Sheila Leirner
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Sheila Leirner (São Paulo, São Paulo, 1948). Crítica de arte, curadora, jornalista, cineasta e artista. Única curadora mulher responsável por duas edições consecutivas da Bienal de São Paulo, em paralelo à sua atuação como crítica de arte em jornais e revistas.
Diploma-se em sociologia da arte pela Sorbonne Université [Universidade Sorbonne] em 1968, tendo o historiador e crítico de arte francês Pierre Francastel (1900-1970) como um de seus professores, o que explica certo viés sociológico em seus projetos, como a busca de diagnóstico dos problemas artísticos-sociais de seu tempo. Em 1969, estuda direção de cinema na Université Vincennes Saint-Denis [Universidade de Vincennes, em Saint-Denis], onde realiza alguns curta-metragens sob a orientação do diretor e etnólogo francês Jean Rouch (1917-2004). Obtém diploma de urbanista pela École Pratique des Hautes Études [Escola Prática de Altos Estudos] em 1970.
Retorna ao Brasil no ano de 1973 e trabalha como produtora e assistente do diretor e roteirista Luiz Sergio Person (1936-1976). Inicia seus escritos de crítica de arte no jornal Última Hora, com supervisão do jornalista Samuel Wainer (1910-1980). Em 1975 é convidada para trabalhar como crítica de arte na seção Suplemento Cultural do jornal O Estado de São Paulo, função que exerce até 2019. Algumas vezes comenta seus projetos autorais, ao lado de artistas já consagrados ou em ascensão no cânone artístico, como Luiz Paulo Baravelli (1942) e Nelson Leirner (1932-2020).
Como artista, entre 1982 e 1983, produz a videoperformance Trilogia Amorosa, exposta no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP) em 1983 e integrada ao acervo em seguida. Neste trabalho, é mobilizado o vocabulário formal da performance e das investidas conceitualistas de torção do fenômeno artístico, a fim de apresentar seu projeto de ruptura das margens entre o universo da crítica de arte e da criação artística – em sua definição, uma metacrítica. Durante a mostra, profere uma palestra em que comenta desejar que a crítica de arte faça uso do mesmo aparato argumentativo que a arte, pois os projetos de mediação e de construção das ideias importam muito mais que o produto final. Crítico e artistas são, portanto, cúmplices da criação.
Tal perspectiva autoral vai ao encontro de dois projetos curatoriais mais significativos de Leirner, a 18ª (1985) e a 19ª (1987) Bienal de São Paulo. É a única curadora mulher a produzir duas edições seguidas da mostra, após sua extensa participação no Conselho de Arte e Cultura da Fundação Bienal de São Paulo.
Na mostra de 1985, popularmente conhecida como a Bienal da “Grande Tela”, Leirner realiza uma exposição de grande porte, ora seguindo o mote do então presidente da República José Sarney (1930), de uma exposição como uma “Grande Festa”, a primeira da Nova República, ora seguindo a interpretação conceitual do crítico italiano Germano Celant (1940-2020), da pintura como um grande rolo de pano estendido sobre o mundo.
Seu escopo curatorial enfatiza o expressionismo abstrato como força motriz, em concomitância com a apresentação de performances e peças de videoarte, com a proposta expográfica, desenvolvida com o arquiteto Haron Cohen (1936), de salientar a centralidade do retorno pictórico nas artes e as demais órbitas poéticas ligadas às práticas conceituais e experimentais, como as peças da artista russa Marina Abramovic (1946), do artista alemão Ulay (1936-2020) e do artista americano John Cage (1912-1992). Com três corredores de mais de cem metros de extensão instalados no segundo pavimento, local do setor contemporâneo da exposição, quadros e telas de diversos artistas, nacionais e estrangeiros, são dispostos com 30 centímetros de distância entre si, materializando a avalanche de imagens cotidianas que assolam o sujeito e que, ao final, fundem tudo em uma única paisagem, uma única grande tela saturada.
A recepção crítica da mostra oscila entre um caráter de exultação vanguardista, que aponta o gesto curatorial de Leirner como um assertivo local da Era dos Grandes Curadores, em uma tentativa de alocar a Bienal dentro do panorama internacional de exposições. O outro lado segue para críticas ligadas à planificação e homogeneização de trabalhos altamente díspares e complexos, que recaem em uma generalidade de temas com jugo autoritário. Esta crítica ressoa inúmeras vezes nos projetos de Leirner, muito devido à sua proposta de “Grande Obra Contemporânea Ocidental”. Nessa visão romântica, compreende que o gesto e a criação são instâncias coletivas que se estendem por todas as categorias simbólicas e epistemológicas. Portanto, não há limites para intervenção e coaptação de objetos, situações e sujeitos. O importante é a elaboração e possível materialização de uma ideia, um conceito.
Com essa proposta, as projeções curatoriais de Leirner se mostram sobre a égide da ambiguidade da profissão, pois o curador ora atua como um corretor cultural de legitimização e validação mercadológica e sistêmica, ora como facilitador de intenções e projetos.
A atuação de Sheila Leirner perpassa diferentes locais do mundo artístico e busca tensionar seus limites, característica que se manifesta em suas produções e marca seu lugar de importância.
Exposições 11
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4/10/1985 - 15/12/1985
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2/10/1987 - 13/12/1987
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17/3/1990 - 29/4/1990
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30/4/1990 - 31/5/1990
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5/7/1990 - 5/8/1990
Fontes de pesquisa 6
- BEUTTENMÜLLER, Alberto; SOUZA, Aldir Mendes de. Críticos x artistas. Apresentação Edla Van Steen. São Paulo: Galeria Arte Aplicada. 132 p., il. color. 709.8104 B569c
- HOLLANDA, Heloisa Buarque de; ARAÚJO, Lúcia Nascimento. Ensaistas brasileiras. Rio de Janeiro: Rocco, 1993. 322 p. R869.9 H7375e
- LAGNADO, Lisette. Por uma revisão dos estudos curatoriais. Revista Poiesis, Niterói, v. 16, n. 26, p. 81-97, 2015. Disponível em: http://www.poiesis.uff.br/p26/p26-3-dossie-8-lisette-lagnado.pdf. Acesso em: 21 maio 2020.
- LEIRNER, Sheila. Arte e seu tempo. São Paulo: Perspectiva; Secretaria de Estado da Cultura, 1991.
- REINALDIM, Ivair. Grande Tela: curadoria e discurso crítico da pintura na década de 1980. SEMINÁRIO DE PESQUISADORES DO PPGARTES – UERJ, 2, Rio de Janeiro, 9, 10 e 11 dez. 2008. Anais... Rio de Janeiro: UERJ, 2008. Disponível em: http://www.ppgartes.uerj.br/seminario/2sp_artigos/ivair_reinaldim.pdf. Acesso em: 21 maio 2020.
- SOUZA, Tálisson Melo de. Criticar/criar/curar arte: Sheila Leirner e sua “Grande Obra” na imprensa e em exposições. Teoria e cultura, UFJF, Juiz de Fora, v. 14, n. 1, p. 117-133, jun. 2019.
Como citar
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SHEILA Leirner.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa2010/sheila-leirner. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7