Dulce Carneiro
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Dulce Granja Carneiro (Atibaia, São Paulo, 1929 – São Sebastião, São Paulo, 2018). Fotógrafa, poeta, jornalista. Com atuação em diversas áreas, dedica-se principalmente à fotografia, explorando diversos segmentos como retrato, arquitetura e industrial. Faz parte de uma das primeiras gerações de mulheres fotógrafas profissionais do Brasil.
Participa ativamente da vida cultural de sua cidade natal entre as décadas de 1940 e 1950. Com seu irmão, o romancista André Carneiro (1922-2014), funda o jornal literário Tentativa, em 1949, do qual participam nomes como Sérgio Milliet (1898-1966), Cassiano Ricardo (1894-1974), Murilo Mendes (1901-1975), Graciliano Ramos (1892-1953), Carlos Drummond de Andrade (1902-1987). Em meados da década de 1950, lança, pelo Clube da Poesia, seu primeiro livro, Além da Palavra (1953). No fim da década, mantém a coluna Uma Crônica por Mês no jornal O Estado de S. Paulo, em que escreve sobre literatura, poesia, artes, cinema e fotografia; e outra na revista feminina Lady, para a qual também fotografa, tornando-se uma das primeiras profissionais brasileiras a trabalhar com jornalismo especializado em moda.
É por meio da organização de uma mostra de cinema na década de 1960 que entra para o Foto Cine Clube Bandeirante (FCCB), na capital paulista, e começa a se interessar profissionalmente pela fotografia, pela qual se aventura como amadora desde a infância. Ao lado de fotógrafas como Alice Kanji (1918-1992) e a alemã Gertrude Altschul (1904-1962), faz parte do primeiro grupo de mulheres a frequentar o FCCB.
No Boletim Informativo do FCCB, assina a coluna Fotografia É Arte?, em que convida diversas pessoas para responderem à pergunta. Com essa iniciativa, pretende aproximar a fotografia das artes visuais, que aprecia e usa como referência para trazer um olhar mais artístico às suas fotos.
Suas primeiras atuações profissionais na fotografia são por meio de retratos, fotografando principalmente artistas, como Samson Flexor (1907-1971), Flávio de Carvalho (1899-1973) e Maria Leontina (1917-1984), e depois se dedicando também a retratos corporativos. Carneiro se destaca por ser uma fotógrafa extremamente técnica e precisa, sem deixar de lado a criatividade. Explora, em suas fotografias, luzes, sombras e grafismos interessantes, como é o caso de Mulher (1957), em que um jogo de linhas geométricas forma uma sombra sobre o rosto da modelo, trazendo para o retrato camadas de abstração geométrica. “É uma artista de rara sensibilidade, que emprega a máquina fotográfica como instrumento de trabalho ao invés do pincel ou do escopro”, escreve Sérgio Milliet1 sobre sua primeira exposição, intitulada Gatos e Gente, em cartaz na galeria Atrium em 1965.
Sua precisão técnica a leva a trabalhar com fotos de arquitetura e de indústria na década de 1970 – uma área até então dominada por homens. Carneiro é contratada para fotografar a maioria dos projetos residenciais do arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012). Em 1978, recebe o prêmio Communication Arts Magazine pelo ensaio fotográfico de um projeto do arquiteto mexicano Aurelio Martinez Flores (1929-2015) publicado na revista americana Architectural Digest no ano anterior. Um de seus trabalhos mais conhecidos na área é o registro da casa do artista Flávio de Carvalho para a revista Casa e Jardim.
Entre os anos 1970 e 1980, trabalha para agências de publicidade fotografando em indústrias e usinas siderúrgicas, hidrelétricas e nucleares, tornando-se uma das primeiras mulheres a fotografar o segmento. Carneiro considera esse ofício algo braçal, técnico e muito bruto, o que aproxima sua fotografia dos trabalhadores da indústria. Por isso, ao se apresentar para fotografar empreendimentos do tipo, diversas vezes causa certo estranhamento nos funcionários, que são desagradavelmente surpreendidos por uma mulher ser contratada para fotografar.
Carneiro, no entanto, posiciona-se radicalmente contra qualquer discurso feminista, recusando-se a participar de exposições de arte feminina ou nas quais são expostos apenas trabalhos feitos por mulheres, pois acredita que essa é uma forma de colocar “a mulher como um bicho exótico, ocasionalmente eficiente [...]2, e existem bons fotógrafos, indepentemente do sexo.
Em 1980, participa da primeira Trienal de Fotografia do Museu de Arte Moderna de São Paulo, com três séries: Afeto, Moda e A Demolição, A Destruição, A Construção, totalizando 34 fotografias, o que a torna uma das fotógrafas com o maior número de trabalhos na mostra.
Em 1990, desencantada com a fotografia, vende sua casa na capital paulista, sua câmera rolleiflex e muda-se para São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, mas antes destrói todo o seu arquivo de fotos e textos, a fim de apagar sua trajetória – o que abre uma lacuna irreparável na história da fotografia brasileira.
Dulce Carneiro transforma as imagens em sua forma de fazer poesia. Exímia retratista, explora sua habilidade técnica de maneira criativa, trazendo elementos interessantes para compor o quadro das pessoas que fotografa. O rigor e a excelência profissional a levam para a fotografia corporativa, tornando-se uma das primeiras mulheres a registrar ambientes industriais, como usinas nucleares.
Notas:
1. MILLIET, Sérgio. "De hoje, de Sempre - Fotografia". O Estado de S. Paulo, São Paulo, 14 mar. 1965.
2. A MULHER NA FOTOGRAFIA. São Paulo: Museu da Imagem e do Som de São Paulo, 1982. (52 min). Mesa Redonda.
Exposições 5
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22/9/1968 - 8/1/1967
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17/6/1980 - 11/7/1980
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27/6/2009 - 30/8/2009
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27/11/2016 - 20/3/2015
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8/5/2021 - 26/9/2021
Exposições virtuais 1
Fontes de pesquisa 4
- A MULHER NA FOTOGRAFIA. São Paulo: Museu da Imagem e do Som de São Paulo, 1982. (52 min). Mesa Redonda. Disponível em: http://acervo.mis-sp.org.br/audio/mulher-na-fotografia-parte-12. Acesso em: 1 nov. 2020.
- COSTA, Helouise. Presenças efêmeras: mulheres fotógrafas no Foto Cine Clube Bandeirante. São Paulo: Galeria Utópica, 2020. (46 min.) Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=O8sUFI2zJx8. Acesso em: 1 nov. 2020.
- FERNANDES JUNIOR, Rubens; MATAR, Denise. Três autores do sexo fraco: Quem foi Dulce Carneiro? São Paulo: Galeria Utópica, 2020. (1h15min). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=KfKnyAq08lA. Acesso em: 1 nov. 2020.
- MILLIET, Sérgio. "De hoje, de Sempre - Fotografia". O Estado de S. Paulo, São Paulo, 14 mar. 1965.
Como citar
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DULCE Carneiro.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa218617/dulce-carneiro. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7