Elisa Lucinda
Texto
Elisa Lucinda (Cariacica, Espírito Santo, 1958). Escritora, atriz, cantora, jornalista, professora. Artista versátil e atenta às questões sociais brasileira, estrutura sua carreira, desde a década de 1980, com fluidez e trânsito entre diferentes expressões e linguagens artísticas, todas mediadas por seu principal instrumento de trabalho: a poesia.
Formada em Comunicação Social pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), exerce a profissão de jornalista até 1986, quando decide se mudar para o Rio de Janeiro e concretizar o sonho, alimentado desde a infância, de se tornar atriz. Durante os últimos anos da década de 1980 e os primeiros da década de 1990, trabalha em peças de teatro e filmes nacionais, consolidando a sua trajetória como atriz e recebendo prêmios em importantes festivais de cinema, como o de atriz revelação no Festival de Cinema de Brasília, em 1989. Nesse mesmo ano, estreia no teatro com Rosa, um musical brasileiro, do diretor Domingos Oliveira (1936-2019). Recebe convites para participar de algumas produções na televisão e estreia na novela Kananga do Japão (1989), da diretora Tizuka Yamasaki (1949), exibida pela TV Manchete.
Simultaneamente à carreira de atriz, firma sua trajetória também na literatura. Ao se dedicar ao estudo de interpretação teatral, conecta a prática cênica ao trabalho com as palavras, alicerce fundamental de sua expressão artística. Em 1992 lança o primeiro livro de poemas A lua que menstrua, publicado de maneira independente. A essa primeira publicação, seguem-se mais 17 obras de gêneros variados, como poesia, prosa poética, texto teatrais e romances. Em 2010, publica Parem de falar mal da rotina, adaptação literária do texto da peça homônima de 2002, escrita, atuada e dirigida por ela, e que se torna um grande sucesso de público. A peça rememora, de maneira cômica, histórias vividas por Elisa, que narram as pequenas belezas ordinárias que compõem o cotidiano. Em 2016, lança seu primeiro romance Fernando Pessoa, cavaleiro do nada, pela Editora Record. Escrito como uma espécie de autobiografia ficcionalizada do célebre autor português, o livro recebe reconhecimento de importantes nomes da literatura, como o escritor moçambicano Mia Couto (1955), que assina o prefácio da obra.
Muito embora seja autora de diversos livros, uma das características mais importantes da criação literária da escritora é, sobretudo, a capacidade de apresentar a poesia falada, de maneira popular, com traços de oralidade que aproximam o poema do público ao mesmo tempo em que aproxima o público da poesia, democratizando a prática da escrita lírica.
Uma poesia contada, falada, cantada, que retira os contornos cerimoniosos que, por vezes, parecem querer definir o fazer poético. O escritor Nei Lopes (1943) chama a atenção para essa qualidade da obra da artista ao afirmar que ela “acredita que o fazer poético precisa desmistificar a memorização sem reflexão de quem leva a poesia para uma audiência".1 Esse modo de atuar a poesia é bem recebido em sua chegada ao Rio de Janeiro, em meados da década de 1980: enquanto estuda teatro, atua em bares e pequenos shows, apresentando seus poemas e cativando um público que se interessa por seus textos publicados, o que lhe garante algum retorno financeiro da poesia e o incentivo necessário para a continuidade de sua escrita. Conhecida não apenas como atriz, mas também como poeta e cantora, essas atividades lhe abrem possibilidades para atuar em outras frentes de trabalho. Participa ainda de produções que a aproximam da música, tanto no teatro como na televisão, interpretando personagens como as cantoras Pérola, da novela Mulheres apaixonadas (2010), dirigida por Manoel Carlos (1933), e Ester Rios da peça L., o musical (2017), do diretor Sérgio Maggio (1967), que esteve em cartaz nas grandes capitais do país.
Como mulher negra, a artista também tem olhar atento à realidade brasileira, em especial à da população ainda marginalizada. Voz atuante nos debates sobre racismo e feminismo, participa de algumas estratégias de promoção de cidadania e formação de leitores. A Casa Poema, por exemplo, fundada por ela e pela atriz Geovana Pires no Rio de Janeiro em 2008, oferece cursos e aulas de poesia falada, com foco em grupos minorizados, como mulheres e pessoas negras, e prioriza a contratação de pessoas trans. Em 2009, recebe do Senado Federal o prêmio Mulher Cidadã Bertha Lutz, em reconhecimento ao seu trabalho como escritora e ativista dos direitos das mulheres.
Sua atuação no teatro, cinema e televisão continua ativa nas décadas seguintes, com participações em diversas telenovelas, séries e programas na televisão, além de mais de 15 filmes nacionais, como o premiado A última estação (2012), do diretor Marcio Curi (1947-2016), e Por que você não chora? (2019) da diretora Cibele Amaral, pelo qual ganha o prêmio especial do júri do 48º Festival de Cinema de Gramado, em 2020.
Artesã da palavra, a atuação de Elisa Lucinda está intimamente ligada ao fazer poético como possibilidade de inscrição no mundo, por meio da expressão cênica, musical ou literária. A pluralidade que imprime à sua trajetória sinaliza a importância da autoria da poesia falada que ela incorpora em sua carreira e demarca uma persona artística engajada e múltipla.
Notas
1. LOPES, Nei. Afro-Brasil reluzente: 100 personalidades notáveis do século XX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2019, p. 174.
Obras 14
Espetáculos 7
Fontes de pesquisa 5
- ANDRADE, Isabelle de. L., o musical reúne forte elenco de atrizes e estreia nesta quinta. Correio Braziliense, Brasília, 10 ago. 2017. Caderno Diversão e Arte. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-e arte/2017/08/10/interna_diversao_arte,616545/l-o-musical-estreia-nesta-quinta.shtml. Acesso em: 21 ago. 2021.
- DICIONÁRIO CRAVO ALBIN DE MÚSICA POPULAR BRASILEIRA. Verbete Elisa Lucinda. Disponível em: https://dicionariompb.com.br/elisa-lucinda/biografia. Acesso em: 20 ago. 2021.
- ESTAÇÃO Sabiá entrevista Elisa Lucinda. [Entrevista cedida à] Regina Zappa. São Paulo, TV 247, 9 maio 2019. (57 min). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=PWJMVsraeRk. Acesso em: 20 ago. 2021.
- LOPES, Nei. Afro-Brasil reluzente: 100 personalidades notáveis do século XX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2019.
- REFERÊNCIA. Direção: Ricardo Bravo. Rio de Janeiro, Bravofilmes, 1988. (12 min), son., color. Disponível em: https://portacurtas.org.br/filme/?name=referencia. Acesso em: 21 ago. 2021.
Como citar
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ELISA Lucinda.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa5980/elisa-lucinda. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7