Angeli

Angeli, 2012
Texto
Arnaldo Angeli Filho (São Paulo, São Paulo, 1956). Cartunista, chargista. É considerado um dos grandes cartunistas brasileiros por revolucionar o modo de fazer charges e tirinhas no país. Destaca-se por seu traço original, que remonta à produção underground norte-americana, e por seus personagens pouco convencionais, que registram os novos comportamentos daqueles que vivem nas metrópoles em um país de recente urbanização.
Angeli desenha desde criança. Na adolescência, conhece o periódico O pasquim e se interessa pelos cartuns de Millôr Fernandes (1923-2012), Jaguar (1932) e Ziraldo (1932). Autodidata, aprende a desenhar copiando o trabalho desses desenhistas. Na mesma época, conhece quadrinistas que produzem cartuns underground, como o norte-americano Robert Crumb (1943) e os franceses Georges Wolinski (1934-2015) e Jean Marc Reiser (1941-1983), que o influenciam profundamente. Com 14 anos de idade, publica seu primeiro desenho, na revista Senhor. Em 1973, inaugura o espaço de charge política no jornal Folha de S.Paulo, em que permanece até 1982. Nesse intervalo, colabora também com os periódicos Movimento, Versus e O pasquim. Em 1975, fica em segundo lugar no 2º Salão Internacional de Humor de Piracicaba.
Em 1983, abandona a charge para se dedicar às histórias em quadrinhos. Ainda na Folha de S.Paulo, deixa o caderno de política e passa a produzir para o caderno de cultura “Ilustrada”, em que publica tiras diárias. Cria personagens icônicos, que conquistam um espaço perene na cultura pop brasileira. A partir de tipos controversos, Angeli retrata novos comportamentos observados na vida cotidiana nas metrópoles, fazendo uma crônica social. Um exemplo é a personagem Rê Bordosa, uma mulher na faixa dos 40 anos, com cabelo vermelho, alcoólatra, fumante e ninfomaníaca, cujo comportamento é malvisto socialmente. Ao criar essa personagem, Angeli demonstra seu olhar perspicaz da nova cultura urbana e quebra o paradigma de romantização da figura feminina.
Nessa produção, Angeli reencontra as influências do cartum underground das décadas de 1960 e 1970. Com uma abordagem ácida, outros personagens largamente conhecidos, como os velhos hippies Wood & Stock e o rockeiro punk Bob Cuspe, além da própria Rê Bordosa, trazem à tona temas censurados durante a ditadura militar, especialmente o lema da contracultura: sexo, drogas e rock’n’roll. Faz isso atualizando a universalidade da contracultura na boemia paulistana local. Nesse processo, seu traço se torna mais sujo, aproximando-o de quadrinistas como o francês Vuillemin (1958), mas com uma linguagem própria, original.
Pouco depois, junto com o editor Toninho Mendes (1954-2017), funda a Editora Circo, destinada a quadrinhos adultos, sobretudo de autores brasileiros. Em 1984, a Circo lança o livro Chiclete com banana, reunindo as tiras de Angeli com alguns personagens criados para o jornal e lançando outros novos, como Walter Ego, Rigapov, Rhalah Rikota, Bibelô, Meiaoito e Nanico, Ritchi Pareide, Aderbal e Os Skrotinhos. O sucesso da publicação leva a editora a criar uma revista bimestral homônima, cujo primeiro exemplar vai para as bancas em 1985. Segundo o próprio cartunista, a Chiclete com banana revitalizou a tira brasileira ao abordar assuntos marginalizados, o que tem um caráter mais político do que propriamente a abordagem da política em si. Com Laerte (1951) e Glauco (1957-2010), cria a série “Los três amigos” (1987), também publicada na Chiclete com banana, em comemoração aos dois anos da revista.
Na década de 1990, Angeli retorna à charge política na Folha de S.Paulo, produção em que também se destaca pela originalidade. O jornalista Matinas Suzuki (1954) explica essa singularidade: ao contrário do traço simples no vazio, que se faz habitualmente nas charges, Angeli constrói desenhos complexos, preenchendo todo o espaço com fundo, personagens e objetos. Essa complexidade, segundo Suzuki, faz com que as charges de Angeli permaneçam sendo objeto de interesse por sua qualidade estética, mesmo em contextos políticos diferentes daquele em que são produzidas. O próprio Angeli afirma que: “ficava preso a uma convenção”, mas que deu “certo molejo e, ao mesmo tempo, um pouco mais de porrada na charge. PORRADA GRÁFICA e no texto também.”1.
Além de publicar tiras e charges na imprensa, Angeli produz esquetes e roteiros para a TV, além de publicar livros reunindo seus trabalhos, como FHC: biografia não autorizada (1995) – coletânea de charges produzidas durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1931). O diretor Otto Guerra (1956) lança, em 2005, o longa-metragem de animação Wood & Stock: sexo, orégano e rock'n’roll. Em 2008, é lançado o curta-metragem de animação Dossiê Rê Bordosa, dirigido por Cesar Cabral e baseado na personagem criada por Angeli. Seus desenhos estão incluídos na Enciclopédia del humor latino americano, da Colômbia, na Antologia de humor brasileiro e no Museu do Cartum e Caricatura de Basiléia, Suíça. Por 16 anos consecutivos (de 1997 a 2012), é eleito o melhor chargista brasileiro no festival de quadrinhos HQ Mix, categoria modificada para “Melhor desenhista de humor gráfico”, a qual vence em 2013. Em 2014, é homenageado na categoria “Grande mestre”. Em 2005, recebe a Ordem do Mérito Cultural, sendo nomeado comendador da República pelo Ministério da Cultura brasileiro.
Angeli revoluciona o cartum brasileiro, influenciando novas gerações de quadrinistas e contribuindo para o registro social de uma época, com seus personagens inesquecíveis. Incontestavelmente, é aclamado como um dos grandes quadrinistas brasileiros.
Notas
1. CHARGES: Angeli (Ocupação Itaú Cultural). Itaú Cultural. São Paulo. Disponível em: https://www.itaucultural.org.br/ocupacao/angeli/charges/. Acesso em: 9 jul. 2022.
Obras 77
Espetáculos 1
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31/5/2008 - 31/8/2008
Exposições 13
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23/8/1975 - 31/8/1975
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19/11/1999 - 28/2/1998
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1/12/1999 - 5/12/1999
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8/11/2002 - 20/5/2001
Links relacionados 2
Fontes de pesquisa 5
- LAGO, Pedro Corrêa do. Caricaturistas brasileiros: 1836-1999. Rio de Janeiro: Sextante Artes, 1999.
- Revista Mil Perigos, nº 05. São Paulo: Editora Dealer, nov. 1991.
- Revista eletrônica Cybercomix, vol. 04. São Paulo, 1998. Disponível em [http://www.zaz.com.br/cybercomix/4/entrevistas/mes1/index.htm].
- SILVA, Nadilson Manoel da. Comercialização, cultura jovem e cotidiano nos quadrinhos brasileiros para adultos. in Revista Agaque, vol. 2, nº 01. São Paulo: ECA/USP. jul. 1999. Disponível em: [http://www.eca.usp.br/agaque/agaque/ano2/numero1/artigosn1_1v2.htm].
- TRAÇO, Humor & Cia. Curadoria Denise Mattar; versão em inglês Angela Melim. São Paulo: FAAP, 2003.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
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ANGELI.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa6199/angeli. Acesso em: 03 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7