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Enciclopédia Itaú Cultural
Artes visuais

Rafael Bqueer

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 30.12.2023
1990 Brasil / Pará / Belém
Rafael Bqueer (Belém, Pará, 1992). Artista, drag queen. Trabalha em múltiplas plataformas, como fotografia, vídeo e performance, para investigar questões que envolvem arte e política, gênero, sexualidade, afrofuturismo, decolonialidade e interseccionalidade, além de ser uma voz como ativista LGBTQIA+.

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Rafael Bqueer (Belém, Pará, 1992). Artista, drag queen. Trabalha em múltiplas plataformas, como fotografia, vídeo e performance, para investigar questões que envolvem arte e política, gênero, sexualidade, afrofuturismo, decolonialidade e interseccionalidade, além de ser uma voz como ativista LGBTQIA+.

Com bacharelado e licenciatura pelo curso de Artes Visuais da Universidade Federal do Pará (UFPA), expressa, desde sua formação, profundo interesse por ficção, carnaval e cultura afro-brasileira. Em 2008, torna-se assistente dos carnavalescos Claudio Rêgo de Miranda (1963) e Jean Gomes Negrão (1984), ambos reconhecidos e premiados no carnaval das escolas de samba paraense. Nesse período, começa a desenhar figurinos e fantasias e a participar da construção de carros alegóricos. É nos bastidores do Carnaval que compreende, de fato, o lado experimental, coletivo e político da arte, contribuindo para a produção artística que desenvolve ao longo de sua trajetória. Em 2012, assina seu primeiro projeto-solo na escola de samba Quem São Eles, com enredo sobre Umarizal, bairro da capital paraense.

Influenciado por cantoras brasileiras como Gaby Amarantos (1978) e Elza Soares (1930-2022), o artista começa a se montar1 despretensiosamente entre 2013 e 2014, momento em que a produtora Noite Suja realiza uma série de festas com a proposta de montação e a participação de artistas que adotam estéticas club kid2 e punk. No mesmo ano, Rafael Bqueer recebe a coroa de primeira rainha Themônia da festa Noite Suja e funda, com outros artistas, o coletivo Thêmonias [lê-se “demônias”]. Formado por mais de 150 pessoas que se apresentam na cena cultural de Belém, a expressão é resultado do encontro da cultura drag com uma estética de montação amazonense. O coletivo afirma o posicionamento contra-hegemônico de corpos3 dissidentes que veem na arte da montação a possibilidade de quebrar padrões normativos de comportamento e gênero. Em 2015, o artista adota o nome, de origem africana, da personagem Uhura da série Jornada nas estrelas (Star Trek), que significa "estrela da liberdade", tornando-se Uhura Bqueer.

As festas de aparelhagem4 são as principais referências em seu trabalho. Na série de ações Alice e o chá através do espelho (2013-2017), Uhura resgata a imagem de Alice, personagem fictícia da obra do romancista inglês Lewis Carroll (1832-1898), personificada pelo ator Jorge Lafond (1952-2003) no abre-alas da escola de samba Beija-flor de Nilópolis em 1991, no desfile “Alice no Brasil das Maravilhas”. Bqueer reflete sobre as zonas de exclusão social e racial da cidade do Rio de Janeiro, sobre a vivência com outros corpos negros e LGBTQIA+ nos barracões das escolas de samba, e também sobre as violências sofridas diariamente em uma cidade marcada pelas contradições e pela necropolítica.  

Em 2016, o artista paraense chega ao Rio de Janeiro para trabalhar no G.R.E.S Acadêmicos do Salgueiro e ocupar os espaços de poder da arte contemporânea. Inicia-se um período de intensa atividade, com participação em diversas residências e exposições: é finalista do Prêmio EDP nas Artes, realizado no Instituto Tomie Ohtake, em 2018; no mesmo ano, é selecionado pela Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage para uma bolsa de residência na AnnexB, em Nova York, e indicado em 2019 para a 7ª edição do Prêmio Marcantonio Vilaça. Em Sereias (2019), videoperformance selecionada para o Salão Arte Pará 2019, que hoje integra o acervo da Coleção Amazoniana, Bqueer ecoa um lamento pela destruição do meio ambiente. Em sua languidez e agonia, a sereia futurista amazônica nada a seco na direção do observador, abraçando-o e ameaçando-o com sua doçura e monstruosidade. O trabalho é um desdobramento da série Super Zentai, em que o artista faz uso de símbolos do erotismo e pós-pornô para pensar as relações entre os corpos e as identidades contemporâneas.

Selecionado na edição de 2020 da Bolsa de Fotografia ZUM/IMS, produz, com o apoio do prêmio, quatro curtas-metragens inéditos, estrelados por integrantes das Themônias. O primeiro filme, intitulado O nascimento (2021), apresenta Uhura BQueer como drag alienígena em uma floresta calcinada pelas chamas do fogo. Em A bela é poc (2021), segundo curta da quadrilogia, retrata a drag Tristan Soledade em uma performance de bate-cabelo no Palacete Bolonha, edifício construído na capital paraense no início do século XX. Nessa obra, confronta a narrativa desenvolvimentista da Belle Époque amazônica com a subalternidade latina que se engalfinha com as elites racistas sem jamais perder a elegância. Em Torre de Babildre (2021), terceiro filme, a artista Monique Lafond (1954) utiliza a dança vogue-ninja como estratégia de ataque e defesa contra uma réplica da estátua da Liberdade instalada em uma loja de departamentos Havan. E no último curta da série, Hierogritos (2021), treze artistas se dirigem montados e armados com palavras de desordem ao mercado Ver-o-Peso, em Belém, para performar seu corpo e presença ancestral no espaço. As obras são recheadas de palavras em pajubá, língua de fusão de termos da língua portuguesa com termos extraídos dos grupos étnico-linguísticos nagô e iorubá e bastante utilizado por pessoas LGBTQIA+ .

A pesquisa do artista e drag queen paraense Rafael Bqueer é uma afirmação do ato performático da montação como afronta às normatividades, construindo críticas atentas e pertinentes às questões sociopolíticas da contemporaneidade.

Notas

1. Se montar ou montação diz respeito à prática de vestir-se ou maquiar-se de forma exagerada a fim de se apropriar de signos femininos, recorrendo ao uso de roupas, calçados, perucas e elementos que exacerbam uma ideia de feminilidade. O termo origina-se no universo das travestis e Drag Queens, sendo difundido na comunidade LGBTQIA+ como um todo.

2. Movimento que tem origem na cidade estadunidense de Nova York, entre os anos 1980 e 1990, ligado à vida noturna alternativa. Sua estética se caracteriza por roupas coloridas e extravagantes que extrapolam os conceitos binários de gênero e está intimamente ligado à performance, sendo associado muitas vezes a drag queens.

3. Em seus trabalhos e reflexões, Rafael Bqueer, assim como outros e outras artistas de sua geração trocam a flexão de gênero do substantivo corpo, passando a utilizar “corpa” como linguagem e objeto de reflexão.

4. Festas que surgem entre os anos 1950 e 1960 no Pará, utilizando toca-discos e misturando ritmos que vão desde a música popular amazônica até o eletrônico vindo de outras regiões e países. Em 1970, recebem o nome de "aparelhagem", quando os equipamentos utilizados pelos DJs evoluem. A proximidade com a Zona Franca de Manaus, onde se situavam importantes empresas de eletrônicos, facilitando o acesso a tecnologias de ponta e reunindo cada vez mais pessoas.

Exposições 21

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