Antônio Calmon
Texto
Biografia
Antônio Augusto Du Pin Calmon (Manaus, Amazonas, 1945). Diretor de cinema, roteirista e escritor de novelas. Filho de pais cariocas, mas nascido na capital amazonense, Calmon volta ao Rio (então capital da República) aos treze anos de idade, quando seu pai se elege deputado federal. Em meio à euforia cinéfila em torno da ascensão do cinema novo, realiza junto com colegas do Colégio de Aplicação da UFRJ o curta-metragem em 16mm Infância, agraciado com o segundo lugar no 1º Festival de Cinema Amador (1965) promovido pelo Jornal do Brasil. Com o prêmio, Calmon é convidado para trabalhar como continuísta no filme A Grande Cidade (1965), de Cacá Diegues. Em seguida, faz a assistência de direção de Glauber Rocha em Terra em Transe (1967) e O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro (1969
Calmon estreia na direção de longa-metragem com O Capitão Bandeira Contra o Doutor Moura Brasil (1970), um filme irreverente que se torna fracasso de bilheteria. Depois de certo hiato (em parte decorrente das dívidas contraídas com o filme), ele volta à direção com o thriller Paranóia (1975). Seu relativo sucesso permite a Calmon uma bem sucedida carreira comercial como diretor e roteirista de filmes de gênero, dentre os quais se destacam as comédias Gente Fina É Outra Coisa (1976) e O Bom Marido (1977), os dramas sobre o submundo carioca Nos Embalos de Ipanema (1978) e Eu Matei Lúcio Flávio (1979), biografia romanceada de um policial ligado ao esquadrão da morte. Seu maior sucesso, no entanto, ainda estava por vir: o ensolarado Menino do Rio (1982). A repercussão do filme, e de sua continuação, Garota Dourada (1984), faz com que Calmon seja convidado para roteirizar uma nova série de TV inspirada em seus filmes. Armação Ilimitada (1985-88) torna-se uma série de sucesso na televisão brasileira. Calmon decide, assim, trocar o cinema pela teledramaturgia. Para a Rede Globo, escreve sucessos como Top Model (1989), Vamp (1991) e Sex Appeal (1993), além de outros títulos, como Um Anjo Caiu do Céu (2001), Começar de Novo (2004-5) e Três Irmãs (2008-9). Em 2011, tem a minissérie de sua autoria Na Forma da Lei (2010) indicada ao Emmy Internacional na categoria de melhor drama.
Comentário Crítico
Tendo Glauber Rocha como amigo de trabalho, o jovem Antônio Calmon fez sua educação cinematográfica como assistente em alguns dos principais filmes do cinema novo. Em 1970, em parceria com Arnaldo Jabor, então também um jovem cinemanovista, escreve o roteiro de Pindorama, dirigido por Jabor. No mesmo ano, estreia na direção com O Capitão Bandeira contra o Doutor Moura Brasil. Em seu enredo, Cláudio Bandeira (Cláudio Marzo) é perseguido em seus sonhos pelo doutor Moura Brasil e, ao mesmo tempo, mantém, também no universo onírico, um relacionamento com a Mensageira, interpretada por Norma Bengell. Os dois filmes não têm boa recepção. Realizado dentro do espírito marginal e lisérgico que marcou o cinema brasileiro na virada dos anos 1960 para os 1970, Capitão Bandeira é antes de tudo marcado pela ironia e pela paródia do filme de gênero. Com traços do tropicalismo, apresenta uma montagem descontínua, de colagens e citações que o tornam de difícil compreensão. Para usar uma expressão do próprio cineasta, é "ininteligível",1 mas que talvez por isso mesmo muito nos diga sobre o momento pelo qual então passava o país (o recrudescimento da ditadura).
É como "diretor de aluguel" que Calmon se reinventa na profissão. Nesse sentido, seu encontro com os roteiristas Armando Costa e Leopoldo Serran é fundamental. Com eles divide os roteiros de Gente Fina É Outra Coisa (1976), O Bom Marido (1977) e Os Embalos de Ipanema (1978) - todos filmes também dirigidos por Calmon. Em suas palavras, "foi com eles que aprendi a ser roteirista",2 ponto importante se levarmos em conta sua futura e bem sucedida carreira como autor de telenovelas. Surgem nessa época as primeiras divergências com ex-companheiros cinemanovistas que o acusam de fazer um cinema vulgar e apelativo em filmes como Eu Matei Lúcio Flávio (1979), considerado "policialesco" e "de direita", ou ainda A Mulher Sensual (1981), descartado como "pornochanchada". O crítico Jairo Ferreira sai em defesa de Calmon, que enxerga como um novo modelo de cineasta - comercial, mas também inventor:
Ele é um dos poucos que assimilou o melhor do cinema novo e o melhor do experimental que se opôs ao cinema novo, quando este começou a ficar velho. Filho de ambos os movimentos (...) talvez seja o caso de falar numa terceira posição.3
Jairo destaca ainda a necessidade de o cinema brasileiro possuir artesãos de qualidade, daí caracterizar Calmon como um "pistoleiro de aluguel que faz filmes como quem toca jazz".4
Calmon segue adiante com seu cinema comercial de invenção em Menino do Rio (1982), filme que praticamente lança sozinho um novo filão: o "filme de verão", jovem e com sabor tipicamente carioca. Nele, o surfista Ricardo (André di Biasi) se apaixona pela modelo Patrícia (Cláudia Magno) e tem de conquistá-la. Há uma sucessão de cenas em que o protagonista surfa, voa de asa delta e pratica outros esportes de ação. Sua continuação, Garota Dourada, em que Ricardo viaja ao litoral catarinense com sua filha, depois de separar-se de Patrícia, não obtém o mesmo sucesso de bilheteria. Porém, Calmon é convidado a escrever o roteiro de Armação Ilimitada (1985-1988), série de TV produzida pela Rede Globo inspirada nos dois filmes, que se torna um marco de renovação da linguagem televisiva no Brasil. O imaginário pop e a atmosfera praieira, de camaradagem e curtição, presentes nos filmes, alinham-se perfeitamente com a nova estética videoclip proposta pelo programa. Com a repercussão de seu trabalho na TV, e com a curva descendente do cinema nacional (1985 aponta já uma significativa queda na produção), Calmon passa a se dedicar à teledramaturgia e não mais volta a dirigir filmes.
Notas
1 Entrevista a Cláudia Teles. Última Hora, Porto Alegre, 20 julho 2012.
2 Idem.
3 O Jazz Criminal do Pistoleiro Calmon. Folha de S. Paulo, 8 de Outubro de 1979.
4 Idem
Obras 1
Fontes de pesquisa 11
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- CALMON, Antônio. Entrevista a Cláudia Teles. In: Segundo Caderno, Última Hora, 20 jul. 2012.
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- FERREIRA, Jairo. O jazz criminal do Pistoleiro Calmon. In: Ilustrada, Folha de S.Paulo, 8 out. 1979.
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- RAMOS, Fernão Pessoa; MIRANDA, Luiz Felipe (Orgs). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo: Senac, 2000.
- RAMOS, José Mário Ortiz. Cinema, televisão, publicidade: cultura popular de massa no Brasil nos anos 1970-1980. São Paulo: Annablume, 2004.
- RUIZ CUERTAS, Sérgio Alberto. Armação Ilimitada: análise discursiva de um seriado ficcional da TV. Dissertação de mestrado, ECA/USP, 1990.
Como citar
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ANTÔNIO Calmon.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/pessoa17466/antonio-calmon. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7