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Enciclopédia Itaú Cultural
Literatura

Ana Maria Gonçalves

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 19.11.2023
13.02.1970 Brasil / Minas Gerais / Ibiá
Ana Maria Gonçalves (Ibiá, Minas Gerais, 1970). Escritora. Sua produção literária se caracteriza pelo caráter intimista, quase autobiográfico, das narrativas e resulta de densas pesquisas sobre as heranças africanas deixadas no Brasil. Tais estudos e as obras que deles decorrem fazem da autora uma voz contra-hegemônica no campo da literatura nac...

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Ana Maria Gonçalves (Ibiá, Minas Gerais, 1970). Escritora. Sua produção literária se caracteriza pelo caráter intimista, quase autobiográfico, das narrativas e resulta de densas pesquisas sobre as heranças africanas deixadas no Brasil. Tais estudos e as obras que deles decorrem fazem da autora uma voz contra-hegemônica no campo da literatura nacional.

Leitora assídua por influência da mãe, ainda na juventude ensaia os primeiros textos literários, mas os abandona quando decide estudar publicidade. Já adulta, muda-se para a cidade de São Paulo, onde trabalha durante 13 anos como redatora e revisora publicitária.

Em 2002, cansada da rotina extenuante em agências de publicidade, decide viver na Bahia, inicialmente em Salvador e depois na Ilha de Itaparica, arquipélago vizinho à capital do estado. Em Itaparica, escreve seu primeiro romance, Ao lado e à margem do que sentes por mim (2002), lançado de maneira independente, em edição artesanal. O livro, com tiragem única e esgotada de mil exemplares, é uma obra intimista, com características de ficção autobiográfica. Ele conta a história de uma mulher que decide fazer uma grande mudança na vida para tentar se descobrir. Em 310 páginas, recupera os cenários geográficos e culturais do interior do Brasil, em especial de Minas Gerais e da Bahia, por meio de festejos e tradições vivenciados pela personagem Ana com a intensidade da busca realizada por ela.

A obra mescla uma escrita profundamente subjetiva, composta de questionamentos existenciais da protagonista sobre o amor romântico e sobre as consequências geradas pelo fim desse sentimento. Também contém memórias remotas da infância e da juventude da narradora, descritas de modo a elaborar um presente que não seja descolado do passado. O tempo e espaço retratados são descritos de forma detalhada, uma característica de destaque na produção literária da autora.

Ainda vivendo na Ilha de Itaparica, Ana Maria inicia uma pesquisa documental e de campo para escrever seu segundo romance, Um defeito de cor. Vencedor do Prêmio Casa de las Americas em 2007, o livro torna Ana Maria Gonçalves uma das mais lidas e comentadas escritoras brasileiras contemporâneas. Ao escolher contar a história de Kehinde, personagem narradora e protagonista da trama que se passa durante mais de oito décadas do século XIX, Ana Maria deseja criar uma obra literária que retrate a formação da nação brasileira do ponto de vista de uma mulher africana escravizada. Nesse sentido, ela “constrói um recurso ficcional que dá palavra contra o silêncio que a História relegou às mulheres negras”1.

Tal recurso ficcional se delineia de modo limítrofe e suplementar à narrativa histórica do Brasil colônia e do sistema escravista vigente à época. Essa característica estrutural do romance possibilita a discussão levantada pela professora de literatura da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Fabiana Carneiro da Silva. A análise defende que, com base em um interesse pessoal pela Revolta dos Malês, rebelião de negros muçulmanos escravizados ocorrida em Salvador em 1835, Ana Maria borra as fronteiras entre ficção e realidade e funde sua criação ficcional com fatos históricos. Assim, permite à crítica literária algumas chaves de interpretação sobre como essa fusão serve a novos entendimentos da literatura de autoria negra2 e seus devires.

A construção da personagem Kehinde, africana raptada no início do século XIX no Reino de Daomé, atual Benin, e que em terras brasileiras se transforma na icônica figura de Luísa Mahin, é o mote para o processo de subjetivação com o qual Ana Maria Gonçalves interpela a si mesma3. Como mulher negra, inserida em uma sociedade brasileira que ainda crê na existência de uma democracia racial, a autora encontra na escrita literária sua identificação racial como um posicionamento político e se torna figura pública ativa na luta antirracista no Brasil.

No ano de 2019, o texto teatral Pretoperitamar – O caminho que vai dar aqui, de autoria de Ana Maria Gonçalves e da atriz e diretora mineira Grace Passô (1980), ganha montagem sob direção artística de Grace. Idealizado pela compositora e cantora Anelis Assumpção (1980), o espetáculo cênico-musical conta a trajetória do artista Itamar Assumpção (1949-2003) e celebra os 70 anos de seu nascimento. A peça é a primeira encenação de uma obra de dramaturgia assinada por Ana Maria e, não por acaso, debruça-se especialmente sobre a experiência de Itamar como artista negro em um ambiente cultural permeado pelo racismo.

Presença cada vez mais constante nos debates culturais e acadêmicos sobre as profundas desigualdades raciais que ainda definem a sociedade brasileira, a autora se apropria com destreza do fazer literário para demarcar territórios e abrir possibilidades às presenças, vozes e escritas de outras mulheres negras.

 

Nota

1. MIRANDA, Fernanda R. Silêncios PrEscritos: estudo de romances de autoras negras brasileiras (1859-2006). Rio de Janeiro: Malê, 2019. p. 298.

2. SILVA, Fabiana Carneiro da. OMINIBÚ: maternidade negra em Um defeito de cor. Salvador: EDFUBA, 2019. p. 47.

3. GONÇALVES, Ana Maria. Uma ficção à procura de suas metáforas. Suplemento Pernambuco, Recife, n. 132, fev. 2017. Disponível em: https://www.suplementopernambuco.com.br/edi%C3%A7%C3%B5es-anteriores/67-bastidores/1783-uma-fic%C3%A7%C3%A3o-%C3%A0-procura-de-suas-met%C3%A1foras.html. Acesso em 22 jul. 2020.

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