Miguel Forte
Texto
Miguel Forte (São Paulo, São Paulo, 1915 - São Paulo, São Paulo, 2002). Arquiteto, designer, urbanista e professor. Ingressa, em 1934, no curso de engenharia civil da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Transfere-se no mesmo ano para o curso de engenharia e arquitetura, em que seus projetos são premiados e publicados na Revista de Engenharia do Mackenzie. Retorna à instituição em 1964 como professor de projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, e torna-se responsável pela disciplina em 1975. Entre 1938 e 1942, trabalha no escritório de Rino Levi (1901-1965) e Jaime Fonseca Rodrigues, e abre em seguida a firma Forte & Ciampaglia, com o colega de faculdade e cunhado, Galiano Ciampaglia. A empresa de projetos e construção dedica-se exclusivamente a programas residenciais, obras de maior porte são desenvolvidas com Jacob Ruchti (1917-1974), outro colega do Mackenzie. Em 1946, Forte, Ruchti e Ciampaglia vencem o concurso para a construção da nova sede do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), em São Paulo, dividindo a premiação com outras duas equipes, formadas por Levi e Roberto Cerqueira César (1917-2003); e Abelardo Reidy de Souza (1908-1981), Hélio Duarte (1906-1989) e Zenon Lotufo (1911).
Forte realiza viagem de seis meses pelos Estados Unidos, em 1947, acompanhado de Ruchti, e visita as obras de Walter Gropius (1883-1969), Mies van der Rohe (1886-1969), Richard Neutra (1892-1970); o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), do qual se torna sócio; o Instituto de Design de Chicago; e as escolas Taliesin East e West, dirigidas por Frank Lloyd Wright (1867-1959). O diário redigido durante a viagem é publicado em 2001. Segundo a historiadora da arquitetura Mônica Junqueira Camargo, o contato com o MoMA e o universo museológico norte-americano influenciam o arquiteto e Rutchi no projeto de instalações das exposições de fotografias de Thomaz Farkas (1924-2011) e da Secretaria de Agricultura, organizadas pelo Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp), além do projeto da exposição e do pavilhão da 1ª Bienal Internacional de São Paulo, 1951 (demolido), este realizado em parceria com Luis Saia (1911-1975).
Inspirados pela viagem, mas, sobretudo, pela exposição de design contemporâneo organizada por Philip Johnson (1906-2005) no MoMA, Forte e Ruchti abrem, em 1952, com os arquitetos Roberto Aflalo (1926-1992), Plínio Croce (1921-1984) e Carlos Millan (1927-1964), além do arquiteto e colaborador Chen Y Hwa, a loja de móveis e tecidos modernos Branco & Preto. Pouco tempo após sua inauguração, Ruchti, Hwa e Croce deixam a sociedade, que passa a pertencer a Millan, Forte e Aflalo, e esta empresa encerra suas atividades em 1970. Em 1965, Forte dissolve sua sociedade com Ciampaglia, e mantém-se ativo até 2002.
Análise
A marca mais evidente e constante na obra de Miguel Forte é sua filiação aos princípios da arquitetura orgânica de Frank Lloyd Wright. Interessado na obra do arquiteto desde os tempos de estudante, quando se opõe à orientação antimodernista do então diretor da Faculdade de Arquitetura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Christiano Stockler das Neves (1889-1982) , Forte confirma sua adesão aos princípios de Wright na viagem aos Estados Unidos, em 1947, onde, além de visitar suas obras, conhece suas escolas, a Taliesin East e Taliesin West. Ele testemunha a capacidade do arquiteto norte-americano de se utilizar dos materiais e das formas da natureza na constituição de edifícios perfeitamente integrados à paisagem, e se encanta com sua atenção ao conhecimento detalhado de todas as etapas do projeto e da obra, do estudo do funcionamento de cada ambiente à sua construção efetiva. É justamente essa capacidade de atenção a todo processo construtivo que Forte assimila à sua atuação como arquiteto, realizando projetos que buscam uma integração harmoniosa com a paisagem local e se configuram como uma obra de arte total, em que cada elemento, dos detalhes até os objetos, tem não só uma relação entre si como também um vínculo estreito com as funções que vai desempenhar.
O único projeto de destaque em que essa referência não está presente é o da nova sede do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), 1948-1950, em São Paulo. Por sugestão do então presidente do IAB, Eduardo Kneese de Mello (1906-1994), o projeto deveria ser desenvolvido pelas três equipes vencedoras formadas por Forte, Jacob Ruchti e Galiano Ciampaglia; Rino Levi e Roberto Cerqueira César; Abelardo Reidy de Souza, Hélio Duarte e Zenon Lotufo. Efetivamente o projeto é realizado pelas equipes de Forte e Levi, cujo trabalho e as propostas têm uma proximidade maior do que os apresentados pela equipe de Souza. De fato, analisando seus projetos, é possível perceber a assimilação na versão final - mais dinâmica e bem acabada - da marcação da linha horizontal e do desalinhamento da fachada do edifício no primeiro pavimento, propostas no concurso por Levi e Forte, respectivamente. É visível também a afirmação de soluções comuns às duas propostas iniciais, como a utilização da estrutura independente destacada nos primeiros pavimentos pelo recuo da fachada e o emprego de panos contínuos de vidro.
A despeito do interesse e da relevância desse projeto, bem como do edifício de apartamentos construído, em 1944, na avenida Rebouças, novamente com Galiano e Ruchti, é nos programas residenciais que a obra de Forte ganha corpo e sentido.
Na Residência Fileppo (1943), um de seus primeiros projetos à frente da Forte & Ciampaglia, 1942-1965, o arquiteto confirma a influência de Wright na atenção dada às necessidades do cliente, no cuidado com a implantação, na integração entre os espaços internos e externos, na horizontalidade da composição, nas aberturas de janelas corridas no alto das paredes no beiral, mas também adota algumas soluções que lhes são específicas, como a ênfase na modulação da estrutura e a disposição de escadas contínuas, sem patamares, em paredes e caixilhos. Segundo a historiadora da arquitetura Mônica Junqueira Camargo, essas soluções são recuperadas e aperfeiçoadas nas residências Miguel Forte (1948-1949), e Luiz Forte (1952-1955), sua obra mais conhecida, publicada, em 1956, no livro Modern Architecture in Brazil, de Henrique Mindlin (1911-1971). Em ambas, assim como na Residência Cacace (ca.1950), Forte reforça as linhas horizontais da construção, utiliza-se de materiais em seu estado natural, como a pedra, a madeira e o tijolo e, por meio de amplos caixilhos, integra os espaços internos da residência a amplos jardins, cujo desenho respeita as características do terreno e de seu entorno. A modulação da estrutura e o fechamento entre vãos com caixilhos, venezianas e painéis de madeira são, entretanto, mais marcantes nas residências Miguel e Luiz Forte do que na Cacace, conferindo àquelas obras maior singularidade.
Seus últimos projetos são realizados na praia do Pinto, em Ilhabela, São Paulo. Preocupado com o estado de devastação da praia, Forte desenvolve um projeto urbanístico que respeita a topografia e procura, com ajuda da paisagista Irene Ruchti, recuperar a flora local. As residências ali construídas, entretanto, apesar de seguirem os preceitos orgânicos descritos, são, em função da volumetria movimentada, da acentuada declividade dos telhados, do desenho das aberturas e do peso da estrutura, muito distintos do ponto de vista plástico daqueles realizados na década de 1950, pelos quais o arquiteto é notadamente reconhecido.
A atenção permanente ao desenho de cada ambiente e o impacto causado pela exposição de design de móveis contemporâneos no MoMA, em 1947, levam o arquiteto a realizar também projetos de móveis, alguns desenhados especificamente para uma residência, como o construído em alvenaria de tijolos de barro, madeira e estofado, que define a sala de estar e o bar da Residência Luiz Forte, outros, concebidos para serem produzidos em série pela loja Branco & Preto, (1952 - 1970), responsável pelo mobiliário e a arquitetura de interiores de dezenas de residências modernas em São Paulo nos anos 1950. Dos móveis ali realizados, destacam-se a poltrona e sofá MR7 e a poltrona MF5, realizadas com Jacob Ruchti e Carlos Millan, respectivamente. Enquanto os dois primeiros móveis são marcadamente estáticos, com desenho pesado reforçado pela opacidade do assento e do encosto, assim como pela seção quadrada da estrutura de madeira, a poltrona MF5 é um exemplo de dinamismo e leveza enfatizados pelo encosto de palha, o estofado listrado do assento e a seção curva variável da estrutura de madeira.
Fontes de pesquisa 6
- ACAYABA, Marlene Milan. Branco & Preto: uma história de design brasileiro nos anos 50. Sao Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi, 1994.
- CAMARGO, Mônica Junqueira. Arquiteto Miguel Forte 1915-2002. Vitruvius. São Paulo. Seção Arquitextos. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/03.030/732. Acesso em: 31 out. 2007.
- FORTE, Miguel. Diário de um jovem arquiteto: minha viagem aos Estados Unidos em 1947. São Paulo: Editora Mackenzie, 2001.
- GIMENES, Lourenço Urbano. Miguel Forte. Documento. AU, São Paulo, n. 99, pp. 85 - 91, dez./jan. 2002.
- MINDLIN, Henrique. Arquitetura moderna no Brasil. Rio de Janeiro: Aeroplano/IPHAN, 2000.
- SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil, 1900-1990. 2.ed. São Paulo: Edusp, 1999.
Como citar
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MIGUEL Forte.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa101799/miguel-forte. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7