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Cinema

Ed Mort

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 17.05.2024
1996
Ed Mort é o terceiro longa-metragem de Alain Fresnot (1951), cineasta francês radicado no Brasil. O personagem, criado pelo escritor Luis Fernando Verissimo (1936), é uma paródia brasileira dos detetives de histórias estadunidenses. O diretor utiliza como base a revista em quadrinhos Ed Mort Procurando o Silva, com texto de Verissimo e desenho d...

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Ed Mort é o terceiro longa-metragem de Alain Fresnot (1951), cineasta francês radicado no Brasil. O personagem, criado pelo escritor Luis Fernando Verissimo (1936), é uma paródia brasileira dos detetives de histórias estadunidenses. O diretor utiliza como base a revista em quadrinhos Ed Mort Procurando o Silva, com texto de Verissimo e desenho de Miguel Paiva (1950). O projeto do filme inicia-se em 1989, mas é finalizado apenas em 1996, por causa da crise que o cinema brasileiro atravessa durante o governo de Fernando Collor de Mello (1949). 

Ed Mort aposta em um gênero bem-sucedido – a comédia –, com atores conhecidos nos papéis principais: Paulo Betti (1952), Cláudia Abreu (1970), Otávio Augusto (1945) e Ary Fontoura (1933). O filme conta com participações especiais como Chico Buarque (1944), José Mojica Marins (1936) e Cauby Peixoto (1931-2016) – para o papel de Silva, personagem que assume diversas facetas, todas dubladas por José Rubens Chachá (1954).

Na história, o detetive falido Ed Mort é contratado por Dayse, para encontrar seu marido Silva, misterioso mestre dos disfarces. Ao mesmo tempo, investiga o sumiço de Durvalzinho, menor abandonado desaparecido depois de frequentar o programa televisivo infantil de Cibele, filha de Silva. Durante a investigação, Ed Mort descobre que Silva cria uma forma de fazer salsichas nutritivas e baratas para sua empresa, a Delbono. A companhia, chefiada por Nogueira, patrocina Cibele e controla o policial Mariano. Na trama, o protagonista é enganado por todos os personagens e termina sozinho e sem dinheiro, como no início do filme, enquanto os criminosos fogem livres do país.

Ed Mort alia a comédia de costumes à sátira social. Para isso, Fresnot constrói uma paródia de romances policiais dos estadunidenses Raymond Chandler (1888-1959) e Dashiell Hammet (1894-1961), inspirada nos filmes noir protagonizados pelo ator Humphrey Bogart (1899-1957). A caracterização da obra, entretanto, tende à chanchada: o modelo narrativo idealizado do cinema americano cede lugar a uma versão precária e subdesenvolvida, com personagens de moral duvidosa. O personagem Ed Mort, por exemplo, representa a imagem do brasileiro. O humor do filme, porém, não se restringe à paródia.

Os roteiristas Fresnot e José Rubens Chachá preservam as características do texto de Verissimo: o jogo de palavras – a começar pelo nome do personagem, trocadilho com a expressão “É de morte” – e a quebra de expectativa da narrativa. Na cena de discussão entre Nogueira e Mort, por exemplo, o empresário ordena a seus capangas que se livrem do detetive: “Rapazes, levem ele prum passeio”. Carregado pelos guarda-costas, Mort retruca: “Você está cometendo um grave erro, Nogueira!”. Essa fala prepara o desenvolvimento de uma cena típica nesse tipo de trama: o herói do filme descobre a vilania de seu opositor e promete vingança. Entretanto, a sequência da cena é inesperada. Mort esclarece o erro de Nogueira: “Não é ‘Levem ele’; é ‘Levem-no!’”. Nesse momento, a expectativa do clichê é interrompida com um comentário inusitado – o erro é gramatical (forma), sem relação lógica com a narrativa (conteúdo) – para a construção do humor.

A cena também explicita a crítica social de Fresnot. O empresário sequestra menores abandonados, engorda-os e transforma-os em salsichas. Para realizar essa operação, aproveita-se do programa de Cibele, que recruta crianças órfãs para compor o público figurante. Nogueira classifica sua ação como filantrópica, pois tira potenciais bandidos das ruas e protege a sociedade. Mas o empresário não atua sozinho: em conluio com ele, estão o chefe de polícia, cotado para ser Secretário da Segurança, que oculta os desaparecimentos, e a mídia de entretenimento infantil, justificando o patrocínio da Delbono. Fresnot satiriza o poder da televisão na produção de “enlatados”, ridicularizados no palco e na platéia1.

A maneira como o diretor apropria-se da paródia e da sátira provoca os comentários da crítica. Hugo Sukman (1970), do jornal O Globo, elogia Fresnot por ter como “único objetivo satirizar o brasileiro, esse malandro-otário”2. Marcelo Coelho (1959), da Folha de S. Paulo, questiona o objeto da sátira: “[Ed Mort] Goza dos brasileiros quando pretendem ser bogartianos; mas com isso faz mais um espetáculo de autopunição do que de paródia”3. No mesmo jornal, Inácio Araújo (1948) ressalta que o problema resvala em como o diretor filma. Segundo o crítico, Fresnot opta por planos fechados nos atores, o que imobiliza a cena e dá pouca margem a gags visuais eficientes. E arremata: “Se tivesse entregue a realização a um diretor com mais ‘feeling’ para a comédia, as coisas andariam melhor”4.

Notas

1. A canção Fique frente a TV, de Alain Fresnot, feita para o filme e cantada pela personagem Cibele, explicita essa sátira: “Fique frente a TV / Coma frente a TV / Estude frente a TV / Eu tô te vendo / Durma frente a TV / Dance frente a TV / Viva frente a TV / Eu tô te vendo / Ôooo, ôooo, ôooo / Não saia pra rua, é perigoso / Fique frente a TV e não mude de canal”.

2. SUKMAN, Hugo. Herói brasileiro, esse malandro-otário. O Globo, Rio de Janeiro, 23 maio 1997. Rio Show, p. 11.

3. COELHO, Marcelo. Ed Mort é um macunaíma sem esperteza. Folha de S.Paulo, São Paulo, 11 jun. 1997. Ilustrada, p. 9.

4. ARAÚJO, Inácio. Comédia atrai simpatia com estética de HQ. Folha de S.Paulo, São Paulo, 6 jun. 1997. Ilustrada, p. 13.

Fontes de pesquisa 22

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  • ARAÚJO, Inácio. Comédia atrai simpatia com estética de HQ. Folha de S.Paulo, São Paulo, 6 jun. 1997. Ilustrada, p. 13.
  • COELHO, Marcelo. Ed Mort é um macunaíma sem esperteza. Folha de S.Paulo, São Paulo, 11 jun. 1997. Ilustrada, p. 9.
  • COELHO, Marcelo. Filme de Alain Fresnot hesita entre o tom de paródia e o realismo. Folha de S.Paulo, São Paulo, 18 jun. 1997. Ilustrada, p. 7.
  • COUTO, José Geraldo. Filme tem trama rocambolesca. Folha de S.Paulo, São Paulo, 1 fev. 1997. Ilustrada, p. 1.
  • COUTO, José Geraldo. O detetive Ed Mort chega às telas procurando o Silva. Folha de S.Paulo, São Paulo, 1 fev. 1997. Ilustrada, p. 1.
  • COUTO, José Geraldo. Personagem mimetiza Gil, Chico e Zé do Caixão. Folha de S.Paulo, São Paulo, 1 fev. 1997. Ilustrada, p. 1.
  • DECIA, Patricia. Verissimo, enfim, no cinemão. Folha de S.Paulo, São Paulo, 6 jun. 1997. Ilustrada, p. 13.
  • FOLHA de S. Paulo. Betti se inspira em Columbo. Folha de S.Paulo, São Paulo, 20 dez. 1995. Ilustrada, p. 10.
  • FOLHA de S. Paulo. Cinemas boicotam estréia de “Ed Mort”. Folha de S.Paulo, São Paulo, 24 maio 1997. Ilustrada, p. 5.
  • FRESNOT, Alain. Alain Fresnot: um cineasta sem alma. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006.
  • FRESNOT, Alain. “Ed Mort” não é paródia e trata personagens com proximidade. Folha de S.Paulo, São Paulo, 18 jun. 1997. Ilustrada, p. 7.
  • GAMA, Júlio. Estréia de “Ed Mort” é adiada para junho. O Estado de S.Paulo, São Paulo, 23 maio 1997. Caderno 2, p. D4.
  • MAIA, Mônica. Ed Mort leva quadrinho nacional ao cinema. Folha de S.Paulo, São Paulo, 20 dez. 1995. Ilustrada, p. 10.
  • MERTEN, Luiz Carlos. Paulo Betti se transforma em Ed Mort no novo filme de Fresnot. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 22 nov. 1995. Caderno 2, p. D3.
  • NAGIB, Lúcia. O cinema da retomada: depoimentos de 90 cineastas dos anos 90. São Paulo: Editora 34, 2002.
  • ORICCHIO, Luiz Zanin. Detetive dos quadrinhos estréia nas telas. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 5 abr. 1996. Caderno 2, p. D4.
  • ORICCHIO, Luiz Zanin. Filme revela-se melhor nos detalhes que no conjunto. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 7 maio 1997., Caderno 2.
  • ORICCHIO, Luiz Zanin. Humor ferino marca “Ed Mort”. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 7 maio 1997. Caderno 2.
  • SQUEFF, Larissa. Alain Fresnot dá vida a Ed Mort. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 18 set. 1995. Caderno 2, p. D4.
  • SQUEFF, Larissa. Alain Fresnot dá vida a Ed Mort. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 18 set. 1995. Caderno 2, p. D4.
  • SUKMAN, Hugo. Herói brasileiro, esse malandro-otário. O Globo, Rio de Janeiro, 23 maio 1997. Rio Show, p. 11.
  • SUKMAN, Hugo. TV atrapalha lançamento de “Ed Mort”. O Globo, Rio de Janeiro, 22 maio 1997. Segundo Caderno, p. 2.

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