Lucia Santaella
Texto
Maria Lucia Santaella Braga (Catanduva, São Paulo, 1944). Pesquisadora, professora. Gradua-se em letras, nas línguas português e inglês, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), em 1966. Obtém doutorado em teoria literária pela mesma universidade em 1973, com a tese Manuel Bandeira e a Poética do Elemento Lexical. Faz pós-doutorados na Indiana University (1993), Estados Unidos, e na Gesamthochschule Kassel (2004), Alemanha, e obtém livre-docência na Universidade de São Paulo (USP), em 1993, com o trabalho Metodologia Semiótica.
É uma das pesquisadoras brasileiras pioneiras na área da semiótica e da metodologia da ciência, com uma obra que oferece uma base teórica amplamente adotada nos cursos de comunicação do país. É considerada uma grande difusora do pensamento do filósofo inglês Charles S. Peirce (1839-1914) no Brasil, seguindo a tradição criada pelos precursores Haroldo de Campos (1929-2003) e Décio Pignatari (1927-2012) no programa de pós-graduação de teoria literária na PUC/SP. Seus interesses de pesquisa incluem a semiótica cognitiva (fundamentos biocognitivos da comunicação) e computacional e estéticas tecnológicas, com incursões na área de games (jogos eletrônicos), relações entre o verbal, o visual e o sonoro na multimídia, redação e leitura na universidade, novas tecnologias e novas gramáticas da sonoridade.
Entre 1989 e 1991, coordena o projeto coletivo de pesquisa Imagens Técnicas: do Mundo Industrial-Mecânico ao Eletrônico-Pós-Industrial, realizado em convênio entre a PUC/SP e a Finep. Entre 1992 e 1995, coordena as pesquisas O Advento de Novas Tecnologias e Novas Gramáticas da Sonoridade e, entre 1999 e 2002, Produção e Difusão da Pesquisa Científica na Era Digital, ambas financiadas pela Fapesp.
Além de ser professora titular da PUC/SP desde 1967, coleciona períodos como professora visitante em instituições estrangeiras, como na Universidade Livre de Berlim, em 1987, na Universidade de Valência, em 2004, e na Universidade de Évora, em 2010.
Coordena desde 1995 o Centro de Estudos Peirceanos no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica da PUC/SP, e dirige, desde 2000, o Centro de Investigação em Mídias Digitais (Cimid) e a pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital, na mesma instituição. Como orientadora de mais de cem trabalhos de pós-graduação, influencia toda uma geração de acadêmicos e artistas atuantes nos campos da arte e tecnologia, como o artista espanhol Julio Plaza (1938-2003), que conclui o mestrado em 1983; o professor brasileiro Arlindo Machado (1949), que conclui o mestrado em 1983 e o doutorado em 1987; o artista plástico brasileiro Marcos Rizzolli (1959), que conclui o mestrado em 1993 e o doutorado em 1999; e o artista plástico Omar Khouri (1948), que conclui o mestrado em 1992 e o doutorado em 1996.
Pelo conjunto de sua obra, torna-se presidente honorária da Federação Latino-Americana de Semiótica e, em 2004, membro-executiva da Asociación Mundial de Semiótica Massmediática y Comunicación Global, com sede no México. Durante 2007, é presidente eleita da Charles S. Peirce Society, nos Estados Unidos. Prolífica acadêmica, tem dezenas de livros publicados, dentre os quais O que É Semiótica (1983), Cultura das Mídias (1992); A Assinatura das Coisas: Pierce e a Literatura (1992); Teoria Geral dos Signos: Semiose e Autogeração(1995); Imagem, Cognição, Semiótica, Mídia (1998), com o professor Winfried Nöth (1944); Semiótica Aplicada(2002); O Método Anticartesiano de C. S. Pierce (2004); Mapa do Jogo: a Diversidade Cultural dos Games (2009); Redes Sociais Digitais: a Cognição do Twitter (2010); e Leitura de Imagens (2012). Tem também quase 300 artigos publicados em revistas acadêmicas brasileiras e estrangeiras.
É premiada, em 2002, com o prêmio Jabuti; em 2005, com o prêmio Sergio Motta de Arte e Tecnologia, e, em 2010, com o prêmio Luiz Beltrão de Maturidade Acadêmica.
Análise
Se há um tema que permeia todo o trabalho intelectual de Santaella, ele é a semiótica, definido por ela em O que É Semiótica (1983), obra da Coleção Primeiros Passos, como “a ciência dos signos”, ou a “ciência geral de todas as linguagens”. Como a autora esclarece, as linguagens podem ser verbais ou não verbais, e, como tal, não devem ser confundidas com língua.
O trabalho autoral de Santaella com semiótica inicia-se com um grupo de pesquisa sobre ensino de redação e leitura na PUC/SP, com o objetivo de analisar a incapacidade dos alunos de ler e compreender, mas também de produzir textos coerentes e claros. Buscando critérios para a análise de redações de alunos universitários - com base em seus estudos de Charles S. Peirce, do estruturalismo e pós-estruturalismo franceses e do formalismo russo -, Santaella trabalha os conceitos semióticos de primeiridade, secundidade e terceiridade, e sua relação com o discurso verbal. Desse desenvolvimento, o grupo de pesquisa analisa as redações dos universitários e desenvolve uma metodologia aplicada no curso Comunicação e Expressão Verbal: Redação e Leitura, que seria, por anos, ministrado em todas as faculdades da PUC/SP, contendo a divisão proposta por Santaella.
A experiência multiplica-se em materiais didáticos e outros cursos presenciais e televisivos e em toda a obra posterior de Santaella, com mais ou menos prioridade durante períodos determinados. É a partir de 1979 que a visualidade ganha também centralidade em seu trabalho, quando passa a compreender que a tríade da linguagem verbal está de forma recursiva inserida numa tríade maior, composta de primeiridade (linguagem sonora), secundidade (linguagem visual) e terceiridade (a linguagem verbal). Da mesma forma, também as linguagens sonora e visual poderiam ser divididas em nove modalidades cada uma. Em desenvolvimentos posteriores da categorização da autora, as linguagens sonora, visual e verbal constituiriam três importantes matrizes de linguagem e pensamento, a partir de combinações e misturas.
Em 1983, Lucia Santaella já é figura reconhecida nos meios acadêmicos de estudos semióticos, sendo saudada e estimulada por semioticistas experientes como o norte-americano Joseph Morton Ransdell (1931-2010) e o francês Gérard Deledalle (1921-2003). Suas classificações passam a ser utilizadas também em pesquisas de seus orientandos na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e de pesquisadores de pós-graduação na PUC/SP.
Com a abertura da internet para provedores comerciais, a partir de 1994, e sua ampla disponibilidade ao grande público, os estudos classificatórios de Santaella passam a abarcar uma nova vertente: a multimídia, o hipertexto e a hipermídia. A multimídia, em conceito emprestado pelo cientista norte-americano Nicholas Negroponte (1943), caracteriza-se pela mistura bits de áudio, vídeo e dados; o hipertexto, por “texto digitalizado, fluido, reconfigurável à vontade, que se organiza de modo não linear, em arquiteturas reticulares”.1 A hipermídia, por sua vez, seria “uma extensão do hipertexto, pois não se limita à informação escrita, mas permite acrescentar ao texto não apenas os mais diversos grafismos […] mas também todas as espécies de elementos audiovisuais”.2 O caminho que o usuário segue para obter a informação é alinear, numa miríade de possibilidades. A partir de 1997, Santaella busca aplicar à hipermídia as 27 modalidades das três matrizes de linguagem e pensamento antes desenvolvidas, já que, para a autora, a hipermídia articula o verbal, o visual e o sonoro.
Concomitantemente a esse desenvolvimento conceitual, Santaella publica sobre objetos concretos que referenciam a sua teoria. Assim, análises de processos de hibridização da produção artística (exemplos: os artigos Artes Híbridas e Panorama da Arte Tecnológica, ambos de 2003) que, se remontam à arte moderna e aos desenvolvimentos tecnológicos colocados naquele contexto, encontram sua necessidade na hipermídia, em que bits de diferentes matrizes necessariamente se misturam. Em Semiótica Aplicada (2004), por sua vez, entre outros temas, Santaella debruça-se sobre sobre o design de embalagens e a publicidade. Em Computer Games: the Epitome of Self-Reference (2007), contribui para uma análise semiótica de jogos de computador. Em A Cognição Conectiva do Twitter, a rede social é analisada principalmente do ponto de vista das estratégias coletivas de interação social em rede. Na obra de Santaella, não são os estudos de caso que decorrem de sua elocubração teórica, mas seu esforço de categorização que decorre de inúmeros projetos de pesquisa centrados em objetos da linguagem.
Notas
1. SANTAELLA, Lucia. Matrizes da linguagem e pensamento: sonora, visual, verbal. São Paulo: Iluminuras: Fapesp, 2005.
2. Idem.
Exposições 5
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14/10/1983 - 18/12/1983
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2/9/1985 - 9/9/1985
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23/4/1988 - 25/6/1988
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2003 - 2003
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2005 - 2005
Fontes de pesquisa 11
- BRAGA, Maria Lucia Santaella. Currículo do sistema currículo Lattes. [Brasília], 14 ago. 2014. Disponível em: < http://lattes.cnpq.br/8886485096957731 > . Acesso em: 14 ago. 2014.
- SANTAELLA, Lucia. Artes híbridas. In: Culturas e artes do pós-humano. São Paulo: Papirus, 2003. p. 133 a 150.
- SANTAELLA, Lucia. Computer games: an epithome of self-reference. In: NOTH, Winfried; BISHARA, Nina (ed.). Self-reference in the media. Berlim: Walter de Gruyter, 2007.
- SANTAELLA, Lucia. Entrevista concedida à Revista Digital de Tecnologias Cognitivas. Disponível em: http://www.pucsp.br/pos/tidd/teccogs/download/edicao5-entrevista-lucia-santaella.pdf. Acesso em: 14 ago. 2014.
- SANTAELLA, Lucia. Estudos de Peirce no COS/PUCSP. In: LAURENTIZ, S. (org.) Caderno da 1ª Jornada do Centro de Estudos Peirceanos. São Paulo: Cenep-COS/PUC-SP, 1997.
- SANTAELLA, Lucia. Matrizes da linguagem e do pensamento: sonora, visual, verbal. São Paulo: Iluminuras: Fapesp, 2005.
- SANTAELLA, Lucia. O método anticartesiano de C. S. Peirce. São Paulo: Editora Unesp: Fapesp, 2004.
- SANTAELLA, Lucia. O que é semiótica? São Paulo: Brasiliense, 1983.
- SANTAELLA, Lucia. Panorama da arte tecnológica. In: Culturas e artes do pós-humano. São Paulo: Papirus, 2003. p. 151 a 180.
- SANTAELLA, Lucia. Semiótica aplicada. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004.
- SANTAELLA, Lucia; LEMOS, Renata. A cognição conectiva do Twitter. São Paulo: Paulus, 2010.
Como citar
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LUCIA Santaella.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa3192/lucia-santaella. Acesso em: 04 de maio de 2025.
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ISBN: 978-85-7979-060-7