Robertinho do Acordeon
Texto
José Carlos Ferraresi (Lucélia, São Paulo, 1939 – São Paulo, São Paulo, 2006). Instrumentista, compositor, produtor musical. Recebe as primeiras noções musicais de seu tio, Osvaldo Ferraresi, e na escola de Armando Patti, em Valparaíso. Aos 11 anos, integra o trio Palmeirinha1, Lenço Verde e Zezinho. Em 1951, muda-se para São Paulo, onde se apresenta em programas de calouros de emissoras de rádio e estuda acordeom com Ângelo Reale (1903-1994). Em 1953, é convidado para substituir Alberto Calçada (1929-1983), o Albertinho, no trio com Sertãozinho e Nhá Neide, quando adota o pseudônimo Robertinho.
Com o fim do trio em 1955, ingressa no circo ao lado do humorista Nhô Belarmino (1920-1984). Entre 1957 e 1959, trabalha com o ator e cineasta Amácio Mazzaropi (1912-1981), atuando no filme Chofer de Praça (1958). Forma trio com Biá e Biazinho, usando o nome artístico Roberto Carlos – com o qual grava seu primeiro disco solo, em 1960 –, e depois com Cláudio de Barros e Nena Viana. Dirige a orquestra Tabajara Ritmos, em Lins (São Paulo). Participa do trio sertanejo Facínio, Lacerda e Roberto Carlos e atua como gerente da Rádio Piratininga de Lins.
Retorna a São Paulo em 1970. Trabalha como acordeonista, organista e secretário do cantor Waldick Soriano (1933-2008). Grava LP como solista de órgão, aproveitando playbacks das músicas de Waldick. Com a ida do cantor para o Rio de Janeiro, passa a acompanhar duplas em São Paulo. Forma um conjunto regional para o programa Canta Viola, da TV Record. Trabalha como organista na adega Lisboa Antiga, chegando a ser sócio e diretor artístico da casa. Atua em estúdios como multinstrumentista, além de fazer coral, arregimentação, ritmo e arranjo. Em 1973, inicia carreira de produtor na Chororó. Em 1981, trabalha como produtor do núcleo sertanejo da Polygram.
Participa como músico do filme Mágoa de Boiadeiro (1978), estrelado por Sergio Reis (1940). Faz as trilhas de Presídio de Mulheres Violentadas (1976), de Antonio Polo Galante (1934) e A Volta do Jeca (1984), de Pio Zamuner (1935-2012). Grava com duplas sertanejas, entre elas, Tonico e Tinoco (1943-1994), Leo Canhoto e Robertinho, Cascatinha e Inhana e Irmãs Galvão. Como produtor independente, lança dezenas de duplas e trios, além de cantores evangélicos. Permanece por quase 20 anos como músico do programa Viola, Minha Viola, apresentado por Inezita Barroso (1925-2015) na TV Cultura.
Crescido no interior de São Paulo, onde escuta música caipira pelo serviço de alto-falantes de sua cidade natal, Robertinho do Acordeon tem a infância marcada pelas duplas caipiras. Apesar de ter rudimentos de música, o principal aprendizado é de ouvido. Para ele, o que diferencia o “sanfoneiro” do “acordeonista”, é o nível de estudo, sendo o segundo mais especializado. Ele não entende isso como hierarquia, considerando raro um acordeonista ao mesmo tempo “bom de ouvido e de música (pauta)”2. Coloca-se no meio termo entre essas duas categorias, tendo como influências o sanfoneiro Rielinho (1917), o professor Ângelo Reale e acordeonista ítalo-americano Jô Basile.
Sua trajetória é representativa dos rumos tomados pela música sertaneja ao longo do século XX. No início, agentes da capital exploram o filão. Uma segunda geração, crescida no interior e adaptada aos discos de 78 rotações, é responsável por incorporar manifestações populares do interior e da periferia das cidades. Essa geração, na qual Robertinho inicia a carreira, promove o cruzamento de sonoridades ibero-indígenas, inserindo ritmos, como o recortado, a guarânia e a polca paraguaia. Nesse momento, a sanfona – trazida pelos imigrantes italianos no século XIX e popularizada por Luiz Gonzaga (1912-1989) nos anos 1940 – ganha destaque na música caipira.
Nos anos 1950, sob influência da música mexicana, que chega sobretudo com Miguel Aceves Mejía (1915-2006), os corridos e rancheiras também se alojam na música caipira. Em sua autobiografia, Robertinho afirma que a grande virada se dá com a gravação de “Boneca Cobiçada” por Palmeira e Biá, em 1956. A partir dela, instrumentos até então estranhos à música sertaneja começam a fazer parte dos arranjos, fundindo-se com outros gêneros, como tangos, boleros, baladas. Nos anos 1960, sob influência das bandas de rock, a música sertaneja incorpora instrumentos e temática do playboy, espécie de vaqueiro da cidade, e se aproxima da balada romântica da jovem guarda.
Ao longo da trajetória, Robertinho vivencia essas transformações, inclusive na nomenclatura – da música caipira à sertaneja. Embora a maior parte de sua carreira tenha sido desenvolvida nesses gêneros, ele também tem longa atuação na MPB. Como músico, trabalha com Moacyr Franco (1936), Beth Carvalho (1946), Belchior (1946-2017), Ângela Maria (1929). Como solista, não se restringe a um gênero. Explora as múltiplas possibilidades de seu instrumento, gravando rancheiras, polcas, choros, xotes, valsas, boleros. Em Calendário de Tangos (1975), revive clássicos do gênero portenho, como “Caminito”, “Mano a Mano” e “Adiós Muchachos”. Já em Rincón Guarany (1977) desenvolve um repertório de guarânias, rasqueados e outros gêneros da fronteira.
Apesar da obra registrada em discos autorais, muitas interpretações encontram-se em programas de televisão e atuações ao vivo, sobretudo ao lado de Inezita Barroso, com quem trabalha nos últimos anos de vida. Além disso, participa como instrumentista (acordeom, piano, órgão, vibrafone, marimba, gaita de boca, violão, contrabaixo, bateria) nos discos de outros artistas. Desempenha papel importante como produtor, numa época em que não se dá para a música sertaneja o mesmo tratamento dispensado à MPB, e que os arranjos, muitas vezes, são improvisados dentro do estúdio.
Notas
1. Palmeirinha depois troca de pseudônimo e forma a dupla Tião Carreiro e Pardinho.
2. FERRARESI, José Carlos [Robertinho do Acordeon]. Eu e a música sertaneja. São Paulo: Ed. Santo Agostinho, s/d. p. 46.
Obras 2
Fontes de pesquisa 5
- FERRARESI, José Carlos [Robertinho do Acordeon]. Eu e a música sertaneja. São Paulo: Ed. Santo Agostinho, s/d.
- NEPOMUCENO, Rosa. Música Caipira: da roça ao rodeio. São Paulo: Editora 34, 1999.
- ROBERTINHO do Acordeon. IMDb. Disponível em: http://www.imdb.com/name/nm1146585/bio?ref_=nm_ov_bio_sm. Acesso em: 27 ago. 2017.
- ROBERTINHO do Acordeon. Recanto Caipira. Disponível em: http://www.recantocaipira.com.br/duplas/robertinho_do_acordeon/robertinho_do_acordeon.html. Acesso em: 24 ago. 2017.
- VILELA, Ivan. Cantando a própria história: música caipira e enraizamento. São Paulo: Edusp, 2013.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
-
ROBERTINHO do Acordeon.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa638692/robertinho-do-acordeon. Acesso em: 05 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7