneira como se refere a si mesmo - pode por ela atingir uma temporalidade circular, a-histórica, mitológica: a um só tempo moderna e arcaica. Seu trabalho de invenção de instrumentos influencia, entre outros, Hermeto Pascoal (1936), Tom Zé e o grupo mineiro Uakti.
Nota
1. Intervalo entre duas notas menor do que o praticado na música ocidental.
Obras 2
O bicho
Tímpanos grandes, potes d'água
Espetáculos 1
Exposições 8
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1/10/1977 - 30/11/1977
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30/1/1989 - 6/3/1989
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27/9/1990 - 18/10/1990
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10/7/2002 - 6/10/2002
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6/9/2007 - 28/10/2007
Links relacionados 2
Fontes de pesquisa 7
- MORAES, Renato de. O alquimista de sons. In: VEJA, 5 mar. 1975, pg. 3-5. páginas amarelas.
- SCARASSATI, Marco. Walter Smetak, o alquimista dos sons. São Paulo: Perspectiva: Edições SESC SP, 2008.
- SMETAK, Walter. A simbologia dos Instrumentos. Salvador: Ed. Omar G., 2001.
- SMETAK, Walter. CONJUNTO MICROTONS. Interregno. Salvador/Brasil: Discos Marcus Pereira 1002, 1979.
- SMETAK, Walter. Smetak. Philips, 6349-110, série de luxo, 1975. Material impresso com entrevista ao compositor pelo Serviço de Imprensa Phonogram, com produção de SMETAK, Walter, VELOSO, Caetano, e BERTHIER, Denis.
- TANTOS TALENTOS: Walter Smetak. Roteiro e Direção: DIAS, Luciana; Edição: SMETAK, Honorato; Realização: TV Salvador.
- WALTER SMETAK. Disponível em: http://www.waltersmetak.com.br/index.html. Acesso em: 5 set. 2007. Não catalogado
Como citar
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WALTER Smetak.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa9570/walter-smetak. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7