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Cinema

Carandiru

Por Editores da Enciclopédia Itaú Cultural
Última atualização: 20.05.2024
2003
Carandiru (2003) é o oitavo longa-metragem de ficção de Hector Babenco (1946). O filme é uma adaptação do livro de memórias Estação Carandiru (1999), do médico e escritor Dráuzio Varella (1943), um fenômeno editorial com mais de 460 mil exemplares vendidos. O livro expõe na primeira pessoa o testemunho do médico em suas visitas à casa de detençã...

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Carandiru (2003) é o oitavo longa-metragem de ficção de Hector Babenco (1946). O filme é uma adaptação do livro de memórias Estação Carandiru (1999), do médico e escritor Dráuzio Varella (1943), um fenômeno editorial com mais de 460 mil exemplares vendidos. O livro expõe na primeira pessoa o testemunho do médico em suas visitas à casa de detenção. A partir do depoimento dos presos, narra o massacre do Carandiru, chacina cometida pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar do Estado de São Paulo. O episódio resultou em 111 presos assassinados no Pavilhão 9 (segundo os presos, são 250) em 1992.  Das 14 semanas de filmagens, quatro ocorrem na área externa do Pavilhão 5, e são as últimas imagens gravadas no interior da cadeia, antes de ser demolida. A adaptação do livro para as telas é uma superprodução com mais de 30 locações, 26 atores principais e 8 mil figurantes. Coproduzido pela Globo Filmes, Columbia Tristar, Sony Pictures e HB Filmes, Carandiru é lançado em 250 salas de todo o país (equivalente aos grandes lançamentos de Hollywood), considerado, na época, um dos grandes lançamentos nacionais do ano.

O espaço narrativo de Carandiru é o Pavilhão 9. O massacre é apresentado no final, após a caracterização de alguns personagens e situações testemunhadas por Dráuzio Varella em suas visitas como voluntário em um programa de tratamento da AIDS. Há cenas dedicadas ao registro do cotidiano da prisão, entremeadas com histórias, contadas por alguns dos detentos ao médico, que remontam aos motivos de estarem ali. Se Varella é o narrador na primeira pessoa do livro, no filme ele aparece como um observador dos acontecimentos e faz algumas considerações ao longo da história. O filme inicia-se na primeira visita do médico ao pavilhão, que corresponde, no livro, ao ano de 1989, e termina com o massacre, em 1992. Assiste-se a um presidiário veterano [Milton Gonçalves (1934)], à espera da visita da filha; a um matador profissional [Milhem Cortaz (1972)], que se torna evangélico; a um travesti, interpretado por Rodrigo Santoro (1975), se casar de véu e grinalda; a um traficante galã [Ailton Graça (1964)], disputado por duas mulheres; a um viciado em drogas que sonha em ser surfista na prisão [Lázaro Ramos (1978)]; a dois amigos assaltantes de bancos que fazem as pazes quando presos [Floriano Peixoto (1959) e Ricardo Blat (1950)], entre outras histórias. As personagens são representadas em um mundo carcerário com regras próprias, ligado aos acontecimentos exteriores por meio das suas memórias, das visitas dos familiares ou das televisões no interior das celas.

Uma sequência emblemática de Carandiru apresenta os fatos que teriam levado à entrada da polícia na casa de detenção e o decorrente massacre. Ela acontece logo após a execução do hino nacional que inaugura a final do campeonato de futebol do pavilhão. O médico dá o pontapé inicial da partida, direciona-se para sair da prisão, passa por alguns varais e cumprimenta alguns presos. A voz em over de Varella antecipa o que é a sua última vez na prisão antes do massacre: “15 dias depois, quando voltei ao presídio, só encontrei o vazio dos buracos das balas na parede.” Com a saída do médico, vemos um preso querendo pendurar uma cueca no varal. Inicia-se uma briga. Um guarda  aponta uma arma e ameaça atirar para que os presos parem com a confusão. Assistimos ao primeiro depoimento de uma das personagens sobreviventes. Ela conta que o motivo da briga a que assistimos é apenas uma das versões contadas pelos presos, que poderiam ser, também, por “cigarro ou discussão de futebol” e “até mesmo por uma cueca”. Enquanto ocorre o primeiro acerto de contas entre os grupos que brigam nos varais, a montagem paralela nos mostra o “herói” da partida sendo carregado com a taça. Eles entram no conflito que se espalha rapidamente. A sequência no conjunto apresenta a banalidade do que leva ao massacre.   

O filme de Hector Babenco tem 4,6 milhões de espectadores, uma das quatro maiores bilheterias do ano. Para a pesquisadora Regina Gomes1 tal sucesso deve-se à adoção da narrativa linear clássica, própria aos filmes do diretor; ao fato de ser uma adaptação de um sucesso editorial; à eficiente estratégia de lançamento e distribuição; além da seleção para o Festival de Cannes de 2003. A crítica, na altura do lançamento, reconhece no filme cenas bem realizadas, rigor técnico, e boa atuação do elenco. Por outro lado, observa como defeito características que tornam o filme popular e de fácil comunicação com o público como o seu classicismo cinematográfico, as qualidades técnicas que resultariam em uma estetização da miséria e da violência. Também acusa o narrador de não tomar posição em relação aos acontecimentos. O crítico de cinema Ismail Xavier (1947), por sua vez, observa em Carandiru a apresentação do ponto de vista dos detentos, tratados de modo humanizado, em oposição ao Estado (produtor do massacre e do “inferno carcerário”), em perspectiva sentimental, portanto, distinto da entonação distanciada do livro de Varella.

Carandiru recebe os prêmios de Melhor Filme no Festival de Cinema de Cartagena; Melhor Som no ABC Cinematography Award; Melhor Diretor e Melhor Roteiro Adaptado no Grande Prêmio Brasileiro de Cinema. Recebe oito prêmios no Havana Film Festival, entre os quais, o de Audiência, o Glauber Rocha e o Especial do Júri.

Notas
1. GOMES, Regina. A Crítica do cinema como objeto histórico e retórico: o caso do filme Carandiru de Hector Babenco. In.: INTERCOM – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. IX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação da Região Nordeste, Salvador, 2007. p. 2. Disponível em: < http://www.intercom.org.br/papers/regionais/nordeste2007/resumos/R0102-1.pdf >. Acesso em: 06 out. 2015.

Fontes de pesquisa 9

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  • ARAUJO, Inácio. Massacre parece colado ao filme “Carandiru”. Folha de São Paulo, São Paulo, 14 abr. 2003. Ilustrada. p.3.
  • BUTCHER, Pedro. As Memórias do Cárcere de Hector Babenco. In: NESTROVSKI, Arthur (Org.). Em branco e preto: artes brasileiras na Folha 1990-2003. São Paulo: Publifolha, 2004. p. 201-202.
  • CANNITO, Newton. Violências individuais, ausência de estado e de conflito de classes: modelos da representação da violência no cinema brasileiro. Revista de Cinema, São Paulo, n.10, dez. 2004. p.65-67
  • GOMES, Regina. A Crítica do cinema como objeto histórico e retórico: o caso do filme Carandiru de Hector Babenco. In: INTERCOM – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. IX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação da Região Nordeste, Salvador, 2007. Disponível em: < http://www.intercom.org.br/papers/regionais/nordeste2007/resumos/R0102-1.pdf >. Acesso em: 06 out. 2015.
  • JAAFAR, Ali. Protect and survive. Sight & Sound, Londres, v. 14, n. 5, p. 20-3, mai. 2004.
  • MANEVY, Alfredo. O cinema brasileiro quer sair do presídio. Revista de Cinema, São Paulo, n. 37, p.40-41, mai. 2003.
  • SOUSA, Ana Paula. No coração das celas. Carta Capital, São Paulo, n. 235, 9 abr. 2003. p.54.
  • VARELLA, Dráuzio. Estação Carandiru. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
  • XAVIER, Ismail. Humanizadores do Inevitável. Alceu, Rio de Janeiro, v.8, n.15, p.262-263, jul./dez. 2007.

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