Carlos Lemos
Texto
Carlos Alberto Cerqueira Lemos (São Paulo, São Paulo, 1925). Arquiteto, pintor, historiador e professor. Forma-se na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie (Faum), em 1950. Em 1948, faz o projeto de decoração para o apartamento do jornalista Octavio Frias de Oliveira (1912-2007), que o convida para desenvolver o edifício Paris-Roma-Rio (1952), o Teatro Maria Della Costa (1954) e o prédio do Banco Nacional Imobiliário (BNI).
Frias confia a Lemos, em 1952, a coordenação do escritório paulista de Oscar Niemeyer (1907-2012), responsável por outros projetos do BNI em São Paulo. Com a saída de Niemeyer, em 1957, Lemos dá continuidade aos projetos do escritório e concebe o edifício-sede do Bradesco (1962). Além dessas obras, trabalha na seção de Engenharia Sanitária do Departamento de Saúde do Estado (c. 1950 – c. 1968), dedica-se à pintura e desenvolve projetos em seu escritório particular até os anos 1990.
Como pintor, expõe no Salão do Sindicato dos Artistas Plásticos, em 1947 e 1948, em São Paulo. Em 1949, integra o 55º Salão Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Em 1967, realiza exposição individual na galeria Astreia, em São Paulo. No ano seguinte, expõe no 17º Salão Paulista de Arte Moderna, na mesma cidade. É premiado no 4º Salão Paulista de Arte Contemporânea, no Museu de Arte de São Paulo (Masp), em 1972. Em 1973 e 1976, participa do Panorama de Arte Atual Brasileira, no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP). Entre 1961 e 1967, apresenta obras na Bienal Internacional de São Paulo e, entre 1968 e 1971, integra o Salão de Arte Contemporânea de Campinas, São Paulo.
A carreira como professor começa em 1954, como assistente da disciplina teoria da arquitetura, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP), a convite do arquiteto Eduardo Corona (1921-2001), que o conhece no escritório de Niemeyer. Por meio de Corona, Lemos inicia o trabalho como pesquisador, desenvolvendo com o colega duas obras fundamentais para a história da arquitetura no país: Dicionário da Arquitetura Brasileira (1972) e Arquitetura Moderna Paulistana (1983), esta última em colaboração com Alberto Xavier, ambas publicadas originalmente em fascículos na Revista Acrópole.
Publica vários livros de igual importância: Cozinhas, etc. (1976), tese de doutorado defendida em 1973 na FAU/USP; Arquitetura Brasileira (1979); O que É Arquitetura (1980); O que É Patrimônio Histórico (1981); Alvenaria Burguesa (1986), tese de livre-docência defendida na FAU/USP, em 1984; Ramos de Azevedo e seu Escritório (1993), prêmio Jabuti na categoria ensaios, em 1994; Casa Paulista (1999); e A República Ensina a Morar (Melhor) (1999).
Aposentado como professor-titular do Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto em 1988, Lemos continua a dar aulas na pós-graduação. Entre outras atividades, atua no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), entre 1969 e 1979 e na direção do Museu de Arte Sacra de São Paulo. Também colabora com o jornal a Folha de S.Paulo e participa do International Council of Monuments and Sites [Conselho Internacional de Monumentos e Sítios] (Icomos) e no Comitê Brasileiro de História da Arte. Em 2005, lança o livro de memórias Viagem pela Carne.
Análise
A experiência como pintor e arquiteto, central para formação e engajamento disciplinar de Carlos Lemos, não ofusca a vocação mais profícua: a docência e a pesquisa. Os primeiros anos de atuação, contudo, são marcados pelo trabalho como diretor do escritório paulista de Oscar Niemeyer. De 1952 a 1957, coordena projetos importantes da filial, como a Galeria Califórnia (1951-1955) e os edifícios Montreal (1951-1954), Eiffel (1953-1956) e Copan (1951-1970), além de participar de outro projeto de Niemeyer na cidade: o Parque Ibirapuera (1951-1954).
A partir de 1957, quando Niemeyer desliga-se do BNI, até a década de 1970, Lemos dá continuidade e reformula alguns desses projetos, com a substituição do hotel do Copan pelo edifício-sede do Bradesco (1962), de sua autoria. Ao contrário do que se passa com arquitetos de sua geração, Lemos não fica preso à linguagem e às propostas do arquiteto carioca. A partir dos anos 1960, dedica-se a seu escritório e realiza obras como a residência Luís Eduardo Magalhães Gouvea, em 1961, ao lado de Eduardo Corona. Notável pela estrutura triangular em concreto armado aparente, que define a zona de repouso, separando-a das zonas de estar e de serviço, distribuídas em volume horizontal retangular, a residência aproxima o trabalho de Carlos Lemos da chamada “escola paulista”.
Mas é em 1962, com a residência em Ibiúna, que o arquiteto define um caminho de experimentação próprio. A primeira versão do projeto segue a linha da casa anterior, com uma grande estrutura em concreto armado aparente, que se revela muito dispendiosa. Diante da limitação orçamentária e da sugestão do empreiteiro de utilizar técnicas e materiais empregados nas casas populares locais, Lemos reelabora o projeto e adota tijolos, telhas de barro e toras de eucalipto. Dessa forma, o concilia os pressupostos modernistas às experiências tradicionais, em interpretação própria, mais afinada com a arquitetura bandeirista do que com a arquitetura colonial mineira, matriz das experiências de Niemeyer e Lucio Costa (1902-1998).
A casa de Lemos, projetada por volta de 1975, na Praia Vermelha, Ubatuba, e a residência João Batista Munhós, de 1977, seguem esse novo caminho. Desde 1956, quando começa a escrever, ao lado de Corona, o Dicionário de Arquitetura da Revista Acrópole (publicado em 1972 como Dicionário da Arquitetura Brasileira), o arquiteto realiza diversas viagens pelo Brasil e amplia o repertório arquitetônico. Se as viagens e a prática projetual lhe apontam outras formas de fazer arquitetura, para além do concreto armado, é certo também que elas abrem caminho para um dos flancos de pesquisa mais recorrentes de sua carreira.
Segundo o arquiteto, é no município paulista de Iguape, entre 1958 e 1959, que ele começa a se interessar pelas “questões ligadas aos modos de morar ao longo da história brasileira”, objeto de sua tese de doutorado, Cozinhas, etc. O tema desdobra-se em outras pesquisas, como a realizada em 1972, com a colega da FAU/USP, a socióloga Maria Ruth Amaral Sampaio, sobre as casas operárias autoconstruídas na periferia paulistana. O trabalho resulta no relatório Pesquisas sobre Habitação Popular 1964-1965 (1976) e no livro Habitação Popular Paulistana Autoconstruída (1978), publicado em coautoria com Sampaio. O mesmo assunto é estudado na tese de livre-docência, Alvenaria Burguesa (1984), e nas pesquisas que dão origem aos livros publicados em 1999: Casa Paulista e A República Ensina a Morar (Melhor). A motivação central desses trabalhos é compreender a casa popular para colher elementos que subsidiem projetos e políticas habitacionais mais adequadas à realidade brasileira e de melhor qualidade do que a financiada pelo Banco Nacional de Habitação (BNH) entre os anos de 1960 e 1970
Do compromisso com a prática projetual expresso na tese de doutorado, Lemos passa a se dedicar mais à pesquisa, concentrando-se no trabalho como professor e historiador da arquitetura. Nesse campo, distancia-se da explicação então hegemônica na historiografia sobre a produção arquitetônica nacional, presente em seu livro Arquitetura Brasileira (1979). Dedica-se a todas as formas de arquitetura e urbanismo, sem hierarquia de estilos, preocupando-se em compreendê-las com base no contexto social, político, econômico e cultural.
Para além da arquitetura moderna e colonial, Lemos dá atenção à produção acadêmica, notadamente a eclética e a neocolonial, desprezadas por aquela historiografia. Suas pesquisas deixam de ser operativas, no sentido de servirem diretamente ao projeto, para se afirmarem como investigações historiográficas. A ampliação dos objetos de pesquisa, o desenvolvimento de novas perspectivas analíticas e o trabalho com fontes documentais torna a atuação de Carlos Lemos importante e coloca-o entre aqueles que constituem o campo da história da arquitetura e do urbanismo no Brasil.
Nas artes plásticas, Lemos atua desde os anos 1940, mas se projeta na cena artística nas décadas de 1960 e 1970. Suas obras encontram-se no limite entre figuração e abstração, e dialogam com a construção poética de trabalhos do artista suíço Paul Klee (1879-1940).
Exposições 26
Fontes de pesquisa 25
- 150 anos de pintura no Brasil: 1820-1970. Rio de Janeiro: Colorama, 1989.
- BARIANI, Márcio. A vida e obra de Carlos Lemos. Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, nov. 2011. Disponível em: http://www.revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/184/imprime142811.asp. Acesso em: 10 nov. 2011.
- DICIONÁRIO brasileiro de artistas plásticos. Organização Carlos Cavalcanti e Walmir Ayala. Brasília: Instituto Nacional do Livro, 1973-1980. 4v. (Dicionários especializados, 5).
- DICIONÁRIO brasileiro de artistas plásticos. Organização Carlos Cavalcanti e Walmir Ayala. Brasília: Instituto Nacional do Livro, 1973-1980. 4v. (Dicionários especializados, 5).
- KAWALL, Luiz Ernesto Machado. Artes reportagem. São Paulo: Centro de Artes Novo Mundo, 1972. v.1.
- LEAL, Daniela Viana. Oscar Niemeyer e o mercado imobiliário de São Paulo na década de 1950: o escritório satélite sob a direção do arquiteto Carlos Lemos e os edifícios encomendados pelo Banco Nacional Imobiliário. Dissertação (Mestrado em História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2003.
- LEMOS, Carlos A. C. A república ensina a morar (melhor). São Paulo: Hucitec, 1999.
- LEMOS, Carlos A. C. Alvenaria burguesa: breve história da arquitetura residencial de tijolos em São Paulo a partir do ciclo econômico liderado pelo café. São Paulo: Nobel, 1985.
- LEMOS, Carlos A. C. Arquitetura brasileira. São Paulo: Melhoramentos: Edusp, 1979.
- LEMOS, Carlos A. C. Casa Paulista: história das moradias anteriores ao ecletismo trazido pelo café. São Paulo: Edusp, 1999.
- LEMOS, Carlos A. C. Cozinhas, etc.: um estudo sobre as zonas de serviço da casa paulista. São Paulo: Perspectiva, 1976.
- LEMOS, Carlos A. C. Dicionário da arquitetura brasileira. São Paulo: Edart-São Paulo Livraria Editora, 1972.
- LEMOS, Carlos A. C. O prazer pelo desenho: os últimos 50 anos. São Paulo: Pinacoteca, 1996.
- LEMOS, Carlos A. C. O que é arquitetura. São Paulo: Editora Brasiliense, 1980.
- LEMOS, Carlos A. C. O que é patrimônio histórico. São Paulo: Brasiliense, 1981.
- LEMOS, Carlos A. C. Ramos de Azevedo e seu escritório. São Paulo: Pini, 1993.
- LEMOS, Carlos A. C. Viagem pela carne. São Paulo: Edusp, 2005.
- PANORAMA DE ARTE ATUAL BRASILEIRA, 1976, São Paulo, SP. Panorama de Arte Atual Brasileira 1976: pintura. São Paulo: MAM, 1976.
- PINACOTECA do estado de São Paulo. Catálogo geral de obras. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1988.
- SALÃO DE ARTE CONTEMPORÂNEA, 7. , Campinas, 1971. Catálogo. Apresentação de José Alexandre dos Santos Ribeiro. Campinas: MAC, 1971.
- SALÃO DE ARTES PLÁSTICAS DA NOROESTE, 6., 1985, Penápolis, SP. 6º Salão de Artes Plásticas da Noroeste. Penápolis: Funarpe, 1985.
- SALÃO PAULISTA DE ARTE CONTEMPORÂNEA, 1. , São Paulo, 1969. 1º Salão Paulista de Arte Contemporânea. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura: MASP, 1969.
- SALÃO PAULISTA DE ARTE CONTEMPORÂNEA, 4. , 1986, São Paulo. 4º Salão Paulista de Arte Contemporânea. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 1986.
- SAMPAIO, Maria Ruth Amaral de; LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira (Colab). Habitação popular paulistana autoconstruída. São Paulo: FAU/USP, 1978.
- SAMPAIO, Maria Ruth do Amaral. A promoção privada de habitação econômica e a arquitetura moderna, 1930-1964. São Carlos: RiMA 2002.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
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CARLOS Lemos.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa52/carlos-lemos. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7