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Enciclopédia Itaú Cultural
Teatro

Mamulengo Só-Riso

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 15.07.2022
1975 Brasil / Pernambuco / Olinda
Fundado em 1975, em Olinda, Pernambuco, pelos atores Fernando Augusto (1947-2022), Nilson de Moura e Luiz Maurício Carvalheira (1945-2002), o Mamulengo Só-Riso direciona inicialmente seu trabalho para a criação de um teatro com mamulengos - o teatro de bonecos do Nordeste - e ganha notoriedade tanto pelas pesquisas e recriações desse "brinquedo"...

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Fundado em 1975, em Olinda, Pernambuco, pelos atores Fernando Augusto (1947-2022), Nilson de Moura e Luiz Maurício Carvalheira (1945-2002), o Mamulengo Só-Riso direciona inicialmente seu trabalho para a criação de um teatro com mamulengos - o teatro de bonecos do Nordeste - e ganha notoriedade tanto pelas pesquisas e recriações desse "brinquedo" em seus espetáculos quanto pelas publicações, cursos e ações culturais.

Tendo como ponto de partida o mamulengo, o grupo é fundado com o propósito de recriar "o universo mágico/mítico da cultura popular nordestina",1 captando o espírito da representação dramática e dando continuidade ao folguedo. O Mamulengo Só-Riso estreia em junho de 1975, em Juazeiro do Norte, Ceará, mas é em Olinda que fixa sua sede.

Os trabalhos que Fernando Augusto desenvolve no Teatro Popular do Nordeste (TPN) - companhia que integra como assistente de direção de Hermilo Borba Filho (1917-1976), no espetáculo Cabeleira aí Vem, de Sylvio Rabello, em 1970 - e no Teatroneco - grupo de teatro de bonecos ligado ao Centro de Comunicação Social do Nordeste (Cecosne), criado por Madre Armia Escobar - resultam no surgimento do Mamulengo Só-Riso. Como frequentador do TPN, em 1969, Fernando Augusto conhece o mamulengueiro Januário de Oliveira, Mestre Ginu, criador do boneco Tiridá, que modela e ensina a manipular bonecos para a montagem de Dom Quixote, de Antônio José da Silva, o Judeu. No Teatroneco, Fernando Augusto torna-se diretor e aprende as técnicas do teatro de bonecos de Jim Henson e seus muppets, além de conhecer seu espírito por meio dos ensinamentos de Madre Escobar, que tem a experiência de 25 anos com esse grupo nos Estados Unidos.

Após uma apresentação na reitoria da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em outubro de 1975, o grupo passa a receber apoio institucional - o que não significa patrocínio, mas apenas promoção - do Departamento de Extensão Cultural da UFPE e inicia uma série de apresentações em instituições culturais e educacionais. São montados, então, com recursos dos fundadores do grupo, dois espetáculos com títulos (os anteriores não têm nome): Festança no Reino da Mata Verde e Carnaval da Alegria, ambos de Fernando Augusto e Nilson de Moura.

Em janeiro de 1976, o Mamulengo Só-Riso participa do 5º Festival Nacional de Teatro de Bonecos, no Recife, e obtém boa aceitação de seus pares. Ainda nesse ano participa do 2º Festival Internacional de Teatro de Bonecos, em Belo Horizonte, e se apresenta em cidades mineiras como Ouro Preto, Sabará, São João Del Rei, e outras. No Diario de Pernambuco, Hermilo Borba Filho escreve: "Há muita coisa espantosa feita por bonecos na face da terra, desde que o homem apareceu, muita coisa feita em todas as partes do mundo. [...] O exemplo de Gaston Baty, na França, foi o mais comentado. [...] Enquanto Baty mergulhava, por sua cultura e princípios, num teatro que expressasse as dores e as alegrias dos personagens de autores famosos, o Teatro Só-Riso procura, nas raízes de sua região, um novo teatro que, não sendo de violinha [...], quero dizer, não sendo pitoresco simplesmente, possa nos conduzir, a todos, para os planos da arte e do humano. Que esta é a função dos artistas. No caso, a missão dos bonecos".2

O Mamulengo Só-Riso faz a primeira temporada aberta ao público, em março de 1977, com os espetáculos Festança no Reino da Mata Verde, para o público adulto, e Carnaval da Alegria, para o público infantil, no Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco (MAC/PE), em Olinda. Os dois espetáculos se notabilizam pela elaboração formal nunca antes vista na arte do mamulengo e pela eficaz comunicação com a plateia. O grupo cria uma linguagem erudita de inspiração popular. É mamulengo, porém com uma sofisticação formal (plástica, na feitura dos bonecos, e também de encenação e de manipulação) que o diferencia claramente dos brincantes populares. Com essas peças o grupo se consagra não apenas em Olinda e no Recife, mas também em outros estados brasileiros e no exterior.

No Rio de Janeiro, ainda em 1977, faz temporada no Teatro Sesc Tijuca, em que antes se apresenta o Grupo Giramundo, com El Retablo de Maese Pedro. Yan Michalski (1932-1990), no Jornal do Brasil, refere-se às diferenças entre os dois grupos e assinala as características que o Mamulengo Só-Riso preserva em sua trajetória: "Lá onde o grupo mineiro mostrava um requinte altamente estetizante, claramente importado de terras longínquas, os pernambucanos exaltam uma exuberante alegria e energia vital, velhas tradições do povo brasileiro, primitivas na sua orgânica ligação com a terra, os instintos e a natureza, mas paradoxalmente sofisticadas no seu humor verbal e visual e sobretudo na generosa fantasia do seu universo, liberto de quaisquer leis de plausibilidade realista. Festança no Reino da Mata Verde não é uma peça, no sentido convencional do termo: trata-se de uma solta sucessão de cenas, cada uma das quais apresenta um personagem tradicional do folclore nordestino, ou então um dos principais folguedos dramáticos desse mesmo folclore: pastoril, bumba meu boi, maracatu. O único elo de ligação é proporcionado pela presença do clássico apresentador e mestre de cerimônias, o professor Tiridá. No entanto, existe uma coerência profunda na sucessão desses episódios aparentemente avulsos e estanques: cada personagem e cada folguedo representam uma maneira de ser e se posicionar no mundo, e o conjunto dos 20 e tantos bonecos que desfilam pelo pequeno palquinho resulta profundamente representativo da alma coletiva do povo que criou as tradições das quais estes bonecos são uma cristalização - uma alma coletiva que enfrenta as durezas da sua existência com sucessivas explosões de irreverência e sistemáticas demonstrações de sabedoria".3

Em 1978, o Só-Riso integra o projeto Mambembão, do Serviço Nacional de Teatro (SNT), e se apresenta no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília. Participa do 13º Festival Internacional de Bonecos, em junho de 1980, patrocinado pela Union Internationale de la Marionnette (Unima), em Washington. Pela primeira vez o grupo, se apresenta no exterior, com o espetáculo Festança. Na ocasião, monta na sede da Organização dos Estados Americanos (OEA), com curadoria de Magda Modesto, a exposição Mamulengo - Histórias e Estórias, que apresenta mais de 200 bonecos, alguns deles do século XIX e outros do início do século XX, e divulga o mamulengo brasileiro como uma expressão de teatro de bonecos de tradição popular.

Voltando de Washington, o Só-Riso inaugura, no Rio de Janeiro, o Teatro Aurimar Rocha, dedicado ao teatro de bonecos, e viaja por oito capitais brasileiras, com patrocínio do SNT: Campo Grande, Cuiabá, Rio Branco, Manaus, Belém, São Luís, Fortaleza e Natal.

Um novo espetáculo estreia em 1988, gestado nos anos anteriores: Olinda Olanda Olindamente Linda, de Fernando Augusto e Nilson de Moura. A montagem, com grande estrutura cenográfica, utiliza-se de vários procedimentos técnicos e mais de cinco diferentes técnicas de construção e manipulação de bonecos, como, por exemplo, técnica da luva, técnica da vara, técnica balcão, manipulação direta, técnica de engenhocas e bonecos gigantes de técnica mista. O texto se torna pretexto para homenagear a cidade de Olinda, e ao mesmo tempo desenha um perfil do Brasil. Para Celso Marconi, do Jornal do Commercio, "Fernando Augusto e Nilsinho Moura conceberam um espetáculo que prima pela visualização, pelo brilho, pela grandeza plástica, pela magia da imagem".4

O Mamulengo Só-Riso se apresenta na França, em 1994, no 10º Festival Mondial des Théâtres des Marionnettes [Festival Mundial de Teatros de Bonecos], em Charleville-Mézières, e monta com patrocínio do governo francês a exposição Marionnettes en Territoire Brésilien [Fantoches em Território Brasileiro]. Participa também do 12º Festival de la Cultura Caribeña, em Santiago de Cuba, em 1996.

O grupo realiza um espetáculo com bonecos e atores: Folgazões & Foliões, Foliões & Folgazões, em 2000, com o qual participa do Festival de Inverno de Garanhuns, Pernambuco, do Festival de Teatro de Goiás e do Festival Internacional de Brasília. Em 2003, no projeto Janeiro de Grandes Espetáculos, no Recife, recebe os prêmios de melhor direção, espetáculo, figurino, maquiagem e trilha sonora, e representa o Brasil no Festival International de Montpellier, na França, com o espetáculo Extraits Poétiques [Extratos Poéticos], e faz temporada de um mês na cidade.

Além de ter criado o Museu do Mamulengo - Espaço Tiridá, o grupo tem a própria casa de espetáculos, o Teatro Mamulengo Só-Riso e a Fábrica de Alegorias Gigantes, todos em Olinda. Desde 2001, amplia seu raio de ação social por meio de uma ONG, o Centro de Produção Cultural Mamulengo Só-Riso, cujo objetivo é a promoção e preservação da arte do mamulengo e das manifestações de cultura popular nas suas interfaces com a inclusão social e a geração de renda.

Como atesta Hermilo Borba Filho, em 1976, o Mamulengo Só-Riso tem uma trajetória que "se reveste da melhor qualidade artístico-cultural, fundamentado que está em nossas melhores raízes populares, prestando, assim, serviço inestimável a toda uma comunidade, cujas dores e alegrias podem ser vistas através das peças habilmente encenadas".5

Notas
1. MAMULENGO SÓ-RISO. Festança no reino da mata verde / carnaval da alegria. Direção Fernando Augusto. Mamulengo Só-Riso: Fundamentação e proposição de trabalho. Recife: Universidade Federal de Pernambuco/Departamento de Extensão Cultural, 1976. Programa, p. 11.

 2. BORBA FILHO, Hermilo. Teatro Só-Riso. Diario de Pernambuco, Recife, 1 abr. 1976. [Acervo Cedoc Funarte].

3. MICHALSKI, Yan. Estudantes americanos e bonecos de Pernambuco. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 17 maio 1977. Caderno B, [s.p.]. [Acervo Cedoc Funarte].

4. MARCONI, Celso. Olinda Olanda é Só-Riso. Jornal do Commercio, Recife, 22 nov. 1988. Caderno C, p. 6.

5. BORBA FILHO, Hermilo. A quem interessar possa. Recife, 10 abr. 1976. [Acervo Cedoc Funarte].

Espetáculos 11

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Fontes de pesquisa 15

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  • ALVAREZ, Enéas. Magia e encantamento nos bonecos do Só-Riso. Jornal do Commercio, Recife, 22 nov. 1988. Caderno C, p.4.
  • BORBA FILHO, Hermilo. A quem interessar possa. Recife, 10 de abril de 1976. [Acervo Cedoc Funarte].
  • BORBA FILHO, Hermilo. Fisionomia e Espírito do Mamulengo (o teatro popular do Nordeste). São Paulo: Companhia Editora Nacional; Edusp, 1966. 295p.
  • BORBA FILHO, Hermilo. Teatro Só-Riso. Diario de Pernambuco, Recife, [s.p.] 1 abr. 1976. [Acervo Cedoc Funarte].
  • FERRAZ, Leidson (Org.). Memórias da Cena Pernambucana 04. Recife: L. Ferraz, 2009. [Mamulengo Só-Riso, p. 81-104].
  • MAMULENGO SÓ-RISO. Festança no Reino da Mata Verde/Carnaval da Alegria. Direção Fernando Augusto. Mamulengo Só-Riso: Fundamentação e proposição de trabalho. Recife: Universidade Federal de Pernambuco/ Departamento de Extensão Cultural, 1976, p. 11, programa.
  • MARCONI, Celso. Mamulengo Só-Riso estreia hoje no Museu de Olinda. Jornal do Commercio, Recife, 22 nov. 1988. Caderno C, p. 6.
  • MARCONI, Celso. Olinda Olanda é Só-Riso. Jornal do Commercio, Recife, 11 mar. 1977. Caderno C, [s.p.]. [Acervo Cedoc Funarte].
  • MICHALSKI, Yan. Estudantes americanos e bonecos de Pernambuco. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 17 maio 1977. Caderno B, [s.p.]. [Acervo Cedoc Funarte].
  • MOURA, Ivana. A arte do mamulengo como ato de paixão. Diario de Pernambuco, Recife, 16 fev. 1992. Viver, p. E-1.
  • PIMENTEL, Altimar de Alencar. O Mundo Mágico de João Redondo. 2ª ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: Ministério da Cultura/Fundação Nacional de Artes Cênicas, 1988. 333p.
  • RIVAS, Lêda. Mamulengo Só-Riso mostra nos EUA o que é que o nosso teatro tem. Diario de Pernambuco, Recife, 25 maio 1980. Viver, p. 1.
  • ROTEIRO EXCURSÃO - MAMULENGO SÓ-RISO. Serviço Nacional de Teatro, Rio de Janeiro, 1980. [Acervo Cedoc Funarte].
  • SANTOS, Fernando Augusto Gonçalves. Fisionomia e Espírito do Mamulengo: um povo em forma de bonecos. In: MACHADO, Lúcia (Org.) O Diálogo como Método: Cinco Reflexões Sobre Hermilo Borba Filho. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2006, p. 75-91.
  • SANTOS, Fernando Augusto Gonçalves. Mamulengo: um povo em forma de bonecos. Rio de Janeiro: Funarte, 1979. 204p.

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