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Enciclopédia Itaú Cultural
Artes visuais

Jorge Bodanzky

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 11.04.2017
22.12.1942 Brasil / São Paulo / São Paulo
Jorge Bodanzky (São Paulo, São Paulo, 1942). Fotógrafo, diretor. Interessa-se por fotografia na juventude. Em 1965, ingressa na faculdade de arquitetura da Universidade de Brasília, onde se aproxima do curso de cinema implementado por Paulo Emílio Salles Gomes (1916-1977), Jean Claude Bernardet (1936), Nelson Pereira dos Santos (1928), entre out...

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Biografia 

Jorge Bodanzky (São Paulo, São Paulo, 1942). Fotógrafo, diretor. Interessa-se por fotografia na juventude. Em 1965, ingressa na faculdade de arquitetura da Universidade de Brasília, onde se aproxima do curso de cinema implementado por Paulo Emílio Salles Gomes (1916-1977), Jean Claude Bernardet (1936), Nelson Pereira dos Santos (1928), entre outros. Com o fechamento do curso pela ditadura militar, passa a atuar como repórter fotográfico. Em 1966, obtém uma bolsa para estudar fotografia na Escola Superior da Forma em Ulm, Alemanha. O departamento de cinema, para onde se transfere, é coordenado pelo diretor alemão Alexander Kluge (1932). Lá, especializa-se em fotografia de cinema. Também conhece seu futuro parceiro de documentários e longas, Wolf Gauer. Retornando ao Brasil em 1968, trabalha como repórter fotográfico na revista Realidade e faz seus primeiros trabalhos como fotógrafo de cinema em curtas documentais e longas de ficção, como Hitler 3º Mundo (1968), Gamal, O Delírio do Sexo (1969) e O Profeta da Fome (1969).

Dirige com Hermano Penna (1945) e fotografa o curta Caminhos de Valderez (1971). Ainda no início de 1970, retorna à Alemanha, onde trabalha como fotógrafo de reportagens e documentários para a TV. Funda a Stopfilm (1972) em Munique com Wolf Gauer, para produzir documentários sobre o Brasil e a América Latina. Nesta época, faz as primeiras incursões à Amazônia. A partir de 1973, trabalha em São Paulo, quando fotografa o documentário O Fabuloso Fittipaldi (1973) de Roberto Farias (1932). 

No ano seguinte, financiado pela TV alemã, retorna a Amazônia para rodar Iracema – Uma  Transa Amazônica (1974), filme em 16 mm, som direto, com codireção de Orlando Senna (1940) e uma pequena equipe de filmagem. Premiado internacionalmente após o lançamento, o filme é vetado pela censura até o início da década de 1980. Em 1975, com a mesma equipe e coprodução alemã, Bodansky e Senna partem para o sertão nordestino e realizam o longa-metragem Gitirana (1976). O filme participa da quinzena dos realizadores do Festival de Cannes, mas é censurado por mais de 5 anos no Brasil. Filma o documentário de média-metragem Jari (1979), sobre o Projeto Jari na Amazônia. 

Entre os anos 1970 e 1980, continua com Wolf Gauer a dirigir documentários para a TV alemã, como Wolkswagen: Operários na Alemanha e no Brasil (1974). Com codireção de Gauer, realiza Os Mucker (1978), também com apoio da TV alemã. Em 1981, filma a campanha para a reeleição do senador amazonense Evandro Carreira (1927-2015), o Terceiro Milênio. Ainda em 1981, Iracema – Uma  Transa Amazônica é relançado e recebe o Candango de melhor filme no Festival de Brasília. Realiza para o Globo Repórter, Amazônia, O Último Eldorado (1982). Retorna ao longa documental com Igreja dos Oprimidos (1986) em parceria de Helena Salem (1948-1999). Dos anos 1990 em diante, continua realizando documentários de curtas e médias metragens, tal como a fotografia do documentário À Margem do Concreto (2006) de Evaldo Mocarzel (1960). Produz CD-ROMs como Amazônia – Um Fantástico Universo (1996) e dedica-se à produção fotográfica tematizando a relação cultura e meio ambiente.

Análise 

Jorge Bodanzky é um cineasta reconhecido por filmes que focam o limiar entre ficção e documentário, tais como: Iracema, Uma Transa Amazônica e Gitirana, ambos em parceria com Orlando Senna; Os Mucker, com codireção de Gauer; e por documentários sobre a região amazônica, cuja maior referência é Terceiro Milênio. Estes são reconhecidos como seus  filmes mais importantes. Em Iracema, seu primeiro longa-metragem, Bodansky e Senna abordam o choque entre culturas, o deslocamento de personagens em espaços precários, a floresta amazônica, sua devastação no momento de construção da rodovia Transamazônica e a situação de penúria da população nativa. Estes temas retornam em outros filmes que resultam em denúncia social. São narrativas de viagens que incorporam na forma as  dificuldades e impasses da própria equipe durante o trajeto. Para Carlos Alberto de Mattos (1964), o deslocamento ocupa posição central no processo criativo do cineasta, constitutivo da matéria dos filmes [1]. 

Para Ismail Xavier (1947), Iracema é exemplar pelo modo como os diretores articulam a encenação e o registro documental [2]. Rodado na Amazônia, o filme é feito inteiramente em locações, com atores profissionais e amadores que interagem abertos à improvisação. Há diálogos em forma de entrevistas, intercalados a imagens documentais do espaço. O filme conta a história de Iracema [Edna de Cássia (1959)], uma nativa do interior do Amazonas que vai para Belém assistir às festas do Círio de Nazaré, torna-se prostituta, e conhece o caminhoneiro Tião Brasil Grande [Paulo César Pereio (1940)], que viaja com ela e deixa-a na beira da estrada. Na sequência final do filme, Iracema em completa decadência, reencontram-se e ele novamente a abandona. 

São visíveis as escolhas dos diretores em inserir travellings de estrada, do rio, e imagens documentais (como os imprevistos que acontecem nos arredores da floresta amazônica para construção da rodovia)  entre  as cenas ficcionais. A sequência inicial de Iracema, o caminho de barco que conduz a jovem ao seu destino, e a cena final, quando Tião deixa Iracema pela última vez, simbolizam, para Bodanzky, o encontro e a separação de dois mundos: o da estrada e o do rio [3]. Os planos abertos e cortes da paisagem acentuam o contexto social em que se passa a narrativa. Imagens de queimadas da floresta e situações de extração ilegal de seus recursos, bem como da penúria da população, são montadas como palco da trajetória de Iracema. Nesse sentido, torna-se irônico o otimismo da personagem de Pereio com o “progresso do país”. 

Gitirana tem a mesma equipe de Iracema, e mantém a mescla entre ficção e documentário. O roteiro do longa é de Orlando Senna, que adapta a peça de sua autoria Teatro de Cordel. Gitirana utiliza-se de atores não profissionais de um grupo teatral de Juazeiro, Bahia, e moradores da região que interagem com a atriz profissional Conceição Senna, no papel de Ciça. Ela é o fio condutor que liga as pequenas histórias, interpretando várias personagens, tais como uma feiticeira e uma operária. As diversas narrativas da peça são independentes. Baseadas na literatura de Cordel, as cenas estão alocadas no entorno da construção da barragem de Sobradinho, que resulta na expulsão de mais de 70 mil moradores de suas casas. Diferente de Iracema, as cenas são ensaiadas, e a equipe não interage com os atores. Mas, assim como o longa anterior, o filme produz, no modo como articula os elementos documentais com a ficção, uma denúncia da modernização engendrada pelos militares nos anos 1970.  

Os Mucker, com codireção de Gauer, narra os antecedentes e o massacre dos membros da seita de colonos alemães liderados por Jacobina Mentz Maurer (1841-1874). Massacre esse realizado pelas forças do Estado em 1874 na região de Sapiranga, Rio Grande do Sul. Como nos filmes anteriores, elementos documentais misturam-se à ficção, como o uso de atores não profissionais descendentes dos Mucker, que se utilizam do mesmo dialeto dos antepassados, e a locação no mesmo local do ocorrido. Esses atores são camponeses cujo estilo de vida rural assemelha-se ao do século XIX, e mesmo a atriz profissional que interpreta Jacobina – Marlisse Saueressig – também é uma descendente dos Mucker. O filme é um mergulho etnográfico na cultura do grupo, com uma leitura distinta da versão corrente de então, que trata os membros da seita como fanáticos sanguinários. A dupla Gauer e Bodanzky, apresenta-os como colonos comuns, semelhantes a seus pares. Os motivos do massacre são apresentados como a diferença religiosa e de costumes, como o avançado comportamento sexual de seus membros e o modo violento como respondem à perseguição de outros colonos. 

Terceiro Milênio (1981) é um documentário que aborda o choque de culturas, por meio do registro da campanha de reeleição do senador Evandro Carreira em viagem de barco por rios da Amazônia. Seu percurso compreende aldeias indígenas e comunidades ribeirinhas. O filme evoca a distância cultural de Evandro em relação àqueles que encontra no caminho. Durante a viagem, o personagem –  um típico político populista em busca de votos – aborda temas como educação, extração de madeira e religião. O senador mostra-se consciente da presença da câmera, dos efeitos de seus gestos e palavras, e não percebe que o filme não corresponde a sua autoconstrução. A sequência em que a equipe chega em uma aldeia indígena e logo é expulsa pelos habitantes é exemplar nesse sentido. O senador, de frente para a câmera, conta a história da expulsão comparando os indígenas a crianças alcoolizadas, e culpa a Funai [4] pela situação. Assim como Iracema, o filme apresenta a relação entre o estado brasileiro e a floresta, em sua precariedade. Neste sentido, diz Bodanzky em um depoimento sobre sua obra: “A satisfação é plena quando consigo juntar viagem e cinema... quanto mais longe, incômodo e precário, melhor” [5].

Filmografia:
Caminhos de Valderez (1971)
Iracema, Uma Transa Amazônica (1974) 
Gitirana (1976) 
Os Mucker (1978) 
Terceiro Milênio (1981)
Igreja dos Oprimidos (1986) 
No Meio do Rio Entre as Árvores (2009) 
 

Notas

[1] MATTOS, Carlos Alberto. Jorge Bodanzky: um homem com a câmera. São Paulo: Imprensa Oficial: Fundação Padre Anchieta, 2006. p.16.

[2] XAVIER, Ismail. Iracema – o cinema verdade vai ao teatro. Devires: cinema e Humanidades,  Belo Horizonte, v.2, n.1, p.70-85, jan-dez. 2004. p.74.

[3] MATTOS, op. cit., p. 232.

[4] Fundação Nacional do Índio – Órgão Indigenista oficial do Estado Brasileiro. 

[4] MATTOS, op. cit., p.17.

Obras 2

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Exposições 9

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Fontes de pesquisa 4

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  • ARAUJO, Mauro Luciano de. Cinema Ativista de Jorge Bodanzky – o imaginário profundo de terceiro milênio. Manuscrítica, São Carlos, n.19, p.138-156, 2011.
  • GOTTWALD JUNIOR, Luis Alberto. O Cinema Novo alemão e o docudrama cinematográfico brasileiro: aproximações de Jorge Bodanzky com o Cinema Novo alemão. Boletim Historiar, São Cristóvão, n. 12, p. 76-86, nov./ dez. 2015. Disponível em: < https://seer.ufs.br/index.php/historiar/article/view/4681 >. (Acesso em: 16 set. 2016).
  • MATTOS, Carlos Alberto. Jorge Bodanzky São Paulo: Imprensa Oficial: Fundação Padre Anchieta, 2006. (Série Aplauso).
  • XAVIER, Ismail. Iracema – o cinema verdade vai ao teatro. Devires: cinema e Humanidades; Belo Horizonte, v.2, n.1, p.70-85, jan-dez. 2004.

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