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Enciclopédia Itaú Cultural
Cinema

Geraldo Sarno

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 11.11.2022
06.03.1938 Brasil / Bahia / Poções
22.02.2022 Brasil / Rio de Janeiro / Rio de Janeiro
Fidélis Geraldo Sarno (Poções, Bahia, 1938 - Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2022). Diretor de cinema, roteirista, produtor. Nome atuante de uma geração que desde os anos 1960 busca registrar, compreender e problematizar a complexidade de um Brasil desigual. Nessa configuração, seus documentários e ficções têm viés político e forte componente so...

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Fidélis Geraldo Sarno (Poções, Bahia, 1938 - Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2022). Diretor de cinema, roteirista, produtor. Nome atuante de uma geração que desde os anos 1960 busca registrar, compreender e problematizar a complexidade de um Brasil desigual. Nessa configuração, seus documentários e ficções têm viés político e forte componente social.

Na infância, frequenta a sala de cinema local e coleciona fotogramas. Ingressa, em 1955, no curso de Direito na Universidade Federal da Bahia, em Salvador. Torna-se ativo na política estudantil e participa da criação do Departamento de Cinema do Centro Popular de Cultura (CPC). Em 1962, viaja a Cuba para estudar cinema. Dois anos depois, segue para São Paulo onde integra grupo de curta-metragistas capitaneado por Thomaz Farkas (1924-2011), iniciativa mais tarde denominada Caravana Farkas1.  

Na primeira produção conjunta, Sarno estreia com o média documental em 16mm Viramundo (1965). O filme introduz conceitos de seu cinema, como o domínio da produção já a partir do argumento e a temática nordestina, em especial a migração. Nele, a chegada de trabalhadores do Nordeste a São Paulo e a busca por trabalho é registrada por depoimentos dos migrantes, referências à religião e à atitude solidária. O diretor adota os preceitos do chamado cinema-verdade2, entre eles o uso do som direto e de câmeras portáteis. Viramundo é recebido como um marco, retrato crítico das relações dos migrantes com a capital da indústria e sua riqueza. Em 1968, o filme é ampliado para 35 mm e integra o longa coletivo Brasil Verdade.    

Em 1966, realiza Auto de Vitória, curta que confirma a vocação documental e sociológica de sua carreira. A realização se dá junto ao Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB/USP). Em duas partes, registra-se o traslado dos restos mortais do padre José de Anchieta (1534-1597) à basílica de Aparecida e a encenação por atores de teatro da peça do religioso que nomeia o filme. Nesse contexto universitário, o diretor faz viagens ao sertão nordestino em 1967 e 1969. Delas resultam oito curtas em 16 mm e 35 mm, com temas como a literatura de cordel, o ofício dos artesãos, a religiosidade e a questão agrária. Viva Cariri (1970), título determinante dessa fase, é rodado em Juazeiro do Norte e articula a figura do Padre Cícero ao cenário de pujança econômica da região. Um narrador contextualiza as situações mostradas e serve como voz crítica ao desenvolvimentismo do governo militar, em expediente comum a todas as produções do projeto.

Dedica-se a uma sequência de curtas e médias-metragens de cunho educativo para televisão e instituições oficiais. Tais experiências o conduzem ao primeiro filme ficcional e em longa-metragem, O Picapau Amarelo (1973). A adaptação do clássico de Monteiro Lobato (1882-1948) se centra em personagens de fábulas infantis que saem dos livros para ganhar vida. Em seu segundo longa ficcional, Coronel Delmiro Gouveia (1977), renova as preocupações sociais em chave política. O drama revisita o conflito do empreendedor e comerciante de origem cearense Delmiro Augusto da Cruz Gouveia (1863-1917) quando, em Alagoas, funda fábrica de linhas de costura e rivaliza com líder internacional do setor. O sucesso da empreitada incomoda a concorrência e os coronéis da região, situação que teria levado ao assassinato de Gouveia. Para analistas, o filme traz discussão fundamental sobre o papel da elite econômica brasileira na história do país e a aproximação necessária entre burguesia e operariado para combater pressões de fora.

O interesse pelas religiões retorna com o média-metragem A Terra Queima (1984) e o longa Deus É um Fogo (1987), inspirados pela tendência católica da Teologia da Libertação3 . Em 2008, o diretor experimenta sobre o próprio ato de filmar no metalinguístico Tudo Isso me Parece um sonho. O longa se vale de um registro da vida do general pernambucano José Inácio de Abreu e Lima (1794-1869) para discutir a busca de imagens e a construção da personagem.

Faz na sequência um híbrido de ficção e documentário, O Último Romance de Balzac (2010), de temática espírita. Mais uma vez investiga o fazer artístico, adicionando a questão mediúnica, a partir do fato revelado por um médium de que o romancista francês Honoré de Balzac (1799-1850) teria lhe ditado do além um livro derradeiro. A crítica vê no filme uma vitalidade ao buscar o espelhamento entre a alegaçãodo espírita, a pesquisa de um estudioso sobre a obra psicografada, um romance similar de Balzac e a encenação deste.

A noção de vitalidade também é lembrada uma década depois para novo longa ficcional. Sertânia (2020) contempla em preto-e-branco universo do sertão com seus mitos, sua cultura popular e suas personagens referenciais como o cangaceiro e o jagunço. Sobretudo, há o retorno à temática do migrante, em ciclo de predileção iniciado com Viramundo. Na trama, o jovem sertanejo Antão, levado ainda criança da Canudos massacrada4 para São Paulo, volta para compreender a morte do pai. O protagonista, alistado nas forças de combate a operários insurgentes na metrópole, é considerado paradigmático dos interesses do realizador no embate entre donos de poder e oprimidos, modernização e conservadorismo, um Brasil dinâmico e arcaico, por fim.

O veterano Sarno desenvolve com coerência um cinema voltado ao entendimento do povo brasileiro, seus conflitos e suas aspirações, quer na linguagem documental, quer na ficcional. Mantém como ética utilizar do conhecimento e das ferramentas criativas definidas na sua formação nordestina, raiz constante dos filmes que dirige.  

Notas

1. Caravana Farkas é o nome informal dado a um conjunto de documentários produzidos por Thomaz Farkas entre 1964 e 1969. Inicialmente, o conceito se refere a vinte produções sobre a cultura popular nordestina realizadas em 1969 e reunidos sob o título A Condição Brasileira. Os episódios são dirigidos por Paulo Gil Soares (1935-2000) e Sérgio Muniz, além de Sarno. Mais tarde, passam a integrar nesta noção coletiva outros quatro curtas-metragens em 1964 sob a produção de Farkas , entre eles Viramundo, de Sarno.

2. Cinema-verdade, ou Kino Pravda, é uma teoria desenvolvida pelo pioneiro documentarista soviético Dziga Vertov (1896-1954) e diz respeito a filmar a realidade de improviso, sem a interferência do realizador e o conhecimento de quem é filmado. Busca-se, assim, a expressão da verdade, do real. Inspirados nas ideias de Vertov, o filósofo Edgar Morin (1921) e o antropólogo cineasta Jean Rouch (1917-2004) desenvolveram o estilo documental chamado Cinéma Vérité, assim batizado por Morin em 1960.

3. Teologia da Libertação é uma corrente teológica cristã suprapartidária surgida na América Latina nos anos de 1960. O lançamento, em 1971, do livro A Teologia da Libertação, de autoria do padre peruano Gustavo Gutiérrez Merino (1928), costuma ser considerado o fato fundador do movimento. Junto à fé,  adota as ciências humanas e sociais como base estrutural e atua em prol de direitos básicos do ser humano, no combate à fome e à pobreza.

4. A pequena comunidade de Canudos, no sertão baiano, se torna palco de um conflito de dimensão nacional quando, em 1893, o líder messiânico Antonio Conselheiro (1830-1897) ali se instala e atrai milhares de seguidores entre camponeses, índios e ex-escravos. A partir de 1896, os governos locais e mais tarde o poder federal passam a enviar expedições para destruir o povoado, o que acontece um ano depois na quarta tentativa. Pelo menos 25 mil pessoas são mortas na chamada guerra ou campanha de Canudos.  

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