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Enciclopédia Itaú Cultural
Cinema

Sueli Maxakali

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 09.10.2024
1976 Brasil / Minas Gerais / Santa Helena de Minas
Sueli Maxakali (aldeia Água Boa, Santa Helena de Minas, Minas Gerais, 1976). Professora, cineasta, liderança indígena. Destaca-se pelo resgate da memória e pela reinvenção contemporânea dos saberes do seu povo maxakali, com ênfase nas práticas femininas. 

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Sueli Maxakali (aldeia Água Boa, Santa Helena de Minas, Minas Gerais, 1976). Professora, cineasta, liderança indígena. Destaca-se pelo resgate da memória e pela reinvenção contemporânea dos saberes do seu povo maxakali, com ênfase nas práticas femininas. 

Nasce na aldeia de Água Boa, onde vive até 2006. Em 1993 casa-se com o professor, artista e cineasta Isael Maxakali (1978), com quem compartilha a feitura de grande parte de seus trabalhos. Em 2007, muda-se para a Aldeia Verde, em Ladainha, na região de Teófilo Otoni, em Minas Gerais, onde leciona a língua e elementos da cultura Maxakali na escola local. Aprende com a mãe Noêmia a defender os direitos de seu povo nos conflitos por terra e torna-se uma liderança política ao traduzir para os não indígenas as demandas dos Maxakali.

Em 2009 participa do projeto Hitupmã’ax/Curar, promovido pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). No mesmo ano, publica o livro de fotografias Koxuk Xop Imagem. As imagens apresentam o cotidiano e rituais da Aldeia Verde, com foco nas atividades femininas. 

Participa da primeira oficina de audiovisual realizada na Aldeia Verde e, como resultado, estreia na realização cinematográfica com o filme Quando os yãmiy vêm dançar conosco (2011), codirigido pelo companheiro e pela antropóloga Renata Otto. O média-metragem apresenta um ritual para chegada dos yãmĩyxop (espíritos) ligados à caça. Mostram-se, especialmente, as atividades de preparação das mulheres e dos pajés para a recepção. O que pode ou não ser filmado é determinado pelo pajé. Segundo a diretora, é fundamental respeitá-lo porque “se vier um tempo em que não tem mais segredo, acaba nossa cura”1. A kuxex (casa tradicional de rituais), por exemplo, não pode ter seu interior filmado. Justifica-se, no filme, a oscilação entre planos sequência na relação direta com os cantos e danças e planos distanciados, de onde se vê a kuxex ao longe, enquanto uma voz narra o que lá acontece.

Gradua-se no curso de Formação Intercultural de Educadores Indígenas (FIEI) da UFMG. Em 2016, 2017 e 2019, atua como professora do Programa de Formação Transversal em Saberes Tradicionais da mesma universidade, compartilhando saberes Maxakalis, especialmente os transmitidos pelas mulheres, como a prática com miçangas e técnicas têxteis. 

Em 2020, o filme Yãmĩyhex: as mulheres-espírito (2019), codirigido por Isael Maxakali, é premiado na 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes. A naturalização da presença da câmera na comunidade permite a radicalização dos planos-sequências, que integram os rituais a partir da perspectiva do participante. Esse modo de filmar, permitido ela cumplicidade entre o campo [o que se filma] e o antecampo [a posição de quem filma], leva pesquisadores a caracterizarem a filmografia Maxakali como “filmes-rituais”2. Elaborado com a consciência de que é visto também por espectadores não indígenas, o filme, além da participação direta no acontecimento, apresenta o tema com didatismo estratégico para apresentação desse contexto para o exterior. Como assinala a crítica de cinema Ingá (1995), ao discorrer sobre a narração, presente em todo o filme, a voz atua como “guia, professora, ensaísta e testemunha do próprio ato de filmar”3.

Em 2021, a diretora lança o Nũhũ yãg mũ yõg hãm: essa terra é nossa, codirigido com Isael Maxakali, Carolina Canguçu e Roberto Romero, exibido no Sheffield Doc Fest-Reino Unido e no 66o Flaherty Seminar, nos Estados Unidos. O filme mostra o forte entrelaçamento entre espiritualidade e militância, notável em culturas indígenas. Filma-se uma caminhada dos indígenas revisitando o território Maxakali tal como era antes das invasões dos brancos e evocando os espíritos que o habitam. O mapa das antigas terras Maxakali é preservado pela memória oral e pelos cantos. O filme é um exemplo de como a cosmologia Maxakali, calcada no invisível, reelabora os modos de conceber o cinema, arte essencialmente calcada no registro do visível. 

Na 34ª Bienal de São Paulo, em 2021, apresenta a instalação Kumxop koxuk yõg (Os espíritos das minhas filhas), realizada em conjunto com um grupo feminino da comunidade Maxakali, responsável por cuidar dos espíritos evocados pelo trabalho. A criação é composta por máscaras, vestidos e objetos que integram o universo das yãmĩyhex (mulheres-espíritos). Segundo a curadora independente Nina Gaziri, esse processo compartilhado entre mulheres e a escolha por objetos da cultura local ecoam preceitos do ecofeminismo, apresentando “uma ética do cuidado que não opera um mandato universal”4, mas responde às especificidades do grupo em sua relação com o território.

Para além dos circuitos de cinema, a produção audiovisual Maxakali é endereçada também à educação e à militância, tendo em vista o desejo reiterado dos Maxakali de exibi-los em escolas de indígenas e não indígenas. A diretora colabora com a construção de espaços que possam abarcar esse cruzamento entre arte, pedagogia e política desejado pelo seu povo. Em 2021, ao lado de Isael Maxakali, lidera o processo de construção da Aldeia Nova, às margens do rio Mucuri, em Minas Gerais, envolvendo a mudança de mais de cem famílias. Nesse local, fundam a Escola-Floresta, dedicada a fomentar práticas transversais entre a preservação da memória e o ensino das culturas indígenas, a conservação ambiental e, de modo inovador, os fazeres de interesse estético em diálogo com a arte contemporânea. 

O entrecruzamento entre arte, pedagogia e militância presente nas ações de Sueli apresentam novas perspectivas éticas e estéticas para a arte e o cinema contemporâneo. O trânsito cultural promovido por suas práticas se torna essencial para a luta pela sobrevivência da cultura Maxakali. 

Notas

1. Entrevista concedida à antropóloga e pesquisadora Junia Torres (1968) para a revista Verberenas, v. 7, n. 8, 2021. Disponível em: https://www.verberenas.com/article/cada-uhex-mulher-menina-tem-a-yamiyhex-mulher-espirito-que-a-acompanha/. Acesso em: 4 jun 2022. 

2. O termo é utilizado por diversos críticos e pesquisadores. Um dos mais conhecidos é o pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais André Brasil (1969). Para mais informações, ver BRASIL, André; BELISÁRIO, Bernard. Desmanchar o cinema: variações do fora-de-campo em filmes indígenas. Revista de Sociologia e Antropologia, Rio de Janeiro,v. 6, n. 3, set. 2016.

3. “Esconde, esconde”. Revista Cinética, 8 fev. 2020. Disponível em: http://revistacinetica.com.br/nova/yamiyhex-tiradentes-inga/. Acesso em: 5 jun. 2022. 

4. “Por uma poética do cuidado”. Revista Select, v. 10, n. 52. Disponível em: https://www.select.art.br/por-uma-poetica-do-cuidado/. Acesso em: 20 jun. 2022.

Exposições 4

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