Gê Viana
Texto
Geane Viana de Sousa (Santa Luzia, Maranhão, 1986). Fotógrafa, performer, pesquisadora. Suas obras são marcadas pela crítica à cultura hegemônica e pelo uso de diversas técnicas artísticas, como a fotografia, a colagem e o "pixo"1
Nascida no povoado Centro de Dede, em Santa Luzia (Maranhão), cresce na divisa entre as regiões Norte e Nordeste, rodeada por territórios e culturas indígenas: o Caru e o Alto Turiaçu, habitado pelas etnias Awa Guajá, Ka'apor e Tembé. Caçula de dois irmãos, filha de agricultor e empregada doméstica, aos 12 anos migra com a família para a capital maranhense.
Forma-se no Centro de Artes Cênicas do Maranhão e começa a ministrar oficinas e a participar de espetáculos como intérprete, criadora e produtora. Desde jovem, transita pelo mundo da pichação. Sua relação com essa expressão artística se mostra ora na tentativa de ocupar diretamente as ruas da cidade, ora incorporando a técnica na produção de obras destinadas a espaços expositivos tradicionais.
Entre 2009 e 2011, participa da peça O escravocrata, premiada no Festival Maranhense de Teatro Estudantil; realiza a residência "Projeto Vivências Artivismo, Corpo&Anticorpo", no Teatro de Operações, no Rio de Janeiro; integra o elenco de O fingidor em experimentações, em cartaz no Festival Fringe de Teatro de Curitiba, no X Encontro Humanístico e na IV Feira do Livro, esses dois últimos em São Luís.
Em 2010, cria a mostra fotográfica Um Olhar – Novas Perspectivas, para a pré-Bienal da União Nacional dos Estudantes (UNE). Ao retratar casarões abandonados, suas obras abordam as mudanças do espaço urbano. A partir desse projeto, inicia seu primeiro espetáculo solo, Abre e fecha – Uma alegoria 3x3, pelo qual ganha o prêmio do Júri Técnico do Salão de Artes Plásticas de São Luís em 2012.
Em 2014,desenvolve o projeto editorial "Assim fica claro: roubo, colo e pixo!", para a revista Insight Photo. Nesse trabalho, conjuga retratos antigos e fotografias de casas localizadas em bairros pobres e periféricos. As imagens têm por objetivo explicitar a complexidade de visões sobre a miséria, pois, apesar do contexto habitacional precário, os retratados se divertem. Em 2015, o projeto ganha o Prêmio do Júri Técnico do Salão de Artes Plásticas de São Luís e é exposto na Galeria Trapiche, equipamento cultural da prefeitura da capital maranhense.
A residência com o coreógrafo Marcelo Evelin (1962) e a relação mais intensa com o “pixo” marcam esse período. Em 2016, a residência resulta na obra Batucada, contemplada com o Prêmio Funarte de Dança Klauss Viana, com estreia nacional em Teresina, Piauí. O projeto possibilita que a artista mescle dança e pichação como modalidade de expressão corporal. No ano seguinte, cria a performance Corpografias do pixo, exibida no Junta – Festival Internacional de Dança, também na capital piauense. Com colaboração da coreógrafa e bailarina Márcia de Aquino, ambas reescrevem as narrativas e caligrafias urbanas, para demonstrar a possibilidade de mulheres se sentirem livres no espaço público.
Ainda em 2017, trabalha na série Paridade, utilizando a técnica de fotomontagem para abordar o reencontro com a cultura indígena. No projeto, busca traçar semelhanças entre indivíduos indígenas do passado e do presente. A série também denuncia os estereótipos e o genocídio dos povos originários. As obras consistem de lambe-lambes colados em muros de centros urbanos. O projeto é exposto de forma individual na Galeria de Arte Sesc, em São Luís, em 2017; e nas coletivas Valongo Festival Internacional de Fotografia de Santos (São Paulo), em 2017, e Festival de Fotografia de Tiradentes (Minas Gerais), em 2018.
Contemplada com o prêmio de residência artística do Programa Bolsa Pampulha, desenvolve, entre 2018 e 2019, pesquisas sobre a cultura da cana-de-açúcar e do canavial e sobre as possibilidades de ressignificação sócio-histórica desses elementos: a artista propõe construção de objetos nos quais a cana-de-açúcar e o cristal selenita se transformam em adereços utilizados por mulheres periféricas, como símbolo de poder e transformação social. A performer Eliza Afrofuturista é convidada para posar em um canavial e representar o poder de cura de tais ornamentos.
Em 2019, ano de sua graduação em Artes Visuais pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Corpografias do pixo é selecionada para a mostra coletiva À Nordeste, no Sesc 24 de Maio, em São Paulo, com obras de mais de 160 artistas. Também são incluídos seis lambe-lambes de Paridade na exposição. No mesmo ano, participa do 36º Panorama da Arte Brasileira, intitulado Sertão, no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP), com o trabalho Retiro de caça ou um outro capelobo. Nessa obra, seu corpo nu, rodeado de cães de caça em uma mata, denuncia a violência de homens brancos ao laçarem, raptarem e estuprarem mulheres indígenas. Na mitologia maranhense, o capelobo é um lobo com corpo de homem e focinho de tamanduá, um ser que habita esse lugar de caça. A artista constrói seu próprio capelobo para evocar a história de violências contra mulheres nativas e gerar uma nova mitologia de proteção às vítimas.
Em Sapatona, de 2020, intensifica a pesquisa sobre a sexualidade, conferindo um tom de felicidade e amor às colagens para combater a lesbofobia e a transfobia. No mesmo ano, é vencedora do Prêmio Pipa, coroando uma trajetória que articula outras narrativas protagonizadas por mulheres para abarcar toda sua complexidade social, cultural e subjetiva.
A artista maranhense Gê Viana articula as linguagens do teatro, da performance, da fotografia, da fotocolagem e da pichação para abordar sua experiência de mulher periférica de ascendência indígena, tematizando os marcos identitários de gênero, raça e orientação sexual para oferecer narrativas contra-hegemônicas da arte e da história brasileiras.
Notas
1. Pixo, termo equivalente à pichação e forma como a própria artista denomina seu trabalho.
Espetáculos 3
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7/11/2009 - 29/3/2008
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7/11/2009 - 29/3/2008
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7/11/2009 - 29/3/2008
Exposições 15
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17/8/2019 - 17/11/2019
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21/8/2022 - 30/1/2021
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1/9/2021 - 22/11/2021
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15/12/2022 - 7/3/2021
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19/3/2022 - 21/5/2022
Exposições virtuais 1
Fontes de pesquisa 13
- 36º PANORAMA da Arte Brasileira: Sertão. São Paulo: Museu de Arte Moderna, 2021. Disponível em: https://mam.org.br/exposicao/36o-panorama-da-arte-brasileira-sertao/. Exposição realizada no período de 17 ago. a 17 nov. 2019. Acesso em: 05 jun. 2021.
- Ancestral: Afro-Américas [Estados Unidos e Brasil]. São Paulo: Museu de Arte Brasileira (MAB-Faap), 2024. Disponível em: https://www.faap.br/mab/exposicao/ancestral-afro-americas/. Acesso em: 20 nov. 2024.
- BULHÃO, H. L. J. Revista Insight Photo #3. São Luiz: Objeto Contemporâneo, 2014. Disponível em: https://issuu.com/revistainsightphoto/docs/revista_insight_photo__3. Acesso em 27 out. 2021.
- ENCRUZILHADAS da Arte Afro-brasileira. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil, 2023. 1 press release. Disponível em: https://ccbb.com.br/sao-paulo/programacao/encruzilhadas-da-arte-afro-brasileira/. Acesso em: 30 dez. 2023.
- Exposição "Atos de revolta: outros imaginários sobre independência": 17 set. 2022 a 26 fev. 2023. ArtSoul, 2023. Disponível em: https://artsoul.com.br/revista/eventos/exposicao-atos-de-revolta-outros-imaginarios-sobre-independencia. Acesso em: 06 jan. 2023.
- GÊ VIANA. JA.CA. Belo Horizonte, 2019. Disponível em: https://www.jaca.center/ge-viana-br/. Acesso em: 27 out. 2021.
- GÊ Vianna. Prêmio PIPA, [Rio de Janeiro], 2021. Disponível em: https://www.premiopipa.com/ge-viana/. Acesso em: 30 out. 2021.
- INSTITUTO DE ESTUDOS BRASILEIROS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Exposição - Watú não está morto! São Paulo, 21 jun. 2022. Disponível em: https://www.ieb.usp.br/watu/. Acesso em: 22 jun. 2022.
- INSTITUTO DE ESTUDOS BRASILEIROS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Watú não está morto! [convite virtual]. Mensagem recebida por enciclopedia@itaucultural.org.br em 21 jun. 2022.
- PAIVA, Lara. Mostra revê semelhanças e diferenças da diáspora negra ao aproximar a arte brasileira da americana. Folha de S. Paulo, São Paulo, 20 nov. 2024. Ilustrada. p.B6-B7.
- RAHE, Nina. Os artistas Gê Viana e Gustavo Caboco constroem suas trajetórias a partir da compreensão da própria ancestralidade. Select, v. 10, n. 50, abr.-maio-jun. 2020. Disponível em: https://www.select.art.br/plantar-o-corpo/. Acesso em: 25 out. 2021.
- VERAS, L. Gê Viana: corpografias e performances. Continente, n. 239, nov. 2020. Disponível em: https://revistacontinente.com.br/edicoes/239/ge-viana. Acesso em: 29 out. 2021.
- VIANA, C. Gê Viana: a busca pela paridade em povos indígenas. About Light, 1 mar. 2018. Disponível em: https://aboutlightblog.wordpress.com/2018/03/01/ge-viana-a-busca-pela-paridade-em-povos-indigenas/. Acesso em: 29 out. 2021.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
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GÊ Viana.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa636733/ge-viana. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7