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Enciclopédia Itaú Cultural
Artes visuais

Sérgio Bianchi

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 22.03.2024
25.11.1945 Brasil / Paraná / Ponta Grossa
Reprodução fotográfica autoria desconhecida

Lance Maior [cartaz], 1968
Sérgio Bianchi
Fotografia
94,00 cm x 63,00 cm

Sérgio Luis Bianchi (Ponta Grossa, PR, 1945). Cineasta, fotógrafo e roteirista. Nascido numa família de fotógrafos - seu avô, Luis Bianchi, chega ao Paraná em 1908 como fotógrafo da Brazilian Railway Company -, envolve-se com cinema em Curitiba, onde trabalha na Secretaria de Educação e Cultura do Estado do Paraná.

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Sérgio Luis Bianchi (Ponta Grossa, PR, 1945). Cineasta, fotógrafo e roteirista. Nascido numa família de fotógrafos - seu avô, Luis Bianchi, chega ao Paraná em 1908 como fotógrafo da Brazilian Railway Company -, envolve-se com cinema em Curitiba, onde trabalha na Secretaria de Educação e Cultura do Estado do Paraná.

Na capital paranaense, participa como assistente de produção e ator do filme Lance Maior (1968), estreia na direção de Sylvio Back (1937). Decidido a fazer carreira no cinema, se estabelece definitivamente em São Paulo a partir de 1969. Acompanha cursos na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), tem breve passagem como crítico no jornal Folha da Tarde e trabalha como assistente de direção em filmes como Compasso de Espera (1969), de Antunes Filho (1929), Uma Mulher para Sábado (1970), de Maurício Rittner (1939), e Jogo da Vida e da Morte (1972), de Mário Kuperman (1940). Em 1971, como fotógrafo, realiza uma exposição individual na Galeria Sesc São Paulo, e no ano seguinte filma seu primeiro curta-metragem: Omnibus (1972), baseado no conto de Júlio Cortázar (1914-1984). No período entre 1973 e 1976, dedica-se a documentários institucionais e filmes publicitários. Mais experiente no traquejo cinematográfico, realiza um novo curta, A Segunda Besta (1977), também baseado num conto de Cortázar, e começa a preparar seu primeiro longa-metragem.

Maldita Coincidência estreia em 1979. Em 1980, a convite do Sesc São Paulo, organiza a mostra de filmes Geração 68 – Uma Década de Cinema Paulista. Segue-se um novo período de curtas, com destaque para Mato Eles? (1982), filme polêmico sobre a questão indígena no interior do Paraná que ganha os principais prêmios dos festivais de Gramado e Brasília; e Divina Providência (1983), sátira mordaz que coloca um mendigo às voltas com a burocracia governamental, recebendo o prêmio de melhor direção em Gramado. Em 1987, lança seu segundo longa, Romance, que recebe os prêmios de melhor direção e de melhor atriz no 21º Festival de Brasília, além de participar do 39º Festival Internacional de Cinema de Berlim. Em 1989, estreia na direção cênica da ópera Dom Giovanni, de Mozart (1756-1791), no Teatro Guaíra, em Curitiba. A Causa Secreta (1994), seu terceiro longa, baseado num conto de Machado de Assis (1839-1908), é lançado em plena crise de produção do cinema nacional. Novo prêmio de direção no 27º Festival de Brasília. Após hiato de seis anos, lança Cronicamente Inviável (2000), seu trabalho mais conhecido. O filme marca um ponto de virada na carreira de Bianchi devido à repercussão de crítica e público. Quanto Vale ou É por Quilo? (2006) aprofunda tópicos do filme anterior, mas sem a mesma repercussão. Os Inquilinos (2009) é um novo sucesso de crítica, recebendo os prêmios de melhor filme e direção no 7º Prêmio Fiesp/Sesi. Lança o longa Jogo das Decapitações, em 2013.

A filmografia de Sérgio Bianchi é marcada, sobretudo, pelas constantes interrogações a respeito dos limites e dos compromissos entre o político e o existencial. Interrogações que perpassam tanto os personagens de suas tramas como atingem o próprio cineasta e a forma dos seus filmes. Quando Maldita Coincidência, seu primeiro longa, é lançado, ganha destaque na crítica impressa justamente esse “enfoque centrado sobre a repercussão individual dos fatos e da sociedade” que assume “a característica de um depoimento sincero e quase bruto”Para além da constatação de o filme parecer um tanto confuso, destaca-se a força do cineasta estreante em canalizar as aflições do seu tempo, então já às voltas com a crise das utopias que definiria as duas últimas décadas do século XX.

Em seu filme seguinte, o curta-metragem Mato Eles?, esse “depoimento quase bruto” se potencializa na própria figura do cineasta que se corporifica em frente às câmeras e se problematiza como narrador, afirmando sua primeira pessoa e sua diferença em relação ao seu objeto: os índios xavantes e guarani. Dentro do documentário brasileiro, que desde os anos 1960 afirma certa solidariedade com os oprimidos para encorpar a crítica social, o filme representa um ponto de inflexão, uma quebra, uma virada lógica, já que “ele exercita a crítica, só que o lugar de onde ele fala também é questionado”, escreve o crítico Jean-Claude Bernardet (1936). Ainda hoje há quem considere, como o próprio Bernardet, sua obra mais relevante.

Muito se espera do longa seguinte do cineasta, ainda mais com a boa recepção a seus curtas subsequentes, como Divina Providência e Entojo (1984). Romance vem a público apenas em 1988. A crítica, especialmente a paulistana, volta a destacar a potência bruta do filme. O escritor Caio Fernando Abreu (1948-1996), roteirista do longa, escreve que no “retrato da corrupção emocional exterior deste país movido a absurdas fantasias, Romance é irregular, sujo, cínico e saturado”. Só que talvez o problema seja justamente esse: Romance é irregular em demasia. Quando a narrativa acompanha os passos de André, um dos três personagens principais da trama, temos um retrato poético da solidão homossexual num mundo tomado pelo fantasma da aids; no entanto, quando a narrativa se desenvolve a partir das outras duas personagens, e do legado deixado por um intelectual de esquerda morto subitamente, o filme emperra. Bianchi parece ainda não ter encontrado uma maneira satisfatória de elaborar dramaticamente a dimensão política dos seus personagens.

Ele vai ensaiar uma nova abordagem do assunto em seu próximo filme, A Causa Secreta. Baseado num conto de Machado de Assis, mestre em desvelar o público através dos afetos privados, o filme acompanha um grupo de teatro que, a pretexto de montar uma peça, pesquisa situações de miséria no país. A dimensão, digamos, intertextual da trama - a peça que pensa a si mesma durante sua própria realização - sugeria um bom modo de conduzir a fatura narrativa, de pesquisar as articulações entre o político e o existencial. Só que, como comentou o crítico Carlos Augusto Calil (1951), Bianchi “não acertou o foco, porque ele quis discutir a dicotomia entre expressão e forma, e ele não é a melhor pessoa para fazer isso”. O filme deixa no espectador a sensação de que importa mais “o que se diz” do que “como se diz”.

Com Cronicamente Inviável, ocorre uma mudança. Nesse filme que “resume, como talvez nenhum outro, o desgosto da classe média intelectualizada com aquilo que foi feito do mundo na última década do século”, Bianchi encontra um modo muito específico de narrar, uma linguagem híbrida, no limite do documentário, que recupera tanto o retrato bruto e poético dos personagens de sua ficção quanto a voz pública e íntima de seus curtas documentais. Quem melhor define este estilo é o crítico Roberto Schwarz (1938): “(...) esse não desenvolvimento do conflito (...) degrada tudo. É uma espécie de truncamento geral, que se transforma em regra de composição estética”. Para Schwarz, cada episódio do filme não leva a lugar algum, não aproveita a lição do anterior, funcionando apenas como reincidência. Ninguém aprende nada: eis a sua lei. Essa estética, que geralmente se mostra conservadora, adquire outra dimensão na obra, pois ela está articulada “a um momento histórico do país, a um momento em que as molas do progresso do país, a sua dinâmica interna, se desmontaram”. Nesse sentido, ela adquire potência crítica. Nenhum outro filme do movimento da retomada é tão impactante quanto Cronicamente Inviável, nenhum outro foi tão discutido e comentado. Quanto Vale ou É por Quilo (2005), seu trabalho posterior, leva adiante esta “estética do desespero”, agora ainda mais sintética e sintomática do “caráter nacional”, pois recupera trechos documentais da nossa história judicial, desde os tempos do Império, reencenando-os dramaticamente como forma de discutir a persistência da escravidão em nossos costumes e mentalidades.

Já em Os Inquilinos, retorna-se a certa estrutura dramática mais fechada e uniforme. Ao acompanhar as desventuras de uma família da classe média baixa às voltas com seus novos vizinhos, Bianchi realiza seu filme mais técnico, mais bem apurado estilisticamente. Livre de certos diálogos rebarbativos presentes em obras anteriores, ele pode finalmente contar uma história a partir de personagens bem construídos, especialmente o protagonista, Valter. Se não tem os arrojos formais de Cronicamente Inviável é seu filme mais bem acabado e envolvente.

Notas

1. Durante a presidência de Collor de Mello (1990-1992), a Embrafilme, empresa estatal que subsidia o cinema nacional, é fechada. Com esse evento e uma série de sanções econômicas, a produção audiovisual entra em declínio.
2. MIRANDA, Luiz Felipe. Dicionário de cineastas brasileiros. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura: Art Editora, 1990. p. 56.
3. SOLER, Marcelo (org.) Quanto vale um cineasta brasileiro? Sérgio Bianchi em palavras, imagens e provocações. São Paulo: Garçoni, 2005.  p. 24.
4. MIRANDA, Luiz Felipe. Idem. p. 56.
5. SOLER, Marcelo (org.). Idem.  p. 50.
6. ORICCHIO, Luiz Zanin. Cinema de novo: um balanço crítico da retomada. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p. 166.
7. SOLER, Marcelo (org.). Idem  p. 19.

Obras 2

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Exposições 1

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Fontes de pesquisa 9

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  • BANHO, Denise; BIANCHI, Sérgio. Geração 68: cinema paulista de 68 a 79. (Catálogo de mostra). São Paulo, Editora do Sesc, 1980.
  • BENAIM, Eduardo; CANNITO, Newton; BIANCHI, Sérgio. Quanto vale ou é por quilo. (Roteiro). São Paulo: Imprensa Oficial, 2008.
  • MIRANDA, Luiz Felipe. Dicionário de cineastas brasileiros. Apresentação Fernão Ramos. São Paulo: Art Editora, 1990, 408 p.
  • MOTTA, Sérgio Vicente. Machado de Assis à luz do cinema de Sérgio Bianchi. In: BUSATO, Susanna: MOTA, Sérgio Vicente (org.). Figurações contemporâneas do espaço na literatura. São Paulo: Editora da Unesp, 2010.
  • NAGIB, Lúcia. O cinema da retomada: depoimentos de 90 cineastas dos anos 90. São Paulo: Editora 34, 2002.
  • OLIVEIRA, Nezi Heverton Campos. O cinema autoral de Sérgio Bianchi: uma visão crítica e irônica da realidade brasileira. (Dissertação de Mestrado). ECA/USP, São Paulo, 2006.
  • ORICCHIO, Luiz Zanin. Cinema de novo: um balanço crítico da retomada. São Paulo: Estação Liberdade, 2003.
  • SOLER, Marcelo (org.) Quanto vale um cineasta brasileiro? Sérgio Bianchi em palavras, imagens e provocações. São Paulo: Garçoni, 2005.
  • VIEIRA, José Luiz (org.). Câmera-faca: o cinema de Sérgio Bianchi. Santa Maria da Feira: Editora do Cineclube da Feira, 2004.

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