Regina Vater
![Amon/Amen, 1999 [Obra]](http://d3swacfcujrr1g.cloudfront.net/img/uploads/2000/01/006368001013.jpg)
Amon/Amen, 1999
Regina Vater
Placa de acrílico, linhas de pesca e pipocas
Texto
Regina Maria da Motta Vater (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1943). Artista multimídia, curadora, escritora. Sua extensa produção, de natureza transmidiática e polissêmica, transita entre as novas figurações dos anos 1960, a arte conceitual e as experiências relacionais, construindo uma poética singular nas conexões entre arte e cultura, natureza e técnica.
Estuda desenho com o pintor e desenhista Frank Schaeffer (1917-2008) entre 1958 e 1962. Ingressa na Faculdade Nacional de Arquitetura em 1961 (FAU-UFRJ), e prossegue os estudos com o pintor Iberê Camargo (1914-1994), entre 1962 e 1965, marcando profundamente sua formação. Os primeiros trabalhos de Regina Vater partem de uma investigação mais intimista das formas e caminham para a intensidade cromática das novas figurações pictóricas e do movimento tropicalista.
Na década de 1970, experimenta processos criativos situados entre a performance e a instalação. Em Magi(o)cean (1970), experiência realizada na Praia da Joatinga, no Rio de Janeiro, signos de diferentes devoções ocupam um mesmo território: uma escultura de Nossa Senhora Aparecida, sincretizada com Oxum, é posta no topo de uma escadaria de areia. Nos degraus inferiores, são colocados a estátua de São Jorge representado como Ogum e um menino Jesus e as plantas que formam sua manjedoura. O oceano completa a ação da obra, que, em sua natureza efêmera, é levada pela maré como uma oferenda, restando apenas registros fotográficos.
Nas pinturas de fins dos anos 1960, figuras sem rostos ou mãos compõem paisagens acentuadamente tropicais, que fundem atmosferas quase metafísicas à plasticidade pop. A dessubjetivação dos corpos femininos que nelas se observa é intensificada nos experimentos que Regina realiza sobre as possibilidades plásticas e semânticas dos nós. Cordas são impressas ou pintadas sobre suportes prosaicos, como sacos descartáveis, e as pinturas que compõem o tríptico Nós, obra que lhe rende o prêmio de viagem do 7º Salão Nacional de Arte Moderna, em 1972. No tríptico, os corpos são ainda mais fragmentados e objetificados pelo impedimento conferido pelas cordas e pelos índices formais de uma geometria esfacelada que, em cores nacionais, metaforizam a condição do país. As cordas protagonizam também o Evento dos Nós (1973), experimento no qual os participantes atam e desatam nós em uma praça pública no Rio de Janeiro, ao mesmo tempo que refletem sobre seus significados, sejam eles metáforas de prisão ou dos laços interpessoais.
Entre 1973 e 1975, mora em Nova York e Paris, e realiza uma série de cartões postais sobre camas de hotéis. Em Parisse 2 (1974-1975), a fotografia da cama em desalinho no quarto pouco iluminado transmite ao destinatário a experiência da viagem. A série Postalixo: land(e)scape (1974) revela o lado oposto dos cartões postais: os resíduos do consumo nas grandes cidades. Em Luxolixo (1973), audiovisual que reverbera o impacto de Regina Vater com o poema visual homônimo (1965) de Augusto de Campos (1931), o luxo das ruas de Manhattan é contraposto ao lixo produzido pela cidade, ao som turbulento de aparelhos eletrônicos que concorrem com a leitura de Hélio Oiticica (1937-1980) de um poema de Vater.
No álbum Tina América (1975), Regina é fotografada nos papéis de dona de casa, intelectual, guerrilheira etc., que falam tanto da diversidade cultural latino-americana quanto dos estereótipos de feminilidade. Seus livros de artista indagam a identidade individual, coletiva, e a relação entre arte e público, como em O que É Arte? São Paulo Responde (1978), que reúne as respostas de visitantes do Teatro Municipal à pergunta “o que é arte?”.
Em 1980, recebe bolsa da Fundação Guggenheim e passa a se dedicar ao estudo da instalação. O movimento ecológico e o sincretismo de mitos amazônicos e europeus permeiam obras como Yauti Marandua (1979). Muitas de suas instalações colocam-se além das artificiais oposições entre natureza e cultura, em claro desejo de fusão entre arte e vida, na esteira de algumas formulações neoconcretistas. Com base no uso popular da planta comigo-ninguém-pode como amuleto na entrada de residências e estabelecimentos, Regina realiza a instalação Comigo Ninguém Pode (1984), em que a planta é cercada por enormes faixas com fotografias 3 x 4 de desconhecidos, que a encaram e reiteram silenciosamente a afirmação “comigo ninguém pode”. Diferentes culturas visuais e temporalidades cruzam-se também na série fotográfica Nature-Morte (1987), composta de oferendas a divindades afro-brasileiras, criadas com materiais encontrados nas praias cariocas, aproximando a tradição pictórica da natureza morta aos arranjos de função ritual.
Como pensadora da arte contemporânea, seus textos e curadorias das mostras Brazilian Works on Paper: 49 artists, em Nova York (1979), e Brazilian Visual Poetry, no Mexic-Arte Museum, em Austin, no Texas (2002), tornam a arte brasileira mais conhecida no exterior. A palavra escrita ou falada é matéria-prima fundamental na criação de sentidos que evidenciam a natureza poética de seus trabalhos. Na web instalação Desire (2010-2012), a decomposição de uma maçã, carimbada com as palavras Desire e Desejo, é transmitida por uma câmera, e o observador é convidado a acompanhar a morte desse desejo e a produzir poemas que são exibidos em um site e no espaço expositivo.
Autora de uma de produção que amplia os limites da arte em diferentes direções, o pensamento poético de Regina Vater articula experimentação estética, cultura popular e tecnologia para a criação de novos sentidos e experiências.
Obras 20
A Inominável
Água (detalhe)
Amon/Amen
Amuleto para Alimento e Boa Sorte (detalhe)
Art É Mis à NoUs (detalhe)
Exposições 255
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0/0/0 - 0/0/1964
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28/12/1967 - 28/2/1966
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Links relacionados 1
Fontes de pesquisa 34
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- 150 anos de pintura no Brasil: 1820-1970. Rio de Janeiro: Colorama, 1989. R703.0981 P818d
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REGINA Vater.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
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Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7