João Ubaldo Ribeiro
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Viva o Povo Brasileiro, 1984
João Ubaldo Ribeiro
Texto
João Ubaldo Osório Pimentel Ribeiro (Itaparica, Bahia, 1941 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014). Romancista, contista, cronista, roteirista e jornalista. A vasta obra de João Ubaldo se caracteriza pela genialidade do escritor na manipulação das palavras não apenas para refletir sobre questões tipicamente brasileiras, mas também para compor o imaginário do que é a brasilidade.
João Ubaldo inicia a carreira jornalística em 1957, como repórter no Jornal da Bahia. Torna-se bacharel em direito pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) em 1962 e recebe uma bolsa da embaixada norte-americana para realizar o mestrado em administração pública e ciência política na Universidade da Califórnia. De volta ao Brasil em 1965, leciona ciência política na UFBA, atividade que desempenha até 1971.
Estreia em livro em 1968 com o romance Setembro Não Tem Sentido, mas o reconhecimento de crítica e público vem apenas em 1971, com o lançamento de Sargento Getúlio. Esse romance se passa na década de 1950, no Brasil, quando se digladiam a União Democrática Nacional (UDN) e o Partido Social Democrático (PSB). Getúlio, o narrador protagonista, tem a tarefa de conduzir um prisioneiro do interior do Sergipe à capital do estado, Aracaju. A narrativa se desenvolve ao longo do percurso, com predomínio da primeira pessoa, em um quase ininterrupto monólogo.
Na linguagem que simula a oralidade nordestina – construída sobre neologismos, reproduções dos desvios da norma culta e frases entrecortadas –, a violência do meio e a precariedade psicológica dos próprios personagens são retratadas com intensidade. Getúlio, bruto e ignorante, não chega a compreender o jogo político no qual ele mesmo, sendo militar, atua: “Não gosto de jornal como vosmecê, acho difícil, muitas palavras. Menas verdades. Udenistas, comunistas. Comunistas udenistas”, diz ao preso, capturado pelas intrigas partidárias.
Em Sargento Getúlio, percebe-se o interesse de João Ubaldo Ribeiro em investigar a existência de uma identidade nacional e as relações entre vida individual e destinos coletivos da nação. A obra leva a crítica especializada a definir o autor como alguém que mescla a preocupação social de Jorge Amado com a invenção linguística de João Guimarães Rosa (1908-1967), como escreve Luciana Stegagno-Picchio.
O livro rende a João Ubaldo o prêmio Jabuti, em 1972, e é o marco da primeira fase do escritor. Sua riqueza regionalista é tão fiel à realidade que é difícil traduzi-lo para o inglês, o que obriga o próprio autor a fazê-lo. Com ele, João Ubaldo inaugura sua forte presença no cenário internacional. Ao longo de sua carreira, colabora para diversos jornais em outros países, e também publica alguns de seus livros no exterior e é constantemente lembrado pela crítica literária. Dois momentos importantes, nesse aspecto, são a participação do autor, em 1979, como convidado, do International Writting Program, da Universidade de Iowa, e, dois anos depois, como bolsista da Fundação Calouste-Gulbenkian em Lisboa.
Na segunda fase da produção de Ribeiro, a inventividade linguística se mantém, mas os romances se estruturam tradicionalmente. Viva o Povo Brasileiro (1984), que alcança grande sucesso de público e marca esse segundo momento, almeja abarcar mais de 300 anos da história do país, da colonização à contemporaneidade, em busca declarada de algo que defina a identidade nacional. Ao plano que se quer histórico une-se o fantástico, iniciado no “Poleiro das Almas”, em que estas esperam pela encarnação. Todo o livro se desenvolve nessa dicotomia, com uma dessas almas reencarnando sucessivamente e conduzindo a trama de 1647, quando os holandeses chegam à Ilha de Itaparica, na Bahia, até 1977, quando recrudesce o regime militar. Dicotomia é o que ocorre também no âmbito da linguagem. As fontes eruditas se alternam com as populares, e a estrutura considerada comercial convive com a sofisticada intertextualidade. O livro rende o segundo prêmio Jabuti ao autor, em 1984.
Nos livros que se seguem a Viva o Povo Brasileiro, esse movimento é ainda mais amplificado. Em o O Sorriso do Lagarto (1989), suspense que conta com um triângulo amoroso e é adaptado para a televisão, e A Casa dos Budas Ditosos (1999), que alcança amplo sucesso de público, o autor se aproxima cada vez mais do que Haroldo de Campos chama de “fabulista do significado” – isto é, mostra-se cada vez mais interessado nas intrigas narrativas, em detrimento das reflexões sobre a linguagem.
Apesar do sucesso desses e de outros romances, João Ubaldo Ribeiro é mais conhecido por sua produção como cronista. De acordo com o professor João Luís Ceccantini, o escritor tem a capacidade de transformar uma pequena questão em uma reflexão ampla, além de um exímio conhecimento da linguagem, o que lhe permite manipulá-la para construir críticas duras com uma ironia fina1. A professora Denise Salim Santos, por sua vez, ressalta a importância dessa destreza linguística de João Ubaldo para produzir o humor, chamando-o de um “alquimista das palavras” que subverte o sério em busca do prazer2.
Seja por suas crônicas, seja por seus romances, João Ubaldo Ribeiro constitui-se como um dos maiores nomes da literatura brasileira, e, inclusive, é eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1993. É um escritor que contribui para a formação de uma identidade nacional e para o reconhecimento do que é ser brasileiro, considerando nossas misérias e riquezas, sempre com humor.
Notas
1. CARNEIRO, Raquel. “O João Ubaldo cronista tinha uma independência intelectual incomum no Brasil”, diz especialista. Veja, São Paulo, 18 jul. 2014. Disponível em: https://veja.abril.com.br/blog/meus-livros/o-joao-ubaldo-cronista-tinha-uma-independencia-intelectual-incomum-no-brasil-diz-especialista/. Acesso em: 20 set. 2020.
2. SANTOS, Denise Salim. A palavra e o riso nas crônicas de João Ubaldo Ribeiro. Caderno Seminal Digital, ano 18, n. 18, v. 18, p. 174-185, jul./dez. 2012.
Obras 1
Espetáculos 6
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6/2/2004 - 15/2/2004
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8/7/2016 - 17/7/2016
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10/3/2017 - 26/3/2017
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1/4/2017 - 2/4/2017
Mídias (2)
Links relacionados 1
Fontes de pesquisa 10
- CADERNOS de literatura nº 7. João Ubaldo Ribeiro. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 1999.
- COUTINHO, Wilson. João Ubaldo Ribeiro: um estilo da sedução. Rio de Janeiro: Relume Damará: Prefeitura, 1998.
- JOÃO UBALDO. Biografia. Disponível em < http://www.releituras.com/joaoubaldo_bio.asp>. Acesso em: 13 nov. 2006.
- JOÃO Ubaldo Ribeiro. In: Academia Brasileira de Letras. Disponível em: https://www.academia.org.br/academicos/joao-ubaldo-ribeiro/biografia. Acesso em: 20 set. 2020.
- MIYAZAKI, Tieko Yamaguchi. Um tema em três tempos: João Ubaldo Ribeiro, João Guimarães Rosa, José Lins do Rego. São Paulo: Editora Unesp, 1996.
- Morre no Rio o escritor João Ubaldo Ribeiro. In G1. Disponível em: < http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2014/07/morre-no-rio-o-escritor-joao-ubaldo-ribeiro.html>. Acesso em: 18 jul 2014.
- PASTA JÚNIOR, José Antonio. Prodígios de ambivalência: notas sobre viva o povo brasileiro. In: Novos Estudos - Cebrap. São Paulo, n. 64, novembro de 2002. p. 61-71.
- Programa do Espetáculo - A Casa dos Budas Ditosos - 2003.
- SANTOS, Denise Salim. A palavra e o riso nas crônicas de João Ubaldo Ribeiro. Caderno Seminal Digital, ano 18, n. 18, v. 18, p. 174-185, jul./dez. 2012. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/cadernoseminal/article/view/11886/9311. Acesso em: 20 set, 2020.
- SILVERMAN, Malcom. As distintas facetas de João Ubaldo Ribeiro. In: _____. Moderna ficção Brasileira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1981.
Como citar
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JOÃO Ubaldo Ribeiro.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa7658/joao-ubaldo-ribeiro. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7