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Enciclopédia Itaú Cultural
Música

Secos & Molhados

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 14.06.2024
1973
Em 23 de maio de 1973, Gerson Conrad (1952), no violão e vocal, João Ricardo (1949), no violão, vocal e gaita e Ney Matogrosso (1941), no vocal, entram em estúdio para gravar o primeiro álbum dos Secos & Molhados. Finalizado duas semanas depois, é lançado em agosto, com shows no Teatro Aquarius, e em setembro, no Teatro Itália, em São Paulo. O c...

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Em 23 de maio de 1973, Gerson Conrad (1952), no violão e vocal, João Ricardo (1949), no violão, vocal e gaita e Ney Matogrosso (1941), no vocal, entram em estúdio para gravar o primeiro álbum dos Secos & Molhados. Finalizado duas semanas depois, é lançado em agosto, com shows no Teatro Aquarius, e em setembro, no Teatro Itália, em São Paulo. O conjunto já faz algum sucesso com apresentações em espaços musicais alternativos, como o Kurtisso Negro e a Casa de Badalação & Tédio, anexa ao Teatro Ruth Escobar, em São Paulo. Além dos três integrantes oficiais, participam da gravação Marcelo Frias, na bateria e percussão, Willy Verdaguer, no baixo elétrico, John Flavin, na guitarra e violão de 12 cordas, Sérgio Rosadas (Gripa), na flauta, e Emílio Carrera, no piano. Apesar da precária gravação em quatro canais, o LP conta com a participação de músicos e técnicos experientes. O compositor e multi-instrumentista Zé Rodrix (1947-2009) é responsável pela maioria dos arranjos, Sidney Morais, pela coordenação de produção, Júlio Nagib (1929-1983), faz a direção artística e Moracy do Val, a direção de produção. A direção musical é do estreante João Ricardo, que assina, sozinho ou em parceria, doze das treze faixas.

A capa do disco contribui para o impacto do trabalho, reforçando os elementos cênicos das apresentações ao vivo. Criada pelo fotógrafo Antonio Carlos Rodrigues (1944), é eleita em 2000 pelo jornal Folha de S.Paulo como a melhor já produzida no Brasil. Traz a cabeça dos quatro integrantes, servidas como num banquete, em meio a artigos típicos dos armazéns que dão nome ao grupo. A quarta cabeça é a do baterista Marcelo Frias, a princípio creditado como membro oficial, mas que depois decide participar apenas como músico de apoio.

Aspecto marcante do álbum é sua força poética, associada à sonoridade inovadora. Apropriando-se de elementos do folk e do rock internacional, as composições contrastam os violões de seis e 12 cordas de João e Gerson e as harmonias vocais de seus integrantes – Ney cantando uma oitava acima em relação aos demais. O grupo aproveita a tendência libertária, base rítmica e instrumentos eletrificados do rock, e acrescenta outras referências musicais. “O Vira” é resultado da parceria de João Ricardo com a cantora e compositora Luhli (1945) anterior à criação do grupo. Surge como um folk, misturando o gênero musical e coreográfico do folclore português com base rítmica e guitarras distorcidas do rock. Na segunda parte, é marcado pelo acordeom de Zé Rodrix. A música torna-se o hit do carnaval de 1974.

Importante referência para João Ricardo, principal compositor do conjunto, é o cantor e compositor escocês Donovan (1946). Este inspira duas músicas: “Rondó do Capitão”, poema de Manoel Bandeira (1900-1964) musicado por João Ricardo, e “Patrão Nosso de Cada Dia”. Nelas, a instrumentação baseia-se apenas em violão e flauta. Já “Sangue Latino” (Paulo Mendonça e João Ricardo), última música incluída no disco e primeira faixa do lado A, tem seu ritmo acentuado pelo riff de baixo do início, que depois se funde aos violões de 12 cordas, percussão e à voz de Ney. Outra influência é o quarteto Crosby, Stills, Nash and Young – cuja canção “Suite Judy Blue Eyes” é citada em “Amor”, quarta faixa do disco, que tenta alcançar o efeito obtido pelo esquema de violões e vozes. Com a melodia pronta, a letra é escolhida: o poema “Primavera de Estrelas”, escrito pelo pai do compositor, João Apolinário (1924-1988). “Primavera nos Dentes” é outro poema de Apolinário musicado pelo conjunto, extraído de um livro escrito em Portugal, na época do salazarismo. Nesta faixa, os músicos de apoio fazem um exercício de improvisação à free jazz, resultando num diálogo musical com “Breathe”, da banda inglesa Pink Floyd – com a peculiaridade de incluir violão. Dado curioso é que o grito que se destaca no verso final não é de Ney, mas do baterista Marcelo Frias.

A aproximação do grupo com a poesia também se faz com a musicalização de poemas de Cassiano Ricardo (1895-1974), “Prece Cósmica e As Andorinha”; Manoel Bandeira, “Rondó do Capitão”; Solano Trindade (1908-1974), “Mulher Barriguda”, e Vinícius de Moraes (1913-1980), “Rosa de Hiroshima”. “As Andorinhas” torna-se significativa pelo momento político de cerceamento da liberdade de expressão vivido no país. Os versos “Nos fios tensos da pauta de metal / As andorinhas gritam / Por falta de uma clave de sol” encerram-se junto com a música, conferindo-lhe força. A crítica à ditadura está latente nesta e em outras canções, como “Assim Assado”. Composta sem pretensão e considerada infantil, ela satiriza os militares com figura do Guarda Belo, vilão do desenho animado Manda-Chuva. A melodia contrapõe a agressividade da guitarra à batida leve e contagiante, pontuada pelas frases melódicas da ocarina.

O disco fecha com a canção “Fala”. Composta por João Ricardo com base na inversão da sequência de notas de “Isn’t it a Pity”, de George Harrison (1943-2001), e com letra de Luhli, o arranjo é criado por Zé Rodrix, que faz a instrumentação de piano, ocarina e sintetizador.

Completada pela performance nos palcos, a sonoridade dos Secos & Molhados transforma seu primeiro trabalho num fenômeno de vendas. É considerado o primeiro disco a unir diferentes públicos de MPB. O sucesso inesperado pega a Continental desprevenida: a prensagem inicial de 1.500 cópias logo se esgota. Em menos de dois meses seguidos ao lançamento, o álbum vende cerca de 100 mil cópias, um recorde para artistas estreantes no Brasil da época. Para atender à demanda, a gravadora recolhe discos sem sucesso de outros artistas e os refunde para ampliar a tiragem do LP. Em 1999, a Continental, incorporada à Warner Music do Brasil, lança os dois primeiros álbuns do grupo em CD, em edição especial, remasterizada e compilada pelo produtor e baterista Charles Gavin (1960).

Fontes de pesquisa 5

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  • BAHIANA, Ana Maria. Nada será como antes: MPB anos 70 - 30 anos depois. Rio de Janeiro: Editora Senac, 2006.
  • OUVIDO NU: a verdadeira história dos Secos & Molhados. Produção, direção e concepção: Daniel Iasbeck. Digital, 2012. Disponível em: http://www.youtube.com/user/tvsecosemolhados.
  • SECOS e Molhados. Site oficial da banda. Disponível em: < www.secosemolhados.com >. Acesso em: 15 nov. 2013.
  • SILVA, Vinícius Rangel Bertho da. O doce e o amargo dos Secos & Molhados. Poesia, estética e política na música popular brasileira. 2007, 467 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2007.
  • SOUZA, Tárik de. Ney Matogrosso, válvula de escape da massa. In: ______. O Som nosso de cada dia. Porto Alegre: L&PM, 1983. p. 31-34

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