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Enciclopédia Itaú Cultural
Música

A Noiva do Condutor

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 14.06.2024
1985
A Noiva do Condutor (1985) leva quase cinquenta anos para se concretizar como disco. É escrita pelo compositor Noel Rosa (1910-1937) como uma opereta radiofônica e musicada pelo maestro e arranjador húngaro Arnold Glückmann entre 1935 e 1936. Permanece inédita até 1985, quando é gravada por Marília Pera (1943-2015), Grande Otelo (1915-1993) e o ...

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A Noiva do Condutor (1985) leva quase cinquenta anos para se concretizar como disco. É escrita pelo compositor Noel Rosa (1910-1937) como uma opereta radiofônica e musicada pelo maestro e arranjador húngaro Arnold Glückmann entre 1935 e 1936. Permanece inédita até 1985, quando é gravada por Marília Pera (1943-2015), Grande Otelo (1915-1993) e o grupo Coisas Nossas. Assim como o radialista e pesquisador Almirante (1908-1980), herdeiro dos manuscritos, Glückmann tenta realizar a opereta nas rádios carioca e paulista, chegando a cogitar Isaurinha Garcia (1923-1993) para o papel de Helena. O disco de 1985 é fruto de uma pesquisa empreendida por João Máximo (1935) e Carlos Didier (1954), que também assinam a produção, iniciada dois anos antes, durante a elaboração do LP Noel Rosa Inédito e Desconhecido (1983). Esta obra recupera um aspecto desconhecido de Noel: músicas de alta qualidade artistica e letras tecnicamente bem-elaboradas com graciosadidade e o humor requintado.

Em abril de 1935, Noel volta ao Rio de Janeiro, depois de passar três meses em Belo Horizonte, para se tratar da tuberculose. A convite de Almirante, vai trabalhar na Rádio Clube do Brasil, da qual Glückmann é diretor artístico. O maestro dirige um programa de operetas,  gênero leve de teatro musicado, no qual as estrofes cantadas alternam-se com as partes faladas. No programa, operetas vienenses e alemãs são resumidas em trinta minutos e com versos brasileiros, traduzidas pelo cantor Oscar Gonçalves. Na ausência dele, Noel, que colabora com versos de algumas peças, assume o posto. Aproveitando o talento deste compositor para fazer paródias, Almirante concebe um novo programa humorístico: Como se as Óperas Célebres do Mundo Houvessem Nascido Aqui, no Rio... Noel apresenta as paródias-bufas O Barbeiro de Niterói – inspirada na obra O Barbeiro de Sevilha, do compositor italiano Gioachino Rossini (1792-1868) – e o Ladrão de Galinhas. Nestas, os números musicais não passam de paródias de canções populares brasileiras, com textos inspirados nos enredos e personagens das óperas clássicas. A Noiva do Condutor é a única opereta escrita por Noel com temas musicais inéditos.

O enredo passa-se no Rio de Janeiro, no bairro de Cascadura, onde Joaquim corteja a jovem Helena. O pai, doutor Henrique, é contra o romance, mas cede às “Boas Tenções” (faixa 4) do moço, que se declara “rapaz bem-educado”, “cuja família além de dote ainda vai dar mobília”. O primeiro ato encerra-se com o consentimento do pai. No segundo, Helena descobre que Joaquim é condutor de bonde e rompe o namoro. Joaquim implora pelo perdão da moça, mas também se desentende com doutor Henrique. Por fim, aparece o pai de Joaquim, o banqueiro Jota Barbosa, esclarecendo que o filho tinha saído de casa e se tornado condutor para contrariá-lo, por ele se opor ao enlace com Helena. A moça e seu pai demonstram-se novamente interessados e, com a benção de todos, os dois reatam. O finaleto culmina no canto em coro do verso “por isso viva a Deus e chova arroz!”.

Alternando tom coloquial e rebuscamento da fala, a comédia trata de assuntos prosaicos. Estão presentes alguns aspectos datados, como a temática do bonde que, nos anos 1950, acompanha o desuso do meio de transporte, e a etiqueta do namoro dos anos 1930. Eles convivem com outros elementos atemporais, como o choque de gerações, o preconceito contra profissões socialmente menos prestigiadas e a hipocrisia nas relações humanas. Nesse contexto, a mulher é retratada como leviana e interesseira, características recorrentes em outras composições de seu tempo, muitas do próprio Noel.

Composta de oito números originais, a obra apresenta fórmulas clássicas da opereta, com prelúdio e finaleto, escritos por Glückmann a partir da melodia do samba-canção “Tudo Pelo Teu Amor” (faixa 2). Os esboços orquestrais trazem harmonias trabalhadas e linhas melódicas nas quais praticamente não há nota repetida. Noel adapta apenas dois de seus sambas para esta obra. “Cansei de Pedir”, gravado por Aracy de Almeida (1914-1988) em 1935, passa a se chamar “Cansei de Implorar” e “Tipo Zero”, gravado por Marília Batista (1917-1990) nos anos 1950, tem acréscimo de nova estrofe. O poeta da Vila assina algumas músicas e todas as letras, nas quais demonstra sua habilidade em verso, como “linda flor de Cascadura” (“Tudo Pelo Teu Amor”), marcado pela ambiguidade, pois se refere ao bairro e à postura da moça. O restante fica por conta de Glückmann, que escreve partitura variada, em que figuram gêneros populares no período, entre os quais marcha (“Joaquim é Condutor”, “Tudo nos Une”), fox-blue (“Perdoa Este Pecador”), e valsa (“Boas Tenções”).

Lançado em LP pelo selo Eldorado, conta com Marília Pêra como Helena, Grande Otelo como doutor Henrique, Carlos Didier (1954) como Joaquim e Oscar Bolão (1954) como Jota Barbosa. Os dois últimos também participam da instrumentação do disco. Conta, ainda, com arranjos do cavaquinista Henrique Cazes (1959) e do tecladista Aluísio Didier (1956), que dão uma roupagem moderna à pauta de Glückmann.

No disco, as partes faladas do texto original para o rádio são reduzidas, e a narrativa musical é explorada. A escolha dos intérpretes não é gratuita. Grande Otelo, ator, cantor e compositor ligado ao rádio e às comédias populares nas décadas anteriores, é famoso por papéis cômicos, humor sagaz e habilidade na improvisação, trabalhando expressão corporal, vozes e trejeitos. Atriz, cantora e bailarina de uma geração posterior, Marília Pera protagoniza, em 1972, a cantora Carmen Miranda (1909-1955) no espetáculo A Pequena Notável, trazendo a brejeirice desejada para o papel da noiva Helena. O álbum é relançado em CD em 1995.

Fontes de pesquisa 5

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  • A Noiva do Condutor. In: KFOURI, Maria Luiza. DISCOS do Brasil. Disponível em: http://www.discosdobrasil.com.br/discosdobrasil/consulta/detalhe.php?Id_Disco=DI01475. Acesso em: 20 dez. 2014.
  • ALMIRANTE (Henrique Foreis Domingues). No Tempo de Noel Rosa. 3 ed. Rio de Janeiro: Sonora, 2013.
  • MÁXIMO, João; DIDIER, Carlos. Noel Rosa: uma biografia. Brasília: Linha Gráfica Editora: Editora UnB, 1990.
  • ROSA, Noel. A Noiva do Condutor. São Paulo: Terceiro Nome, 2010.
  • TINHORÃO, José Ramos. Música Popular: um tema em debate. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora 34, 1997.

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