José Bina Fonyat Filho
Texto
José Bina Fonyat Filho (Salvador, Bahia, 1918 – Idem, 1977). Arquiteto. Filho de engenheiro civil, Bina Fonyat reside em Salvador até os 8 anos de idade, quando sua família muda-se para o Rio de Janeiro. Começa a trabalhar como desenhista em uma construtora carioca aos 13 anos. Tempos depois, em sociedade com Murillo Vaz, abre seu próprio escritório de desenvolvimento e detalhamento de projetos, dando apoio a arquitetos como Oscar Niemeyer (1907-2012), Affonso Eduardo Reidy (1909-1964), Jorge Machado Moreira (1904-1992), Álvaro Vital Brazil (1909-1997) e Sérgio Bernardes (1919-2002).
Depois da experiência de desenhista, aos 27 anos, Bina Fonyat ingressa na Faculdade Nacional de Arquitetura da Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro (FNA/RJ). Faz a graduação entre 1945 e 1949 e participa da política universitária, ocupando o cargo de presidente do Diretório Acadêmico da FNA. Pouco depois de receber o diploma, no final de 1950, é convidado a ser assistente do arquiteto e professor Lucas Mayerhofer na FNA.
A convite do arquiteto baiano Diógenes Rebouças (1914-1994) em 1951, Bina Fonyat torna-se professor do curso de arquitetura da Escola de Belas Artes (EBA) da Universidade da Bahia, Salvador, ministrando as disciplinas de teoria e filosofia da arquitetura e composição da arquitetura. No período em que divide sua atividade entre o Rio de Janeiro – onde mantém seu escritório – e a capital baiana, projetos de Bina Fonyat têm repercussão em publicações nacionais e internacionais, como a Casa de Campo de João Antero de Carvalho (1954), em Petrópolis, e o Conjunto Administrativo da Refinaria de Manguinhos (1954). Associado ao escritório de arquitetura de Diógenes Rebouças (1914-1994), Bina Fonyat faz projetos em Salvador, como o edifício do Banco Habitacional Lar Brasileiro, o Larbrás (1955). Participa no Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), tendo o cargo de secretário do conselho diretor entre 1956 e 1957, e funda o departamento baiano do IAB que tem Rebouças como seu primeiro presidente. Esta parceria termina no Teatro Castro Alves (TCA), Salvador, em 1967, que recebe duras críticas de Rebouças, o que leva Bina Fonyat a sair da Universidade da Bahia para se dedicar a seu escritório no Rio de Janeiro. O projeto do TCA destaca-se na época com menção honrosa na 1ª Bienal de Artes Plásticas de Teatro (1957), em São Paulo, e integra a exposição da 4ª Bienal Internacional de São Paulo (1957).
Entre 1959 e 1960, projeta o posto de serviços da Petrobras, em Brasília, em harmonia com os edifícios de Oscar Niemeyer para a nova capital federal. Apesar de não lecionar mais em Salvador, prossegue com projetos na Bahia, como a Agência Central do Banco do Brasil (1962-1968) e o prédio administrativo da fábrica da Coca-Cola (1967).
Análise
A arquitetura de José Bina Fonyat concilia funcionalidade e beleza. Seja na forma geral do Teatro Castro Alves – um prisma com laterais de matriz triangular e uma longa aresta em balanço –, ou nas lajes de cobertura em forma de losango do posto de serviços da Petrobras, Brasília, e do prédio administrativo da fábrica da Coca-Cola, Salvador.
No artigo “Veneziana e Vidro – a ocorrência”, publicado na revista Acrópole, em 1959, Bina Fonyat explicita como essas características de sua arquitetura – e, ao seu ver, de toda sua geração de arquitetos brasileiros – são oriundas do pensamento e da obra do arquiteto Lucio Costa (1902-1998), mestre “que, desde a primeira hora, legitimou a intenção plástica na concepção de obra arquitetônica, e mesmo autorizou a procura deliberada e constante da forma, aliada às conveniências funcionais.” 1 Assim demonstra sua filiação à Escola Carioca de arquitetura, justificável pelos detalhamentos de projetos feitos para alguns dos principais arquitetos do Rio de Janeiro antes de sua graduação na FNA. Seu papel na disseminação dos fundamentos da arquitetura moderna por outros estados brasileiros, com as especificidades da vertente carioca, é análogo ao do arquiteto Luiz Nunes (1909-1937) para Pernambuco, na década de 1930, ou do arquiteto Severiano Mario Porto (1930) para o Amazonas.
O primeiro projeto de repercussão de José Bina Fonyat é a Casa de Campo de João Antero de Carvalho (1954), em coautoria com o arquiteto Tércio Fontana Pacheco, no município fluminense de Petrópolis. Em consonância à arquitetura modernista da época, a residência divide-se em dois blocos: frontal e posterior. No frontal, estão a sala de estar e os quartos, já na parte posterior estão a cozinha, serviços e uma sala de jogos, ligados por uma passarela. Segundo o crítico Lauro Cavalcanti (1954), o arquiteto “apropria-se da ideia de volumes trapezoidais e coberturas ‘borboletas’, dando autonomia visual e espacial a cada um dos prismas.” 2 Concomitantemente, Bina Fonyat projeta o Conjunto Administrativo da Refinaria de Manguinhos (1955), Rio de Janeiro, com os arquitetos Firmino Fernandes Saldanha (1906-1985) e Humberto de Barros Kaulino (1904?-1986?). Neste edifício, as coberturas variam entre uma sequência de abóbodas de berço e uma laje inclinada em composição com uma linha de pilares também na diagonal. É uma edificação que guarda semelhanças com projetos contemporâneos de Oscar Niemeyer, como os prédios do Instituto de Tecnologia Aeronáutica (ITA), São José dos Campos.
Em meados da década de 1950, Bina Fonyat faz diversos projetos em Salvador em parceria com o arquiteto Diógenes Rebouças, entre os quais estão o edifício habitacional Barão de Itapuã (1953), a sede Banco Habitacional Lar Brasileiro (1955), o Conjunto Residencial Almirante Waldemar Motta (1957).
Inicia-se em 1957 o principal projeto da trajetória de José Bina Fonyat Filho: o Teatro Castro Alves (TCA), elaborado com o engenheiro Humberto Lemos Lopes (1921-2008), além da colaboração do arquiteto Ubirajara Motta Lima Ribeiro (1930-2002), do arquiteto João Carlos Bross (1934) e do cenógrafo e figurinista italiano Aldo Calvo (1906-1991). O arquiteto reaproveita as fundações executadas para o abandonado projeto anterior 3 e constrói um edifício com dois volumes independentes, mas integrados: frontal e posterior. No frontal, mais baixo e horizontal, há o foyer, o bar, a sala de eventos e terraço-jardim voltado para a praça do Campo Grande. Atrás, o volume maior é um monumental prisma triangular cujo formato comporta uma plateia de mais de 1500 lugares e o palco. O historiador francês Yves Bruand define o projeto do TCA como uma derivação do projeto não executado do Auditório do Ibirapuera (1952) 4, de Oscar Niemeyer, quando analisa que o bloco destinado à plateia “traduzia no exterior a inclinação necessária para a boa disposição do público em toda a sala de espetáculos, acentuando a diferença de espaço necessária, de uma extremidade à outra; mas a forma era, antes de mais nada, plástica tanto em Bina Fonyat, quanto em Niemeyer; [...] a massa foi trabalhada como uma verdadeira escultura.” 5 O que distingue os projetos é o fato que, no Ibirapuera, Niemeyer deseja apoiar o prisma somente na linha da aresta, enquanto o volume de Bina Fonyat integra-se à topografia, quando chega ao solo, resolvendo funcionalmente a disposição dos camarins e espaços de apoio. Tal fato demostra que a forma, em Bina Fonyat, não prevalece como aspecto preponderante acima de questões utilitárias.
Projetado durante a construção de Brasília, o posto de serviços da Petrobras é composto por três edificações – motel, restaurante e posto de lubrificação – entremeadas por jardins, estacionamentos e bombas de gasolina. Cobertura e caixa d’água fundem-se em um único elemento radial, de pouca espessura, e apoiado em um pilar central. Esta solução provê uma estética singular a um equipamento utilitário com formato cúbico ou cilíndrico. A ideia sui generis de incorporar a caixa d’água no interior do teto desdobra-se nos outros dois edifícios do conjunto, nos quais as lajes têm seções no formato de uma sucessão de losangos ocos para armazenar o líquido. Reproduzida no prédio administrativo da fábrica da Coca-Cola, em Salvador, este tipo de cobertura inventado por Bina Fonyat responde de modo racional a duas demandas e estabelece uma identidade plástica. É um caso exemplar de como José Bina Fonyat Filho concretiza o projeto arquitetônico ao longo de sua trajetória.
Notas
1. FONYAT FILHO, José Bina. Veneziana e vidro – a ocorrência. Acrópole, São Paulo, n. 251, p. 384, set. 1959.
2. CAVALCANTI, Lauro. Quando o Brasil era moderno: guia de arquitetura 1928-1960. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2001. p.163.
3. O teatro é originalmente concebido em 1947 por Anísio Teixeira (1900-1971), então Secretário de Educação e Saúde do Estado da Bahia. Por indicação de Lucio Costa, o projeto arquitetônico cabe a Alcides da Rocha Miranda (1909-2001) e José de Souza Reis (1909-1986), porém sua execução é paralisada em 1951. Em 1956, o governador do estado incumbe o engenheiro Norberto Odebrecht (1920-2014) para a retomada da construção, que rejeita o projeto original e chama Bina Bonyat. Tal fato gera intriga pública no meio arquitetônico baiano, visto que Diógenes Rebouças acusa José Bina Fonyat de plágio em uma campanha veiculada pelo IAB-BA e pela imprensa local. In.: ANDRADE JUNIOR, Nivaldo Vieira de; ANDRADE, Maria Rosa de Carvalho; FREIRE, Raquel Neimann da Cunha. Avant-garde na Bahia: urbanismo, arquitetura e artes plásticas em Salvador nas décadas de 1940 a 1960. Rio de Janeiro, 8º Seminário DOCOMOMO Brasil, 2009. ANDRADE JUNIOR, Nivaldo Vieira de. Vida e obra do arquiteto baiano Bina Fonyat. AU: arquitetura e urbanismo, São Paulo, n.228, mar. 2013.
4. O anteprojeto de 1952 de Oscar Niemeyer para os edifícios, por ocasião da Exposição do IV Centenário da cidade de São Paulo, no Parque Ibirapuera, continha uma proposta de auditório não construída. A forma da sala de espetáculos é de matriz trapezoidal, com uma seção triangular, tendo uma aresta encostada ao solo e todas as outras em suspenso. Portanto, é um prisma semelhante, porém invertido, ao projeto executado para o local entre 2003 e 2004, com um novo desenho de Oscar Niemeyer.
5. BRUAND, Yves. Arquitetura contemporânea no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1981. p.218.
Exposições 3
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6/2016 - 10/2016
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26/8/2022 - 30/10/2022
Fontes de pesquisa 23
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JOSÉ Bina Fonyat Filho.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
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