Anselmo Duarte
Texto
Anselmo Duarte Bento (Salto, São Paulo, 1920 – São Paulo, São Paulo, 2009). Diretor de cinema, ator, roteirista. Conciliando um estilo autoral de fazer cinema e uma sensibilidade para abordar temas populares, constrói uma filmografia com mais de 40 títulos e conquista um reconhecimento raro para o cinema brasileiro, o prêmio principal no Festival de Cannes, com O pagador de promessas (1962).
Duarte vive em sua cidade natal até os 14 anos, quando se muda para São Paulo e passa a trabalhar como datilógrafo. No início da década de 1940, após se formar em economia, vai para o Rio de Janeiro, onde participa como figurante do inacabado It's all true (1942), do cineasta Orson Welles (1915-1985), e de Inconfidência mineira (1948), de Carmem Santos (1904-1952). Em seguida, faz participações em radionovelas e trabalha como redator e repórter em uma revista.
Em 1947, faz sua estreia como ator principal em Querida Suzana, dirigido por Alberto Pieralisi (1911-2001). Nos anos seguintes, atua em filmes dos estúdios Atlântida e Vera Cruz, entre eles Terra violenta (1948), de Edmond Bernoudy (1901-1978) e Tico-tico no fubá (1952), de Adolfo Celi (1922-1986).
O porte físico, o modo de atuar e os papéis que assume fazem dele um dos atores preferidos do público brasileiro nas décadas de 1940 e 1950, tanto nas chanchadas, as comédias musicais que viraram marca registrada da Atlântida, quanto nas superproduções da Vera Cruz, que fazem dele o intérprete brasileiro mais bem pago do país na época.
Após a falência da Vera Cruz, em 1954, Duarte se associa a Watson Macedo (1918-1981) para produzir filmes populares. Pouco depois, inicia a carreira como diretor com o documentário Fazendo cinema (1958), sobre os bastidores de uma produção cinematográfica e dirige Absolutamente certo! (1957), uma comédia – também escrita, co-produzida e protagonizada por ele mesmo – sobre um homem que memoriza a lista telefônica e vai tentar a sorte em um programa de TV. Seu desempenho atrai a atenção de uma quadrilha, que tenta obrigá-lo a errar e perder o prêmio.
Incorporando a experiência das chanchadas, Duarte aprimora a construção dramática, dando maior fluência narrativa e equilibrando a relação entre a intriga e a inserção dos números musicais. O filme é bem recebido pelo público e pela crítica. O diretor vai estudar e aprimorar sua técnica na Europa.
De volta ao Brasil, decide se dedicar a um enredo competitivo para o Festival de Cannes. Após duas tentativas fracassadas, decide comprar e adaptar o texto da peça O pagador de promessas, de Dias Gomes (1922-1999), que conta a história de Zé do Burro e sua saga para pagar a promessa feita a Santa Bárbara em um terreiro de candomblé, a fim de salvar a vida de seu burro de estimação.
A trama evoca a questão religiosa a partir do embate entre personagens que representam a religião africana e a ortodoxia católica. Com narrativa clássica, aprimorada desde as experiências na Vera Cruz, o filme de 1962 ganha a Palma de Ouro, prêmio principal de Cannes, e é indicado ao Oscar de filme estrangeiro.
Segue-se um clima de expectativa sobre o possível impacto do sucesso de O pagador de promessas no cinema brasileiro. Segundo Paulo Emílio Salles Gomes (1916-1977), a repercussão positiva se deve à realização equilibrada, da qual emerge uma visão de certos componentes da vida brasileira acessível ao público cosmopolita de Cannes. Por outro lado, forma-se uma corrente que critica elementos de continuidade da tradição cinematográfica nacional, especialmente por parte de realizadores do cinema novo.
Motivado a rebater as críticas, Duarte realiza Vereda da salvação (1965), mas o filme não faz sucesso e o diretor se afasta da direção até 1969, quando retorna Quelé do Pajeú, uma história de costumes nordestinos e tragédias provocadas por vinganças pessoais. De 1973 a 1975, realiza comédias eróticas do gênero conhecido como pornochanchada. Em 1977, lança O crime do Zé Bigorna, comédia que retrata o povo brasileiro, sempre à mercê de políticos populistas. Seu último trabalho de direção é Os trombadinhas (1979), estrelado por Edson Arantes do Nascimento, o Pelé (1940-2022).
Anselmo Duarte é um cineasta que atua em várias frentes, com destaque para direção e interpretação. Durante quatro décadas, constrói uma filmografia consistente, com média de um título por ano. Seu estilo como diretor concilia uma forma pessoal de contar uma história, com qualidade técnica e artística, e a atenção a temas acessíveis ao grande público, elemento essencial para a repercussão alcançada por alguns de seus filmes.
Nota
1. GOMES, Paulo Emílio Salles. Do circo de Salto a Cannes. Visão, São Paulo, 13 abr. 1962.
Obras 6
Fontes de pesquisa 18
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- CINEMATECA BRASILEIRA. Arquivo pessoal de Anselmo Duarte.
- DUARTE, B.J. Revista Anhembi, n° 140, 1962. In: Estudos de Cinema, Editora Annablume, 1998.
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- GOMES, Paulo Emílio Salles. Crítica no Suplemento Literário do Estado de S. Paulo. Volumes I e II. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
- GOMES, Paulo Emílio Salles. Do circo de Salto a Cannes. Visão, São Paulo, 13 abr. 1962.
- GOMES, Paulo Emílio Salles. Uma glória que obriga a pensar. In: Visão, 22 jun. 1962, p. 20-23.
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- MERTEN, Luiz Carlos. Anselmo Duarte: o homem da palma de ouro. São Paulo: Imprensa Oficial, 2004. (Coleção Aplauso).
- NOVAES, Cláudio. Cinema sertanejo: o sertão no olho do dragão. Feira de Santana, 2007.
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- RAMOS, Fernão; MIRANDA, Luis Felipe. Enciclopédia de cinema brasileiro. São Paulo: Editora SENAC, 2ª Edição, 2004.
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- SADOUL, Georges. História do cinema mundial. Tradução de Sônia Salles Gomes. Volume 2. São Paulo: Martins, 1963.
- SINGH JR., Oséas. Adeus Cinema: Vida e Obra de Anselmo Duarte. São Paulo: Masao Ohno Editor, 1993.
- XAVIER, Ismail. Sertão mar: Glauber Rocha e a estética da fome. São Paulo: Editora Brasiliense. 1983.
Como citar
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ANSELMO Duarte.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa451695/anselmo-duarte. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7