Yacunã Tuxá

Yacunã Tuxá, 2022
Texto
Sandy Eduarda Santos Vieira (Rodelas, Bahia, 1994). Artista visual, ilustradora, ativista. Experimenta técnicas digitais para realizar trabalhos que reflitam sua espiritualidade, a memória de seu povo e a sabedoria de suas anciãs. É ativista das causas indígenas, na luta contra o racismo e pela demarcação de terras, e também da causa LGBTQIAPN+. Indígena do povo Tuxá, reflete em suas produções artísticas a identidade do que é ser mulher indígena.
Estuda letras na Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador. Esse espaço urbano e universitário impulsiona sua criação artística para lutar contra o racismo e os estereótipos enraizados sobre os modos de vida indígenas, sobretudo com relação à imagem idealizada das mulheres indígenas presentes na literatura e nas artes visuais brasileiras. A ilustração digital Não somos Iracema (2019) retrata três mulheres trajadas com agasalhos, colares e pinturas tradicionais e cada uma tem uma feição e um cabelo diferente, sendo um cacheado e castanho, outro preto e liso e outro loiro e curto. Essa diversidade representada na obra busca romper com padrões e vem acompanhada da frase “Não somos Iracema”, alusão à personagem do escritor José de Alencar (1829-1877), que reforça uma imagem romântica e idealizada da mulher indígena.
Querença (2022) evoca a ancestralidade, tema muito presente nos trabalhos de Yacunã Tuxá, seja com ilustração digital, seja com outras técnicas, como aquarela, pintura e colagens. A obra apresenta duas mulheres: uma em primeiro plano, menor; outra em segundo plano, maior que a primeira, dando a impressão de proteção. Ao lado das mulheres, há plantas desenhadas e vários olhos pequenos compõem o fundo da tela. Além da ilustração, há um poema escrito pela artista, que também trabalha com a palavra escrita como ferramenta de luta. Os versos “Cresci nos braços da minha mãe, avós, tias, madrinha, primas e irmã. Elas me cuidavam. [...] / Cresci no abraço e aprendi a ser generosa. [...] / O afeto é arma anticolonial.”1 trazem à tona a convivência entre mulheres na cultura indígena e a relação de ensinar-aprender presente nessas trocas afetivas.
A pintura Yacunã Gênesis (2022) traz como elementos centrais a origem e a espiritualidade. A partir do título, entende-se que a obra retrata o nascimento da subjetividade da artista, afirmando-se como mulher indígena que carrega consigo elementos da sua ancestralidade. O próprio nome Yacunã, atribuído à artista pelos encantados2, significa “filha da terra” e marca seu renascimento e afirmação. Ao centro do quadro há uma cuia e, desse objeto, partem três elementos: uma maraca, importante artefato usado nos rituais para marcar o som; folhas da jurema, planta sagrada utilizada nos momentos ritualísticos; uma cobra, elemento que representa sabedoria e espiritualidade. Ainda, grafismos de seu povo estão desenhados às margens e, abaixo da cuia, há uma autorrepresentação e as palavras “Yacunã Gênesis”.
Como mulher indígena e lésbica, também luta para que a afirmação de sua sexualidade não seja alvo de preconceito. A obra Mulher indígena e sapatão (2019) reforça o ativismo pela causa LGBTQIAPN+, com uma mulher indígena desenhada ao centro, carregando no ombro esquerdo a bandeira colorida do movimento.
Participa do programa IMS Convida, promovido pelo Instituto Moreira Salles, com as obras Filhas da terra e suas resistências invisíveis (2020). A expressão da pluralidade das mulheres indígenas está presente nas diversas ilustrações que compõem o projeto, além de um poema sob o título “Filhas da terra” que reforça o caráter de luta, resistência e ancestralidade de seu povo: “tecendo resistências invisíveis / com mil guerreiras a nos acompanhar / com cantos e rezas a nos benzer / nós semeamos a terra.”[3]. As ilustrações apresentam mulheres em diferentes atividades: lutando pelos seus direitos à terra, exercendo o direito de voto ou uma anciã benzendo uma mulher mais jovem. As obras evidenciam a poética de Yacunã que pretende, com sua arte, mostrar a diversidade e ancestralidade indígenas.
É convidada pela artista e curadora Naine Terena (1980) para a exposição Véxoa: Nós Sabemos (2020), apreentada na Pinacoteca do Estado de São Paulo (Pina_), primeira mostra de arte indígena contemporânea desse museu. Participa também de outras exposições coletivas, como Imagens que Não se Conformam (2021), no Museu de Arte no Rio (MAR), no Rio de Janeiro, com obras que têm o objetivo de falar de memória, pertencimento e respeito à terra por parte dos povos originários, além de retratar a força e a resistência das mulheres indígenas. Compõe a mostra digital Palavras Dentro de Palavras (2021), promovida pela Galeria Paralela, também na capital carioca, com colagens digitais, que reúnem fotografias antigas para trazer temas como memória, resistência e denúncia.
Em suas obras, a artista mostra a força, a resistência e a sabedoria das mulheres indígenas contra os estereótipos atribuídos a elas pelo imaginário social. Yacunã Tuxá vê na arte uma forma de luta, equilíbrio e cura, conectando-se consigo e também com a tradição aprendida com o povo Tuxá. A artista faz uso da tecnologia para produção de seus trabalhos, com ilustrações e colagens digitais, que falam de memória, espiritualidade e identidade.
Notas
1. Trecho retirado do poema “Querença”, que acompanha ilustração digital homônima, de 2022. Disponível em: https://www.behance.net/gallery/140021673/Q-U-E-R-E-N-C-A. Acesso em: 20 maio 2022.
2. Para a maioria das culturas indígenas, os encantados são seres que trazem consigo o poder de cura e entram em contato por meio dos rituais sagrados. Para pesquisa mais completa sobre o termo, ver Ferretti (2008), Santos e Silva (2014) e Gondim (2016).
3. Trecho retirado do poema “Filhas da terra” apresentado no projeto Filhas da terra e suas resistências invisíveis, realizado no Programa IMS Convida, do Instituto Moreira Salles, em 2020. Disponível em: https://ims.com.br/convida/yacuna-tuxa/. Acesso em: 19 maio 2022.
Exposições 7
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31/10/2021 - 22/3/2020
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5/2022 - 2/2021
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19/3/2022 - 17/7/2022
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26/8/2022 - 30/10/2022
Exposições virtuais 2
Mídias (1)
Cada voz
A série “Cada voz” é um projeto da "Enciclopédia Itaú Cultural" com registros de depoimentos de artistas de diferentes áreas de expressão, como literatura, música, teatro e artes visuais. Conduzidos pelo fotógrafo Marcus Leoni, os vídeos capturam o pensamento dos artistas sobre seu processo de criação e sua visão sobre a própria trajetória. Os registros aproximam o público do artista, que permite a entrada no camarim, no ateliê ou na sala de escrita.
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Fontes de pesquisa 14
- A ILUSTRADORA Yacunã Tuxá exalta a resistência das mulheres indígenas. Claudia, 20 set. 2020. Feminismo. Disponível em: https://claudia.abril.com.br/feminismo/ilustracao-mulheres-indigenas/. Acesso em: 17 maio 2022.
- ARTE Indígena Contemporânea – Episódio 8: Yacunã Tuxá. Direção: Gisele Kato. Arte1: São Paulo, 2022. (28 min). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=U01OpkGIz7g&ab_channel=InstitutoCulturalVale. Acesso em: 19 maio 2022.
- FERRETTI, Mundicarmo. Encantados e encantarias no folclore brasileiro. In: SEMINÁRIO DE AÇÕES INTEGRADAS EM FOLCLORE, 6., São Paulo, 2008. Anais [...]. São Paulo: Comissão Paulista de Folclore, 2008. Disponível em: http://www.repositorio.ufma.br:8080/jspui/bitstream/1/198/1/Encantados%20e%20encantarias.pdf. Acesso em: 30 maio 2022.
- GONDIM, Juliana Monteiro. Seguindo trilhas encantadas: humanos, encantados e as formas de habitar a Almofala dos Tremembé. 2016. 213 f. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8134/tde-14032017-145349/publico/2016_JulianaMonteiroGondim_VOrig.pdf. Acesso em: 30 maio 2022.
- MOSTRA “Viva Palavra” em espaço inédito. Museu da Língua Portuguesa, São Paulo, 19 ago. 2021. Fique por dentro. Disponível em: https://www.museudalinguaportuguesa.org.br/mostra-viva-palavra-em-espaco-inedito/. Acesso em: 17 maio 2022.
- PALAVRAS DENTRO DAS PALAVRAS [exposição virtual]. Galeria Paralela, 2020. Disponível em: https://www.galeriaparalela.com/palavras-exposicao. Acesso em: 20 maio 2022.
- PROJETO Um outro céu. Página oficial. [sem data]. Disponível em: https://umoutroceu.ufba.br/. Acesso em: 18 maio 2022.
- SILVA, Camila da e MESQUITA, Gabriella. Artistas indígenas fogem dos rótulos: "ninguém aqui é Iracema". TAB, São Paulo, 13 set. 2019. Disponível em: https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2019/09/13/yacuna-tuxa-artista-indigena-ninguem-aqui-e-iracema.htm. Acesso em: 04 jan. 2021.
- SILVA, Camila da; MESQUITA, Gabriella. Artistas indígenas fogem dos rótulos: "ninguém aqui é Iracema". TAB UOL, 13 set. 2019. Sociedade. Disponível em: https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2019/09/13/yacuna-tuxa-artista-indigena-ninguem-aqui-e-iracema.htm.
- SILVA, Camila da; MESQUITA, Gabriella. Artistas indígenas fogem dos rótulos: "ninguém aqui é Iracema". TAB UOL, 13 set. 2019. Sociedade. Disponível em: https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2019/09/13/yacuna-tuxa-artista-indigena-ninguem-aqui-e-iracema.htm. Acesso em: 17 maio 2022.
- SILVA, Gerson Santos e. Encantados da Amazônia: os espíritos da natureza. In: ENCONTRO REGIONAL DE HISTÓRIA DA ANPUH-RIO, 16., Rio de Janeiro, 2014. Anais [...]. Rio de Janeiro: Associação Nacional de História Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: http://www.encontro2014.rj.anpuh.org/resources/anais/28/1400206941_ARQUIVO_ArtigoparaaANPUH,EncantadosdaAmazonia.pdf. Acesso em: 30 maio 2022.
- YACUNÃ Portfólio de trabalhos. Behance, [sem data]. Disponível em: https://www.behance.net/gallery/117862451/Portfolio-de-trabalhos-Yacuna. Acesso em: 19 maio 2022.
- YACUNÃ Tuxá (BA). IMS, 13 nov. 2020. IMS Convida. Disponível em: https://ims.com.br/convida/yacuna-tuxa/. Acesso em: 19 maio 2022.
- YACUNÃ Tuxá: mulher indígena, sapatão e artista em Salvador. Direção: Raquel Franco. TV UFBA: Salvador, 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ngZ0gK-vaNce ab channel=TVUFBA. Acesso em: 18 maio 2022.
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YACUNÃ Tuxá.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa202496/yacuna-tuxa. Acesso em: 04 de maio de 2025.
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