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Enciclopédia Itaú Cultural
Cinema

Eduardo Coutinho

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 23.08.2024
11.05.1933 Brasil / São Paulo / São Paulo
02.02.2014 Brasil / Rio de Janeiro / Rio de Janeiro
Registro fotográfico Daryan Dornelles

Eduardo Coutinho, s.d.

Eduardo de Oliveira Coutinho (São Paulo, São Paulo, 1933 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014). Diretor de cinema, documentarista. Leva a experiência no jornalismo para a construção de seus documentários, aproximando o cinema da entrevista para registrar os relatos de seus personagens, sem distanciar-se da cena, prática comum de documentaristas.

Texto

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Eduardo de Oliveira Coutinho (São Paulo, São Paulo, 1933 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014). Diretor de cinema, documentarista. Leva a experiência no jornalismo para a construção de seus documentários, aproximando o cinema da entrevista para registrar os relatos de seus personagens, sem distanciar-se da cena, prática comum de documentaristas.

Em 1954, integra o Seminário de Cinema no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp/SP) e trabalha como revisor na revista Visão. Consegue bolsa de estudos para o Institut des Hautes Études Cinématographiques (Idhec), em Paris, onde conclui  cursos de direção e montagem em 1960.

Em 1962, volta ao Brasil e acompanha a caravana UNE Volante, da União Nacional dos Estudantes (UNE), onde conhece Elizabeth Teixeira, viúva do líder camponês João Pedro Teixeira, assassinado na Paraíba. Decide contar a história do líder em Cabra Marcado para Morrer. Pesquisa as ligas camponesas ao longo de 1963 e inicia as gravações no ano seguinte. As filmagens, no nordeste, são interrompidas pelo golpe civil-militar de 1964, e o material é apreendido. A maior parte do negativo filmado, entretanto, fica no Rio de Janeiro e é salva.

Eduardo Coutinho é autor de obra coerente, em constante aperfeiçoamento. Características de seu trabalho são a importância dada a personagens anônimos e a afirmação do documentário fundado na entrevista. Segundo João Moreira Salles (1962) , “a cada novo filme Coutinho aprofunda as questões de método, sem jamais transformá-las em exercícios de teorização”.1

Em 1975, trabalha no programa semanal Globo Repórter, da TV Globo. Considera a experiência formativa para sua concepção de documentários, além de possibilitar a execução de grandes reportagens com menor impacto da censura.

Na virada para a década de 1980, retoma o projeto interditado em 1964. Grava seu reencontro com os principais atores no Nordeste e exibe-lhes as imagens originais. O filme é finalizado em 1983, com registro de entrevistas de emigrantes nordestinos, residentes no Rio de Janeiro e em Limeira (São Paulo). No ano seguinte, o documentário é lançado e ganha doze prêmios internacionais. A boa acolhida permite sua ampliação de 16 mm para 35 mm.

O cineasta inicia um ciclo de documentários feitos em “locações reais”, entre os quais o melhor exemplo é Edifício Master (2002). O filme é gravado com moradores de um prédio de apartamentos em Copacabana. É realizado por uma equipe que permanece até seus últimos filmes – Jacques Cheuiche na imagem, Valéria Ferro (1964) no som, Jordana Berg (1963) na montagem. O processo é fixo: antes das gravações, os personagens são entrevistados por pesquisadores e, depois, selecionados por Coutinho. Há um dispositivo de entrevista, com regras rígidas para entrevistador, entrevistado e equipe, que orienta a montagem. O método é conhecido como “prisão”: as filmagens se dão em um lugar único, concentram-se em um tempo determinado e baseiam-se em regras preestabelecidas. Os planos fixos e longos predominam, e abdica-se de imagens, ilustração ou cobertura. Enquanto outros documentaristas posicionam-se ao lado da câmera para não aparecer na imagem, Coutinho mantém-se próximo do entrevistado – ele não acredita na possibilidade de uma conversa verdadeira a mais de dez metros de distância2.

Embora próximo do entrevistado, escolha de temas e personagens passa pelo critério da distância – ou da alteridade: os entrevistados são seus “outros” de classe, sexo e idade. É uma estratégia para “se colocar no lugar do outro em pensamento, sem anular a diferença entre os que estão dos dois lados da câmera”, segundo Consuelo Lins (1982). Nas obras desse diretor, a palavra pertence ao entrevistado. O primeiro expõe a realidade com um olhar atento, sensível e profundo, dando voz sem manipulação ao que o segundo diz.

O filme Jogo de Cena (2007) inaugura a fase reflexiva, filmada em espaços cênicos, como teatros e galpões de ensaio. As entrevistas são com mulheres que respondem a anúncio publicado em jornais. Seus depoimentos são montados junto ao de atrizes profissionais, como Fernanda Torres (1965), Marília Pêra (1943-2015) e Andréa Beltrão (1963), que podem contar histórias próprias ou interpretar as de entrevistadas “anônimas”.

A escolha de um palco como cenário indica a teatralidade do documentário, tema abordado por Ismail Xavier (1947): “[a] dimensão reflexiva vem aprofundar o debate sobre as relações entre cinema, performance e teatro, notadamente pela sua escolha de um espaço peculiar de filmagem e pelo estilo muito próprio de compor as cenas das entrevistas e sua sucessão, esta pontuada por mudanças de registro, interrupções nas quais o cineasta conversa sobre problemas da representação com três atrizes bem conhecidas”.3 A ambiguidade entre verdade e atuação apresenta-se em personagens de filmes anteriores. É o caso de Alessandra, de Edifício Master, que se diz uma “mentirosa verdadeira”, demonstrando, segundo Xavier, “notável intuição do que está implicado no efeito-câmera, [evidenciando] a mistura de espontaneidade e de teatro, de autenticidade e de exibicionismo, de um fazer-se imagem e ser verdadeiro”.4

O documentário póstumo, Últimas Conversas (2015), radicaliza o processo. O filme, concluído por Jordana Berg (1963) e João Moreira Salles, registra entrevistas com adolescentes em uma sala de aula. A possibilidade do fracasso é evocada pelo cineasta durante as gravações, para reafirmar o princípio de incerteza de seu cinema, conforme João Moreira Salles prevê, dez anos antes: “O filme pode simplesmente não dar certo, os dispositivos postos em prática podem falhar, os personagens podem falar mal. O cinema de Coutinho é infinitamente maleável e está sob o risco constante de se desmanchar”.5

Eduardo Coutinho segue as regras da entrevista para aproximar-se de seus personagens anônimos. Embora a distância entre entrevistador e entrevistado esteja delimitada, o diretor não se abstrai da conversa e do registo audiovisual, deixando clara sua presença na construção dos relatos.

Notas

1. MOREIRA SALLES, João. Prefácio. In: LINS, Consuelo. O documentário de Eduardo Coutinho: televisão, cinema e vídeo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004, p. 8.

2. EDUARDO Coutinho. Entrevista a Carlos Nader. Espaço Filmes, 7 out. 2014, 112 min.

3. XAVIER, Ismail. A teatralidade como vetor do ensaio fílmico no documentário brasileiro contemporâneo. Aniki – Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, v. 1, n. 1, p. 34, 2014. Disponível em:  http://aim.org.pt/ojs/index.php/revista/article/view/52/19.  Acesso em: 8 abr. 2019. 

4. XAVIER, Ismail. Indagações em torno de Eduardo Coutinho e seu diálogo com a tradição moderna. In: MIGLIORIN, Cezar (Org.). Ensaios no real. Rio de Janeiro: Azougue, 2010, p. 67.

5. MOREIRA SALLES, João. Prefácio. In: LINS, Consuelo. O documentário de Eduardo Coutinho: televisão, cinema e vídeo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004, p. 9.

Obras 3

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Reprodução fotográfica autoria desconhecida / Cinemateca Brasileira

Espetáculos 1

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Exposições 4

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Mídias (1)

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Eduardo Coutinho - Jogo de Ideias (2006)
O documentarista Eduardo Coutinho, autor de uma linguagem própria dentro do cinema documental brasileiro dos últimos 30 anos e diretor de "Cabra Marcado para Morrer" (1962/1984) e "Edifício Master" (2002), conta sobre "O Fim e o Princípio" (2004), sobre sua relação com os personagens e sobre a reação das pessoas aos seus filmes. Na conversa, também participa a pesquisadora e autora do livro "O Documentário de Eduardo Coutinho - televisão, cinema e vídeo", Consuelo Lins.

Coutinho ainda define o momento de gravação como uma espécie de exercício espiritual. "Tento me colocar no lugar do outro. Ouço e acredito no que essas pessoas me falam", ressalta.

Entrevista ao jornalista Claudiney Ferreira, no programa Jogo de Ideias, gravado em fevereiro de 2006, no Itaú Cultural.

Fontes de pesquisa 15

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  • BERNARDET, Jean-Claude. Jogo de cena. Blog do Jean-Claude, 14 jan. 2008. In: OHATA, Milton (Org.). Eduardo Coutinho. São Paulo: Cosac & Naify, 2013. p. 627-628.
  • BERNARDET, Jean-Claude. Vitória sobre a lata de lixo da história. Folha de S. Paulo, São Paulo, 24 mar. 1985. Folhetim. In: ______. Cineastas e Imagens do Povo. São Paulo: Cia. das Letras, 2003.
  • BRAGANÇA, Felipe (Org.). Eduardo Coutinho: encontros. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2008.
  • COUTINHO, Eduardo. O olhar no documentário. Carta-depoimento a Paulo Paranaguá (texto escrito para o Catálogo do festival Cinéma du Réel, em Paris, em 1992). In: BRAGANÇA, Felipe (Org.). Eduardo Coutinho: encontros. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2008. p. 14-21.
  • COUTINHO, Eduardo. O real sem aspas” Entrevista a BOJUNGA, Claudio; CAMARGO, Aspásia; GALANO, Ana Maria e VENTURA, Zuenir. Filme Cultura, 1984. In: BRAGANÇA, Felipe (Org.). Eduardo Coutinho: encontros. Rio de Janeiro, Beco do Azougue: 2008.
  • EDUARDO Coutinho, 7 de outubro. Direção: Carlos Nader. Espaço Filmes, 2014. (112 min).
  • LINS, Consuelo. O Documentário de Eduardo Coutinho. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.
  • LINS, Consuelo. O cinema de Eduardo Coutinho: entre o personagem fabulador e o espectador-montador. In: OHATA, Milton (Org.). Eduardo Coutinho. São Paulo: Cosac & Naify, 2013. p. 374-388.
  • MATTOS, Carlos Alberto. Eduardo Coutinho: o homem que caiu na real. Santa Maria da Feira, Portugal: Festival de Cinema Luso-Brasileiro de Santa Maria da Feira, 2003.
  • MESQUITA, Cláudi; SARAIVA, Leandro. Eduardo Coutinho: cinema do encontro. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil, 2003.
  • OHATA, Milton (Org.). Eduardo Coutinho. São Paulo: Cosac & Naify: Sesc, 2013.
  • SALLES, João Moreira. Prefácio. In: LINS, Consuelo. O Documentário de Eduardo Coutinho: televisão, cinema e vídeo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004. p. 7-10.
  • TAVARES, Mariana Ribeiro da Silva. Poesia e reflexividade na produção de três documentaristas brasileiros contemporâneos: Helena Solberg, Eduardo Coutinho e Walter Carvalho. 2007. 115 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Belas Artes, 2007. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/VPQZ-73BHGR/disserta__o.pdf?sequence=1.
  • XAVIER, Ismail. A teatralidade como vetor do ensaio fílmico no documentário brasileiro contemporâneo. Aniki: revista portuguesa da imagem em movimento, v. 1, n. 1, p. 33-48, 2014. Disponível em: < http://aim.org.pt/ojs/index.php/revista/article/view/52/19 >.
  • XAVIER, Ismail. Indagações em torno de Eduardo Coutinho e seu diálogo com a tradição moderna. In: MIGLIORIN, Cezar (org.). Ensaios no Real. Rio de Janeiro: Azougue, 2010. p.65-79.

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