Orfismo
Texto
Definição
O Orfismo pode ser descrito como uma tendência à abstração ou pintura pura, como era chamada na época em que se manifesta em Paris entre 1911 e 1914. O termo cubismo órfico é utilizado pela primeira vez pelo poeta e crítico de arte francês Guillaume Apollinaire (1880 - 1918) para diferenciar um grupo de pintores que, partindo do cubismo, dirigiam-se cada vez mais à abstração. O nome faz referência a Orfeu, poeta e tocador de lira da mitologia grega que buscou formas puras de música e que simboliza a possível fusão desta com as outras artes. Orfeu, que já havia sido evocado pelos poetas simbolistas (como o próprio Apollinaire), é o artista arquetípico, representante do poder irracional da arte. O poeta francês aponta como pintores órficos Robert Delaunay (1885 - 1941), Fernand Léger (1881 - 1955), Marcel Duchamp (1887 - 1968) e Francis Picabia (1879 - 1953). O pintor e artista gráfico tcheco Frank Kupka (1871 - 1957), que não é mencionado pelo poeta, pode ser considerado um dos primeiros a trabalhar a abstração no sentido do orfismo. Nota-se que apenas Delaunay e Picabia, que logo abandona o grupo, identificam-se com a nomenclatura cunhada por Apollinaire. Com o passar do tempo, Delaunay restringe o uso do termo ao tipo de pintura que fazia, na qual se privilegia o uso da cor e formas não-representacionais como meio de comunicar emoções e simular o movimento e dinamismo do mundo moderno. De modo geral, esses pintores se caracterizam também pela recuperação de um certo lirismo e espiritualidade na pintura, em contraposição ao que julgam ser o cubismo intelectual e austero de Pablo Picasso (1881 - 1973), Georges Braque (1882 - 1963) e Juan Gris (1887 - 1927).
Kupka é o primeiro a realizar uma pintura completamente não-naturalista ainda em 1911 e é considerado um dos pioneiros da arte abstrata. Sua série Discos de Newton (1911 - 1912) é o resultado de estudos sobre as propriedades físicas da cor e a possibilidade de representação pictórica do movimento. Sua obra Amorpha: Fuga em Duas Cores (1912) causa sensação no Salão de Outono de 1912 e provavelmente influencia a percepção de Apollinaire e da nova tendência. Desde cedo, o artista havia adotado a doutrina sobre o simbolismo espiritual da arte, bem como a crença em seus poderes "musicais", capazes de criar verdadeiras "sinfonias de cor". Ao longo de toda sua carreira, Kupka empenha-se em transmitir o significado espiritual por meio da cor e das formas abstratas (é um dos fundadores do grupo Abstraction-Création em 1931).
Por sua vez, Robert Delaunay chega à pintura abstrata ou não-figurativa somente em 1913, com a série Contrastes Simultâneos: Sol e Lua. Como no caso de Kupka, há a predominância de estruturas e movimentos circulares em seus quadros, aliados à junção vibratória de pequenos campos de cor. Delaunay acreditava que seu trabalho era o resultado lógico da revolução impressionista. Trabalha sem realizar esboços ou desenhos prévios, improvisando diretamente na tela, envolvido com as demandas do próprio material. Com tal processo, pretende atingir o que considera "a consciência moderna", fundamentalmente dinâmica. Suas pinturas justificam a descrição de Apollinaire da pintura órfica como "um novo mundo com suas leis específicas".
Já em 1913 Apollinaire perde o interesse pelo Orfismo, rompendo com Delaunay em 1914. Robert e sua esposa e discípula Sonia Delaunay-Terk (1885 - 1979) são os artistas que permanecem por mais tempo associados ao movimento. Durante a guerra, Sonia passa a realizar trabalhos de design inspirados no orfismo, principalmente estamparia de tecidos para moda. Junto, o casal realiza os figurinos e cenários para o espetáculo Cleópatra dos Balés Russos de Serge Diaghilev. Artistas americanos como Patrick Henry Bruce e Arthur B. Frost juntam-se a eles. Delaunay foi mais influente do que qualquer outro orfista: suas idéias sobre cor exercem grande influência sobre os expressionistas alemães, sobretudo os integrantes do grupo Der Blaue Reiter [O Cavaleiro Azul]. Franz Marc (1880 - 1916), August Macke (1887 - 1914) e Paul Klee (1879 - 1940) também sentem-se atraídos pela crença orfista nas propriedades musicais e espirituais da pintura.
Fontes de pesquisa 3
- CHILVERS, Ian (org.). Dicionário Oxford de arte. Tradução Marcelo Brandão Cipolla. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
- DEMPSEY, Amy. Estilos, escolas & movimentos: guia enciclopédico da arte moderna. Tradução Carlos Eugênio Marcondes de Moura. São Paulo: Cosac & Naify, 2003. 304 p., il. color.
- STANGOS, Nikos (org.). Concepts of modern art: from Fauvism to Postmodernism. 3.ed. Londres: Thames and Hudson, 1997. 424 p., il. p.b.
Como citar
Para citar a Enciclopédia Itaú Cultural como fonte de sua pesquisa utilize o modelo abaixo:
-
ORFISMO.
In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2025.
Disponível em: https://front.master.enciclopedia-ic.org/termo911/orfismo. Acesso em: 08 de maio de 2025.
Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7