A Grande Feira
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Histórico
A Grande Feira (1961), dirigido por Roberto Pires (1934-2001) Os personagens de A Grande Feira formam um painel heterogêneo, com parcelas da elite e do povo. Alguns pertencem à crônica popular de Salvador, como o poeta Cuíca de Santo Amaro (cujos cordéis inspiram o roteiro), que aparece na primeira e na última cena do filme, ao pé do Elevador Lacerda, um dos cartões-postais da cidade. “A grande feira de Água de Meninos vai acabar! Devorada pelos tubarões!”, anuncia Cuíca ao povo que o rodeia. O estopim da trama é esta notícia dada em tom de alarde e denúncia: o tradicional mercado popular de Água de Meninos, com seus quatro mil feirantes, está ameaçado de extinção por um grupo de especuladores imobiliários (os “tubarões”) que quer ocupar o terreno, situado bem ao lado de um reservatório de combustíveis da Esso.
Enquanto Ronny representa um idealismo inconseqüente, até farsante em certo sentido, outra figura popular, Chico Diabo (Antonio Luiz Sampaio), encarna o desespero: age de forma precipitada, sem refletir, na frustrada tentativa de explodir a indústria vizinha ao terreno da feira. Os enormes cilindros de metal da Esso compõem uma paisagem industrial propícia ao clímax do filme. As duas locações (a indústria e o cais) que marcam a parte final do filme denotam uma mudança significativa: dos espaços povoados e calorosos do botequim, do cabaré e da feira, a narrativa se desloca para geografias impessoais, vastas, desérticas e desoladoras. Pires procura, durante todo o filme, associar o comportamento dos personagens e o meio ambiente. A cena do cais, que começa com a despedida de Ronny e termina com Ely entrando no carro do marido, sinaliza o imobilismo da elite. Os movimentos de Ely e seu marido são lentos e hesitantes, confluindo para o grande plano geral, feito do alto, que dura cerca de um minuto e meio e mostra os personagens minúsculos no vazio entre os enormes armazéns, ressaltando seu conformismo e solidão existencial.
Cada personagem de A Grande Feira é ao mesmo tempo um indivíduo singular, pessoa de carne e osso, e símbolo de uma posição na estrutura da sociedade. Pires e Schindler valorizam o poder de emoção do espetáculo – a ação, o espaço – mas procuram preservar essa dimensão simbólica dos personagens como suporte de um discurso sobre o social.
A recepção crítica na Bahia é a melhor possível. Walter da Silveira elogia a fala espontânea do filme, seus “diálogos quentes, imediatos, com um arrojo popular”. Glauber, igualmente, exalta os diálogos, ainda que com ressalvas: “Os diálogos estavam imperfeitos, mas tinham vida, uma vida até então inexistente no cinema brasileiro”. Orlando Senna afirma que se trata do “primeiro filme de mise-en-scène brasileiro”.
<a href"="http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa442091/roberto-pires">Em sua estréia na Bahia, A Grande Feira faz enorme sucesso de público, quebra recordes de bilheteria e chega a superar grandes produções estrangeiras do momento, como Ben-Hur, 1959 de William Wyler. A publicidade do filme destaca o seu potencial dramático e popular. No cartaz, Luiza Maranhão é apresentada como a “Sofia Loren de Ébano”, e pode ser lida a frase: “Na grande feira tudo se vendia... o corpo e a alma numa luta primitiva de amor e crime!”.
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Como citar
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A Grande Feira.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/obra54137/a-grande-feira. Acesso em: 04 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7