Alex Vallauri
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Sem Título
Alex Vallauri
Grafitti sobre plástico
13,50 cm x 70,50 cm
Texto
Alex Vallauri (Asmara, Etiópia, 1949 – São Paulo, São Paulo, 1987). Grafiteiro, artista gráfico, gravador, pintor, desenhista, cenógrafo. Conhecido como o mestre do grafite no Brasil, Vallauri caracteriza-se como um artista revolucionário. Conectado com seu tempo, desenvolve seu trabalho incorporando o kitsch e a arte pop, fazendo dos muros cinzas de grandes cidades a sua principal tela, a partir de diferentes técnicas, entre elas, o estêncil1.
Chega ao Brasil em 1965, com 16 anos, estabelecendo-se com a família em Santos, no litoral de São Paulo. Nessa época, inicia-se em xilogravura e produz registros gráficos de alto contraste, cujos temas são personagens do porto, como estivadores e prostitutas. O artista logo se destaca: é premiado no Salão de Arte Jovem, de Santos, em 1968, e realiza sua primeira exposição individual, em 1970, na Associação Amigos do Museu de Arte Moderna de São Paulo (AAMAM/SP). No ano seguinte, já morando na capital paulista, forma-se em comunicação visual pela Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e, dois anos depois, torna-se professor de desenho de observação e livre expressão da mesma escola.
Na década de 1970, o artista desenvolve uma linguagem gráfica que evoca a pop art. Elabora xilogravuras de grandes dimensões que ganham o espaço público, como Boca com Alfinete (1973). Objetos e o corpo humano — ou fragmentos dele — são temas privilegiados dessas intervenções. Especializa-se em litografia no Litho Art Center de Estocolmo, Suécia, em 1975, e passa dois anos viajando por algumas cidades da Europa, onde tem contato com a arte que vinha sendo produzida nos grandes centros, como a pintura mural e as instalações urbanas. Em 1977, participa da 14ª Bienal Internacional de São Paulo com uma projeção de imagens de arte urbana colecionadas por ele, nomeada Ao Alcance de Todos, evidenciando o pensamento de Vallauri que fundamentaria sua obra.
De volta ao Brasil, e dando continuidade à exploração de uma iconografia que remete à cultura de massa dos anos 1950, a partir de 1978, inicia sua produção em grafite, sendo reconhecido como seu precursor no Brasil. Usando o estêncil, concebe personagens que remetem aos das histórias em quadrinhos — apropriando-se de algumas de suas figuras conhecidas, como o personagem Mandrake, de Lee Falk (ca. 1911-1999) — e, em especial, às pin-ups.
O primeiro grafite de Vallauri a estampar os muros de São Paulo é a sua famosa bota preta de salto alto. Desde então, seus desenhos passam a figurar em diferentes pontos da cidade, tornando-se ícones reconhecíveis por seus habitantes e visitantes. Seguindo a mesma estética da bota, surgem também as luvas, que apontam para uma direção aleatória, e os biquínis de bolinhas. Nas palavras do próprio artista, sua intenção é "enfeitar a cidade, transformar o urbano com uma arte viva, popular, de que as pessoas participem, acrescentando ou tirando detalhes da imagem”2.
Mais do que enfeitar a cidade, seus desenhos são atos de resistência de um artista que acredita no potencial comunicativo da arte e que, por isso mesmo, defende que ela deve estar em todo lugar para todos. De acordo com o curador de arte João Spinelli, nessa época, o grafite ainda tem um caráter subversivo, sendo “caso de polícia”. Os desenhos são feitos de madrugada e apagados na manhã seguinte, reaparecendo, pelas mãos insistentes de seu autor, dias depois,em outros lugares3.
A subversão de Vallauri está também no conteúdo que marca sua obra. Sem ser panfletário, ainda segundo Spinelli, o artista produz trabalhos com posicionamento político a partir de elementos lúdicos, pois, para ele, a crítica à ditadura militar, vigente no Brasil à época, tal como era feita por partidos políticos e ativistas, já não chegava ao povo. Boca com Alfinete (1973) é um exemplo desses trabalhos, assim como seus grafites com um telefone vermelho fora do gancho, em referência ao telefone vermelho de Moscou como uma “ameaça” comunista, e araras com balões dizendo “já, já, já”, em alusão ao movimento Diretas Já, pela volta da democracia.
Na década de 1980, sua arte passa a estampar outros lugares. Em 1982, Vallauri muda-se para Nova York, onde cursa artes gráficas no Pratt Institute até 1983. Nesse período, realiza uma série de grafites pela cidade, em pontos incomuns, como Soho, Greenwich Village e Broadway. Esses se diferenciam tanto na paisagem que se tornam referência da cidade, sendo posteriormente reproduzidos em cartões-postais.
Em 1985, apresenta, na 18ª Bienal Internacional de São Paulo, a instalação A Festa da Rainha do Frango Assado, uma reunião dos grafites com os quais vem trabalhando aliados a objetos, simulando uma casa repleta de ícones da sociedade de consumo. A ironia da obra reside na concepção de um espaço de frivolidades com base em uma cenografia precária, apontando para o caráter descartável da modernidade. Mais uma vez, Vallauri se destaca pelo caráter inovador do trabalho, tanto na temática abordada — uma mulher que sai de um picnic no Glicério, uma região marginalizada de São Paulo, para os grandes espaços de arte — quanto na técnica empregada — a instalação foi a grande novidade dessa bienal.
A contribuição de Alex Vallauri para as artes plásticas brasileiras e para o grafite, em especial, é, senão imensurável, bastante importante, sendo uma referência incontornável para a arte que se propõe a questionar padrões sociais e o próprio status da arte, de forma lúdica e acessível. O dia 27 de março foi instituído como Dia Nacional do Grafite, em homenagem ao artista.
Notas
1. Moldes de papelão com máscaras que recebem tinta em spray.
2. Alex Vallauri ao alcance de todos. Bienal, 17 abr. 2013. Disponível em: http://www.bienal.org.br/post/335. Acesso em: 3 jul. 2022.
3. João Spinelli em entrevista ao Curta Artes: Alex Vallauri (Parte 1). SescTV, 2014. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YxWWvzn1N14. Acesso em: 3 jul. 2022.
Obras 13
A Gata do Soutien de Bolinhas Correu ao Telefone
A Rainha do Frango Assado - Nova York (EUA)
Acrobats
Coluna
El Trio Los Panteras
Exposições 94
Fontes de pesquisa 28
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- Alex Vallauri ao alcance de todos. Bienal, 17 abr. 2013. Disponível em: http://www.bienal.org.br/post/335. Acesso em: 3 jul. 2022.
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- Curta Artes: Alex Vallauri (Parte 1). SescTV, 2014. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YxWWvzn1N14. Acesso em: 3 jul. 2022.
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ALEX Vallauri.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa9831/alex-vallauri. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
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