Ordenação

Tipo de Verbete

Filtros

Áreas de Expressão
Artes Visuais
Cinema
Dança
Literatura
Música
Teatro

Período

A Enciclopédia é o projeto mais antigo do Itaú Cultural. Ela nasce como um banco de dados sobre pintura brasileira, em 1987, e vem sendo construída por muitas mãos.

Se você deseja contribuir com sugestões ou tem dúvidas sobre a Enciclopédia, escreva para nós.

Caso tenha alguma dúvida, sugerimos que você dê uma olhada nas nossas Perguntas Frequentes, onde esclarecemos alguns questionamentos sobre nossa plataforma.

Enciclopédia Itaú Cultural
Literatura

Formação da Literatura Brasileira: Momentos Decisivos

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 26.04.2024
1959
Obra central no conjunto da produção de Antonio Candido (1918-2017), Formação da Literatura Brasileira: Momentos Decisivos foi sintetizada pelo próprio autor como a “história dos brasileiros no seu desejo de ter uma literatura”. Combinando reflexão histórica e estética, analisa o arcadismo e o romantismo brasileiros à luz do objetivo que os auto...

Texto

Abrir módulo

Obra central no conjunto da produção de Antonio Candido (1918-2017), Formação da Literatura Brasileira: Momentos Decisivos foi sintetizada pelo próprio autor como a “história dos brasileiros no seu desejo de ter uma literatura”. Combinando reflexão histórica e estética, analisa o arcadismo e o romantismo brasileiros à luz do objetivo que os autores dessas escolas literárias propuseram a si próprios: “dotar o país de uma literatura”, ou seja, criar uma literatura capaz de participar da constituição do Brasil. 

O ponto de partida é o reconhecimento da “unidade histórica” entre os dois períodos literários, apesar de suas características distintas. Se, em termos estilísticos, as obras românticas buscam o oposto do convencionalismo árcade, “a vocação histórica os aproxima”, argumenta o crítico, pois os movimentos literários, paralelos ao processo de independência do país, constituem “um largo movimento, depois do qual se pode falar em literatura plenamente constituída”. 

A partir desses dois “momentos decisivos”, o crítico constata que a literatura brasileira é marcada pelo “compromisso com a vida nacional no seu conjunto” e adota esse compromisso para a orientação histórica da obra. Em outras palavras: em vez de determinar um momento inaugural da literatura brasileira, propõe investigar quando se constitui a circulação de obras entre autor e público e a consciência que os escritores têm desse sistema e de sua inserção na tradição. 

Os capítulos ligam-se por meio da argumentação levantada. Para demonstrar “como certos elementos da formação nacional […] levam o escritor a escolher e tratar de maneira determinada alguns temas literários”, Candido desenvolve um texto com clareza e livre de teorias abstratas, cunhando os conceitos fundamentais ao andamento argumentativo. O primeiro deles é o de sistema literário – sem o qual não há, para o autor, a literatura de um país, e do qual depende a ideia de tradição.

Para haver sistema literário, é preciso haver leitores entre os quais circulem as obras produzidas pelos autores. Segundo a hipótese de Formação da Literatura Brasileira, isso acontece no Brasil a partir do século XVIII, principalmente com Cláudio Manuel da Costa (1729-1789), Frei Santa Rita Durão (1722-1784), Basílio da Gama (1741-1795) e Silva Alvarenga (1749-1814), que “tinham a noção mais ou menos definida de que ilustravam o país produzindo literatura”, ao mesmo tempo em que, transitando entre continentes, “levavam à Europa sua mensagem”. Já o cânone começa a se formar com os românticos, que elaboram uma teoria e uma história da literatura brasileira com base na “expressão literária do sentimento pátrio”.

Ainda que Candido afirme ter deliberadamente escolhido a vocação nacionalista como elemento de coerência para a reflexão crítica e a avaliação das obras, uma das principais críticas à Formação da Literatura Brasileira diz respeito ao suposto nacionalismo do autor. Segundo o argumento de Haroldo de Campos (1929-2003), em O Sequestro do Barroco na Formação da Literatura Brasileira: o Caso Gregório de Mattos (1989), o esquema estruturado por Candido, ao criar um “enredo metafísico” cujo ápice está no Romantismo, falha pela incapacidade de incorporar à literatura brasileira um autor tão fundamental, mas estranho ao critério nacional, como Gregório de Mattos (1636-1696)

Para a ensaísta Iná Camargo Costa, porém, não se trata de uma obra historiográfica em sentido estrito, mas de um projeto que procura mostrar o descompasso entre as expectativas dos autores em relação à literatura e as condições de cultura e leitura no país. Nesse sentido, tal seria a pergunta que constitui o ponto de partida do livro: “como explicar que, em país que não se formou, tenha-se formado uma literatura tão relevante que produziu até um escritor do nível de Machado de Assis?”, dado que esse romancista, embora não estudado no livro, é o horizonte crítico de Candido, pois expõe a tradição da qual conscientemente se vale para compor uma obra madura.

Essa tradição implica uma dialética entre localismo e cosmopolitismo, pois o desejo de constituir uma literatura nacional passa pela aclimatação de modelos literários europeus. Nesse sentido, o pensador Paulo Arantes (1942) argumenta que o livro ilumina não apenas a “lógica específica do sistema literário brasileiro”, mas também “a regra geral de certas linhas evolutivas de nossa sociedade” – investigadas a partir das relações entre nacional e estrangeiro em obras que também levam “formação” no título. Por isso, mais que a obra de história literária, o livro de Candido deve ser equiparado a ensaios de interpretação do Brasil, como Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), Formação do Brasil Contemporâneo (1942), de Caio Prado Jr. (1907-1990), e Formação Econômica do Brasil (1959), de Celso Furtado (1920-2004). 

Segundo o crítico literário Roberto Schwarz (1938), o processo formativo investigado no livro demonstra “as liberdades e vinculações complicadas da literatura, a qual pode atingir organicidade sem que ocorra o mesmo com a sociedade a que ela corresponde”. Para ele, assim se resume o impacto da publicação do livro em 1959: “A erudição segura, a atualização teórica, a pesquisa volumosa, a exposição equilibrada e elegante, o juízo de gosto bem argumentado, tudo isso estava numa escala inédita entre nós”.

Nesta obra o interesse recai sobre a tarefa de construção do sentimento de nacionalidade que os escritores árcades e românticos colocam para si. Nas  seguintes o autor concentra-se na interpretação literária a partir do conceito de redução estrutural – o modo como a “realidade social historicamente localizada” constitui a ordenação da estrutura da obra. Em Formação da Literatura Brasileira, o romance Memórias de Um Sargento de Milícias (1853), de Manuel Antônio de Almeida (1830-1861), é discutido como caso único na ficção romântica de “senso dos limites e possibilidades de sua arte”. Em O Discurso e a Cidade (1993), no ensaio "Dialética da Malandragem", Candido mostra como o trânsito das personagens dessa obra entre lícito e ilícito é correlato da dialética de ordem e desordem que regula a sociedade brasileira.

Ao legar para o estudo da produção literária brasileira ensaios celebrados, como “Álvares de Azevedo, ou Ariel e Caliban”, Formação da Literatura Brasileira é fruto do inovador método crítico de Antonio Candido, que compreende a literatura como “aspecto orgânico da civilização” e conduz as análises sem abandonar a apreciação estética.

Fontes de pesquisa 11

Abrir módulo
  • ARANTES, Paulo. Sentimento da dialética na experiência intelectual brasileira: dialética e dualidade segundo Antonio Candido e Roberto Schwarz. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
  • D'INCAO, Maria Angela; SCARABÔTOLO, Eloísa Faria (Orgs.) Dentro do texto, dentro da vida: ensaios sobre Antonio Candido. São Paulo: Editora Companhia das Letras: Instituto Moreira Salles, 1992. p. 33-36
  • DANTAS, Vinicius. Bibliografia de Antonio Candido. São Paulo: Duas Cidades: Editora 34, 2002.
  • JACKSON, Luiz Carlos. Antonio Candido: crítica e sociologia da literatura. In: BOTELHO, André; SCHWARCZ, Lilia Moritz (Orgs.). Um enigma chamado Brasil: 29 intérpretes e um país. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. p. 268-281
  • LAFER, Celso (Org.). Esboço de figura: homenagem a Antonio Candido. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1979.
  • LITERATURA e Sociedade. Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada da USP, n. 11, São Paulo, 2009.
  • PINTO, Manuel da Costa. A vida nova de Antonio Candido. Folha de S.Paulo, São Paulo, 12 dez. 2004. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1212200409.htm. Acesso em 20 maio 2015
  • PÉCORA, Alcir. Polêmica sobre o barroco ficou datada e vã. Folha de S.Paulo, São Paulo, 19 de março de 2011. Ilustrada. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1903201122.htm >. Acesso em 20 maio 2015
  • SCHWARZ, Roberto. Sequências brasileiras. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
  • WAIZBORT, Leopoldo. Esquema (parcial) de Antonio Candido. Novos Estudos Cebrap, São Paulo, n. 64, p. 177-188, nov. 2002.
  • WORLDCAT: O maio catálogo de bibliotecas do mundo: base de dados. Disponível em: https://www.worldcat.org/. Acesso em: 06 set. 2022.

Como citar

Abrir módulo

Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo: