Edifício do Teatro Cultura Artística
Texto
Localizado na rua Nestor Pestana, na região central de São Paulo, o Teatro Cultura Artística (TCA) é um projeto dos arquitetos Rino Levi (1901-1965) e Roberto Cerqueira César (1917-2003), do escritório Rino Levi. Pelas características inovadoras em acústica, visibilidade e integração com as artes, torna-se um marco na história da arquitetura moderna brasileira. É considerado, na época de sua inauguração, o mais avançado teatro brasileiro e, desde então, uma das melhores salas de concerto do país.
O teatro é fruto de aspirações da Sociedade de Cultura Artística (SCA), instituição da elite paulistana que promove saraus e recitais e, desde 1919, deseja ter uma sede própria. Projetado em 1942, é inaugurado em 1950, com concertos dos maestros brasileiros Heitor Villa-Lobos (1887-1959) e Camargo Guarnieri (1907-1993). Desde então, a obra é divulgada em várias revistas internacionais, como L’Architecture d’Aujourd’Hui, Architectural Review e Domus, sendo elogiada pela concepção, qualidade acústica e pelos dois auditórios superpostos – as salas Esther Mesquita, com 1156 lugares, e a Rubens Sverne, com 339.
É o ápice de uma série de projetos de Rino Levi que contam com elaborados estudos de reverberação e qualidade de som. Iniciados em 1936, com o cine Ufa-Palácio, e consolidados no TCA, esses estudos se inspiram nos princípios acústicos pesquisados pelo físico estadunidense Wallace C. Sabine (1868-1919).
O projeto situa o palco no fundo (a parte mais estreita) do lote, o que lhe confere forma quase triangular. Como um leque, dispõe a plateia a partir de um eixo central do palco, de frente para a Rua Nestor Pestana, o que dá à última fileira uma leve curvatura, que se espelha na fachada e acompanha o traçado da rua. A elevação da plateia cria espaço para o hall de entrada e uma segunda sala menor, enquanto o foyer do piso intermediário, com pilares recuados, se transforma em ponto de observação da cidade.
Adotando o traço marcante da arquitetura moderna brasileira de integrar as artes, os arquitetos inserem, na fachada curva do teatro, um painel do artista brasileiro Di Cavalcanti (1897-1976). Intitulado Alegoria das artes e selecionado em concurso promovido pela SCA, o maior painel já feito pelo artista mede 48 metros de comprimento por oito de altura, é composto por 26.000 pastilhas de vidro e retrata as musas gregas inspiradoras das artes e das ciências.
Depois da inauguração, o teatro funciona por alguns anos, mas logo é alugado para a TV Excelsior, que o devolve em péssimas condições, em 1970. A Sociedade solicita projeto de reforma ao escritório Rino Levi, no qual os sócios Luiz Roberto Carvalho Franco (1926-2001) e Roberto Cerqueira César, com consultoria do especialista em cenotecnia Aldo Calvo (1906-1991), propõem aumentar o palco criando um fosso para a orquestra (não executado) e, assim, criar um retropalco. Na reforma, eliminam-se alguns acessos e algumas fileiras de assentos. O TCA é reaberto em 1977 com cerca de 1100 assentos, 400 a menos. Intervenções posteriores são feitas a intervalos regulares, atendendo a exigências da prefeitura. O arquiteto Paulo Bruna (1941) participa de todas elas.
Em 17 de agosto de 2008, um incêndio começa no palco e destrói o teatro até as portas corta-fogo. O fundo da plateia, formado por parede dupla para evitar ruídos externos, permite salvar o mosaico de Di Cavalcanti. A SCA decide demolir os remanescentes do edifício e contratar um novo projeto, dividindo a recuperação em duas fases: a restauração da fachada e do painel, completada em 2011 pela arquiteta portuguesa Isabel Ruas, da Oficina de Mosaicos, e premiada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 2012; e a construção de um novo teatro, projetado por Paulo Bruna. Por segurança, o arquiteto cria uma grande plataforma metálica para travar e fixar o painel. Após o incêndio, o processo de tombamento do Teatro é aprovado nas três esferas governamentais, além de ter seu projeto de restauração aprovado.
As soluções inovadoras, os traços racionalistas e sóbrios dos autores, a integração entre arte, arquitetura, ciência e tecnologia, além da valorização do espaço urbano e dos pedestres, determinam a importância do Teatro Cultura Artística. Soma-se a isso o uso pioneiro de estudos acústicos para definição da forma arquitetônica, o perfeccionismo e o importante papel do escritório Rino Levi nessa produção.
Fontes de pesquisa 15
- ANELLI, Renato; GUERRA, Abilio; KON, Nelson. Rino Levi: arquitetura e cidade. São Paulo: Romano Guerra Editora, 2001. p. 139
- ARANHA, Maria Beatriz de Camargo. A obra de Rino Levi e a trajetória da arquitetura moderna no Brasil. 2008. Tese (Doutorado em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
- ATELIÊ, Arte e Restauração. Tombamento e Preservação às avessas. 4 ago. 2013. Disponível em: https://www.ateliearterestauracao.com.br/teatro-cultura-artistica-tombamento-e-preservacao-as-avessas/. Acesso em: 29 out. 2019
- BRUAND, Yves. Arquitetura contemporânea no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1981.
- BRUNA, Paulo Júlio Valentino. Entrevista dada, por telefone, à pesquisadora Anita Di Marco, em 12 nov. 2019.
- CARRILHO, Marcos José. Teatro Cultura Artística: novo edifício e restauração. Arquitextos, São Paulo, ano 09, n. 104.01, Vitruvius, jan. 2009. Disponível em https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/09.104/80. Acesso em: 03 nov. 2019
- GEROLLA, Giovanny. Reforma do Teatro Cultura Artística vai mudar estrutura e restaurar painel de Di Cavalcanti. Universia. 8.abr.2010. Disponível em: https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2010/04/28/reforma-do-teatro-cultura-artistica-vai-mudar-estrutura-e-restaurar-painel-de-di-cavalcanti.htm. Acesso em: 28 out. 2019
- MACHADO, Lucio Gomes. Rino Levi e a renovação da arquitetura brasileira. Tese de doutorado. São Paulo, FAUUSP, 1992.
- PEREIRA, Renata Cristina. Teatro Cultura Artística se prepara para reabrir as cortinas. Viva o Centro, 28 jun. 2010. Disponível em: http://www.vivaocentro.org.br/not%C3%ADcias-do-centro/not%C3%ADcias/teatro-cultura-art%C3%ADstica-se-prepara-para-reabrir-as-cortinas.aspx. Acesso em: 29 out. 2019
- PIETRO, Rosane Martins de; GIRALDIO, Rita de Cássia. Teatro Cultura Artística: a recuperação de um patrimônio. Revista Confluências Culturais. v. 8, n. 2: Memória e patrimônio cultural: espaços e práticas de difusão na contemporaneidade, 2019.
- REVISTA Acrópole nº 145, p. 1-10, mai. 1950. Disponível em: http://www.acropole.fau.usp.br/edicao/145. Acesso em: 28 out. 2019
- SERAPIÃO, Fernando. Em SP, o novo Teatro Cultura Artística mobiliza políticos, empresários e arquitetos e seu projeto é aprovado e tombado a toque de caixa. Coisas da arquitetura - O rescaldo. Revista Piauí. nº 33. jun. 2009. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/materia/o-rescaldo/. Acesso em: 28 out. 2019
- SILVA, Raul Mendes. (Org.) Rino Levi. Dicionário de Artistas do Brasil. Disponível em http://www.raulmendessilva.com.br/brasilarte/tablet/nacional/levi_rino.php. Acesso em: 28 out. 2019
- TEATRO Cultura Artística. O restauro do Cultura Artística. Disponível em: http://www.culturaartistica.com.br/apoie/renovacao-do-teatro-cultura-artistica/. Acesso em: 05 nov. 2019
- XAVIER, Alberto (Org.). Arquitetura moderna brasileira: depoimento de uma geração. São Paulo: Pini, ABEA-Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Fundação Vilanova Artigas, 1987.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
-
EDIFÍCIO do Teatro Cultura Artística.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/obra70937/edificio-do-teatro-cultura-artistica. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7